Entre cervejas e mentiras

Por Beatrice Cavalcante | 11/06/2019 | Contos

Eu sou apenas uma menina assustada implorando por atenção, não estou dando em cima de você, quero apenas uma companhia para beber mais um copo de cerveja. Enquanto estou sóbria fica difícil conversarmos, mas eu juro que se você esperar mais uma ou duas cervejas eu posso ser alguém muito interessante, vou prestar atenção em tudo o que você tem a dizer, faço isso porque sei que vou esquecer tudo depois.

Estou com medo de ficar sozinha, não sou nada interessante e as pessoas não ficam muito tempo aqui, logo logo eu sei que você vai embora, provavelmente seu celular vai tocar e você dirá que precisa ir embora, sei que é mentira, mas tudo bem, obrigada pelo tempo que você dedicou a ouvir o que eu tinha para dizer, amanhã eu não vou me lembrar de nada.

Não queria me sentar sozinha na mesa do bar e pedir outra garrafa, vago pela lista de contatos e penso quem pode me fazer companhia dessa vez, chamo todos que posso e sei a desculpa que todos eles darão, vocês são previsíveis, acho que eu também. A gente finge que eu não sei que estão me evitando e eu continuo a chamar todos vocês enquanto peço outra garrafa. A essa altura já dei meu telefone para umas quatro pessoas, preciso aumentar minha lista de contatos, novas desculpas esfarrapadas para me evitar.

Fique mais um pouco, de uma chance para essa bêbada mostrar que ela pode ser interessante, pensa, logo eu estarei morta mesmo e vocês nunca mais precisarão usar das desculpas para me evitar.

O garçom está demorando, será que até ele não quer mais me fazer companhia, adoro os dois minutos que ele passa comigo, entre tirar a garrafa vazia, substituir pela cheia, abrir, jogar a tampinha na rua para que os carros amassem ao passar e encher meu copo. Eu percebi que com o tempo ele só se dá o trabalho de substituir a garrafa vazia por uma cheia, ele sabe que eu tenho meu próprio abridor. Ele não se preocupa em separar outra cadeira para caso alguém chegue, ele sabe que não vai vir ninguém, essa noite estou sozinha e por algum motivo ele sabe disso.

Um dia a mesma pessoa que me evitou, disse que eu estava bebendo demais e a única resposta que posso dar é, ninguém bebe demais enquanto está vivo.

Queria te ligar, só para ouvir a música ao fundo enquanto você me fala que não pode vir por que está em casa sozinho, gosto quando você mente para mim, acho que é exatamente por isso que sempre te ligo, na terceira garrafa meus dedos agem sozinhos, desbloqueia o celular, seu número é sempre o primeiro da lista, agora é só eu ouvir as suas mentiras e pedir a quarta garrafa.

Já está tarde e me expulsaram do bar, falaram que teriam que fechar mais cedo, afinal era segunda feira e não poderiam ficar abertos apenas por que eu queria ficar bêbada. Me serviram uma dose de whisky na esperança deu ficar bêbada mais rápido e querer ir embora, não funcionou, mas pelo menos ganhei uma dose de graça, ou eu não lembro de pagar por ela, ok eu nunca lembro das coisas mesmo, talvez eu tenha pagado por mais do que uma dose.

Eu sou apenas uma menina apavorada, de ressaca e com medo do escuro, não queria ficar aqui sozinha de novo. Por que no final eu sempre acabo sozinha? Talvez por que eu propositalmente afasto as pessoas, sei que não sou o que elas desenham de mim, sou uma pessoa horrível quando visto de perto, vai ver é por isso que as pessoas me evitam.

Estou assustada, já tomei meia garrafa de Whisky, me tranquei no quarto e não sou capaz de contar quantos remédios eu misturei, será que é solitário no inferno?