Entre A Polêmica E A Piada

Por Leonardo Castro | 22/01/2008 | Direito

Em 1984, um caso julgado pelo Judiciário paulista rendeu momentos de muita diversão durante a sessão. Uma vítima de acidente automobilístico reclamou, em oposição ao proprietário do veículo, o ressarcimento pelos danos morais e materiais sofridos. Nesse sentido, nada que cause espanto, exceto por um detalhe que tornou o caso, no mínimo, curioso - o automóvel envolvido no desastre havia sido furtado pelo acidentado. De acordo com o gatuno, o dono do veículo havia sido negligente ao deixá-lo estacionado na rua, e por isso merecia ser compensado. Parece piada, mas aconteceu. Desnecessário dizer que o pedido não foi deferido pelo 1° TACSP[1].

 

Em Rondônia, um advogado atuando em causa própria pediu, judicialmente, que o SBT – Sistema Brasileiro de Televisão – fosse condenado a pagar a quantia de R$1.000.000,00 (um milhão de reais) por danos morais sofridos. Segundo o reclamante, após a reportagem em que falsos integrantes do Primeiro Comando da Capital (PCC) faziam ameaças ao Padre Marcelo Rossi, o trauma por ele sofrido impediu a continuidade de sua rotina. Pensou até mesmo em buscar auxílio médico, pois o medo gerou intensos abalos emocionais. O juiz, em cumprimento à exigência legal, determinou o recolhimento das custas processuais - aproximadamente, R$15 mil. Foi o fim daquela ação de indenização.

 

Julgada em São Paulo, outra ação[2] merece integrar esta lista. No pedido, um consumidor pleiteou R$2 mil a título de reparação por ter ficado viciado em aguardente. De acordo com o ofendido, a empresa omitiu os efeitos do produto em suas campanhas publicitárias, onde a bebida era freqüentemente vinculada ao prazer. Na petição, foi frisado que a vítima passou a consumi-la por acreditar na inocuidade da cachaça.

 

Na cidade de Tubarão, em Santa Catarina, uma jovem moradora recorreu[3] ao instituto da responsabilidade civil para ressarcir os danos morais sofridos ao ser barrada em um baile. O organizador da festa justificou que, previamente, foi solicitado certo traje aos convidados, o que não foi atendido pela reclamante. Na sentença. O magistrado desabafou: “No Brasil, morre por subnutrição uma criança a cada dois minutos, mais ou menos. A população do planeta já ultrapassou seis bilhões de pessoas e um terço deste contingente passa fome, diariamente. A miséria se alastra, os problemas sociais são gigantescos e causam a criminalidade e a violência generalizada. Vivemos em um mundo de exclusão, no qual a brutalidade supera com larga margem os valores humanos. O Poder Judiciário é incapaz de proporcionar um mínimo de justiça social e de paz à sociedade. E agora tenho de julgar um conflito em decorrência de um vestido! Que valor humano importante é este, capaz de gerar uma demanda jurídica?”.

 

Por fim, na França, um adolescente processou a mãe por ter nascido com deficiência física decorrente da rubéola contraída pela mãe durante a gestação. Em sua defesa, a genitora afirmou ter pedido aos médicos a interrupção da gravidez, caso o diagnóstico fosse confirmado, mas não foi atendida. Dentre os casos aqui contados, este é o único que obteve sucesso.

 

[1] 1° TACSP - 4ª C. - Ap. – Rel. Olavo Silveira – j. 21.03.84 – RT 584/146

[2] TJSP – 8ª Câmara de Direito Privado – Ap. Cível n. 450.015-4/0-00 – Rel. Salles Rossi.

[3] TJSC – Comarca de Tubarão – Ação Ordinária n. 075.99.009820-0 – 11.07.2002.