ENSINO E FORMAÇÃO DOCENTE: UMA PERSPECTIVA VARIACIONISTA EM SALA DE AULA

Por talita nobrega da silva | 18/03/2011 | Educação

ENSINO E FORMAÇÃO DOCENTE: UMA PERSPECTIVA VARIACIONISTA EM SALA DE AULA

TALITA CHRYSTINA NÓBREGA DA SILVA
diasnobrega@hotmail.com



Resumo

Este artigo tem a finalidade de apresentar a correlação entre a língua abordada na escola e a língua materna dos alunos, partido do pressuposto de que essa dualidade existencial pode perfeitamente contribuir para uma melhoria do ensino ? aprendizagem num contexto especifico de sala de aula. Traçar uma abordagem entre os supostos erros de leitura motivados pela não decodificação correta dos grafemas e/ou pela própria questão da variação dialetal influenciando na leitura dos alunos. Porque, a variação da língua é inerente a qualquer comunidade de fala e, portanto, essa variação estigmatizada pelos alunos podem ser postas em prática em um ambiente escolar, já que pode ter sido adquirida desde os primeiros contatos com a língua.

Palavras ? Chaves: Variação Dialetal, Formação Docente e Sistema Educacional.


1. INTRODUÇÃO

Estudos sobre a aquisição da leitura e da escrita, sob o ponto de vista do desenvolvimento da linguagem e suas respectivas mudanças dialetais, são elaborados atualmente através de algumas correntes da lingüística como, por exemplo, a sociolingüística, correlacionando os possíveis desacertos entre "erros" ortográfico-gramaticais de mudança lingüística e/ou dialetal.
Partindo desse suporte teórico, é essencial que todos os docentes envolvidos com a questão do ensino materno da língua, adquiram conhecimentos que os tornem cientes de suas funções como profissionais capacitados para compreenderem que em sala de aula existem diversificados modos de comunicação para apregoar um mesmo sentido de interação entre os falantes.
Através dessa conscientização lingüística, devemos praticar uma reflexão sobre a língua no que tange à sua funcionalidade e a subjetividade de compreensão e expressão dos discentes, em contextos específicos de discursos interacionistas. Nessa perspectiva, compreenderemos que a oralidade ? escrita ? leitura são ocorrências que se complementam ao mesmo tempo em que permitem aos sujeitos sociais construir seus próprios conhecimentos sócios ? cognitivos.


2 A LINGUISTICA NA SALA DE AULA

Os avanços nos estudos lingüísticos a partir dos anos 60 do século XX foram muito significativos para o ensino, com eles tiveram início estudos mais aprofundados voltados para a leitura e a produção de textos. Assim, a implementação de estudos voltados para a leitura e o texto, com o tempo, assumiram posturas bem diferenciadas com base nas concepções de linguagem adotadas. Desde uma concepção behaviorista até chegar ao modelo sócio-interacionista, em que a linguagem é tomada em seu aspecto não só social, mas também histórico, em que ela passa a ser vista como interação, com características dialógicas.
A Sociolingüística vem, desde então, exercendo um papel essencial, quanto à diversidade lingüística, no processo de ensino/aprendizagem, demonstrando que a escola não deve fazer restrições às diferenças sociolingüísticas dos alunos. Mas essa não é uma tarefa muito fácil, pois, como afirma Bortoni?Ricardo (2005, p. 14), "a escola é norteada para ensinar a língua da cultura dominante; tudo o que se afasta desse código é defeituoso e deve ser eliminado".
Nas comunidades lingüísticas, influenciadas pelas relações sociais, não é de se pensar em uma padronização da língua, ou seja, uma homogeneização, mas sim, numa heterogeneidade lingüística. Essa heterogeneidade está baseada nas relações intra - comunidade ou inter-comunidades, tendo em vista que cada comunidade sócio-dialetal tende a valorizar ás suas próprias particularidades dialetais, ao mesmo tempo inferiorizando os dialetos que não pertencem ao grupo.
A escola, muitas vezes, ao não reconhecer as peculiaridades dos educandos oriundos dos meios sociais minoritários, transforma-se em um meio sócio-excludente, porque, agindo assim, está corroborando para o fracasso escolar que é refletido na evasão de sala de aula, repetência em série e, às vezes, leva os discentes ao constrangimento em sala de aula.
Geraldi (1985) enfatiza que a função dos agentes escolares é de reproduzir as formas dialetais dos grupos dominantes. Assim, ele afirma:

Cabe ao professor, ao impor a norma, que está relacionada aos dialetos marcadores das classes dominantes, silenciar os detentores dos dialetos marcados pela classe ou origem de classes dos dominados (GERALDI, 1985, p. 26).


Ainda sobre este assunto, Bortoni-Ricardo (2004) advoga que:

[...] é pedagogicamente incorreto usar a incidência do erro do educando como uma oportunidade para humilhá-lo". Ao contrário, uma pedagogia que é culturalmente sensível aos sabres dos educandos está atenta às diferenças entre a cultura que representam e a da escola, e mostra aos professores como encontrar formas efetivas de conscientizar os educandos sobre essas diferentes. Na prática, contudo, esse comportamento é ainda problemático para os professores [...]. (BORTONI-RICARDO, 2004, p. 28)


Sobre essa afirmação da autora, constatamos claramente que a relação dialética existente entre as concepções de linguagem varia consideravelmente baseada na relação docente-discente, porque, como todos nós sabemos, a língua é um campo lingüístico-ideológico baseado no jogo de poder. Por isso, parece-nos bem perceptível que esse conflito acerca da linguagem é motivado, principalmente, como forma de auto-afirmação de um dado grupo social em detrimento de aspectos lingüísticos pertencentes a certas comunidades de fala.
Esse não reconhecimento dos aspectos pessoais relacionados à fala dos alunos é muito prejudicial para o próprio processo de aprendizagem dos mesmos, uma vez que, sentem-se inseguros e colocam em xeque o próprio papel da escola. Prega-se na mídia institucional que a escola é um instrumento social eficaz de combate às injustiças motivadas por ordem econômica e cultural Muito embora, ela é uma mera reprodução nítida dessa exclusão dialetal, na medida em que prioriza-se a padronização da língua em detrimento da variação lingüístico-dialetal dos alunos que é inerente a qualquer comunidade de fala.
A escola tenta, às vezes, ensinar a norma culta, sem respeitar as variações trazidas pelos alunos de suas respectivas comunidade de convívio. Uma criança, ao ingressar na escola, traz uma rica prática de linguagem e, no entanto, a escola não reconhece esse fato. Ao invés de aprimorar sua competência comunicativa, em muitos casos, interrompe-a e impõe a norma culta de maneira inadequada, desrespeitando seus princípios e conhecimentos prévios. Agindo dessa maneira, a escola está cultivando o preconceito lingüístico e a discriminação social.
Por conseguinte, faz-se necessário ao educador conhecer a dinâmica dessas variedades e sua correlação com o ambiente educacional, em uma tentativa de se atenuar o preconceito acerca da diversidade da língua. No entanto, a escola não estimula o incremento das variedades da linguagem, apenas impõe aos alunos uma afeição muito grande sobre as normas contidas na gramática tradicional.
É interessante que todos os professores envolvidos com o ensino de língua materna tenham conscientização de que existe uma gama enorme de variação em um contexto social como a escola e, principalmente, deve conhecer muito a respeito de linguagem e estar ciente de como se dá o processo de aquisição lingüística. Essa conscientização é necessária para que as crianças deixem de ser unicamente falantes de uma língua para tornarem - se leitores e escritores.


Considerações Finais

A língua é fundamental nas relações dos indivíduos que pertencem a certas comunidades de fala, possibilitando uma interação comunicacional. A linguagem não é estática, uma vez que sofre diversas mudanças exteriores a língua, isto é, os fatores extralingüísticos (profissão, o sexo, a escolaridade, a faixa etária e contextos econômico ? regionais) dos falantes são fatores preponderantes que interferem na aquisição da linguagem desses.
Contudo, a nossa contribuição é no sentido de conscientizar todos os profissionais de ensino de língua, para que eles tenham, realmente, de fato, uma preocupação incessante no que tange à educação da língua materna e, que o espaço de sala de aula seja um ambiente propício de intercâmbio multidialetal e cultural, respeitando todas as marcas variacionistas.
Conseqüentemente, seria mais interessante se a escola repensasse seus conceitos de como agir perante a diversidade dialetal dos educandos. Esse seria um ponto importantíssimo para a construção de um conhecimento que vai muito além das variações e da norma culta. E Sabendo que o preconceito lingüístico é um fator existente em sala de aula e que a variação é fator comum e participa do cotidiano do ensino de língua portuguesa, concluímos que o respeito pela língua materna e o combate urgente do preconceito lingüístico, são importantes dentro do contexto sócio-educativo.
Logo, faz-se necessário que todos os profissionais envolvidos com o ensino da língua materna em sala de aula, procurem adaptar-se a essa diversidade verificada na fala dos alunos. Para tanto, é imprescindível que todos eles possam adquirir conhecimentos psicolingüísticos acerca da diferenciação entre "erro" fonético ou gramatical de supostos "erros" lingüísticos ou dialetais.
REFERÊNCIAS
BAGNO, Marcos. Preconceito lingüístico: o que é, como se faz. São Paulo: Parábola, 2003.
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BORTONI-RICARDO, S. M. Educação em língua materna: a sociolingüística na sala de aula. São Paulo: Parábola, 2004.

______. Nós cheguemus na escola, e agora? : sociolingüística e educação. São Paulo: Parábola, 2005.
CALVET, L. Sociolingüística: uma introdução crítica. São Paulo: Parábola, 2002.

FERNÁNDEZ, F. M. Metodologia sociolingüística. Madrid: Gredos, 1990.

GNERRE, M. Linguagem, escrita e poder. 4. ed., São Paulo: Martins Fontes, 1998.