Ensaio sobre a conceituação, as características e nova concepção de governança...

Por Gabriela de Campos Sena | 04/09/2016 | Direito

Ensaio sobre a conceituação, as características e nova concepção de governança corporativa fundamentada no princípio da complexidade

Conceitualmente, entende-se por governança corporativa “o sistema pelo qual as empresas e demais organizações são dirigidas, monitoradas e incentivadas, envolvendo os relacionamentos entre sócios, conselho de administração, diretoria, órgãos de fiscalização e controle e demais partes interessadas. ”[1] Assim, tem-se que a governança corporativa se preocupa em “criar um conjunto eficiente de mecanismos, tanto de incentivos quanto de monitoramento, a fim de assegurar que o comportamento dos administradores esteja sempre alinhado com o melhor interesse da empresa. ” [2]

            Dentro das empresas, a governança corporativa assume o propósito de controle e coordenação, de integração entre unidades (em caso de existência de vários estabelecimentos), suprimento e alinhamento das estratégias empresariais para promover uma boa gestão (material, financeira, de recursos humanos e etc). Assim, para o Instituto Nacional de Governança Corporativa (IBGC), “as boas práticas de governança corporativa convertem princípios básicos em recomendações objetivas, alinha interesses para preservar e otimizar o valor econômico de longo prazo, facilita acesso a recursos e contribui para a qualidade, longevidade e o bem comum na gestão. ”[3]

                A doutrina empresarial considera que o sucesso da governança corporativa (GC) depende dos membros responsáveis pela gestão, assim, a GC “tem de ser composta por profissionais que realmente estejam atentos, alinhados e conectados não somente com as questões de micro e macro interesse e não só no Brasil, mas ao menos, no mundo que interessa ao negócio. ”[4]

            Além de lidar com processos decisórios e gerenciais da empresa e/ou organização econômico-empresarial, a governança corporativa se tornou também “o conjunto de mecanismos que visam a fazer com que as decisões corporativas sejam sempre tomadas com a finalidade de maximizar a perspectiva de geração de valor de longo prazo para o negócio. ” [5]

            No Brasil, a governança corporativa possui quatro objetivos primordiais que são seguidos pelas empresas e demais organizações empresariais:

  1. a) Aprimorar continuamente o processo decisório, de forma a assegurar que as decisões sejam tomadas no melhor interesse de longo prazo da organização: este objetivo diz respeito a atuação dos órgãos de governança como conselho, comitês e diretoria, mecanismos de avaliação de desempenho, sistema de remuneração, fluxo de informações, seleção de pessoas, sucessão de lideranças etc. b) Reduzir a probabilidade de surpresas negativas: contempla os temas relativos à gestão dos riscos, compliance, controles internos, auditorias interna e independente, canais de denúncia, ouvidoria, adesão aos princípios éticos e valores da organização, mitigação dos conflitos de interesses etc. c) Proporcionar elevada transparência para os públicos interno e externo: aborda temas como transparência das informações financeiras e não financeiras, sustentabilidade e impactos socioambientais, prestação de contas e relacionamento com stakeholders d) Promover o exercício efetivo dos direitos de todos os sócios: trata dos procedimentos relativos à assembleia de acionistas, previsões estatutárias, eleição de administradores, canais de comunicação com investidores, mecanismos para resolução de disputas societárias, entre outros. [6]

            A governança corporativa assume traços diferenciados em cada país, mas cada continente possui um foco específico para a gestão empresarial. No caso da América latina há algumas peculiaridades que são inexoravelmente seguidas:

  1. mercado de capitais pouco expressivo e reduzido número de companhias abertas; II. gestão exercida por acionistas majoritários; III. o conflito de agência “predominante, associável à concentração do capital, é entre acionistas majoritários e minoritários”; IV. a proteção legal a minoritários é “predominantemente fraca”; V. a composição dos conselhos “é afetada pela sobreposição propriedade-gestão”; VI. a governança corporativa é “embrionária, mas evoluindo com rapidez”; VII. “prevalecem os interesses dos acionistas”. [7]

            Uma das grandes preocupações da governança corporativa é sobre os ativos da empresa. Os ativos devem ser bem gerenciados para poupar gastos e evitar futuras dificuldades financeiras da atividade empresarial. “Além da redução do custo de capital, um sistema de governança eficiente pode gerar um conjunto de benefícios internos, que melhoram as perspectivas de fluxo de caixa das empresas”. [8]Os mencionados benefícios se traduzem, segundo a ciência da administração, na:

Separação mais clara de papéis entre acionistas, conselheiros e executivos, especialmente em empresas de controle familiar; aprimoramento do processo decisório da alta gestão, com definição mais clara dos responsáveis pelas etapas de iniciação (geração de ideias), aprovação, implementação e monitoramento (avaliação dos resultados vis-à-vis às metas, com estabelecimento de recompensas ou punições); aprimoramento dos mecanismos de avaliação de desempenho e recompensa dos executivos, incluindo a estruturação de pacotes de remuneração mais adequados; diminuição da probabilidade de fraudes, em decorrência do melhor gerenciamento dos riscos e do aprimoramento dos controles internos; e maior institucionalização (menor dependência de pessoas específicas) e maior transparência perante os stakeholders (partes interessadas) da empresa. [9]

            Segundo a Ciência da Administração existem dois benefícios principais acarretados pela governança corporativa nas empresas: “os benefícios externos, associados à maior facilidade de captação de recursos e à redução do custo de capital; e os benefícios internos, vinculados ao aprimoramento do processo decisório na alta gestão. ”[10] Assim, de forma sucinta apresentar-se-á o modelo geral de governança brasileiro no quadro abaixo:

Quadro 1- Governança corporativa no Brasil

Premissas do fluxo das atividades de governança.

Propósito de governança corporativa no Brasil

Cuidados para a implementação da GC

1. Promover o maior retorno possível dos investimentos.

2. Capacidade de otimização do caixa.

3.Maior atenção aos acionistas e investidores.

4.Avaliação frequente.

5.Características sociais e econômicas do Brasil.

1. Alinhamentos

2. Conformidade.

3. sustentabilidade

4. estruturas.

5. Processos.

6. Dimensão social.

7. Dimensão sistêmica.

8. Crises e riscos.

9.Fim dos tradicionais e convencionais comportamentos.

10. Inovação.

1. Comitê para proteger a corporação das crises.

2. Comitê para monitorar os riscos.

Fonte: elaborado pela autora com dados extraídos da obra “matesco, karen. araújo, Luiz César de. Ações estratégicas. Desafios e caminhos para a gestão contemporânea. São Paulo: Atlas, 2004. ”

            No Brasil, a governança corporativa também se preocupa com a reputação das empresas. É a chamada reputação corporativa que é definida como “a reação afetiva ou emocional líquida (boa ou má, fraca ou forte) de clientes, investidores, fornecedores, empregados e do público em geral diante do nome da empresa. ” [11]

Em síntese, a reputação é um produto de um processo competitivo no qual a firma sinaliza suas características distintas para o público (interno e externo à empresa), tendo como resultante o seu status moral e socioeconômico. Derivado do conceito de reputação corporativa, o capital reputacional é aquela porção do valor de mercado da empresa que pode ser atribuída à percepção da firma como uma corporação de boa conduta no mercado. [12]

            Para se construir uma boa governança empresarial, ou seja, uma boa governança corporativa é necessário construir, simultaneamente, uma boa reputação e prezar pelos ativos da organização econômica. Assim, surge a necessidade de se reconstruir a concepção de governança corporativa para incluir maior responsabilidade social que é um consectário da reputação corporativa e, simultaneamente, construir um conceito de governança fundamentado no princípio da complexidade para abarcar problemas profundos existentes dentro das empresas, principalmente, no que tange aos aspectos de despesas com demandas judiciais.

            Infelizmente, a concepção de governança corporativa adotada no Brasil não engloba os riscos do descumprimento da legislação e dos ACT’s e CCT’s que geram a propositura de demandas judiciais trabalhistas, fator esse que interfere diretamente no ativo da empresa que se vê obrigada, pela legislação nacional, a quitar juros e correção monetária pelo descumprimento.

            Segundo a lei 8. 177 de 01 de março de 1991, que estabelece regras para a desindexação da economia, os juros dos passivos trabalhistas possuem taxa de cálculo baseada em juros diários. A lei adota a taxa referencial de juros diária (TRD):

Art. 39. Os débitos trabalhistas de qualquer natureza, quando não satisfeitos pelo empregador nas épocas próprias assim definidas em lei, acordo ou convenção coletiva, sentença normativa ou cláusula contratual sofrerão juros de mora equivalentes à TRD acumulada no período compreendido entre a data de vencimento da obrigação e o seu efetivo pagamento.

  • 1° Aos débitos trabalhistas constantes de condenação pela Justiça do Trabalho ou decorrentes dos acordos feitos em reclamatória trabalhista, quando não cumpridos nas condições homologadas ou constantes do termo de conciliação, serão acrescidos, nos juros de mora previstos no caput juros de um por cento ao mês, contados do ajuizamento da reclamatória e aplicados pro rata die, ainda que não explicitados na sentença ou no termo de conciliação.
  • 2° Na hipótese de a data de vencimento das obrigações de que trata este artigo ser anterior a 1° de fevereiro de 1991, os juros de mora serão calculados pela composição entre a variação acumulada do BTN Fiscal no período compreendido entre a data de vencimento da obrigação e 31 de janeiro de 1991, e a TRD acumulada entre 1° de fevereiro de 1991 e seu efetivo pagamento. [13]

[...]

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