ENCONTRO INESPERADO

Por Romano Dazzi | 29/05/2009 | Crônicas

ENCONTRO INESPERADO

De Romano Dazzi

 

Vencidas as últimas dúvidas, Felipe abriu o site que o amigo lhe tinha  indicado.

Além dos desenhos graciosos, havia somente um endereço – na zona sul da cidade – e um botão para abrir um chat.

Felipe apressou-se, antes que sua curiosidade esmorecesse e encontrou-se diante de um  jardim de rostos femininos, com sorrisos convidativos, maliciosos, ingênuos, selvagens. Seriam talvez uns cinqüenta, cada um com aspecto bem diferente. O fotógrafo havia feito uma obra de arte.

“Sou o Mário” – mentiu ele, ao entrar na conversa.  

“ Muito prazer, respondeu uma voz inexpressiva do outro lado; e mentindo também, completou:  – “e eu sou a Maria”...

- “Gostaria de conhecer a Monique...”

-‘Ótima escolha, Mário; ela é uma francesinha muito inteligente, recém chegada de Paris, onde acabou de se formar em línguas neolatinas, na Sorbonne...”

“Papo furado” - pensou o Felipe; mas aceitando o jogo, prosseguiu: “gostaria de vê-la hoje, às três. O endereço é o que esta aqui no site? “ 

 -“Sim, confirmado; então vemo-nos hoje, às três, está bem?”

“Está bem. Até lá!”.

 

Tempos modernos, pensou o Felipe.

Não era dado a este tipo de encontros; aliás, lembrava-se bem da primeira vez que tinha visitado uma dessas casas, trinta anos antes, com um amigo muito  mais atirado que ele. 

Ao entrar, vira dez ou doze moças perfiladas que aguardavam sorrindo, esperando ser escolhidas.

O empreendimento todo funcionava como uma cooperativa, mas  a moça que conseguia algum encontro recebia um bônus – que dobrava a sua entrada.

Tempos novos, novas abordagens..

A oferta agora era pública, pela internet, e o cliente já recebia o pacote pronto, sem dar bandeira, sem provocar constrangimentos.

É o progresso, pensou...

 

Às três, em ponto, estacionou numa esquina próxima, sob o exame descarado das vizinhas.

Todo o mundo sabia exatamente o que ele vinha fazer, naquela casa de tijolinhos, de aparência modesta e que pouco chamava a atenção.

Tocou a campainha, a porta abriu-se e ele entrou rapidamente.  

Na sala de paredes esverdeadas,  apenas duas ou três poltronas, um sofá, duas mesinhas com revistas. Um barzinho num canto.

Com a iluminação escassa ficava difícil reconhecer o rosto escolhido. 

Mesmo porque a Monique da foto estava coberta por uma grossa demão de maquiagem.

A “Maria” apresentou-se e fez entrar o cliente num quarto modesto, mas bem decorado – talvez, pensou o Felipe, o melhor quarto da casa...

– “Monique já vem” - disse ela carinhosamente – “fique a vontade. Quer beber alguma coisa? “

–“Não, obrigado, agora não . Eventualmente, mais tarde...” 

Maria deixou-o.  Dois minutos depois, apareceu a Monique. 

Surpresa! 

-“Doutor Felipe! O senhor por aqui?!!” 

E ele, de volta - : “Maria Antonieta, você por aqui?!!” 

À surpresa seguiu-se um sorriso, uma risada, um abraço de camaradagem.

Maria Antonieta tinha sido  empregada na casa do Felipe por uns dois anos.

Uma menina quieta, trabalhadora, de confiança.  

Um dia, tinha sumido, simplesmente. 

– “Mas não fui à França, não; – confessou ela – fui a Franca, no norte do Estado e lá dei um duro danado; mas consegui quase tudo o que queria.

Agora estou formada e estou cursando especialização na USP.

Sou quase uma doutora, como o senhor!... Falta-me um ano só! 

E foi com esta profissão que financiei meus estudos....

Quem sabe, ainda vou para a Sorbonne daqui a dois anos....”

 

- “Mas por que não nos disse nada?” – perguntou o Felipe depois da saraivada de explicações da Maria Antonieta

- “Porque com o salário de fome que recebia, não dava mesmo  para dar nem um passo à frente, muito menos para cima.  Tinha que me livrar daquela situação...”

 

Sentaram na beira da cama e papearam durante duas horas.

Maria Antonieta perguntou pelas crianças, pela saúde de dona Amélia, e pelo reumatismo da mãe dela, dona Berenice. E quis saber mil pormenores sobre a vida deles, pois sentira muita falta daqueles tempos... E o Felipe quis saber de seus planos, de suas idéias, e perguntou repetidamente como poderia ajudá-la.

Quanto à profissão, ela concordou que antigamente, sim, era uma coisa muito feia..

Mas com a modernidade os preconceitos caíram; agora, no nível dela, ela podia escolher com quem sairia e raramente tinha algum contratempo.

 

Foram duas horas maravilhosas, rolou intimidade, carinho, amizade, respeito, tudo junto. Menos sexo, naturalmente.

Ficaram ambos felizes, sentiram-se mais leves e, de uma certa forma, mais limpos, até;  e prometeram-se que, daí para a frente, combinariam mais encontros desses.

 

Quando saíram, a “Maria”, com um sorriso cúmplice e maroto, comentou:-  “Serviço completo, hoje, não é?” 

Sim, responderam ambos; e a senhora não imagina como!....