Empreender E Fracassar
Por Emilia Cruz | 12/12/2007 | AdmEsse é o resumo de um dos episódios vividos por mim e muitos brasileiros que participam do mercado varejista, que me marcou e merece ser relatado. O Gerente de perecíveis do hipermercado me chamou para começar a discussão. O primeiro tem sempre a obrigação de trazer à tona as questões mais relevantes, apontar as variáveis críticas, separar o joio do trigo e apresentar um início de solução. "Antes de mais nada, eu mandaria embora 10 funcionários não essenciais, economizando alguns reais. Postergaria por seis meses os gastos com aquisição de novas máquinas e alteração de "layout", porque nossa estrutura já era muito boa. Cancelaria nossos programas de treinamento por um ano, já que estaremos em compasso de espera. Finalmente, cortaria 95% de nossos projetos de novos produtos, afinal nossa sobrevivência vem em primeiro lugar". É exatamente isso que as empresas brasileiras estão fazendo neste momento, muitas até premiadas por seus "produtos inovadores".
Terminada a exposição, o Gerente disse:
- Levante-se e saia da sala.
- Desculpe Senhor, eu não entendi – respondi meio aflito.
- Eu disse para sair desta sala e nunca mais voltar. Eu disse: PARA FORA! Nunca mais ponha os pés aqui neste mercado. Ficamos todos boquiabertos e com os cabelos em pé, eu e os demais supervisores presentes. Nem um suspiro. Comecei a soluçar e, cabisbaixo, me preparei para deixar a sala. O silêncio era sepulcral.
Quando estava prestes a sair, o gerente fez seu último comentário:
- Agora vocês sabem o que é ser despedido. Ser despedido sem mostrar nenhuma deficiência ou incompetência, mas simplesmente porque um bando de prima-donas na sede da empresa meteu medo em todo mundo. Nunca mais na vida despeçam funcionários como primeira opção. Despedir gente é sempre a última alternativa. Aquele momento foi uma lição e tanto. É fácil despedir 10 funcionários de cada seção como se fossem simples linhas de uma planilha eletrônica, sem ter de olhar cara a cara para as pessoas demitidas. É fácil sair nos corredores da empresa prevendo o fim da economia ou aumentar as taxas de juros para 25% quando não é você quem tem de despedir centenas de funcionários nem pagar pelas conseqüências. Consultores, pelo jeito, nunca chegam a estudar casos como esse nos cursos de política monetária.
Se você decidiu reduzir seus gastos familiares "só para se garantir", também estará despedindo pessoas e gerando uma recessão. Se todas as empresas e famílias cortarem seus gastos a cada previsão de crise, criaremos crises de fato, com mais desemprego e mais recessão. A solução para crises são reservas e poupanças, poupança previamente acumulada.
O correto é poupar e fazer reservas públicas e privadas, nos anos de vacas gordas para não ter de despedir pessoas nem reduzir gastos nos anos de vacas magras, conselho milenar. Poupar e fazer caixa no meio da crise é dar um tiro no pé. Demitir funcionários contratados a dedo, talentos do presente e do futuro, é suicídio.
Se todos constituíssem reservas, inclusive o governo, ninguém precisaria ficar apavorado, e manteríamos o padrão de vida, sem cortar despesas. Se a crise for maior que as reservas, aí não terá jeito, a não ser apertar o cinto, sem esquecer aquela memorável lição: na hora de reduzir custos, os seres humanos vêm em último lugar.