Educação psicomotora no 1° ano do Ensino Fundamental

Por JACKELINE FERREIRA SARMENTO | 02/08/2011 | Educação

O SABER DOCENTE EM QUESTÃO: ANALISANDO A EDUCAÇÃO PSICOMOTORA NO 1° ANO DO ENSINO FUNDAMENTAL

Jackeline Ferreira Sarmento#

Resumo: Este estudo apresenta o tema "O saber docente em questão: analisando a educação psicomotora no 1° ano do ensino fundamental de uma escola estadual no centro de Manaus". A psicomotricidade é relevante por apresentar-se como ciência que visa auxiliar o professor em sua prática pedagógica contribuindo para a aprendizagem. Trata-se de um tema de grande relevância para a formação acadêmica, considerando ser a educação psicomotora fundamental para o desenvolvimento global dos alunos e, portanto, essencial ser implementada na prática docente. O objetivo geral da pesquisa é analisar a contribuição da educação psicomotora para a aprendizagem em uma turma do 1° ano do ensino fundamental de uma escola estadual no centro de Manaus. Os objetivos específicos visam: apontar as contribuições da educação psicomotora para o processo de ensino e aprendizagem; conhecer o saber docente sobre a psicomotricidade e sua contribuição para a aprendizagem; e esclarecer como a educação psicomotora pode ser desenvolvida na prática pedagógica cotidiana no 1° ano do ensino fundamental. A pesquisa apresenta-se como qualitativa e explicativa, tendo como procedimentos metodológicos: a pesquisa bibliográfica e de campo. Como técnicas de coleta de dados, utilizou-se a observação participante e o questionário. Para a análise dos dados coletados, utilizou-se da técnica de análise do discurso. As contribuições da educação psicomotora para a aprendizagem foram evidenciadas por meio do referencial teórico construído, embasado em teóricos que abordam a temática, refletindo a cerca da psicomotricidade como promotora da aprendizagem. Os resultados obtidos revelam a dificuldade em relacionar a psicomotricidade com a aprendizagem, e por este motivo acaba-se não percebendo e conseqüentemente não utilizando todas as contribuições que a educação psicomotora proporciona para a aprendizagem das crianças no 1° ano do ensino fundamental.


Palavras-Chave: Psicomotricidade. Educação psicomotora. Aprendizagem.


INTRODUÇÃO


O estudo sobre "a contribuição da psicomotricidade para a aprendizagem em uma turma do 1° ano do ensino fundamental" torna-se relevante, pois, desmistifica a concepção que considera a psicomotricidade relevante apenas na educação infantil.
Do ponto de vista científico, trata-se de uma pesquisa qualitativa, que busca articular o que dizem os autores que abordam a temática e os dados coletados durante a pesquisa de campo, apresentando desde modo, um novo olhar e novos conhecimentos sobre o tema em questão, apontando caminhos para que outras pesquisas sejam desenvolvidas na área.
O conhecimento acerca da temática apresenta-se como fundamental para o professor que pretende ensinar seus alunos considerando seu desenvolvimento globalmente.
Este estudo apresenta dois tópicos principais: o primeiro, "compreendendo a psicomotricidade", apresenta a definição e a contribuição para os estudos psicomotores dos autores Henry Wallon, Jean Piaget e Lev Vygotsky. O segundo, reflete sobre "o que o sistema nervoso tem a ver com a psicomotricidade?" as "habilidades psicomotoras". Para compreender o que é a psicomotricidade utilizou-se como principais referências: Mello (2002), Oliveira (2000) e Fonseca (2005). Os estudos sobre o "desenvolvendo a educação psicomotora na escola" que busca explicitar o sistema nervoso, as habilidades psicomotoras e a ludicidade foi embasado nos seguintes autores: Relvas (2005), Almeida (2003), Mello (2002), Filho (2001), Oliveira (2000) e De Meur (1991).
Os procedimentos metodológicos trabalhados foram: pesquisa de campo e a pesquisa bibliográfica. As técnicas de coleta de dados utilizadas foram a observação participante e o questionário. Para a análise dos dados coletados, utilizou-se a técnica de análise do discurso. Os sujeitos participantes foram os 30 alunos e a professora da turma observados durante a pesquisa de campo.
A pesquisa evidenciou que apesar do conhecimento da temática, por parte da Professora participante, ainda há dificuldade em relacionar a psicomotricidade com a aprendizagem e por este motivo acaba-se não percebendo e conseqüentemente não utilizando todas as contribuições que a psicomotricidade proporciona para a aprendizagem das crianças no 1° ano do ensino fundamental.


COMPREENDENDO A PSICOMOTRICIDADE


A psicomotricidade nos últimos anos vem ganhando espaço cada vez maior no âmbito educacional, dada a sua importância e contribuição, visto que busca estudar o homem e o movimento e sua relação com o espaço e o tempo. A relação que a criança estabelece com o seu eu e com o outro.
Desde modo, visando definir um conceito que viabilizasse o entendimento comum do termo psicomotricidade, em 1982, especialistas de todo o Brasil, reunidos no 1° Congresso Brasileiro de Terapia Psicomotora, definiram a Psicomotricidade como "uma ciência que tem por objetivo o estudo do homem, através do seu corpo em movimento, nas relações com seu mundo interno e externo". (MELLO, 2002, p. 31) Esta definição foi proposta, no entanto, ela é fruto de um longo processo histórico que inicia-se na antiguidade.
Os primeiros registros considerados psicomotores foram escritos por Aristóteles. Podemos ver em sua obra o que é considerado o primórdio do pensamento psicomotor. Segundo Oliveira (2000), Aristóteles analisa a função da ginástica, atribuindo-lhe um novo sentido, mais do que um simples exercício, a ginástica desenvolvia o Espírito, os exercícios deveriam ser escolhidos de acordo com o temperamento de cada pessoa.


O pensador grego valorizava bastante a ginástica, pois ela servia para "dar graça, vigor e educar o corpo". A ginástica para ele, devia ser desenvolvida até o período da adolescência com exercícios não muito cansativos para não prejudicar o desenvolvimento do espírito. (OLIVEIRA, 2000, p. 29)


Nestes termos a origem do pensamento psicomotor confunde-se com a história da educação física. No entanto os estudos avançam e no final do século 19 o corpo começa a ser estudado cientificamente, na área médica, por neurologistas e psiquiatras, que buscavam compreender as estruturas cerebrais e alguns fatores patológicos. (FONSECA,1995)
Assim em 1909, ao realizar estudos voltados para a debilidade motora, Dupré utiliza o termo composto psicomotricidade, que para o autor significa um entrelaçamento entre movimento e pensamento. (OLIVEIRA, 2000)
Percebe-se que a origem da psicomotricidade, confunde-se com a história da educação física e também encontra-se vinculada ao meio médico, contudo a partir de estudos realizados no século 20, surge uma "concepção cientificamente respaldada, pela qual o movimento não pode ser tratado sob um prisma puramente anatômico e mecanicista".(MELLO, 2002, p.30) O indivíduo começa a ser percebido como algo indivisível, integrado, inteiro.
Neste ponto vale ressaltar os estudos dos autores Henry Wallon, Jean Piaget e Lev Vygotsky, que contribuíram com suas teorias para a compreensão do que vem a ser a psicomotricidade, bem como, suas contribuições educacionais. Frente a esses estudos, o corpo deixa de ser visto de forma mecanicista e passa a ser considerado na sua globalidade levando-se em conta os aspectos afetivos, cognitivos, motores e sociais. Iniciaremos apresentando a contribuição da teoria de Henry Wallon para os estudos psicomotores.

· Henry Wallon

Henry Wallon é considerado um pioneiro da psicomotricidade, diferencia-se dos demais autores, ao investigar a personalidade total (e não aspectos isolados), para Wallon o desenvolvimento humano é um processo descontínuo marcado por conflitos e rupturas, mas que ao mesmo tempo integra três aspectos centrais: a afetividade, a inteligência e a motricidade. (BASTOS, 2003)
Destaca em sua teoria o papel da emoção. É por meio da emoção que exteriorizamos desejos, vontades, sentimento de alegria, dor, raiva... Nossas expressões e movimentos do corpo traduzem o que estamos sentindo. Esta é a primeira forma de comunicação utilizada pelos bebês. O choro, o grito, os sorrisos, são sinais que apontam para alguma necessidade (fome, sede, satisfação) a mãe ao ouvir, identifica a necessidade e a supri. Wallon denominou esta troca entre a mãe e o bebê de "dialógo tônico-funcional". (MELLO, 2002)
De acordo com Bastos (2003), a noção de corpo é construída gradativamente, na diferenciação entre o eu e o outro. Ao diferenciar-se a criança passa a ter consciência de si mesma. Neste sentido, o meio social é de suma importância para a construção do eu, visto que, é na interação, primeiro no meio familiar e posteriormente na escola, que a criança vai exteriorizar suas emoções, vivenciar conflitos e aprender a lidar com eles.
A importância do afeto e da interação social para o desenvolvimento da criança, pode ser percebida nos estágios de desenvolvimento definidos por Wallon, descritos de acordo com Relvas (2005) e Mello (2000).
Durante o estágio denominado Impulsivo Emocional (primeiros meses de vida) a criança, apresenta descargas ineficientes de energia muscular o que gera movimentos bruscos e desordenados. É um período marcado por padrões emocionais de medo, alegria e raiva. A emoção transforma-se no principal meio de comunicação, a criança se expressa por meio do choro e do riso. As manifestações de carinho são fundamentais durante esta fase.
No período Sensório-Motor e Projetivo (1 ano a 3 anos) a criança começa a explorar o espaço físico, descobrindo verdadeiramente o mundo dos objetos, atribuindo a eles uma representação simbólica, neste período desenvolve-se a marcha e a linguagem.
No estágio denominado Personalismo (3 anos a 6 anos) a criança começa a tomar consciência de sua personalidade, necessitando ser reconhecida pelo outro. Esta fase é marcada pela exploração de si mesmo, por atividades de oposição, sedução e imitação, além do uso de expressões como: eu, meu, não. Neste período a criança vivencia situações em que sente vergonha e acanhamento. As atividades realizadas em pequenos grupos são fundamentais, visto que, irão fortalecer o espírito de equipe, de cooperação e solidariedade.
O estágio Categorial (6 anos a 11 anos) é marcado pela exploração mental do mundo físico, mediante atividades de agrupamento, seriação, classificação e categorização.
O último estágio denominado Adolescência (11 anos em diante) a afetividade ocupará o primeiro plano. É o período marcado pela exploração de si mesmo, e pela busca de uma identidade autônoma, mediante atividades de confronto, auto-afirmação e domínio de categorias cognitivas de maior nível de abstração. O acesso intelectual aos valores sociais e morais abstratos permitirá ao adolescente alcançar a maturidade do adulto.
Desde modo, é preciso conceber a pessoa na sua totalidade, buscando compreender as diferentes relações que ela vai estabelecer com o seu ambiente. Neste sentido, Wallon critica modelos educacionais que priorizam somente o desenvolvimento intelectual, pois, "para ele o aspecto intelectual não deveria ser desvinculado do desenvolvimento da personalidade total e suas condições de existência, nas quais o meio tem papel primordial". (BASTOS, 2003, p. 21) Concluí-se que a afetividade, a emoção, os movimentos e espaço físico se encontram em um mesmo plano e são fundamentais para o desenvolvimento.
Apesar de ter sido elaborada no século 20 sua teoria é considerada contemporânea e revolucionária, impulsionando os estudos na área da psicomotricidade e servindo de base para estudos posteriores. "A fecundidade do pensamento de Wallon continua em permanente atualização, uma vez que perspectiva o estudo da criança na sua totalidade e renuncia às abordagens unidimensionais ou setoriais". (FONSECA, 1995, p.12) O autor apresenta a criança com um ser completo, onde afetividade, inteligência e motricidade encontram-se totalmente interligados.

· Jean Piaget

Um outro autor que contribuiu para o avanço dos estudos da psicomotricidade é Jean Piaget que estudou a formação e a evolução da inteligência da criança. Ao observar as crianças Piaget percebeu que é por meio dos movimentos que se desenvolve a inteligência, sendo motricidade a primeira forma de comunicação, antecedendo a linguagem oral.
A teoria de Piaget possui conceitos importantes, que mostram como o indivíduo no decorrer do seu desenvolvimento vai se adaptando ao meio no qual encontra-se inserido. De acordo com Faria (1997), destacamos os conceitos de esquema, assimilação, acomodação e equilibração.
O contato que a criança estabelece com o ambiente, possibilita a descoberta do seu corpo e dos objetos ao seu redor, criando desta forma, seqüências de ações ou movimentos que formam uma totalidade que pode ser generalizada em situações semelhantes, os esquemas. A criança que domina o esquema de sugar pode sugar a chupeta, o seio, o brinquedo etc. O esquema corresponde ao saber sugar, independe do objeto sugado.
No entanto, com a maturação biológica e os estímulos do meio a criança retira as informações necessárias ao seu desenvolvimento, e as assimila. A assimilação é a incorporação dos objetos ou dos acontecimentos aos esquemas existentes. Ela é possível, graças vivência e as experiências que a criança adquiriu em contato com meio.
Quando os esquemas existentes são modificados visando atender a novas exigências do ambiente, ocorre o que Piaget denomina de acomodação. Quando a criança toca um objeto e sente que lhe escapa, ela modifica o esquema de tocar formando um novo esquema, o de apanhar ou segurar para assimilar o objeto. O sujeito entra em contato com algo novo e o pensamento que outrora possuía sofre modificação, ou seja, ocorre mudança na organização mental proporcionando-lhe uma nova compreensão.
Quando os conflitos gerados são organizados mentalmente, ocorre a equilibração, processo que explica o desenvolvimento e a formação do conhecimento e que permite a um organismo em desequilíbrio responder as perturbações ou aos distúrbios do ambiente para voltar ao equilíbrio. Há três formas de equilibração: entre o sujeito e o objeto, entre os subsistemas de ações e entre os subsistemas e uma totalidade que os engloba.
Quando os desafios decorrentes das novas informações passam a ser equilibrados pelo individuo em seu pensamento, estes são superados, a criança que sugava qualquer coisa passa a sugar apenas o que deve e é feito para tal.
A psicomotricidade é vista de uma forma mais relevante no primeiro estágio de desenvolvimento humano e que Piaget denomina de "Sensório Motor". Nesta fase a criança percebe o ambiente e age sobre ele, é uma inteligência prática que se manifesta em ações. Os primeiros reflexos vão aos poucos dando lugar a movimentos coordenados, quando a criança tenta alcançar os objetos que vê. Assim é importante que os bebês desde os primeiros dias de vida recebam estimulações visuais, auditivas, táteis e motoras que são essenciais para o desenvolvimento.
O estágio seguinte é denominado, de acordo com Relvas (2005), estágio da inteligência lógico-concreta e se subdivide em dois subestágios: o da inteligência pré-operatória e o da inteligência operatório-concreta. Durante a fase pré-operatória a criança nomeia os objetos, que não estão presentes, a capacidade simbólica se desenvolve, bem como, a linguagem. No período das operações concretas, a criança começa a usar a lógica e o raciocínio, mas somente com o uso de materiais concretos.
O ultimo estágio é o da inteligência lógico-formal ou hipotético-dedutivo, o pensamento passa a não mais depender do uso de materiais concretos, é a capacidade de chegar a conclusões a partir de hipóteses.
De acordo com os conceitos e os estágios de desenvolvimento acima descritos percebe-se a importância de se criar situações desafiadoras para as crianças, momentos que gerem a necessidade de novas adaptações. Neste sentido, o uso de diferentes objetos, de jogos e brincadeiras, são de grande relevância para o desenvolvimento, visto que possibilita à criança a vivência de novas experiências, favorecendo a aprendizagem.
Após apresentamos as contribuições, para a psicomotricidade, de Wallon e Piaget, finalizaremos com Lev Vygotsky que destaca a importância do meio social para o desenvolvimento integral da criança.

· Lev Vygotsky

Lev Vygotsky ressalta a importância da relação indivíduo e sociedade, enfatiza o caráter transformador da atividade humana. Onde o homem transforma a sociedade e ao mesmo tempo é transformado pelas mudanças que ele mesmo gerou. Todas as características tipicamente humanas são resultados desta interação, que é mediada por instrumentos técnicos e símbolos. Desde modo, a pessoa, segundo Vygotsky, é um sujeito ativo e transformador. (RELVAS, 2005)
O aprendizado não depende apenas de um esforço individual, mas é o resultado de uma troca estabelecida entre os sujeitos. Assim para que aprendizagem ocorra é necessário que se crie um ambiente onde a interação entre os sujeitos possa ser estabelecida.


[...] o aprendizado desperta vários processos internos de desenvolvimento, que são capazes de operar somente quando a criança interage com pessoas em seu ambiente e quando em cooperação com seus companheiros. Uma vez internalizados, esses processos tornam-se parte das aquisições do desenvolvimento individual da criança. (VYGOTSKY, 1998, p.117)


Estas aquisições individuais caracterizam o que Vygotsky (1998) denominou de zona de desenvolvimento real, ou seja, o que a criança realiza sozinha sem receber auxilio, no entanto, há também as atividades que a criança ainda realiza com o auxilio de uma outra pessoa, mas que posteriormente poderá realizar sozinha é a zona de desenvolvimento proximal.
A teoria de Vygotsky aponta para a necessidade de se repensar o valor que as interações sociais representam para a aprendizagem, visto que, possibilita o diálogo, a cooperação, a troca de informações, o confronto de idéias, ou seja, as condições indispensáveis para a produção do conhecimento (RELVAS, 2005).
Durante o processo de aprendizagem Vygotsky, enfatiza a importância do brinquedo para o desenvolvimento da criança e mais uma vez ressalta a importância da interação entre as crianças.


No brinquedo, a criança projeta-se nas atividades adultas de sua cultura e ensaia seus futuros papéis e valores. Assim o brinquedo antecipa o desenvolvimento; com ele a criança começa a adquirir a motivação, as habilidades e atitudes necessárias a sua participação social, a qual só pode ser completamente atingida com a assistência de seus companheiros da mesma idade ou mais velhos. (VYGOTSKY, 1998, p. 173)


A interação com crianças da mesma idade ou companheiros mais velhos, favorece também a aquisição e expansão da linguagem, possibilitando a resolução de conflitos e problemas variados.
A teoria de Vygotsky contribui com a psicomotricidade ao colocar em evidencia a criança como sujeito ativo e transformador, que se desenvolve na medida em que age e interage com o meio social, na troca com os seus pares.
As teorias de Wallon, Piaget e Vygotsky, possuem especificidades, mas também pontos comuns importantes para a psicomotricidade. Em todas as teorias, a criança é vista na sua totalidade, corpo, emoção e pensamento, nota-se a importância das interações com o meio social, da afetividade e dos estímulos, fundamentais para o desenvolvimento da motricidade e da inteligência.
Frente a relevante contribuição dos autores supracitados a psicomotricidade torna-se objeto de estudo de várias ciências.

Por tratar da relação entre o homem, seu corpo e o meio físico e sociocultural no qual convive, a Psicomotricidade é fundamentada e estudada por um amplo conjunto de campos científicos, onde se pode destacar a Neurofisiologia, a Psiquiatria, a Psicologia e a Educação, imprimindo cada uma dessas áreas enfoques que lhes são específicos. (MELLO, 2002, p.30):


De Meur (1991, p.05), considera que o estudo da psicomotricidade é recente, mas pouco a pouco foi ganhando espaço e hoje ultrapassa os estudos dos problemas motores. Para o autor "a psicomotricidade quer justamente destacar a relação existente entre a motricidade, a mente e a afetividade e facilitar a abordagem global da criança por meio de uma técnica". Neste sentido, a psicomotricidade busca educar o movimento ao mesmo tempo em que desenvolve a inteligência considerando todos os aspectos emocionais e sociais.
Filho (2001, p.36) define a psicomotricidade como a "relação entre pensamento e ação, envolvendo a emoção". Trata-se de uma ciência que atualmente, de acordo com Mello (2002), divide-se em três campos de atuação: reeducação psicomotora, terapia psicomotora e educação psicomotora.
A reeducação psicomotora destina-se ao atendimento individual ou em pequenos grupos, de pessoas que apresentam: debilidade motora; atraso e instabilidade psicomotora; dispraxias; distúrbios do tônus da postura, do equilíbrio ou da coordenação; e deficiências perceptivo-motoras. O trabalho inicia-se após a realização de um exame psicomotor, onde o reeducador trabalhará de acordo com o sintoma diagnosticado.
A terapia psicomotora destina-se a crianças, adolescentes e adultos, que apresentam grandes perturbações e cuja adaptação é de ordem patológica. Na terapia, ressalta-se a importância do vivido corporal e a valorização do brincar, usado como meio de expressão.
A educação psicomotora é dirigida às crianças consideradas "normais", atuando como parte integrante da educação básica durante as fases referente à educação infantil e primeiros anos do ensino fundamental.
Neste sentido, Jean Le Boulch (2001) defende que psicomotricidade deve ser incluída na educação infantil, pois considera a educação psicomotora uma educação de base que condiciona todos os aprendizados escolares. A educação psicomotora leva a criança a tomar consciência de seu corpo, da lateralidade, a situar-se no espaço, a dominar seu tempo, a adquirir habilmente a coordenação de seus gestos e movimentos.
De Meur (1991) compartilha a mesma concepção, considera a educação psicomotora como indispensável nas aprendizagens escolares, defendendo sua inclusão na escola maternal. E sua permanência nas séries iniciais do ensino fundamental, visto que ajuda a criança a organizar-se, propicia-lhe melhores possibilidades de resolver os exercícios de análise, de lógica, de relações entre os números etc.
Segundo Filho (2001) a educação psicomotora abrange todas as aprendizagens da criança, dirigindo-se a todas elas, individual ou coletivamente, nas quais todas as etapas são necessárias. Acontece desde o nascimento e perdura por toda a vida, através de atividades do dia-a-dia e de jogos ou exercícios bem variados que levam a criança a perceber melhor seu corpo, dominar seus sentimentos para uma melhor expressão corporal, orientar-se no tempo e no espaço para se desenvolver integralmente.
Desde modo, não se pode imaginar uma criança sem movimento, parada, basta olhar no pátio de uma escola, em um parque, ou mesmo em casa, as crianças estão em constante atividade, brincando, interagindo com outras crianças, com adultos, criando novas formas de se divertir e descobrir o mundo. Percebe-se que a psicomotricidade encontra-se presente no cotidiano das crianças, podemos visualizá-la em suas brincadeiras,


uma criança vista como participante de um conhecido jogo como a "amarelinha", por exemplo, está vivenciando estímulos motores, seu raciocínio lógico está sendo solicitado e esta experimentando ao mesmo tempo uma relação com as demais crianças que, portanto, possui implicações emocionais e sociais. (MELLO, 2002, p. 31)


Percebe-se nesta cena, a criança na sua totalidade pensando, agindo e sentindo todas as emoções vivenciadas no momento do jogo, visto que, é a partir da vivência do corpo no espaço e no tempo, que a criança desenvolve a consciência de si mesma, como um ser capaz de sentir, de se expressar e o mais importante, capaz de partilhar e comunicar-se com os demais.


O que o Sistema Nervoso tem a ver com a Educação Psicomotora?


Todas as atividades que realizamos são comandadas pelo sistema nervoso. É ele que coordena todas as funções do organismo, desde o levantar de um braço até a percepção de sensações e idéias. "A consciência do corpo e do movimento, que é uma das manifestações mais ricas e importantes do comportamento humano, ocorre de maneira progressiva, de acordo com o desenvolvimento do sistema nervoso". (COSTALLAT et.al, 2002, p. 157) Este desenvolvimento se deve ao trabalho de células especializadas denominadas neurônios.
De acordo com Relvas (2005) os neurônios processam as informações recebidas, avaliam e coordenam atividades apropriadas à situação e as necessidades correntes das pessoas. Estas informações são processadas através de um evento conhecido como impulso nervoso, que envolve dois fenômenos: o elétrico (propaga um sinal dentro do neurônio) e o químico (transmite o sinal de um neurônio a outro ou a uma célula muscular).
De acordo com Oliveira (2000, p.19) as informações são levadas de um neurônio para o outro através dos neurotransmissores (substância liberada de um neurônio para o outro, em resposta a um estímulo). E esta transmissão designa-se sinapses. Em suma, as sinapses são compreendidas como: "uma conexão entre neurônios na qual um neurônio estimula o seguinte através da liberação de uma substância chamada neurotransmissores, propagando-se assim impulsos nervosos e transmitindo as informações".
As sinapses ocorrem inúmeras vezes, desde o nascimento, pois, cada experiência nova realizada pela criança, desencadeia novas conexões sinápticas, no entanto, a quantidade e a qualidade de sinapses variam de acordo com a experiência e a aprendizagem de cada pessoa.


Nenhuma criança nasce um gênio e nenhuma nasce tola. Tudo depende do estímulo das células cerebrais durante os anos cruciais. Esses anos são os que decorrem desde o nascimento até os três anos. O meio ambiente precisa estimular tanto a atividade mental como a emocional, pois é isso que faz crescer a delicada rede de conexões. (MASARU IBUKA apud ALMEIDA, 2003, p. 43)


Também, neste aspecto Relvas (2004, p.68) destaca que os primeiros anos de vida da criança são fundamentais para o desenvolvimento da mesma. [...] cada experiência nova, cada novo contato realizará conexões sinápticas.
Nos primeiros anos de vida da criança torna-se fundamental conviver em um ambiente estimulador, seja em casa ou na escola. Visto que, "aprender, neurologicamente falando, significa usar sinapses normalmente não usadas". (OLIVEIRA, 2000, p.20), quanto mais estímulos a criança receber maior será o número de sinapses, maior será seu aprendizado.
Neste contexto, importante destacar que o aprendizado, de acordo com Relvas (2005) é a capacidade que todo ser vivo, dotado de um sistema nervoso, tem de modificar o comportamento em função de experiências passadas e essa modificação comportamental ocorre no sistema nervoso através da propriedade chamada plasticidade cerebral, definida pela autora como:


a denominação das capacidades adaptativas do SNC - sua habilidade para modificar sua organização estrutural própria e funcionamento. É a propriedade do sistema nervoso que permite o desenvolvimento de alterações estruturais em resposta à experiência, e como adaptação a condições mutantes e a estímulos repetidos (p.43).


Todo o processo de aprendizagem produz alterações no cérebro e estas alterações são denominadas plasticidade, sendo que uma estimulação correta e eficaz é de fundamental importância para o desenvolvimento das funções motoras e sensitivas do aprendente. (RELVAS, 2005)
Neste sentido, Relvas (2004) salienta que a psicomotricidade pode contribuir na promoção da plasticidade cerebral, na medida que propõe atividades que melhoram a saúde mental e motora da criança e do adulto, tais como: fazer contas, aprender um novo jogo de tabuleiros, ler atentamente e refletir sobre o texto, montar um quebra cabeça, caminhar, fazer alongamentos, exercícios aeróbicos, dentre outros. Estas práticas, quando regulares, estimulam a circulação do sangue levando oxigênio para as áreas menos irrigadas do cérebro, aumentando a quantidade de conexões neurais, melhorando a memória, a capacidade de raciocínio e a motricidade como um todo.
A autora afirma que o sistema nervoso de uma criança em desenvolvimento é mais plástico que o sistema nervoso de um adulto, ou seja, é capaz de gerar um número maior de sinapses. Assim sendo, acreditava-se que o cérebro de um adulto maduro não possuía a capacidade de regenerar suas células nervosas, de formar novas sinapses.
Em contrapartida, os estudos desenvolvidos por neurocientistas mostraram que o cérebro não é estável e imutável com uma memória fixa semelhante a um computador, mas que durante a vida o cérebro muda. Situações desafiadoras e ambientes complexos, agradáveis e divertidos fornecem a capacidade extra de que o cérebro precisa para reconfigurar-se. O cérebro se remodela, para aprender a sentir-se melhor. (RELVAS, 2005)
Dentro do âmbito educacional o mais importante para uma boa estimulação cerebral é fugir da rotina, buscar sempre novas formas de ensinar, novas estratégias. O professor deve buscar situações desafiadoras, que estimulem e animem os alunos na busca de respostas e possíveis soluções para os problemas apresentados.
Neste contexto torna-se importante conhecer cada uma das habilidades ou funções psicomotoras, para saber que tipo de atividade deve ser realizada, visando o bom desenvolvimento da criança.


As habilidades psicomotoras


Com base em Mello (2002), Filho (2001), Oliveira (2000) e De Meur (1991) destaca-se na seqüência os seguintes elementos básicos da educação psicomotora: esquema corporal, lateralidade, estruturação espacial, orientação temporal, discriminação visual, discriminação auditiva, coordenação global e coordenação fina e óculo-manual. Destacando os conceitos, como as habilidades psicomotoras se desenvolvem, as dificuldades geradas pelo não desenvolvimento das habilidades, bem como as contribuições para a aprendizagem.

· Esquema Corporal

"O esquema corporal é um elemento básico indispensável à formação da personalidade da criança. É a representação global, cientifica e diferenciada que a criança tem de seu próprio corpo". (WALLON apud FILHO, 2001, p.48) Trata-se do ponto de referência que o ser humano possui para conhecer e interagir com o mundo. A criança percebe-se e percebe os objetos, pessoas e coisas que a cercam em função de seu corpo. A partir desta interação ela estabelece ligações afetivas e emocionais que possibilitam o desenvolvimento.
O corpo é mais do que algo biológico e orgânico é também um lugar que permite expressar emoções e estados interiores. Tem, portanto, um exterior (o que todos vêem) e um interior que seria sua representação mental, subjetiva, o que ela pensa de si.
O esquema corporal é o resultado das experiências que vivenciamos e das sensações que experimentamos, na interação com o mundo que nos rodeia. Assim, o desenvolvimento do esquema corporal se dá através da experiência vivida pelo corpo da criança. Na medida em que o sistema nervoso "amadurece", surgem sensações como: fome, dor, a criança aprende a encontrar o seu ponto de equilíbrio e o sentimento de mundo através da audição, visão, etc, ou seja, se conhece e integra as diversas sensações que experimenta. Neste sentido:


Uma criança que se sinta bem disposta em seu corpo e capaz de situar seus membros uns em relação aos outros fará uma transposição de suas descobertas; progressivamente localizará os objetos, as pessoas, os acontecimentos em relação a si e, depois, entre eles. Chegamos à conclusão então de que um dos objetivos psicomotores é a conscientização do próprio corpo e de seus movimentos. (FILHO, 2001, p. 43)


Desde modo percebe-se que o desenvolvimento do esquema corporal segue algumas etapas que de acordo com Oliveira (2000) com base nos estudos desenvolvidos por Le Boulch se dividem em três, são elas: O corpo vivido (até 3 anos); Corpo percebido ou "descoberto" (3 a 7 anos) e o Corpo representado (7 a 12 anos).
Na etapa do corpo vivido (até 3 anos), o objetivo é levar a criança a dominar seus movimentos e a perceber seu corpo globalmente, proporcionando atividades que levem a criança a viver seu corpo, pulando, correndo, andando, se arrastando pelo chão, assim ela estará desenvolvendo o esquema corporal ludicamente por meio de atividades psicomotoras.
Após vivenciar situações em que o corpo é trabalhado globalmente, chega-se a segunda etapa do corpo percebido ou "descoberto" que corresponde a idade de 3 a 7 anos, onde se dará a organização do esquema corporal, devido a maturação ou compreensão interior que auxilia a criança a desenvolver a percepção do seu corpo passando a ter o maior domínio do mesmo. Aperfeiçoando e refinando seus movimentos adquirindo com isso maior coordenação dentro de um espaço e tempo determinado.
É através das descobertas e experiências vividas que a criança chega a representação mental dos elementos no espaço. Tendo como ponto de referência o seu corpo pela qual chegará a estruturação espaço-temporal. É pelo corpo que a criança tem acesso a um espaço e a um tempo orientado, descobrindo as formas e dimensões, assimilando os conceitos como embaixo, acima, entre outros, e noções de tempo e durações de intervalo, antes, depois, primeiro e último.
Os jogos com o corpo, pintura no corpo, músicas que falam das partes do corpo, andar sobre diferentes superfícies, entre outros auxiliam na descoberta do corpo pela criança. Este conhecimento de acordo com Filho (2001) se realiza de duas formas: interna - onde a criança irá sentir cada parte do corpo, tocando, nomeando, sentindo as diferentes formas, texturas, temperatura, etc; e externa - onde a criança ira ver cada parte do seu corpo no espelho, em outra criança, em figuras ou bonecos. Outras atividades como: colocar as mãos para cima, manter as pernas afastadas, mãos para os lados, cabeça inclinada, auxiliam a criança quanto a orientação do seu corpo no espaço, as diferentes posições que o seu corpo pode tomar.
A terceira fase denomina-se como o "corpo representado", onde a criança já tem noções do todo e da parte do seu corpo, movimentando-se corretamente com maior domínio corporal sobre o qual amplia e organiza seu esquema corporal. De 7 a 9 anos a criança tem de si, uma imagem estática, é a partir 10 a 12 anos que ela terá uma representação mental em movimento. Deixa de ter o seu corpo ponto de referência passando a ser visto como objeto.
De acordo com Filho (2001) durante esta fase a "criança poderá experimentar todas as possibilidades corporais, conhecendo as partes de seu corpo e as do outro, localizando-as, posicionando-as e movimentando-as organizadamente no espaço disponível". (p.51). Ainda segundo o autor, essa movimentação pode ser analítica: através de exercícios de coordenação equilíbrio, destreza para que o domínio corporal seja atingido, como andar sobre blocos, jogar bola de joelhos, jogos de bola de gude, entre outros; e sintética: expressão do corpo através de ações, sentimentos e emoções, imaginar a careta que se fará ao chupar um limão; ao ouvir um barulho bem forte, sentir um cheiro desagradável, entre outros.
Quando o esquema corporal de uma criança não é bem desenvolvido de acordo com Oliveira (2000), ela manifestará dificuldade de coordenação dos movimentos, lentidão na realização de atividades simples como abotoar uma roupa ou jogar bola, por exemplo, devido a falta de domínio do seu corpo em ação.
As perturbações do esquema corporal estão relacionadas a problemas motores e intelectuais, sendo na maioria dos casos de origem afetiva, podendo levar a impossibilidade de adquirirem os esquemas que correspondem ao hábito visomotor e que intervem na leitura e na escrita. Para isso faz-se necessário desenvolver instrumentos adequados que proporcionem um bom relacionamento com a pessoa e com o meio que interagem.

· Lateralidade

A lateralidade diferencia-se da noção de direita-esquerda, que como o próprio nome já diz, noção de direita-esquerda é saber o que é o lado direito e esquerdo em relação ao próprio corpo e aos objetos. Já a "lateralidade é a dominância de um lado em relação ao outro, levando-se em conta a força e a precisão". (FILHO, 2001, p.52)
A dominância lateral ocorre em três níveis: mão, olho e pé. O lado dominante é o que apresenta maior força e precisão, enquanto que o outro lado apenas auxilia na execução da atividade. Essa definição dar-se-á naturalmente durante o crescimento, pode ser o lado direito, o esquerdo ou uma mistura dos dois. Uma criança pode ter como mão dominante a direita, porém, ter mais força ao chutar uma bola com o pé esquerdo. Assim, a criança precisa descobrir sem interferências qual será o lado dominante do seu corpo. De acordo com Filho (2001):


A contrariedade da dominância lateral poderá trazer inúmeros problemas à criança, tais como dificuldade em coordenar seus movimentos, dificuldades de equilíbrio, dificuldades na grafia (movimento das letras), dificuldades na estruturação espacial, podendo desencadear reações de insucesso, oposição, de fobia escolar que afetam todo o afetivo da criança ocasionando dificuldades gerais do aprendizado (p.52).


Assim o desenvolvimento da lateralidade segue algumas etapas conforme Oliveira (2000): primeiro a criança assimila os conceitos em seu próprio corpo, depois nos objetos em relação a si mesma, e enfim, descobre-os no outro à sua frente e nos objetos entre si. O desenvolvimento da lateralidade pode ocorrer por meio de jogos psicomotores como: amarelinha, equilibrista, pular em um pé só, jogar dados, jogos com arcos, abrir garrafas, enfiar miçangas, costurar abotoar entre outros. O bom desenvolvimento da lateralidade é importante, pois, permite a criança fazer uma relação entre as coisas existentes no seu meio, sendo à base da estruturação espacial.

· Estruturação espacial

A todo instante a criança está em um espaço onde lhe é solicitado que se situe, que situe os objetos uns em relação aos outros e que se organize no espaço que dispõe. (FILHO, 2001). Desde modo, organização espacial "é a capacidade de orientar-se diante de um espaço físico e perceber a relação de proximidade de coisas entre si. Refere-se às relações de perto, longe, em cima, embaixo, dentro, fora, etc." (MELLO, 2002, p.38)
A criança, primeiro, deve perceber a posição de seu próprio corpo no espaço. Depois, onde estão os objetos uns em relação aos outros e a ela própria e como se organizar no espaço em que se encontra. No entanto, para se organizar no espaço e perceber a posição dos objetos, a criança precisará ter a imagem corporal e a lateralidade bem desenvolvidas, visto que, ela usará seu corpo como ponto de referência, o que acontecerá por volta dos 6 anos.
Oliveira (2000) explica que a estruturação espacial consiste em aprender as noções de situações (dentro, fora, longe, perto); de tamanho (grosso, fino, grande, médio, pequeno); de posição (em pé, deitado, sentado, agachado); de movimento (levantar, puxar, girar, rolar, cair); de formas (círculo, quadrado, triângulo); de qualidade (cheio, vazio, pouco); de superfície e de volume.
Importante frisar que antes de diferenciar as noções acima citadas, em exercícios escritos no papel, a criança precisa primeiro vivencia-los em seu corpo, agindo e interagindo com o meio. "A criança adquire essas noções cotidianamente ao jogar o papel no lixo, ir ao banheiro, reconhecer sua cadeira, movimentar-se na rua, no pátio da escola, na sala de aula e em jogos, tais como esconde-esconde, obstáculos, jogos de encaixe, blocos mágicos entre outros". (FILHO, 2001, p. 53)
Desta forma, percebe-se que a orientação espacial é muito importante para o desenvolvimento e também para o processo da leitura e da escrita, no entanto, quando mal estruturada, acarretará muitas dificuldades de aprendizagem, entre elas citamos de acordo com Oliveira (2000) dificuldades em respeitar: as direções das letras e números. Ex. "m" e "u", "ou" e "on", "b" e "p", 6 e 9, 15 e 51, etc; a ordem e sucessão das letras nas palavras e das palavras nas frases; incapacidade em locomover os olhos durante a leitura obedecendo ao sentido esquerda-direita, saltando linhas ou relendo a mesma linha; em matemática, poderá apresentar dificuldades em organizar os números em fileiras e acaba misturando o que é dezena centena e milhar.
Analisamos a estruturação espacial, separadamente, no entanto, ela encontra-se totalmente ligada à orientação temporal, visto que uma pessoa só se movimenta em um espaço e tempo determinados.

· Orientação temporal

"A organização temporal corresponde à capacidade de relacionar ações a uma determinada dimensão de tempo, onde sucessões de acontecimentos e de intervalos de tempo são fundamentais". (MELLO, 2000, p. 38) É a capacidade de situar-se em função: da sucessão de acontecimentos: antes, após, durante. Da duração dos intervalos. Da renovação cíclica de certos períodos: os dias da semana, os meses, as estações. Do caráter irreversível do tempo: já passou, não volta mais, tem cinco anos, caminha para os seis e noção de envelhecimento.
Destaca-se que uma boa orientação temporal é importante para o aprendizado da leitura, visto que para aprender a ler, é necessário que a criança possua: "domínio do ritmo, uma sucessão de sons no tempo, uma memorização auditiva, uma diferenciação de sons, um reconhecimento das freqüências e das durações dos sons das palavras". (OLIVEIRA, 2000, p. 87)
Uma criança cuja orientação temporal não foi bem desenvolvida pode não perceber os intervalos de tempo, apresenta confusão na ordenação e sucessão dos elementos de uma sílaba, pode apresentar dificuldade na organização do tempo e demorar muito em uma mesma tarefa. Além disso, uma organização espaço-temporal inadequada dificulta a aprendizagem da matemática, pois, a criança precisa ter noção de fileira e coluna para organizar as operações e, também, dificuldade de leitura, demorando muito tempo para ler um texto.
Para que estas dificuldades não ocorram algumas atividades são sugeridas, como: completar quadros que representem atividades do dia a dia, as atividades que se realizam de manhã, à tarde e a noite; empregar os conceitos do cotidiano, o que fizemos ontem, o que iremos fazer hoje, o que faremos amanhã; cantar uma canção com ritmos variados, devagar e rápido, acompanhados de movimentos.

· Discriminação visual

"A acuidade visual é a capacidade de ver e diferenciar objetos apresentados no seu campo visual com significado e precisão". (VALLET apud OLIVEIRA, 2000, p. 100) A leitura de um texto requer que a criança possua uma sucessão de movimentos oculares coordenados, ritmados e orientados da esquerda para a direita, além de uma memória visual, importante para discernir letras que possuem o mesmo som. (OLIVEIRA, 2000)
Uma discriminação visual pouco apurada pode levar a criança a confundir letras assimétricas, exemplo: o e e, f e t, c e e, h e b, a e o. A leitura se torna lenta, hesitante e monótona, visto que, acabam lendo várias vezes as mesmas linhas, ou pulam frases inteiras, transparecendo a falta de controle ocular.
De acordo com Ferreira (1997), as atividades que trabalham com o desenvolvimento da percepção visual têm como objetivo levar a criança a discriminar, nomear e classificar os objetos quanto à cor, forma, tamanho, espessura e textura, reconhecer semelhanças e diferenças nos contornos de figuras ou de palavras. Dentre as atividades que podem ser desenvolvidas sugere-se: espalhar no chão da sala ou sobre a mesa pedaços de cartolina ou papel com cores variadas, entregar a cada criança um pedaço de cartolina de determina cor e solicitar que recolham dentro de um tempo estipulado o maior número de pedaços da cor correspondente; distribuir formas geométricas de várias cores, tamanhos e espessura; confeccionar cartazes com material variado (linha, lã, botões, retalhos de tecido, papel).


· Discriminação auditiva

Pelo dicionário de psicomotricidade de "a discriminação auditiva significa a capacidade de sintetizar os sons básicos da linguagem, a habilidade de perceber a diferença existente entre dois ou mais estímulos sonoros" (HURTADO apud OLIVEIRA, 2000, p. 102). É a percepção de diferentes sons e intensidades. A discriminação auditiva possibilita a criança associar a grafia das letras ao som percebido, o que é essencial para a cópia de textos ditados, exemplo: anotar um recado falado por telefone.
As crianças que apresentam dificuldade de discriminação auditiva confundem sons semelhantes como: F por V; B ou J (foi por voi, ou joi); P por B (ponte por bonte); D por B, ou T (dado por bado ou tado), entre outros.
Para que estas dificuldades não ocorram, é importante trabalhar com as crianças atividades em que elas possam desenvolver a discriminação e a memória auditiva de sons diversos vocais e não-vocais, discriminar sons em palavras e desenvolver a pronúncia correta das palavras. As atividades sugeridas para sons não vocais: ouvir diferentes ruídos causados por janelas, portas, instrumentos, arrastar de móveis; uso de diferentes materiais para discriminação de sons (arroz, feijão, milho, areia, pedras, etc.); ouvir cd?s com sons de animais, carro, sons ambiente, etc.; bater palmas, bater os pés, tocar sinos, campainhas, dentre outros. Para sons vocais: imitar as vozes de animais, cantar, falar uma frase com voz aguda e repeti-la com voz grave, brincar de telefone sem fio, etc. Para sons em palavras: ouvir diferentes coleguinhas falarem para descobrir de quem é a voz; bater palmas de acordo com as diferentes divisões silábicas das palavras; distinguir sons que rimam (pão, balão, pião, mão, sabão...); audição de músicas, historinhas, dramatizações. (FERREIRA, 1997)

· Coordenação global

"Diz respeito à atividade dos grandes músculos. Depende da capacidade de equilíbrio postural do individuo [...] Através da movimentação e da experimentação, o indivíduo procura seu eixo corporal, vai se adaptando e buscando um equilíbrio cada vez melhor". (OLIVEIRA, 2000, p. 41)
A conscientização global do corpo pode ser alcançada por meio de diversas atividades como andar, correr, saltar, pular, arrastar-se, nadar, lançar, sentar, pegar, etc. São atividades presentes no dia a dia das crianças, que elas realizam sem que seja necessário que alguém as direcione. Estas atividades continuam quando a criança chega à escola, o professor deve auxiliar as crianças que apresentam dificuldade na realização dos movimentos visando uma coordenação mais harmoniosa e satisfatória.
Algumas atividades são sugeridas de acordo com Ferreira (1997):
- Caminhar: livremente sem esbarrar nos colegas, em linhas desenhadas no chão, de olhos abertos e de olhos fechados, na ponta dos pés, atravessando obstáculos, entre outras.
- Saltar: só com o pé direito ou com o pé esquerdo, lentamente e de forma acelerada, obstáculos, dentro do arco ou fora do arco, no mesmo lugar, para frente, para trás, para um lado e para o outro, corda.
- Correr: livremente, movimentando o corpo, saltando obstáculos, acompanhando o ritmo das palmas, chutando um objeto, com um colega, transportando um recipiente plástico cheio de água sem derramar o líquido.
- Equilibrar-se: nas pontas dos pés, com os braços erguidos, com um pé só.

· Coordenação fina e óculo manual

A coordenação fina diz respeito à habilidade e destreza manual e constitui um aspecto particular da coordenação global. Temos que ter condições de desenvolver formas diversas de pegar os diferentes objetos. Uma coordenação elaborada dos dedos da mão facilita a aquisição de novos conhecimentos. É através do ato de preensão que uma criança vai descobrindo pouco a pouco os objetos de seu meio ambiente. (OLIVEIRA, 2000)
Os movimentos coordenados da mão são acompanhados pelo movimento ocular. Quando escrevemos um texto nossos olhos acompanham os movimentos usados para escrever as letras, esta é a coordenação óculo-manual ou viso-motora. Como vimos seu desenvolvimento é essencial para a aprendizagem da escrita.
O domínio do gesto, estruturação espacial e a orientação temporal são os três fundamentos da escrita. Segundo De Meur (1991) A escrita requer uma direção gráfica, visto que escrevemos horizontalmente da esquerda para a direita, noções de em cima e embaixo ( n e u ), de esquerda e direita (37 e não 73), de oblíquias e curvas (g) e a noção de antes de depois, sem o que a criança não iniciará seu gesto no lugar correto. As atividades sugeridas de acordo com Ferreira (1997) são:
- Movimentos com braços, antebraços e pulsos: fazer movimentos circulando os braços e antebraços de dentro para fora; dobrar, esticar e fazer rotação com os braços; imitar afazeres domésticos lavar roupa, torcendo, estendendo no varal, passando ferro; pentear os cabelos.
- Movimentos com as mãos e dedos: passar as mãos sobre objetos para sentir a textura; traçar o contorno das mãos; amassar o papel; dar laços e nós em fitas, fios e cadarços, recortar e colar figuras; pintar; desenhar; jogos de encaixe; escrever na areia, no ar e no papel; enfiar miçangas em fios; passar a linha na agulha. Os rabiscos, desenhos e grafismos feitos pelas crianças constituem uma preparação fundamental para a aprendizagem da escrita e da leitura.


RESULTADOS OBTIDOS


Os resultados obtidos por meio da observação participante e do questionário objetivavam conhecer o saber docente sobre a psicomotricidade e sua contribuição para a aprendizagem. A análise apresenta três pontos importantes. O primeiro, refere-se ao conhecimento teórico da Professora participante sobre a temática, evidenciado ao definir a psicomotricidade como: "uma ciência que tem por objetivo o estudo do homem, através do seu corpo em movimento, nas relações com seu mundo interno e exterior". Demonstrando conhecimento teórico sobre a temática.
O segundo ponto destacado refere-se à relevância da psicomotricidade para o 1° ano do ensino fundamental. Apesar da Professora participante reconhecer a importância para o desenvolvimento dos alunos na série em que atua, a resposta contraria a prática observada. O que nos reporta para o terceiro ponto, onde foi possível perceber em sua prática, a dificuldade de articular o conhecimento teórico com as atividades cotidianas, prevalecendo na turma observada, a didática baseada em exercícios escritos de repetição e a ausência de atividades lúdicas associadas ao processo de aprendizagem, sendo o lúdico usado apenas como recreação.
Em suma, a pesquisa evidenciou que apesar do conhecimento da temática, por parte da Professora participante, ainda há dificuldade em relacionar a psicomotricidade com a aprendizagem e por este motivo acaba-se não percebendo e conseqüentemente não utilizando todas as contribuições que a psicomotricidade proporciona para a aprendizagem das crianças no 1° ano do ensino fundamental.


CONSIDERAÇÕES FINAIS


Buscou-se, com esta pesquisa, apontar as contribuições da educação psicomotora para o processo de ensino e aprendizagem, investigando o saber docente a respeito da temática e esclarecendo como a mesma pode ser desenvolvida em sala de aula visando à aprendizagem.
As contribuições da educação psicomotora para a aprendizagem foram evidenciadas por meio do referencial teórico construído, embasado em teóricos que abordam a temática, refletindo a cerca da psicomotricidade como promotora da aprendizagem e a necessidade de incluir as atividades lúdicas no 1° ano e nas demais séries do ensino fundamental.
Na coleta de dados realizada por meio do questionário, com a Professora da turma observada, possibilitou o conhecimento do saber docente sobre a psicomotricidade e a contribuição para a aprendizagem. A análise dos dados suscitou o levantamento de três pontos importantes:
- O primeiro refere-se ao conhecimento teórico da Professora participante da pesquisa sobre a temática, evidenciado ao definir a psicomotricidade como: "uma ciência que tem por objetivo o estudo do homem, através do seu corpo em movimento, nas relações com seu mundo interno e exterior". Demonstrando, desta forma, que a mesma possui conhecimento a respeito da temática.
- O segundo ponto destacado refere-se à relevância da educação psicomotora para o 1° ano do ensino fundamental. Apesar de a Professora participante reconhecer a importância para o desenvolvimento dos alunos na série em que atua, a resposta contraria a prática observada. O que nos reporta para o terceiro ponto, onde foi possível perceber em sua prática, a dificuldade de articular o conhecimento teórico com as atividades cotidianas, prevalecendo na turma observada, a didática baseada em exercícios escritos de repetição e a ausência de atividades lúdicas associadas ao processo de aprendizagem, sendo o lúdico usado apenas como recreação.
A pesquisa evidenciou que apesar do conhecimento da temática, por parte da Professora participante, ainda há dificuldade em relacionar a psicomotricidade com a aprendizagem, por este motivo acaba-se não percebendo e conseqüentemente não utilizando todas as contribuições que a psicomotricidade proporciona para a aprendizagem das crianças no 1° ano do ensino fundamental. Visto que, a psicomotricidade é utilizada, na turma observada, como se fosse mais um "conteúdo escolar", sendo considerada uma atividade a parte do processo de aprendizagem.
O exercício da pesquisa evidenciou quão importante é a educação psicomotora para o desenvolvimento infantil e para o processo de aprendizagem, no entanto, a discussão e a reflexão sobre a temática não se encerram neste estudo, pois ele aponta caminhos para que outras pesquisas sejam desenvolvidas em prol da melhoria do processo de ensino e aprendizagem, na perspectiva da educação integral do sujeito aprendente.


REFERÊNCIAS


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COSTALLAT, Dalila M. M. de et al. (orgs.). A psicomotricidade otimizando as relações humanas. São Paulo: Arte & Ciência, 2002.


FERREIRA, Idalina Ladeira; CALDAS, Sarah P. Souza. Atividades na pré-escola. 17° ed. São Paulo: Saraiva, 1997.


FILHO, Audir Bastos; DE SÀ, Cláudia Maria Ferreira. Psicomovimentar. Campinas, SP: Papirus, 2001.


FONSECA, Vítor da. Manual de observação psicomotora: significação psiconeurológica dos fatores psicomotores. Porto Alegre: Artes Médicas, 1995.


MELLO, Alexandre de Moraes de. Psicomotricidade, educação física e jogos infantis. 4°ed. São Paulo: IBRASA, 2002.


MEUR, A. De. Psicomotricidade educação e reeducação. São Paulo: Manole, 1991.


OLIVEIRA, Gislene de Campos. Psicomotricidade: educação e reeducação num enfoque psicopedagógico. 4 °ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2000.


RELVAS, Marta Pires. Fundamentos biológicos da educação: despertando inteligências e afetividade no processo de aprendizagem. Rio de Janeiro: Wak, 2005.


RELVAS, Marta Pires. Cérebro ? O Instrumento da Evolução A Neurobiologia e a Psicomotricidade. In: ALVES, Fátima (Org.). Como aplicar a psicomotricidade: uma atividade multidisciplinar com amor e união. Rio de Janeiro: Wak, p. 61-77, 2004.


VYGOTSKY, Lev Semenovich. A formação social da mente: o desenvolvimento dos processos superiores. Organizadores Michael Cole... [et al]; tradução José Cipolla Neto, Luis Silveira Menna Barreto, Solange Castro Afeche. 6° ed. São Paulo: Martins Fontes, 1998.