EDIFÍCIOS MULTIFUNCIONAIS (HÍBRIDOS)

Por Thayana Hoth Ferreira | 21/05/2014 | Engenharia

Thayana Hoth Ferreira

RESUMO

O presente artigo trata de um assunto que não é muito comum ainda no Brasil, tornando-se aposta em algumas cidades pela dinâmica e forma criativa deste tipo de edificação. São os edifícios multifuncionais, também chamados de edifícios híbridos. Que trazem no mesmo edifício, ou um conjunto, uma variedade de usos, como o morar, trabalhar e o lazer.

PALAVRAS CHAVES: Edifícios multifuncionais verticais, permeabilidade espacial.

1.    INTRODUÇÃO

No cenário urbano atual, em fase de transformações constantes, associados às mudanças nos processos econômicos e tecnológicos, bem como aos modos de viver e habitar as cidades, percebe-se o interesse de arquitetos e urbanistas por alternativas de melhoria da qualidade de vida nas cidades. Morar, trabalhar, comprar e divertir-se são atividades dinâmicas cada vez mais entrelaçadas. Os edifícios multifuncionais, também chamados de híbridos, são aqueles que conjugam diferentes usos no mesmo projeto, independentes entre si, cada um com sua própria gestão. Os edifícios híbridos são como cidades verticais, onde o objetivo é criar intensidade e vitalidade para as cidades, atrair as pessoas, e favorecer a mistura e a indeterminação.

No entanto, além de abrigar as funções internas, os edifícios multifuncionais podem influenciar ou ser influenciados por dinâmica urbana, de acordo com a sua configuração de permeabilidade espacial, ou seja, a relação entre o espaço público na escala do pedestre (praças, ruas, calçadas) e o espaço semipublico, caracterizado, em muitos casos, pela presença do comercio no térreo desses edifícios. Neste sentido, edifícios multifuncionais que contemplam a permeabilidade entre espaço público-privado, são considerados por muitos estudiosos, como a semente da regeneração urbana das cidades.

Atualmente, as cidades, em seu comportamento social e econômico, produzem cada vez mais edifícios que se fecham e negam seu entorno, contribuindo para o declínio da vitalidade nos espaços urbanos. A causa principal está na predominância de edificações destinadas ao serviço em detrimento de outros usos, como o lazer, que acabam por determinar horários e dias específicos.  A concepção de um edifico com conceitos de multifuncionalidade e permeabilidade espacial ressaltam muitos aspectos, tais como a circulação de pessoas em diversos horários do dia, segurança, diversidade de atividades, devido a integração de diferentes usos e funções.

2.  EDIFICIOS MULTIFUNCIONAIS

2.1 CONCEITUAÇÃO DE EDIFICIOS MULTIFUNCIONAIS

Edifícios multifuncionais constituem em um único ou um conjunto de edifícios, que se integra com múltiplas funções (habitação, comércio, serviços, lazer, cultura, entretenimento, etc.), em diferentes escalas que podem variar de acordo com o meio que está inserido.

A discussão teórica sobre os edifícios multifuncionais é recente e nem mesmo o termo multifuncional é conceitual entre os arquitetos e urbanistas, sendo muitas vezes empregadas as palavras ou expressões “uso misto”, “híbrido”, ou “uso múltiplo”. (Dziura 2009)

Para Zeidler (1985) apud Dziura (2009), o edifício multifuncional não é uma ideia, um conceito, e não tanto uma tipologia definida com precisão. Dziura (2009) acrescenta ainda aos edifícios multifuncionais não se deve somente integrar essas funções internas, mas que o edifício ainda precisa se relacionar com o contexto urbano. E, dessa forma, tanto edifícios relativamente pequenos quanto complexos podem ser considerados multifuncionais.

Os edifícios multifuncionais podem ser tanto um instrumento de segregação urbana, quanto podem contribuir para a integração e requalificação dos espaços urbanos. Existem edifícios multifuncionais que se fecham para a cidade e funcionam como um organismo independente, tais como os shopping centers e hipermercados. Outros, no entanto, integram seus espaços internos ao espaço urbano, sendo assim influenciados e influenciando o entorno imediato.

Atualmente os grandes centros urbanos estão sendo caracterizados por alto adensamento, verticalização, e há edifícios que estão acompanhando as demandas desses processos, oferecendo funções de diversos usos que geram presença de pessoas em horários diferentes, com espaços abertos no térreo e que reúnem subsídios para uma melhor qualificação urbana.  Esses edifícios dotados de múltiplas funções podem garantir a diversidade, e fazem com que o convívio entre as distintas atividades citadas - morar, trabalhar, passear, comprar, conviver- e outras, se tornem a base da vitalidade do espaço.

Rogers (2008), cita que os edifícios multifuncionais podem ser uma alternativa no processo de reconstituição do tecido urbano. Para ele, são espaços que naturalmente promovem a diversidade de atividades e pessoas e propiciam a convivência de partes distintas da cidade. Há um grande interesse nesta tipologia de edifício, que deve-se ao fato de que ele representa um novo paradigma do viver na cidade, trazido inicialmente pela Revolução Industrial e que está sendo retomado em algumas cidades.

 

2.2 EDIFÍCIOS MULTIFUNCIONAIS VERTICIAIS NO BRASIL

 

“A implantação dos edifícios multifuncionais no Brasil acompanhou o processo de verticalização que ocorreu a partir da década de 1920, e teve o marco inicial as cidades de São Paulo e Rio de Janeiro. Devido a vários fatores, entre eles o desenvolvimento tecnológico, a industrialização, a atuação dos agentes imobiliários e os interesses políticos.” Dziura (2009)

Alguns dos edifícios multifuncionais verticais citados nesse capitulo correspondem a grandes marcos iniciais ou referências em algumas grandes cidades, como:

No Rio de Janeiro, a autora Dziura (2009) cita o Edifício Marquês do Herval que foi construído em 1953, projetado pelos arquitetos Irmãos Roberto MMM (Marcelo, Milton e Mauricio) e o caracteriza como uma experiência de edifício multifuncional vertical. O edifício tem 21 andares e abriga as funções de comércio no térreo e escritórios e habitações nos pavimentos superiores. Unido à noção da importância da integração ao espaço urbano, os arquitetos demonstram esta preocupação, seja pelo alinhamento das fachadas, escolha dos acessos e inserção dos espaços comerciais. O edifício está localizado na Av. Rio Branco, importante centro comercial da cidade.

 “A combinação dos acessos e a presença de comércio atraem as pessoas a entrarem no edifício, isto é, há uma preocupação projetual em integrar o espaço público com o semipúblico do edifício de modo a trazer os transeuntes para o interior do edifício, por meio da permeabilidade espacial. O pavimento térreo consiste no espaço de integração dos espaços internos em rua pública, sendo o local onde acontece os fluxos, as barreiras e permeabilidades. ” Dziura (2009)

Em São Paulo, ainda nesse contexto, se destacam o Conjunto Nacional (1952-1958), e o Edifício Esther, construído em 1936 com autoria dos arquitetos Álvaro Vital Brazil e Adhemar Marinho, localizado no centro de São Paulo. O edifício abriga nos três primeiros dos seus doze pavimentos a função comercial e habitacional nos demais. É o primeiro edifício que associa habitação a um programa multifuncional em forma de galeria. Álvaro Vital Brazil tornou-se, na década de 1930 um dos mais rigorosos arquitetos racionalistas brasileiros, pela importância de suas iniciativas técnico-construtivas.

Segawa (1997), afirma que o projeto do edifício Marquês de Herval tinha como característica ampliar a comunicação entre o espaço interno e o externo por meio da criação de um rua interna, somando-se a isso o uso racional dos materiais e a linguagem formal sem ornamentos, atendendo aos preceitos da arquitetura moderna. Dziura (2009) completa dizendo que o edifício interfere na paisagem urbana e na própria dinâmica no entorno em que está inserido, além de introduzir o uso mistos nos edifícios verticais. Dessa maneira, sua história faz parte do processo de mudança da própria cidade de São Paulo.

O outro exemplo em São Paulo, é o edifício Copan projetado por Oscar Niemeyer com colaboração de Carlos Alberto Cerqueira Lemos em 1952. O Copan ocupa terreno de 6.006,35 m² e é composto por torre residencial com 32 andares, com 1.160 apartamentos de variados tamanhos, desde quitinetes até apartamentos de quatro quartos distribuídos em 6 blocos, além de uma área comercial no térreo, com 73 lojas, e sala de cinema que hoje é ocupada por uma igreja evangélica. O edifício possui 20 elevadores no total e 221 vagas para automóveis em dois subsolos. (Galvão, 2007)

No Brasil, os edifícios multifuncionais ganharam mais destaque na cidade de São Paulo. Nesta cidade, essa tipologia foi largamente empregada, configurando eixos de valorização do solo e colaborando para a consolidação de eixos comerciais. Segundo Dziura (2009), o uso de espaços de lazer, tais como restaurantes e cinemas, encontrou seu ápice no final da década de 50. Até então, estes espaços eram localizados no centro da cidade e jamais estariam vinculados ao uso habitação. A autora ainda aponta que edifícios-galeria, assim como edifícios-conjunto, não haviam ainda se consolidado: eles começaram a ser reproduzidos na metrópole nesta época, atestando a boa relação entre espaço público e privado.

Um exemplo de edifício multifuncional mais recém inaugurado é o Brascan Century Plaza, que é composto por três edifícios de volumetrias e usos distintos, ocupa quase uma quadra inteira que está localizada entre as ruas Bandeira Paulista, Joaquim Floriano e a Rua Prof. Tamandaré Toledo no bairro Itaim Bibi, zona sul de São Paulo.

Projetado pelos arquitetos Jorge Königsberger e Gianfranco Vannucchi, em 2003, o conjunto de 93. 805,00 m² tem como maior diferencial, a praça térrea, com ampla área verde, que é compartilhada por usuários do condomínio e transeuntes da região.

O complexo é composto por três edifícios, o maior deles é o Brascan Century Staybridge Suítes, torre de flats com 31 pavimentos, 356 unidades hoteleiras e um heliponto. O segundo, com linhas semelhantes, é o Brascan Century Offices que possui 24 pavimentos, com 364 s de escritórios. O Brascan Century Corporate é um volume retangular com 15 pavimentos composto por salas grandes dirigidas a empresas que necessitam de mais espaço para suas instalações. O empreendimento conta ainda com centro de convenções, academia de ginástica. Os acessos dos pedestres no térreo ocorrem basicamente por três entradas, uma em cada rua, além das entradas independes dos prédios com a praça unindo um ao outro e marca seu caráter como conexão entre os prédios.

3. CONCLUSÃO

 

O conceito dos edifícios híbridos começa a engatinhar no Brasil, tornando-se aposta em algumas cidades pela dinâmica e forma criativa. O objetivo destes edifícios é atrair pessoas para dentro destes empreendimentos. A maior vantagem das edificações híbridas é a experimentação da mistura de usos. Cada nova edificação híbrida pode combinar diferentes usos, de diversas formas, assim cada edifício híbrido é único. Então cada combinação de usos pode trazer diferentes benefícios. Mas todos eles terão uma vantagem em comum: a criação de algo novo e inesperado, e assim atraindo as pessoas para dentro dele. 

 

 

4. REFERENCIAS

DZIURA, Giselle Luzia. Permeabilidade espacial e zelo urbanístico no projeto arquitetônico: da Modernidade à Pós-Modernidade nos edifícios multifuncionais do Eixo Estrutural Sul de Curitiba, 1966-2008. 2009. Tese (doutorado) - Faculdade de Arquitetura e Urbanismo, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2009.

GALVÃO, Walter José Ferreira. COPAN/SP: A trajetória de um mega empreendimento da concepção ao uso. Estudo compreensivo do processo com base na Avaliação Pós-Ocupação. Dissertação (mestrado). Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo, 2007.

SEGAWA, Hugo. Arquitetura no Brasil 1900-1990. São Paulo: EDUSP,1997.

ZEIDLER, Eberhard. H. Arquitectura Plurifuncional em el contexto urbano. Barcelona: Gustavo Gilli, 1985.

 

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