E se ainda assim

Por Majoh Rodrigues | 31/10/2016 | Contos

Você ainda estiver pensando, e pensar, a gente sempre pensa, se eu tivesse feito isso ou aquilo, e se eu fizer assim e não assado?

A vida é um eterno pensar e escolher, com bifurcações incríveis, nada e ninguém escapa das escolhas, que anula tudo de um e elege tudo de outro...

O medo nos paralisa, nossa visão restrita e curta nos encarcera e nos deixa estacados num lugar apenas, temos medo de alçar voos e cruzar montanhas, oceanos, mares, riachos e até mesmo poças d’água...

Dos animais somos distinguidos pela capacidade de pensar e falar e nada mais, porque perdemos em força, em atitude, em visão, em olfato, em velocidade...

E quem somos quando estamos insatisfeitos com a vidinha pequena de gaiola em que voluntariamente e pouco a pouco nos acomodamos e instalamos, tomando posse de cada milionésimo de milímetro achando que que estamos bem e nada pode nos alcançar.

Nada?

Nem mesmo as recordações e os desejos?

Impossível!

Uma pessoa com desejo é um mar de possibilidades infinitas para o sim e para o não, ah, e é claro e para os infindáveis “... e se”...

Temos medo de não dar conta do desconhecido, pavor de não nos acostumarmos às inevitáveis mudanças, tememos sentir saudade das pessoas, dos lugares, dos cheiros e dos sabores.

Não percebemos, porque nos olhamos no espelho todo dia, que o tempo passa e vai amarrotando e desbotando nossos sonhos, criando bolores, mofo, amarelando suas bordas, descolorindo e carcomendo de traças e ranço nossa alegria, minguando nossa autoconfiança.

Um dia abrimos a caixa de nossos sonhos passados e vamos olhando com atenção quem éramos, e percebemos com certa amargura por lamentar o tempo perdido que éramos belos, inteligentes, diferentes de nossos pares e quiçá até mais espertos, mas não ousamos, não acreditamos em nós, nas vozes dos anjos que tentavam e muitos ainda tentam em vão nos alertar do que perdemos e perderemos se continuarmos a ser sempre os mesmos.

Não nos damos a chance, pelo menos de tentar, ver no que dá, no que sentimos, no que pode nos acontecer.

Racionalizamos tanto que acabamos perdendo oportunidades preciosas.

Porém, Deus não permite que nada aconteça antes do tempo.

Somos nós que devemos mudar, não porque tenhamos de favorecer o outro fingindo que não percebemos as manobras deste ou daquele, mas sim, por nós mesmos, pela nossa paz, bem estar e saúde.

São necessários anos, décadas e muitas vezes, sem dúvida, a maior parte da vida para percebermos que somos nós que devemos mudar nossa maneira de reagir diante das circunstâncias.

Precisamos acreditar que não podemos controlar tudo da vida alheia, pois devíamos perceber que nem a nossa vida podemos controlar, que dirá a do outro?

Somos grandes quando somos pequenos e é assim que deveríamos nascer pensando, para que cada um cultivasse seu próprio jardim sem querer invadir o jardim do outro.

É sempre conosco a solidão, os momentos de sentarmos diante de nós mesmos e conversarmos conosco, com benevolência, cuidados, atenção, delicadeza e muitas vezes até usar de energia para entendermos que quem precisa de mudança somos nós e que os que estão ao nosso redor reagirão de acordo com o que fizermos, exatamente como um reflexo.

Sejamos coerentes para conosco, não podemos nos mentir e nos burlar, temos de nos dar bronca, falar em voz alta e nos lembrar a todo instante que, por mais que tenhamos pressa, é preciso viver um dia de cada vez.

Sempre haverá entressafras na abundância, temos de aprender a desviar do caminho, explorar atalhos que jamais teríamos considerado, mudar nosso foco, desviar nossa atenção, cuidar de nossos pensamentos, vícios, daquilo que sabemos que causa ansiedade e que mesmo assim persistimos sem resultados...

E na ânsia de satisfazer nossos desejos sôfregos e imediatos nos esquecemos da sensação de vazio que nos dá depois disso, de termos nos esgotado em busca de quimeras, de ter utilizado nossa energia em algo que já sabemos que nunca irá nos preencher.

Repensemos e repesemos nossas ansiedades e cuidemos mais de nosso jardim interior, das sementes que germinam nele, das pessoas que estão conosco dividindo nossa jornada, nos amparando e nos mostrando novas possibilidades, novos horizontes, novas saídas.

Consideremos que nunca nada é fácil de mudar, e que nossos hábitos muitas vezes são nossos carrascos e nossos grilhões a nos manterem presos a velhas tradições que criamos para nós mesmos, grilhões que nos mantém imóveis, fixos e desconfortáveis.

Despertemos para a vida, tentemos novas possibilidades, alternativas que possam nos levar a alçar melhores voos.

E talvez até, mesmo que ainda consideremos ser tarde para mudanças, podemos estar diante da porta do paraíso e tudo isso só depende de nós.