É possível alterar os rumos do desenvolvimento para sustentável?
Por beatriz diniz | 11/03/2009 | EconomiaÉ possível alterar os rumos do desenvolvimento para sustentável?
O desenvolvimento econômico, que esgota recursos naturais e a capacidade da biosfera suportar nossa predação, tem ultrapassado limites e ameaça o planeta. Apesar do tempo já perdido em nossa trajetória comprovadamente insustentável, é possível alterar seu curso para seguirmos trajetos cada vez mais sustentáveis.
Embora a atual crise econômica mundial seja um risco de retração de investimentos em políticas ambientais, não pode mais ser adiada a decisão política para empreender o desenvolvimento sustentável na amplitude global que a gravidade exige. São necessárias diversas e contínuas estratégias de recuperação e conservação.
Não podemos prescindir de conhecimento e tecnologia, cuja utilização deve ser ampliada. Imprescindível também é a conscientização de todos os setores da sociedade no mundo para o uso eficiente da água, do solo, da energia, para o consumo racional, o comportamento responsável, para o valor dos bens materiais, para o preservar da vida cotidianamente.
Somos a humanidade pisando no delicado equilíbrio que nos é vital, no momento de escolher entre continuar na insustentabilidade ou ser aliada do meio ambiente, causar menor prejuízo e ter o lucro de existir. Portanto, precisamos inverter o sentido do desenvolvimento e mudar a qualidade de nossas relações econômicas, ambientais e sociais.
Por que é preciso?
As atividades humanas amontoam impactos negativos sobre a natureza. O planeta não aguenta mais o modo de produzir e consumir que desperdiça bens naturais e materiais. A insustentabilidade do desenvolvimento econômico acumulou até o século XXI sérios problemas ambientais no mundo, prestes a se tornarem irreversíveis, a exemplo do aquecimento global e mudanças climáticas, impossíveis de não serem sentidas.
Para a população que cresce, o desenvolvimento econômico esgota recursos naturais e extrapola a capacidade da biosfera suportar a degradação e a produção de dejetos em velocidade superior à regeneração natural ou tecnológica. Extinção de espécies animais e vegetais, poluição, desastres ecológicos, desequilíbrio de ecossistemas, aquecimento e mudanças climáticas são prova da trajetória insustentável da humanidade. Por isso, é preciso alterar seu curso.
Têm sido projetadas cientificamente, desde o século passado, as ameaças reais e definitivas que o desenvolvimento econômico exerce contra a vida na Terra. Assim como previstas as condições de reverter ou de tornar irreversível o prejuízo ambiental. E também indicados prazos e passos para seguir em desenvolvimento no caminho sustentável.
Além de preciso, é urgente alterar os rumos do desenvolvimento para sustentável
A história do relacionamento do homem com o meio ambiente registra alertas, manifestações, estudos e projeções importantes, que comprovam o caráter predatório das atividades humanas no planeta, seus efeitos degradantes reversíveis e irreversíveis, seus riscos à preservação da vida e seus limites temporais e físicos.
Cerca de três milhões de anos atrás, o homem paleolítico descobriu como manipular o fogo, contudo, não imaginava que essa nova forma de contaminar o ar seria o início do início do processo de degradação do ambiente, que continuou com a descoberta da agricultura, há dez mil anos. A humanidade se instituiu do poder de dominar e alterar o ambiente em seu processo de desenvolvimento, preferindo um modelo predatório e despreocupado com as consequências para a biodiversidade, para a vida no planeta.
Como se não dependessem do equilíbrio dos ecossistemas e da integridade da diversidade natural para sua existência, os seres humanos têm permitido insistentemente que o desenvolvimento econômico dite as normas de suas relações com o meio ambiente. Dessa maneira, o modo de produção e consumo explora, exaure, desperdiça, não repõe e não conserva recursos naturais, polui ar, solo e terra, e se constitui como grave ameaça por gerar problemas em todo o mundo.
O prejuízo ambiental é tão grande que compromete a vida de todas as espécies no planeta e em pouco tempo pode ser irreversível recuperar o que foi destruído e conservar o restante. Esgotamento dos recursos naturais, desrespeito aos limites de capacidade da biosfera suportar a produção de dejetos na velocidade superior à de regeneração (natural ou artificial) e pobreza são os problemas globais agravados pela continuidade desse modelo de desenvolvimento econômico.
Publicada em UNEP Year Book 2008, a probabilidade de que as atividades humanas venham exercendo influência para o aquecimento do clima desde 1750 é de 95%, segundo o IV Relatório de Avaliação do IPCC (IPCC, 2007). O desenvolvimento com vantagens econômicas e prejuízos ambientais, que se consolidou no século XVIII, a partir da Revolução Industrial, intensificou a exploração de recursos naturais e também a poluição.
"Sabemos que homem branco não compreende nosso modo de viver. Para ele, um pedaço de terra é igual a outro. Porque ele é um estranho que vem de noite e rouba da terra tudo quanto necessita. A terra não é sua irmã, é sua inimiga, e depois de a esgotar, ele vai embora... Se todos os animais desaparecessem, os homens morreriam de solidão espiritual, porque tudo quanto acontece aos animais pode também afetar os homens. Tudo está relacionado entre si. Tudo quanto fere a terra fere também os filhos da terra (Cacique Seathl-Seattle, 1855)." Manifestada no século XIX, a preocupação com a integridade do meio ambiente se confirma pertinente.
Intensificar novamente a produção industrial, após a 2ª Guerra Mundial, piorou a poluição. O excesso de poluição causou desastres ambientais no Século XX, quando também teve início a conscientização social e política acerca dos problemas ambientais. De 1930 a 1952, em apenas quatro desastres ambientais, quase cinco mil pessoas morreram e mais de 32 mil sofreram danos à saúde. Não houve como a população não começar a perceber que passava dos limites a destruição da natureza e que a reação natural afetava drasticamente os seres humanos.
O marco histórico do crescimento da consciência preservacionista, há menos de 50 anos, demonstra o atraso diante de cerca de três séculos de intensa degradação do meio ambiente. Ainda que a passos lentos, com maior compreensão e pressão da sociedade a partir da década de 60, vai sendo feita a transição por mercado, governos e empresas da predação para o desenvolvimento sustentável. Contornar os problemas causados pelo excesso de poluição, com a sociedade mais consciente, não é o bastante. As tecnologias são voltadas para limpar a produção na década de 80 e reduzem a emissão de poluentes, o que caracteriza a poluição como desperdício e a produção como ineficiente.
A linha do tempo da questão ambiental mostra as oportunidades perdidas pelos seres humanos com poder político e econômico de decisão para, cientes da caminhada insustentável, ajustar os rumos na direção da sustentabilidade em suas dimensões ambiental, econômica, tecnológica, política, cultural e social.
Em 1908, o então presidente dos Estados Unidos, Theodore Roosevelt, afirmou publicamente a chegada do momento de refletir sobre o esgotamento dos recursos naturais em benefício do progresso. 101 anos depois, entre as urgências da crise econômica no mundo, o Nobel da Paz e ex-vice-presidente americano, Al Gore, levou para o Fórum Econômico Mundial, em Davos, na Suíça, o alerta de que há uma emergência ainda mais devastadora, pois o aquecimento global está chegando mais rápido que o esperado e seus efeitos são para sempre. Em 2009, durante o fórum, o temor de que a crise rebaixe a segundo plano o meio ambiente foi expresso por Gore, em função de estar chegando o momento da irreversibilidade.
Adiar as medidas necessárias ao caminhar sustentável da humanidade, persistindo na pegada pesada, foi desperdício de tempo e não garantiu êxito no século XXI do sistema capitalista de produção e consumo. A crise mundial da economia, que estourou em 2008, persiste no ano seguinte com a aparência de ser mais uma pedra no caminho que mercado, governos, empresas e sociedade precisam percorrer.
As elites dirigentes reconhecem a insustentabilidade de nossa trajetória e a precisão de alterar o sentido do desenvolvimento para sustentável, o que não garante adesão a convenções ou protocolos internacionais para assegurar recursos naturais disponíveis, respeitar os limites da biosfera e reduzir a pobreza. É preciso mais do que triplo do investimento anual de 515 bilhões de dólares em energia limpa a fim de evitar que as emissões que provocam o aquecimento do planeta atinjam os níveis considerados insustentáveis pelos cientistas. "Os líderes empresariais querem clareza dos governos sobre aonde querem ir com a mudança climática. Precisamos de uma perspectiva clara de investimento", avalia a principal autoridade da Organização das Nações Unidas para o clima, Yvo de Boer (REUTERS, 2009).
A eleição de Barak Obama presidente dos Estados Unidos, país que simboliza o estilo de vida consumista e líder do capitalismo, é uma esperança incrível de que a volta do crescimento econômico inclua, definitivamente, a sustentabilidade. No entanto, enquanto o setor privado vem enfrentando questões ambientais, sociais e de governança, encorajado pelas pressões da sociedade civil, governos nacionais precisam criar padrões, apoiar a pesquisa e dar incentivos para a transição para uma economia ambientalmente racional e de baixa emissão de carbono (low-carbon) (UNEP, 2008).
Oposto do modo de produção e consumo do desenvolvimento econômico ainda vigente, o modelo de desenvolvimento sustentável consiste em satisfazer as necessidades presentes, sem comprometer a capacidade das gerações futuras de suprir suas próprias necessidades, gerando riqueza e bem-estar com coesão social e sem destruição da natureza. Ban Ki-moon, Secretário-Geral da ONU, é categórico ao afirmar: “As mudanças climáticas são uma das mais complexas, multifacetadas e sérias ameaças que o mundo enfrenta. A resposta a esta ameaça está ligada, fundamentalmente, às preocupações com o desenvolvimento sustentável e um mundo justo; com a vulnerabilidade e a resiliência; economia, redução da pobreza e sociedade; e com o mundo que nós queremos deixar para os nossos filhos... Não podemos continuar nesta direção por muito tempo. Não podemos continuar neste padrão. O tempo chegou para uma ação decisiva, em escala global” (Ban, 2007 apud UNEP, 2008, p.31).
Sim, nós podemos e precisamos
Além dos diversos problemas ambientais e dos desafios de garantir a disponibilidade de recursos naturais, de respeitar limites da biosfera e reduzir a pobreza, o mundo sofre duas grandes ameaças na atualidade, que são o aquecimento global e a crise mundial da economia. A atual crise na economia aumenta a importância de conscientizar a população para pressionar as elites dirigente a contar, definitivamente, com meio ambiente como aliado e não mais o contrário, como tem sido, exaurí-lo como a um inimigo.
O progresso tecnológico resolve problemas do ambiente, mas não basta, é preciso investir na conscientização de todos os setores as sociedade mundial para revitalizar o tecido social e recriar laços de interação harmônica com os bens materiais. "O uso eficiente da terra, água, energia e outros recursos naturais auxiliam em modos de vida sustentáveis, torna as empresas mais produtivas e reduzem os custos de disposição e limpeza. Produtos e condições de trabalho seguras atraem clientes conscientes e minimizam trágicos e custosos acidentes. Educação, cuidados médicos e igualdade de oportunidades geram comunidades estáveis e uma força de trabalho produtiva. Boa governança, o reino da lei e direitos de propriedade definidos são essenciais para a segurança, eficiência e inovação" (Porter & Kramer, 2006 apud UNEP, 2008, p.33).
O meio ambiente inteiro, recomposto, em equilíbrio, vivo e conservado, tem significativo papel na recuperação do crescimento da economia, além de ser condição para existência da vida na Terra. O ingresso da atividade produtiva global no processo de descarbonização da economia, por exemplo, já é considerado por especialistas como uma das maneiras do mundo sair da crise, segundo o Professor da PUC Rio e consultor da WWF, Sérgio Bresserman, em entrevista a Miriam Leitão no programa Espaço Aberto (GLOBONEWS, 2009).
Continuar em trajetória insustentável levará o planeta a condições irreversíveis. Alterar seu curso para sustentável significa mudar o sentido do desenvolvimento econômico, requer decisões urgentes da governança internacional, demanda transformações no agir e pensar, no modo de produzir, consumir e conservar em todo o mundo.
Sim, nós podemos, com mobilização social, conhecimento e inovações tecnológicas, e precisamos, pois a demora em mercado, governo, empresas e sociedade tomarem as decisões efetivas, internacional, multilateral e localmente, para inverter o sentido predatório do desenvolvimento, encurta o tempo e diminui possibilidades de reversão dos estragos ambientais.
DINIZ, Beatriz. Sim, nós podemos... WebArtigos, Rio de Janeiro, 11 mar. 2009. Disponível em: <http://www.webartigosos.com/articles/15469/1/e-possivel-alterar-os-rumos-do-desenvolvimento-para-sustentavel/pagina1.html>.
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