E Deus Disse: “Faça-se Newton”

Por Julio Cesar Souza Santos | 23/12/2016 | Sociedade

Por Que Isaac Newton Foi Considerado o Herói da Ciência Moderna? O Que Era o “Caminho Matemático”? Por Que Não Havia Diferença Entre o Funcionamento de Um Corpo Humano, de Uma Árvore ou de Um Relógio, na Opinião de Newton?

O primeiro herói popular da ciência moderna foi Isaac Newton e, antes dele, até houve outros conhecidos na Europa pelo seu domínio das forças da natureza. Aristóteles – por exemplo – foi a fonte clássica aprovada por todos, mas quando Roger Bacon (o mais famoso cientista da Idade Média) procurou decifrar as naturezas e “as propriedades das coisas” – incluindo estudar a luz e o arco-íris e descrever o processo de fazer pólvora –, ele foi acusado de “magia negra”. Ele não conseguiu convencer o Papa Clemente IV a incluir as ciências experimentais no currículo universitário, teve de escrever seus tratados científicos em segredo e foi preso por “novidades suspeitas”. 

Mas Newton, cuja visão dos processos da Natureza foi mais penetrante do que as de Bacon, foi publicamente aclamado. Enquanto experimentalistas anteriores foram acusados de terem pacto com o Diabo, a Newton colocaram-no à mão direita de Deus. Ao contrário de Galileu (seu maior predecessor), Newton vogou com as correntes científicas do seu tempo. Provavelmente, ele exerceu maior influência sobre o pensamento científico do que qualquer figura após Aristóteles e não houve outro herói assim até Einstein. 

Em Newton atingiram o clímax das forças da ciência em marcha e o seu século seguia já “o caminho matemático”. Pela primeira vez novos parlamentos da ciência apresentavam observações e descobertas para discussão, aceitação e difusão. Presidente da Royal Society de Londres, Newton transformou-a num centro sem precedentes de publicidade e de poder para a ciência. 

No entanto, se um romancista tivesse planejado as circunstâncias do seu nascimento em 1642, dificilmente poderia ter sido melhor concebidas para alimentar os sentimentos de insegurança de Newton. Seu pai foi um pequeno agricultor que não sabia assinar o nome e os seus antepassados pertenciam a uma categoria social ainda mais baixa. Ele foi uma criança enferma e ao nascer dizia-se que cabia numa caneca de litro, duvidando-se até de que sobrevivesse. O pai morreu três meses antes de Isaac nascer e, quando ele tinha apenas três anos, sua mãe casou-se e foi viver com um eclesiástico, deixando Isaac ao cargo da avó. 

Mais velho do que os outros calouros, aos 19 anos entrou para o Trinity College (em Cambridge) como “subsiza” – estudante pobre que trabalha para custear os estudos. Recebeu seu grau de bacharel em Artes em 1665, quando a universidade fechou as portas por causa da peste e, quando ele reabriu, Newton foi nomeado professor de Matemática. Quando ele foi para Cambridge, a física de Aristóteles estava sendo destronada por uma nova filosofia “mecânica” de que Descartes foi o mais famoso expoente. 

Segundo sua visão mecanicista do Mundo não havia diferença alguma, exceto na complexidade, entre o funcionamento de um corpo humano, de uma árvore ou de um relógio. Formuladas em várias teorias de anatomismo, as ideias de Descartes dominaram o novo pensamento físico da Europa. À Newton, a filosofia parecia depender de “coisas que não são demonstráveis” e, por isso, não eram mais do que hipóteses. A Física (ou “Filosofia Natural”) estava repleta de elaborações dos conceitos de Descartes em “corpúsculos”, “átomos” e “vórtices”. 

Reagindo contra essas suposições pretensiosas, Newton permaneceu no caminho da matemática, pois ele estava convencido de que com o tempo sua filosofia experimental certamente explicaria mais. Descartes – que também tinha talentos matemáticos – inventou a geometria Analítica e fez outros progressos em Álgebra e Geometria. Embora Newton não fosse mais modesto que Descartes, conseguia – quase sempre – canalizar seus esforços para a procura de leis físicas expressas de forma matemática. 

Enquanto estudante, Newton traçou o esboço da sua abordagem experimental da Natureza e, antes de completar 26 anos, descobriu o teorema binomial e já estava bem encaminhado no caminho da formulação do cálculo. A sua “Filosofia Experimental” era uma espécie de autodisciplina. Ele revelou a essência do seu método logo nas primeiras experiências com a luz e a cor. Este provou ser uma perfeita parábola da “Filosofia Experimental”, pois de todos os fenômenos naturais, a luz era o mais assustador nas suas tentações para o romance, a metáfora e a teologia, e o mais improvável de poder ser confinado à disciplina dos números. 

Através de um pequeno buraco apontou uma parte do espectro oblongo ([1]) na direção de um segundo prisma e, após isso, ele verificou que a luz refratada do 2º prisma não se dispersava mais e permanecia uma única cor. Concluiu “que a luz consiste de raios diferentemente refrangíveis ([1]) na direção de um segundo prisma e, após isso, ele verificou que a luz refratada do 2º prisma não se dispersava mais e permanecia uma única cor. Concluiu “que a luz consiste de raios diferentemente refrangíveis ([2]) que eram transmitidos na direção de diversas partes da parede”. O que significava que “a própria luz é uma mistura heterogênea de raios diferentemente refrangíveis”. 

Desse modo, ele destruiu a antiga ideia de que as cores eram modificações da luz branca. Depois confirmou a sua sugestão de que todas as cores eram as componentes do branco utilizando uma lente bicôncava para conduzir os raios do espectro completo para um foco comum. Com essas experiências, Newton reduziu as diferenças “qualitativas” da cor a diferenças quantitativas. Ou “ao mesmo grau de refrangibilidade pertence sempre a mesma cor, e à mesma cor pertence sempre o mesmo grau de refrangibilidade”. 

Em 1664, ainda pré-graduado, Newton começou a pensar em alguns modos de quantificar as leis do movimento de todos os corpos físicos. Ele foi estimulado por algumas fontes como a ideia de Robert Hooke, a qual era baseada não em dados demonstrativos, mas num palpite de que a atração gravitacional poderia decrescer na razão do quadrado da distância. Também foi estimulado pelo discípulo de Kepler – Edmund Halley – de que a força centrípeta na direção do Sol decresceria na proporção do quadrado da distância de cada planeta ao Sol. Mas, coube a Newton ver a universalidade dos princípios, fazer cálculos para prová-los e demonstrar que as órbitas elípticas dos planetas os acompanhariam. 

A lenda da maçã de Newton não é totalmente desprovida de fundamento, pois o conceito de gravitação ocorreu-lhe quando estava sentado em estado de espírito meditativo e foi ocasionado pela queda de uma maçã. Teve a audácia de pensar a maçã não como caindo simplesmente na sua cabeça, mas como sendo atraída para o centro da Terra. Ele observou que a Lua estava 60 vezes tão longe do centro da Terra quanto a maçã e, por isso mesmo, pela lei do quadrado inverso deveria ser uma aceleração de queda livre de 1/60² = 1/3600 da aceleração da maçã. Então, aplicando a 3ª lei de Kepler, ele pôde testar a sua teoria. 

O “caminho matemático” de Newton era um caminho de descobertas, mas também de humildade porque o caminho matemático era um instrumento de exploração e um método de autodisciplina. O título da sua obra (“Os Princípios Matemáticos da Filosofia natural”) tornava tão claro que estava desalojando todas as difundidas pretensões de revelar a mecânica da Natureza. Críticos protestaram de novo contra a estreiteza do propósito de Newton. Ele não explicou por que o mundo físico se comportava daquela forma e por que se limitou a fornecer apenas fórmulas matemáticas. 

Newton se revelou um apóstolo tão eficaz da luz brilhante da matemática precisamente por ter uma consciência aguda da escuridão envolvente. Quem, a não ser Deus, podia penetrar no funcionamento mais secreto do Universo? O hermetismo de Newton aumentou com o passar dos anos. Mas, durante toda a sua vida viu os limites da capacidade da razão humana para abarcar a experiência, o que explicava o seu interesse pela Bíblia e pelas profecias. O seu gênio experimental e matemático foi moldado por um temperamento religioso. 

Os seus manuscritos sobre alquimia e tópicos bíblicos intrigam os estudiosos que tentaram encaixá-los na moldura racional do universo de Newton. Sendo assim, não há dúvida de que ele levou os profetas a sério, servindo-se de todos os seus conhecimentos linguísticos para procurar um significado aos termos místicos usados por João, Daniel e Isaías. Por isso, aplicou as suas sofisticadas técnicas de datação astronômica para confirmar a verdade literal de acontecimentos relatados na Bíblia. Newton nunca se tornou um místico radical, pois parecia consciente da verdade de que “o misticismo é a tentativa de nos livrarmos do mistério”. Isso, Newton jamais quis e nunca ousou.

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([1]) OblongoRaio de Luz de uma só cor

([2]) Refrangível - Suscetível de refração: os raios violeta são os mais refrangíveis.