É,cheguei aos sessenta.
Por valdemir campos rocha | 28/10/2011 | CrônicasÉ,CHEGUEI AOS SESSENTA.
Para quem envelhece parece que o tempo voou. Tudo aconteceu muito rápido; quando olho prá trás...lá para os saudosos tempos de minha infância despreocupada no interior do Mato Grosso do sul,tomando banho nos riachos,caçando passarinhos e jogando pimenta malagueta nos bailes dos vizinhos, é que vejo como os tempos eram bons. Não havia TV,internet,nada do gênero.Más havia “guerras” com vagalumes com os outros moleques,futebol com bola feita de meia,carrinhos de madeira com rodas de carretel e cavalos feitos com folhas de coqueiros.Era assim que levávamos a vida e nos divertíamos pra valer.Nossas noites eram incrivelmente belas,a ausência de luz elétrica nos fazia dormir mais cedo e também nos dava o privilégio de contemplarmos as belezas das estrelas e da lua com mais calma.Nossa família era numerosa,éramos em onze pessoas,isto sem contar tios e primos que moravam na mesma região.Quando chegamos naquela região,no início da década de 50,fomos morar em uma fazenda distante 80 km da civilização,equivale a dizer que nossa vida não era melhor do que a dos índios que lá residiam.Inclusive,os víamos passar em fila,todos nus,em frente da nossa choupana.Perigo existiam em abundancia, quando não eram os jagunços dos fazendeiros matando pessoas em nossa frente,eram as onças atacando e comendo nossos cachorros nos quintais de nossas casas;mesmo assim, a vida era surpreendentemente maravilhosa.Todos solteiros,seis rapazes e três moças,esta era a família do seu Juquinha e da dona Nina,como eram conhecidos os meus pais.Católicos tradicionais e praticantes.Pessoas de respeito e trabalhadoras.Criamos,organizamos e implantamos uma “cidade” naquele deserto verde “ Porto Vilma”,o primeiro cartório civil era do meu pai.Muitos casamentos foram realizados por ele; lembro-me claramente que muitas vezes os noivos chegavam a cavalo; depois da cerimônia todos montavam em seus animais e seguiam para o sítio onde um churrasco daqueles os aguardava;um sanfoneiro e alguns tocadores de pandeiro,viola e violão faziam a festa a noite toda.Era tudo simples,rústico e inesquecível.A primeira escola e o primeiro templo católico também foram construídos pelas mãos de meu pai,foi assim,como uma grande familia que Porto Vilma cresceu.Familias de grande valor lá se instalaram; Alfredo Baganha, Daniel Montello,Antonio Menezes, João Rocha,e tantos outros que fizeram história naquelas terras mato-grossenses.
A mudança para a cidade grande foi necessária. Educação dos filhos, tratamento de saúde e a busca por melhores dias impulsionaram minha família a virem para Campo Grande no final de 68. Nos surpreendemos com a beleza da cidade, edifícios, carros,motos,luz elétrica nas ruas e nas casas, compramos o primeiro aparelho de televisão,enfim,tudo era o novo,fantástico.Estávamos vivendo sonhos.E assim... a vida foi passando Casamentos de meus irmãos...mudança para o Rio de Janeiro...retorno a Campo Grande...meus sessenta anos ainda estavam longe...
Hoje, debruçado no “parapeito” da vida, olho para trás... quantos amigos já não existem mais,quanta coisa mudou na vida e no mundo.Nações sofreram a inclemência da natureza,países foram devastados pelas guerras,homens,que antes pareciam deuses caíram pela fúria dos seus conterrâneos,a moral caiu vertiginosamente,as pessoas,sim as pessoas não evoluíram no mais importante;o amor.Antes ,estamos vivendo uma época caracterizada pelo medo,pelo desamor,pelo egoísmo e pela violência.A poesia desapareceu...A sensibilidade musical quase não se expressa mais.Talvez eu esteja pessimista demais. Com sessenta anos ,nossos julgamentos são carregados de experiências,de frustração,de sonhos não alcançados, de projetos inacabados,já vimos de tudo,experimentamos muitas coisas, perdemos muitas coisas também.Inclusive,a paciência...
Com sessenta anos a visão do futuro é bem afunilada, corremos contra o tempo, pois sabemos perfeitamente que uma pessoa a partir de então só definhará. As dores se acumulam... Os ossos se tornam frágeis...a visão diminui...as pessoas se distanciam...corremos o risco de ficarmos “chatos e ranzinzas” repetindo as mesmas histórias,e cobrando das pessoas aquilo que elas não estão dispostas a dar: tempo e atenção.O que mais fere os idosos não são as dores causadas pelas inevitáveis doenças que os acompanham,e sim o desprezo que as pessoas demonstram.É como se eles fossem desnecessários,suas experiências não servem para os dias atuais,até parece que o ser humano só se realiza errando, perdendo,apanhando.Porém,temos o trunfo da vitória,chegamos até aqui.Vimos vilas se tornando cidades,crianças se tornando adultas, políticos sendo depostos,artistas sendo elevados,outros caindo no esquecimento,alguns recebendo o milagre do Todo Poderoso e vivendo muito,outros,qual loucos pondo fim a própria vida fumando, bebendo,viciados em drogas,e outras doidices mais.É cheguei aos sessenta!.
Pr.Valdemir Campos Rocha/out.2011