DUODÉCIMO DO LEGISLATIVO MUNICIPAL...
Por LEONARDO VASCONCELLOS BRAZ GALVÃO | 31/10/2016 | DireitoDUODÉCIMO DO LEGISLATIVO MUNICIPAL: DA IMPOSSIBILIDADE DE CONTABILIZAÇÃO DO PRODUTO DA ARRECADAÇÃO DA PRESTAÇÃO DE SERVIÇO PÚBLICO DE SANEAMENTO BÁSICO PARA SUA FORMAÇÃO
Leonardo Vasconcellos Braz Galvão*
David Maia Bezerra**
Resumo
O presente trabalho tem como escopo analisar a natureza jurídica do produto da arrecadação (contraprestação) proveniente da prestação do serviço público municipal de saneamento básico (abastecimento de água e coleta de esgotos) e sua classificação orçamentária, demonstrando-se a inviabilidade de contabilizar tal receita como receita tributária apta a compor o valor do repasse (duodécimo) devido às Câmaras de Vereadores.
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Introdução
O manuseio de recursos públicos é sempre uma questão relevante em qualquer ordenamento jurídico, possuindo relevo assaz proeminente em uma República democrática, como se define o Brasil.
Neste cenário é que o presente artigo tenta se situar, buscando o fomento da discussão acadêmica em torno da indagação jurídica pertinente à natureza jurídica dos valores arrecadados pelas concessionárias públicas municipais (autarquias ou empresas) brasileiras prestadoras de serviço público de saneamento básico, com a definição dada pela Lei Federal n.º 11.445/07.
À primeira vista o tema pode parecer de somenos importância, todavia, uma compreensão sistêmica do mesmo nos fará perceber que esta definição tem consequências práticas importantes, notadamente no campo das finanças públicas, já que, a depender da classificação jurídica que se adote, pode-se concluir que o produto da arrecadação decorrente da prestação deste serviço público por intermédio de concessionária pública municipal, compõe, ou não, as receitas que formam a Receita Corrente Líquida (Art. 2ª, IV da LCp 101/00)[1] do Ente político municipal instituidor ou controlador da concessionária, impactando, assim, entre outras coisas, no cálculo do duodécimo que deve ser repassado ao Poder Legislativo local (Art. 168 da CRFB).[1] do Ente político municipal instituidor ou controlador da concessionária, impactando, assim, entre outras coisas, no cálculo do duodécimo que deve ser repassado ao Poder Legislativo local (Art. 168 da CRFB).[1] do Ente político municipal instituidor ou controlador da concessionária, impactando, assim, entre outras coisas, no cálculo do duodécimo que deve ser repassado ao Poder Legislativo local (Art. 168 da CRFB).[1] do Ente político municipal instituidor ou controlador da concessionária, impactando, assim, entre outras coisas, no cálculo do duodécimo que deve ser repassado ao Poder Legislativo local (Art. 168 da CRFB).[2]
O aspecto controvertido acima anunciado, restrito ao âmbito dos Municípios, é o objeto de investigação deste artigo, cujas premissas e conclusões logo passamos a desenvolver.
2. Do Saneamento Básico. Conceito Preliminar
Antes da análise jurídica que se propõe, se faz necessário adotar algumas definições preliminares sobre o próprio conceito de saneamento básico, dês que é instituto proveniente da engenharia, e que na época da promulgação da Constituição da República vigente ainda não estava legalmente definido, tal lacuna somente veio ser suprida quase 20 (vinte) anos após a promulgação da Carta Magna, com o advento da Lei Federal n.º 11.445/2007 (Lei Nacional, no sentido da clássica lição de Geraldo Ataliba[3]).
Nesse sentido, para fins deste escrito, tomaremos por base a definição positivada por intermédio da Lei Nacional atinente à espécie, a qual, em seu art. 3º, define saneamento básico como o “conjunto de serviços, infraestruturas e instalações operacionais de (a) abastecimento de água potável; b) esgotamento sanitário; c) limpeza urbana e manejo de resíduos sólidos e d) drenagem e manejo das águas pluviais urbanas”.[4]
Merece menção, apenas para fins ilustrativos, que o conceito empregado pela Organização Mundial de Saúde (OMS), para precisar o saneamento é bem mais amplo, posto que o conceitua como “o controle de todos os fatores do meio físico do homem, que exercem ou podem exercer efeitos nocivos sobre o bem-estar físico, mental e social”.
Dessa forma, claro está que o saneamento básico é um instrumento capaz de melhorar a qualidade de vida das pessoas, melhorando-lhes a saúde; investimento que racionaliza as despesas públicas, dado que importa em economia das despesas com tratamentos de saúde curativa e ainda contribui para a própria ideia de continuidade da vida humana na Terra, visto que preserva os recursos naturais indispensáveis à sobrevivência da nossa espécie.
Neste contexto, dado o inegável interesse público incidente sobre a matéria, é que a própria norma fundamental fundante de nossa República tratou do assunto nominalmente, ex vi do seu art. 23, IX, daí porque, na passagem precedente, justifica dizer que é competência legislativa concorrente dos entes políticos dispor sobre a matéria, razão da Lei nacional sobre a matéria.
3. Da titularidade do serviço de saneamento básico
Ainda que por ocasião da promulgação da Constituição Federal em vigor, no Brasil, não houvesse definição normativa para o saneamento básico, dedicou a nossa Lex Mater diversos dispositivos explícitos ao tema em comento.
Despiciendo rememorar que nossa Norma fundamental, ao estabelecer a Federação como forma de Estado (art. 1º), impôs como consequência do modelo duas linhas mestras: a ideia de autonomia dos Entes e a divisão de suas competências, com um sistema de repartição vertical e espacial de poderes, competência esta que assume 3 facetas básicas (i) político-administrativas, (ii) legislativas e (iii) tributárias, podendo ser exercidas de forma individual ou coletivamente, conforme o regramento previsto na própria Constituição, que estabelece hipóteses de competências exclusivas, comuns e concorrentes.
Neste tópico ficaremos restritos à análise da competência político-administrativa em matéria de saneamento básico.
Mais que uma competência, o trato dessa matéria se afigura, em nosso sentir, como um dever-poder, dado o caráter de função (atividade de quem não é dono como asseverado por Rui Cirne Lima), que informa todo o agir administrativo consoante a sempre atual lição do eminente Prof. Celso Antônio Bandeira de Mello.[5]
Parece-nos evidente que a obrigação que o Estado, em sentido lato, e seus mandatários e servidores têm de perseguir à exaustão a consecução do interesse público, exime de qualquer dúvida o intérprete quanto ao dever de mútua cooperação entre os 3 (três) Entes federativos, cooperação esta que, em nossa opinião, permeia todo o sistema e que deve ser a premissa principal (maior) a nortear qualquer interpretação que se faça quanto à disciplina jurídica do saneamento básico no Brasil.
A percepção deste verdadeiro postulado (mútua cooperação) não é resultado do livre subjetivismo do intérprete, mas consequência lógica da ratio legis inspiradora do Constituinte originário que estabeleceu ser de competência comum da União, dos Estados-membro, Distrito Federal e dos Municípios a promoção de programas de construção de moradias e a melhoria das condições habitacionais e de saneamento básico, nos exatos termos do art. 23, IX,[6] da vigente Carta Política.
Ainda que não houvesse expressa menção ao saneamento básico na norma constitucional, conforme alhures citado, poderíamos extrair a sua igualmente disciplina constitucional dos comandos sobre (i) Saúde Pública e (ii) Controle da Poluição e Preservação do Meio Ambiente, ambas igualmente tratadas como competências comuns (ou concorrentes) no exato dizer do mesmo art. 23, II e VI, respectivamente, do texto inaugural de nossa República.
Embora ainda não exista(m) em nosso ordenamento a(s) Lei(s) Complementar(es) prevista(s) no parágrafo único do citado art. 23,[7] não nos parece razoável sustentar que a ausência da Lei desincumba os Entes federativos de cumprir com seu mister (competências), relativo à implementação das ações de saneamento básico, especialmente por ser a atuação administrativa vinculada à ideia de função (preceito obrigatório), como antes já abordado.
As competências comuns estabelecidas no art. 23 da CF/88 são corolários do nosso modelo federalista, cuja matriz constitucional claramente optou por ser um federalismo cooperativo, em detrimento de um modelo de federação dual (igualitária) de inspiração ianque.
Reforçando esse aspecto da cooperação, não se pode olvidar também a disciplina do art. 241 da Constituição, expressa no sentido de determinar que “a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios disciplinarão por meio de lei os consórcios públicos e os convênios de cooperação entre os entes federados, autorizando a gestão associada de serviços públicos, bem como a transferência total ou parcial de encargos, serviços, pessoal e bens essenciais à continuidade dos serviços transferidos”.
Cientes da obrigatoriedade que a Administração Pública tem em implementar o saneamento básico e calcados na premissa da necessária cooperação mútua entre os 3 (três) Entes Políticos, visto que se trata de competência comum entre estes, devemos aprofundar na análise dos papéis desses Entes na materialização das ações governamentais voltadas à concretização desse ditame constitucional.
O comando constitucional relacionado com a titularidade de prestação do serviço de saneamento, mesmo que indiretamente, é o do art. 30, V,[8] que estabelece cláusula genérica pela qual compete ao Município prestar serviços de interesse local.
Como se pode observar, o citado dispositivo consagra a ideia de subsidiariedade, pelo qual todos os serviços de interesse tipicamente local, isto é, que possam ser prestados adequadamente pelo Município, direta ou indiretamente, e se relacionem com a sua realidade de forma específica, estejam no âmbito de competência desse Ente federativo.
Resta, todavia, definir o que é interesse local. A rigor, praticamente todo e qualquer serviço apresentará, em última instância, uma dose de interesse local, ao passo que dificilmente algum serviço local será indiferente aos interesses regionais e mesmo nacionais.
Basta imaginar o serviço de telefonia, de produção de energia elétrica e de distribuição de gás canalizado, os dois primeiros conferidos à União (art. 21, XI e XII, b) e o último aos Estados (art. 25, § 2º)[9]. Todos esses serviços repercutem sobre os Municípios e seus habitantes que, por óbvio, desenvolvem os mais diversos interesses (sentido comum) acerca deles. Mesmo assim, a própria Carta estatuiu que tais serviços não serão de titularidade dos Municípios, visto que atribuídos a outros Entes federativos de forma expressa.
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