Dos Procedimentos de Jurisdição Voluntária

Por Steffani Carvalho de Santana | 09/05/2017 | Direito

Dos Procedimentos de Jurisdição Voluntária

 

Com as modificações inseridas na Lei nº 13.105/2015, mais conhecida como Novo Código de Processo Civil, apesar de vigorar há certo termpo em nosso ordenamento jurídico, os procedimentos especiais de jurisdição voluntária continuam regulados, integrando o Capítulo XV do Título III (Dos Procedimentos Especiais) do Livro I da Parte Especial (Do Processo de Conhecimento e Do Cumprimento de Sentença). 

Os procedimentos de jurisdição voluntária possuem natureza administrativa, tendo em vista que o Judiciário é provocado apenas para que o ato ou negócio, já elaborado pelas partes, se concretize. Em outras palavras "ela tem natureza administrativa, do ponto de vista material, e é ato judiciário, do ponto de vista subjetivo ou orgânico; em relação às suas finalidades, é função preventiva e também constitutiva" [1].

Possuem previsão legal nos artigos 719 a 770 do Código de Processo Civil. Como dito, nesses procedimentos não há lide e sim indicação da providencia acerca de negócio jurídico, portanto, o órgão judicial competente desempenha apenas função administrativa como finalidade de criar ou realizar ato jurídico oponível “erga omnes” sem efeito de coisa julgada, podendo, inclusive, tornar-se contenciosa.

 

I- Disposições gerais

Como expresso nas disposições gerais, as partes são denominadas interessadas e, além da citação prevista no art. 721/CPC, deverá ocorrer intimação do Ministério Publico, para, caso queira, figure também como parte, sabendo ainda que é indispensável sua participação caso exista interesse publico, social ou envolvimento de incapaz (art. 178/CPC) e dispensada a participação nas situações elencadas na Recomendação n°16 de 28/04/2010 Conselho Nacional do Ministério Publico.

Após a citação corre prazo para manifestação em 15 dias (art. 721/CPC) que não consiste em uma contestação e sim apenas uma resposta. Não cabe reconvenção. Incidem efeitos da revelia, não cabendo ao juiz processar resposta intempestiva, portanto, ocorrerá a resistência ao pedido (tornando-se litigiosa) e o vencido responderá por custas e honorários.

O pedido inicial deve ser instruído com prova documental e após a manifestação do citado o juiz terá 10 dias para decidir o pleito conforme estabelecido pelo art. 723/CPC. Caso o citado apresente pontos controvertidos, ou seja, quando não houver consenso, o juiz deixará de possuir função administrativa e assumirá a contenciosa, seguindo o procedimento típico de conhecimento e dessa sentença caberá apelação (art. 742/CPC).

Incumbe ao interessado o ônus de provar os fatos constitutivos de seus direitos e pretensões, ainda que o juiz possa adotar em cada caso solução que achar conveniente (art. 723, parágrafo único), porque não consiste em uma decisão que faz coisa julgada material. Ou seja, aquilo que se decide em jurisdição voluntária admite modificação, sem prejuízo dos efeitos produzidos por situações ainda que supervenientes. Pode se destacar também, a existência de vícios que tornem a sentença nula ou anulável não necessitam de ação rescisória (art. 966, §4/CPC), salvo o procedimento tenha se tornado contencioso.

As custas e verbas sucumbências no procedimento voluntário são adiantadas pelo requerente e rateada entre os interessados (art. 88/CPC), não cabe condenação em honorários (art. 85/CPC), salvo quando torna-se contencioso e existam valores como objeto da lide (Lei n° 8.906/94, art. 22,§ 4).

Os procedimentos voluntários ainda se dividem em comum (art. 719 até 725/CPC) e especial (art.726 até 770/CPC).

 

 II - O procedimento para notificar e interpelar (especial - art.726 até 770/CPC).

As notificações e interpelações são meramente conservativas de Direito, possuem a finalidade de emissão/exteriorização de vontade e não de negócio jurídico perante autoridade. Nestes casos não há sentença, pois o ato pretende somente imprimir maior solenidade a sua declaração, tornando-se documento de manifestação de vontade sobre assunto juridicamente relevante.

Dentro destes procedimentos estão:

a- notificação: a pura documentação da vontade solenemente declarada;

b- protesto: conservação ou ressalva de direitos; e

c- interpelação: a provocação do requerido a pratica ou abstenção de atos que declaradamente entenda ser de seu direito.

Pela notificação (art. 726/CPC) o que se faz é uma declaração solene de vontade, para atingir-se um fim de direito material, ou seja, basicamente trata de “aviso” ruptura de vínculos ao fim de certo prazo, sob pena de  ajuizamento de ação processual-contenciosa adequada:

"Art. 726.Quem tiver interesse em manifestar formalmente sua vontade a outrem, sobre assunto juridicamente relevante poderá notificar pessoas participantes da mesma relação jurídica [relação preexistente] para dar-lhes ciência de seu propósito.” (grifamos)

Também poderá o interessado interpelar o requerido, no caso do art. 727/CPC, para que faça ou deixe de fazer o que o requerente entenda ser seu direito. Ou seja, é um espécie de notificação diferenciada pela existência de uma prestação. Serve para reconhecer exigência de cumprimento de obrigação, sob pena de constituir em mora.

Para ambos os casos, o procedimento deverá ser provocado por petição inicial escrita, com exposição dos fatos e os fundamentos da medida. O indeferimento da inicial enseja recurso de apelação.

Deferida a inicial, a notificação deverá ser feita por carta (art. 274/CPC); por mandado (art. 269/CPC); ou, preferencialmente, por meio eletrônico (art. 270/CPC). Ou ainda os meios para citação previstos no art. 246/CPC para intimação das partes e não de seus advogados. Não possui caráter de citação porque o requerido não é imposto dever de se defender, apenas é cientificado acerca da vontade do promovente.

 Pode-se ainda requerer que a notificação seja divulgada por edital quando houver também possível interesse de terceiros incerto. Para isto, em caso possíveis reflexos negativos que a medida pode trazer com relação a futuras obrigações contratuais, para que seja deferida ao requerente deverá demonstrar (i) existência de direito a ser tutelado e (ii) a necessidade de se publicar o edital para ter esse direito.

O juiz pode requerer a oitiva do requerido antes do deferimento da medida a fim de afastar fim ilícito mediante a publicação do edital, alem de proporcionar o contraditório (art. 728, inciso I/CPC). O NCPC permite ainda que sejam averbadas em registro publico (art. 728, inciso II).

Se o requerido quiser se opor a tais diligências, deverá fazer por representação de advogado, caso contrário, será considerado revel. Da determinação em ouvir ou não o requerido, não cabe recurso, por se tratar de despacho previsto me lei e não de decisão interlocutória (art. 1.001/CPC).

São pressupostos para deferimento do pedido (i) a demonstração de interesse do promovente no uso do remédio processual; e (ii) não nocividade efetiva da medida; alem dos princípios básicos do direito processual.

Será indeferida se houver suspeita de que o requerente pretende alcançar fim ilícito (art. 728, inciso I/CPC).

A notificação também não pode aparentar ser um comando judicial ou ordem do juiz, portanto, a decisão do juiz deve ser sumária, não pode se manifestar quanto ao mérito, pois não é medida contenciosa! Limita-se a verificar se é ou não comunicável a intenção manifestada pela requerente. Vale ressaltar que ao decidir se publicará ou não, não cabe recurso, pois é apenas despacho, porém, quando a inicial é indeferida, cabe apelação.

Sobre as custas nos CPCs:

 

CPC 2015
CPC 1973
Art. 729 Deferida e realizada a notificação ou interpelação, os autos serão entregues ao requerente.
Art. 872. Feita a intimação, ordenará o juiz que, pagas as custas, e decorridas 48 (quarenta e oito) horas, sejam os autos entregues à parte independentemente de traslado.

Não cabem defesas ou contraprotestos porque a lei trata tais medidas como “simples exteriorizações de vontade” ou de “comunicação de conhecimento”. Porém, nada exclui a possibilidade de cabimento de mandado de segurança contra tais despachos.

Por fim, não há qualquer espécie de sentença, após as intimações os autos são entregues aos requerente, todavia, aconselha-se realizar o previsto no art. 383 no que tange a produção antecipada de provas [caso necessário]: “Os autos permanecerão em cartório durante 1 (um) mês para extração de cópias e certidões pelos interessados”

 

 

[1] MARQUES, José Frederico. Ensaio sobre a jurisdição voluntária, Campinas: Millennim, 2000, p. 271.