Do Nome Cabala
Por Germano Brandes | 18/12/2015 | HistóriaDo Nome Cabala
Alguns dos latinos tiveram erradamente para si que a Ciência Cabala tomara o nome de um inventor famoso mágico, que diziam Cabaleo; e não poucos persuadidos da indicação desse nome afirmaram ser esse mágico instruído nesta ciência por uma rara encantadora nomeada Cabala. Porém, tudo isto são vaidades de homens indoutos. O nome Cabala ninguém duvidou ser voz hebreia, mas na força de seu significado corre com grande variedade; porque o Mirandulano com os que o seguem interpretam: “tradição”, “revelação”, aludindo ao que dissemos do princípio desta ciência, ou de Deus a Moisés, ou de Raziel a Adão comunicada; o que tudo energicamente se sábiocompreende na palavra Cabala.
Mas Covarrubias, diligente e sábio vocabulista, quer que se deduza o nome Cabala do verbo inpiel, que significa (diz ele) receber ou aceitar de cabeça qualquer razão que a outro se ouve. Mostrando, assim, como por prática e não doutrina se recebia de cor esta Ciência; porque a tudo se estende a força do verbo inpiel, que dá por raiz ao nome Cabala. E verdadeiramente se, como acertou na significação, conhecera a própria raiz do nome, fora aqui tão digno de louvor sua digilência, quanto poderá ser repreensível a omissão do Mirandulano; porque se deduzíssemos o nome Cabala, como ele ensina, do nome “tradição”, acharemos que na colocação hebreia corresponde à palavra tradição mattanah, ou matan, e também mattath, do verbo natthan, ou trado massar, entre os latinos, e entre nós “entrego”, “dou”, “traspasso”; ou se, segundo o mesmo autor, o derivássemos do latino verboque revelo, e entre nós, descubro, por este tal verbo, têm os hebreus ghillah; nos quais por , matan, mattah; natthan, massar, ghillah, e o nome “Cabala” não vemos alguma conexão ou semelhança; e a mesma falta no verbo inpiel, por Covarrubias mostrado por que ainda por aceitar dizem os hebreus “lakah”, e não inpiel, como a este autor lhe parece; e por cabeça tem Rosch, cujo conhecimento de todo exclui a denominação de Covarrubias no modo que ele a escreve. Porém acertou, como já dissemos, no significado; porque o nome Cabala se deduz do verbo nekabel, donde procede o verbo kibbal, ou kibbel, por receber pelo ouvido; e assim poderemos sem erra, dizer: Kebbala, ou Kicabala, pela proporção que tem entre si o kappa grego com o kaph, e o C latino; e a frequente transmutação que se faz de Aleph, como qualquer de outras vogais e, i, nos alfabetos que as admitem. Assim interpreta Chatoayco e Reuchlin aquela cláusula de Esdras no texto hebreu. Mose Kibel, isto é, Moyses audivit, et accepit legem de Sinay, unde Cabala dicitur ab auditu acceptio.
É, contudo, de advertir que como a escritura hebreia é já tão apartada do estudo moderno, pode bem suceder que por defeito ou descuido caiam os autores nestas variedades; ou que também, como na língua grega se observa, que a ática fazia diferença, e tinha melhora da eóleica e jônica, assim na hebreia houvesse semelhantes acidentes, que faziam variar a significação dos verbos. Pelo que nenhuma destas incertezas deve contradizer o crédito de homens tão grandes como os autores que nesta parte refutamos, por cujos estudos passou já a censura dos dias e dos censuradores. Mas é tempo que saindo do nome Cabala passemos adiante em sua especulação.