Diversidade Biológica e as Plantas Medicinais

Por Nilvaci Marques Ribeiro | 15/12/2010 | Arte



Antigas civilizações já conheciam e utilizavam plantas medicinais Um papíro Egípcio, contendo uma lista de plantas medicinais e seus possíveis usos, datados de 1600 a.C., é uma das provas mais antigas da importância das plantas medicinais para estes povos. Documentos semelhantes foram encontrados em locais habitados pelos gregos (460 a.C.) e assírios (700 a.C.) (JUMA, 1989).

Hoje em dia, apesar da presença dos "medicamentos convencionais" em praticamente todas as partes do mundo, as plantas medicinais continuam ocupando um espaço importante na vida de milhares de pessoas. Segundo a Organização Mundial de Saúde, 80 em cada 100 habitantes no Terceiro Mundo, se tratam com medicamentos tradicionais, 85% destes medicamentos contêm extratos de plantas medicinais (EMBRAPA, 1996).

Os próprios "medicamentos convencionais" dependem (direta ou indiretamente) das plantas medicinais. Pelo menos 7000 medicamentos comercializados no ocidente (envolvendo desde aspirina até pílulas anticoncepcionais), foram desenvolvidos a partir de extratos de plantas medicinais (THE CRUCIBLE GROUP, 1994). A partir dos extratos foi possível identificar os princípios ativos dos medicamentos, para a posterior síntese em laboratório.

Muitos destes medicamentos tiveram como ponto de partida as ervas e plantas medicinais existentes no Terceiro Mundo (também chamados de Países em Desenvolvimento ou Países do Sul). No futuro bem próximo, o número de plantas do Terceiro Mundo utilizadas como base para a extração de drogas tende a aumentar (PISTORIUS et al., 1993). Isso porque é nestes países, que se concentra a maior parte da diversidade biológica (biodiversidade) mundial (EMBRAPA, 1996).

A riqueza em número de espécies dos países do Terceiro Mundo (ou seja, riqueza em diversidade biológica) pode ser explicada pela Glaciação. Enquanto todas as zonas temperadas do globo (Hemisfério Norte) foram congeladas; os climas tropicais (Hemisfério Sul) continuaram com sua florescente diversidade genética (MOONEY, 1987). As diferenças em diversidade de espécies entre estas duas regiões do globo são facilmente percebidas. Ao redor de um pequeno vulcão nas Filipinas é possível encontrar um número maior de espécies de árvores que em todo o Canadá. Na Bacia Amazônica existem dez vezes mais espécies que as encontradas em toda a Europa (MOONEY, 1987).

Foram as condições especiais existentes nos países em desenvolvimento, diversidade biológica aliadas a diversidade cultural, que possibilitaram a identificação, o uso e o aprimoramento dos métodos de obtenção dos preparados infusões e "remédios" de centenas de diferentes plantas.

A geração destes conhecimentos envolveu séculos de testes, em um contínuo processo de experimentação coletiva e de transmissão dos conhecimentos, de geração para geração (SHIVA, 1993). As comunidades, vilas e povoados do Terceiro Mundo, locais onde estes conhecimentos foram e continuam sendo gerados, são importantes pontos de acúmulo de conhecimentos sobre a biodiversidade local e sobre as diversas possibilidades de utilização desta diversidade.

Tanto a diversidade biológica, quanto os conhecimentos sobre possíveis usos e comportamentos das espécies, são vitais para a sobrevivência humana e para a sustentabilidade do planeta (SHIVA, 1993; GOEWIE, 1998). A existência da biosfera está intimamente associada à vida das plantas, animais e microorganismos. A espécie humana depende de produção estável de alimentos, fibras, medicamentos e outros produtos, derivados das formas de vida domesticadas ou selvagem. O futuro da espécie humana está ligado à contínua habilidade de produzir novas variedades de plantas e animais adaptados as novas e dinâmicas condições ambientais e as, também mutantes, necessidades humanas. A capacidade de produzir novas plantas depende da existência de materiais genéticos (variedades e parentes silvestres das plantas) a partir dos quais é possível avançar (OLDFIELD et al., 1991). A preservação deste material genético diversificado depende, porém, da preservação da diversidade cultural que criou e mantém estes materiais. Como apontado por SHIVA:

"Ecossistemas diversos deram origem a diversas formas de vida e a diferentes culturas. A co-evolução das culturas, formas de vida e habitats, conservaram e conservam a diversidade genética deste planeta. Diversidade cultural e biológica caminham de braços dados" (SHIVA, 1993).

Um dos grandes problemas atuais é o de que a diversidade biológica tem sido erodida (perdida) e a diversidade cultural destruída rapidamente. Isso põe em risco a sobrevivência de parte dos seres vivos que habitam o planeta e, muito importante, dos conhecimentos relativos a eles (SHIVA, 1993; HOBBELINK,1990; FOWLER et al., 1990). As principais causas deste fenômeno são: a destruição das florestas e da vegetação nativa (destruição do habitat de plantas e animais); o deslocamento de populações de determinadas regiões (êxodo rural); o aniquilamento de nações indígenas inteiras; as mudanças radicais no modo de vida dos povos; a desintegração de comunidades de agricultores familiares; a destruição de hierarquias e o enfraquecimento dos laços comunitários em comunidades rurais.

FOWLER,C.; MOONEY,P. Shattering: Food, Politics, and the Loss of Genetic Diversity, The University of Arizona Press, Tucson, 1990. 278p.
JUMA,C. The Gene Hunters- Biotechnology and the Scramble for Seeds. African Centre for Technology Studies Research Series 1, Zed Book, London, 288p. 1989.
HOBBELINK,H. Biotecnologia: Muito Além da Revolução Verde- As novas Tecnologias Genéticas para a Agricultura: Desafio ou Desastre?, Riocell, Rio de Janeiro, 196p. 1990.

MOONEY,P.R. O Escândalo da Sementes: O domínio na Produção de Sementes, Editora Nobel, São Paulo, 146p. 1987.