Direitos humanos universais x relativismo cultural

Por marcos mauricio dos reis souza | 03/08/2012 | Sociedade

       DIREITOS HUMANOS UNIVERSAIS X RELATIVISMO CULTURAL

 

   Bruno Henrique Ribeiro de Araujo Costa[1]

                                    Igor Rios Sena Santos[2]

Marcos Mauricio dos Reis Souza[3]

                  

Sumário: 1. Introdução; 2. Semelhança x Diversidade; 3. O Etnocentrismo e o Relativismo Cultural: Na Índole de um Direito Universal; 4. O Direito como Produto da Cultura e a Idéia Universal de Direitos Humanos; 5. Conclusão; Referências.

 

RESUMO

O presente artigo visa explanar sobre as diferenças ocorridas entre as culturas em relação à formação de um direito universal. Com o presente tema abordado, percebe-se a ineficácia em utilizar uma cultura base para obter uma discussão com o mínimo de influência sobre culturas adversas. Abordar-se-á, além disso, o direito como produto da cultura.

 

PALAVRAS-CHAVE

 

Relativismo Cultural; Etnocentrismo e Direitos Humanos Universais        

 

  1. 1.      INTRODUÇÃO

Neste artigo iremos questionar a eficácia de direitos universais em uma humanidade multicultural. Abordaremos assuntos que pertençam a uma “ontologia humana”, e logo após apontar diferenças culturais enraizadas nas coletividades, mostrando como essas características comuns encontradas na pessoa humana transformam-se em uma diversidade cultural.

Em seguida, questionaremos o etnocentrismo utilizando as teorias relativistas. Chegando a conclusão que os direitos ditos universais possuem uma atitude etnocêntrica, em vista que suas formulações utilizam uma referência como base, ou seja, um conjunto de valores definidos a partir de uma cultura específica e que ao ser universalizado se torna ineficaz.

Finalizando o artigo, analisaremos que ao invés de um valor absoluto, o direito é uma conseqüência cultural, e que o “bem” aclamado nos direitos humanos é relativo de uma sociedade para outra, em que esse “bem” é querido por todos, mas de maneiras diferentes.

 

  1. 2.      SEMELHANÇA X DIVERSIDADE

 

Livre de influências culturais, o homem se singulariza em face dos outros seres vivos por se tratar de um Ser transformador e possuidor de características singulares em sua ontologia, citado pelo professor Fábio Konder Comparato com a seguinte observação:

 

“para definir a especificidade ontológica do ser humano, sobre a qual fundar a sua dignidade no mundo, a antropologia filosófica hodierna vai aos poucos estabelecendo um largo consenso sobre algumas características próprias do homem, a saber: a liberdade como fonte da vida ética, a autoconsciência, a sociabilidade, a historicidade e a unicidade existencial do ser humano.” [4]

 

Características que abrangem a razão, a autonomia, a percepção, a organização, a criatividade, que faz do homem um ser único e com capacidade de potência para construir e transformar a natureza.

Apesar, da existência desses elementos que fundamentam a especificidade da pessoa humana, faz com que exista, independente de qualquer valor cultural, um ponto de convergência entre todos os seres humanos: a natureza humana, ponto que é natural a qualquer homem, independente de cultura, etnia, cor e religião. A construção de um direito universal não pode ser levada em consideração apenas a “condição humana” na construção de um direito para todos. A existência de diferentes valores que definem diversas sociedades e culturas, montam um relativismo onde o aceitável e não aceitável podem variar de uma sociedade para outra. Firmado o juízo de que o conceito de certo e errado não é universal e sim variável dentro dos valores de cada cultura.

 

  1. 3.      O ETNOCENTRISMO E O RELATIVISMO CULTURAL: Na Índole de um Direito Universal

 

Este item vem expressar a dificuldade existente na colocação de um valor ou norma absoluta para toda uma humanidade, num panorama em que as diversidades das manifestações culturais se postulam em valores inerentes que direcionam o modo de agir, pensar e julgar próprio para diferentes situações, citado por Marina de Andrade como: “Os indivíduos têm direito a suas próprias crenças, aos seus próprios hábitos e costumes, a sua própria ideologia e a sua própria cultura.” [5]. Assim, partindo desse pressuposto se afirma não existe um valor absoluto e que todo ponto de vista é aceitável, visto que não existe uma idéia de bem ou mal definida, pois numa sociedade especifica a idéia de bem possui conceito que em outra sociedade em particular pode ser considerada como mal, a exemplo o infanticídio que para nossa sociedade é repudiada e analisada como absurda, mas em certas comunidades indígenas é vista como natural e banal.

Nesse contexto, um choque entre duas culturas com valores totalmente distantes, sem a idéia de relativismo, o juízo concebido pela cultura do próximo era manifestada de forma etnocêntrica, em que os seus valores eram a referência no julgamento da atitude do outro. Definido por Luís Rodrigues como “a atitude característica de quem só reconhece legitimidade e validade às normas e valores vigentes na sua cultura ou sociedade” [6], ou seja, encarando o seu grupo como o centro da realidade.

Dessa maneira, a falta de conhecimento dessas diferentes concepções culturais, a imposição e a subordinação de uma cultura sobre a outra foi evidente. Hoje, pode-se observar esse processo conhecido como aculturação na manifestação da cultura americana na “mundialização” do seu modo de vida, em que vemos índios bebendo refrigerante, africanos com roupas de grife e asiáticos assistindo filmes hollywoodianos, mas sem negar a existência das peculiaridades culturais intrínsecas dentro dessas coletividades.

Contudo, a dificuldade de se definir um direito de caráter universal se torna impossível, “não seria correto eleger um reduzido número de modelos culturais, que seriam tidos como padrões universais e, fulcrados neles, passar a avaliar e a estigmatizar todos os outros que com eles não se coadunassem” [7]. O relativismo se torna uma barreira na legitimação e eficácia desse direito para nessa dimensão, e a colocação de um valor ou norma cuja índole se denomina como universal, absorve uma postura etnocêntrica por se fundamentar e possuir referências específicas em que não se identifica com todas as sociedades existentes. Assim, a tradição cultural particular se firma perante a negação dos “direitos” denominados universais que vão em direção oposta aos seus valores e consequentemente da legitimidade do seu próprio ordenamento.

 

  1. 4.      O DIREITO COMO PRODUTO DA CULTURA E A IDÉIA UNIVERSAL DE DIREITOS HUMANOS

 

A noção de relativismo cultural é o fundamento para a idéia de direito como produto da cultura. Percebe-se assim a construção de uma estrutura do direito a partir das especificidades de cada sociedade.

O Direito assim como qualquer outro fator que compõe a sociedade, é derivado das relações interpessoais que existem na mesma. Portanto se parte do pré-suposto de que o Direito são os “códigos” estabelecidos para reger as relações entre os indivíduos, fica claro o fato de que o Direito tem sua base de formação em cada sociedade na cultura “local”.

 Ao se falar de Direito, há a concepção dos Direitos humanos, que vêm a ser os direitos que visam resguardas os valores mais preciosos da pessoa humana, ou seja, direitos que visam resguardar a solidariedade, a liberdade, a igualdade, fraternidade, a dignidade da pessoa humana, etc. Sendo assim, analisando-se a origem dos ideais anteriormente citados, pode-se achar diversos fatores culturais que contribuíram para o que Rebelo de Sousa discorre: “tal formação, a exemplo da cultura cristã que “emprestou” vários de seus ideais e ensinamentos para a formação da concepção atual do Direito e ainda mais dos Direitos Humanos”.

       A cultura reflete o contexto em que vive uma sociedade. Logo, o direito, como produto histórico do homem, está intimamente ligado à realidade social e é resultado da dinâmica cultural. Sobre essa relação entre a história e o direito, Rebelo de Sousa discorre: “O Direito é uma realidade social. As regras e as situações jurídicas são realidades sociais. Elas projectam-se em universos definidos no tempo e no espaço. São historicamente conformadas.”[8]

        Percebe-se que muito da transformação ocorrida no Direito foi usado pelas classes dominantes para continuar no poder como discorre Roberto Lyra Filho:

“Toda aquela velha estrutura então se desvenda como elemento condicionante, que pesa sobre o país, obstaculizando as remodelações, sob a pressão simultânea das classes e grupos nacionais dominantes e das correlações de forças internacionais, interessadas em que ao imperialismo não escape tão gordo quinhão.” [9]

 

  1. 5.      CONCLUSÃO

 

O presente artigo nos leva a consolidar a seguinte constatação: ao se falar de direitos humanos universais, percebe-se a necessidade de tratar com cautela este tema. Para a cultura ocidental em específico, direitos tidos como básico quando não respeitados, como por exemplo, a dignidade humana, é uma grande aberração. Porém deve-se notar que a cultura de outros povos podem não concordar que determinados fatos feitos por eles, vão contra a dignidade.

Deseja-se demonstrar também que o Direito tem como um dos principais fundamentos a cultura. Sendo assim, elas são projeções de todo uma história social de determinado povo. E esse direito pode ser usado para a dominação de classes por exemplo.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

REFERÊNCIAS

 

COMPARATO, Fábio Konder. Fundamento dos Direitos Humanos. Cultura dos Direitos Humanos, ed. LTr. 1998, p. 69 – 72.

 

MARCONI, Marina de Andrade. Antropologia: uma introducao. 6. ed. Sao Paulo: Atlas, 2007. p.17.

 

RODRIGUES, Luís. Padrões de Cultura e Etnocentrismo Cultural: Diversidade cultural, etnocentrismo e relativismo. Lisboa: Plátano Editora, 2003. Filosofia 10.º ano. Disponível em: <http://www.esas.pt/dfa/sociologia/etnocentrismo.htm> Acesso em: 23 maio 2009.

 

OLIVEIRA NETTO, Sérgio de. Relativismo ou universalismo das leis sobre direitos humanos. Jus Navigandi, Teresina, ano 5, n. 51, out. 2001. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=2041>. Acesso em: 25 maio 2009.

 

SOUSA, Marcelo Rebelo de. GALVÃO, Sofia. Introdução ao estudo do direito. 4 ed. São Paulo: Europa América, 1998. P.232

 

FILHO, Roberto Lyra. O que é Direito. São Paulo: Brasilience, 2003. (Coleção primeiros passos; 62). p.53

 

 



[1] Aluno do 4º período do Curso de Direito Noturno da UNDB (bruno_10z@yahoo.com.br)

[2] Aluno do 4º período do Curso de Direito Noturno da UNDB (igor_1990_@hotmail.com)

[3] Aluno do 4º período do Curso de Direito Noturno da UNDB (marcosmauricio_1989@hotmail.com)

[4] Fábio Konder Comparato, Fundamento dos Direitos Humanos, Cultura dos Direitos Humanos, pp. 69-72

[5] MARCONI, Marina de Andrade. Antropologia: uma introducao. 6. ed. Sao Paulo: Atlas, 2007. p.17.

[6] RODRIGUES, Luís. Padrões de Cultura e Etnocentrismo Cultural: Diversidade cultural, etnocentrismo e relativismo. Lisboa: Plátano Editora, 2003. Filosofia 10.º ano. Disponível em: <http://www.esas.pt/dfa/sociologia/etnocentrismo.htm> Acesso em: 23 maio 2009.

[7] OLIVEIRA NETTO, Sérgio de. Relativismo ou universalismo das leis sobre direitos humanos. Jus Navigandi, Teresina, ano 5, n. 51, out. 2001. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=2041>. Acesso em: 25 maio 2009.

[8] SOUSA, Marcelo Rebelo de. GALVÃO, Sofia. Introdução ao estudo do direito. 4 ed. São Paulo: Europa América, 1998. P.232

[9] FILHO, Roberto Lyra. O que é Direito. São Paulo: Brasilience, 2003. (Coleção primeiros passos; 62). p.53