Direito penal militar e direito processual penal militar– contradições e inconstitucionalidades

Por Rogério martins Saraiva | 14/11/2011 | Direito

  1. 1.       INTRODUÇÃO

 

O Direito Penal Militar no Brasil teve o seu início com a vinda da família real portuguesa em 1808 para estabelecer normas de conduta, hierarquia e punições para os que então entregavam as fileiras da caserna, onde foi criado o primeiro Tribunal da Nação, o Conselho Militar e de Justiça, que depois veio a se transformar no Superior Tribunal Militar, nos dias atuais com sede em Brasília, e jurisdição em todo território nacional. Por força da Constituição Federal, O Superior Tribunal Militar é considerado um Tribunal Superior, mas na pratica funciona como um Tribunal de Segundo Grau, tendo em vista que não existe na estrutura judiciária nacional um Tribunal Regional Militar.

A última atualização do Código Penal Militar foi editado por meio do decreto-lei 1001 no ano de 1969. O estatuto penal militar alcança integrantes das Forças Armadas, Polícias Militares e Corpos de Bombeiros Militares dos Estados membros da nação, que devem obedecer e respeitar as regras militares.

Após o findo período de exceção político vivido pelos governos militares e a promulgação da Constituição Federal de 1988, o Direito Militar tem despertado em estudiosos e doutrinadores do direito a desconexão para com os princípios democráticos e constitucionais em vista do estabelecimento do que é um crime militar e principalmente ferindo cláusulas pétreas nos ditames processuais.

 

  1. 2. DA PRISÃO MILITAR E A ESTRUTURA CONSTITUCIONAL

 

A prisão é a prisão da liberdade individual de alguém mediante clausura, determinada por ordem escrita da autoridade judiciária competente ou em caso de flagrante delito. Nosso ordenamento jurisdicional faz a previsão de três espécies de prisões: prisão disciplinar, prisão civil e a prisão penal.

No artigo 5º da Constituição Federal, define a previsão da prisão disciplinar será permitida para os casos em que o militar afronte uma norma de cunho administrativo, caracterizando, então, uma transgressão disciplinar, sendo apurada através de procedimento administrativo. No mesmo artigo da CF em nenhum momento veda aos militares a possibilidade de interpor habeas corpus, liberdade assegurada a todos os brasileiros natos, naturalizados e estrangeiros residentes no país. Negar ao militar tal direito fundamental de primeira geração, legítima, que pode ser amparado por habeas corpus, é contrapor a vigência do artigo 5º da Constituição Federal.

Sem dúvida a prisão em flagrante e disciplinar é um recurso eficaz para se manter a ordem na caserna onde a desobediência poderia acarretar problemas sérios para a estrutura institucional e de hierarquia, já que os integrantes da mesma possuem o direito de portar armas de fogo com alto poder destrutivo. Entretanto, tal prisão é excessivamente coercitiva e atenta contra a dignidade humana. É muito subjetivo o que pode levar um superior a decretar a prisão de um subordinado. Chegar atrasado, respondeu de forma desatenciosa ao superior hierárquico ou não cedeu lugar a qual se sentava, barba mal feita, entre outras deformidades que só o sistema militar é capaz de propor. As garantias do cidadão, seja civil ou militar, não estão voltadas para a impunidade, mas para a efetiva aplicação da lei com justiça e equidade.

O professor Paulo Tadeu Rodrigues Rosa nos direciona de forma clara o que tange a inconstitucionalidade da prisão disciplinar:  “Se a prisão somente pode ser decretada por uma autoridade judiciária militar com base na lei, como o sistema poderá admitir uma prisão administrativa fundada em um ato praticado por autoridade administrativa que justifica a sua decisão em um regulamento disciplinar militar que não foi editado por meio de lei, mas um decreto do executivo?”¹

 

  1. 3. CONSIDERAÇÕES FINAIS

 

A questão fatídica interposta é a de que esses regulamentos já desatualizados estão em vigor por meio de Decreto-Lei que está abaixo da nossa Magna Carta, por isto, ferindo-a. Ou seja, inconstitucionais. Não obstante, possui-se um problema maior quando adentra-se mais nos estudos da jurisdição militar Federal para com a Estadual, já que o Brasil possui uma polícia preventiva de caráter militar, inclusive sendo corpo auxiliar das Forças Armadas. Decerto que é um campo vasto para se averiguar contradições e inconstitucionalidades perante a Constituição da República ao que tange as garantias fundamentais aos membros dessas instituições, que antes de serem militares, são civis com todas as prerrogativas inerentes aos mesmos. Isso já vem ocorrendo na Polícia Militar de Minas Gerais, que teve seu Regulamento Disciplinar modificado e abolido a prisão por transgressão disciplinar:

A Polícia Militar de Minas Gerais reconhecendo a importância das atividades policiais e buscando aplicar os princípios estabelecidos na Constituição Federal extinguiu a pena de prisão administrativa, sem que em qualquer momento a hierarquia e a disciplina fossem quebradas. O respeito ao profissional não significa submissão, mas o cumprimento das disposições constitucionais que devem ser observadas e respeitadas por todas as pessoas que vivem no território nacional.²

O objetivo do presente artigo não é desqualificar a jurisdição da prisão militar, ao entender dos estudos doutrinários vigente, esta deve continuar existindo para salvaguardar uma boa execução da doutrina militar para aqueles que se encontrem nesta categoria, que busca defender os limites territoriais e a soberania do país como nas Forças Armadas, e as Polícias Militares e Corpo de Bombeiros Militares dos Estados membros na prevenção ativa da segurança pública. Já a prisão por transgressão disciplinar, deve ser revista de forma criteriosa e objetiva, por ser aplicada de forma totalmente inconstitucional, o que vem ocorrendo por muitos agentes administrativos sem as devidas prerrogativas para esse ato. Todo cidadão sem distinção de sexo, cor, crença e preferência política só deve ser preso por ordem judicial conforme dita a CF/88, no caso aqui tratado, por ordem de Juízes militares, após o devido trânsito em julgado respeitando o princípio da ampla defesa e do contraditório.

 

 BIBLIOGRAFIA:

  1. ROSA, Paulo Tadeu Rodrigues. Extinção da prisão administrativa militar. Jus Vigilantibus, Vitória, 31 dez. 2002.Disponível em: <http://jusvi.com/doutrinas_e_pecas/ver/1149>. ¹’²
  2. ASSIS, Jorge César de. Direito Militar. Juruá. Curitiba. 2005
  3. CORREA, Getúlio. Direito Militar. História e Doutrina. Artigos Inéditos. AMAJME. Florianópilis. 2002.
  4. Constituição Federal de 1988
  5. Código de Processo Penal Militar

 

 

Rogério Saraiva é bacharelando e extensionista em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais.