DIREITO ADMINISTRATIVO: ATO JURÍDICO E ATO ADMINISTRATIVO - NULO E ANULÁVEL (Felipe Genovez)
Por Felipe Genovez | 23/09/2017 | Direito
I – INTRODUÇÃO:
Insanável é o ato administrativo nulo, irrecuperável sob qualquer aspecto o ato administrativo inexistente. Não se pode sanar-se o ato administrativo inexistente. Pode sanar-se entretanto, o ato administrativo anulável. O art. 7º, inciso V, da LC 381/07 (Estado de Santa Catarina), estabeleceu ser competência dos Secretários de Estado “revogar, anular e sustar ou determinar a sustação de atos administrativos eu contrariem os princípios constitucionais e legais da Administração Pública”
"Ato administrativo é toda manifestação da vontade da Administração, por seus representantes, que tenha por efeito imediato a aquisição, o resguardo, a transferência, a modificação ou a extinção de direitos em matéria administrativa (Cretella Jr., in Direito Administrativo, 4a . edição, Ed. Forense, RJ, 1975, p. 26).
II - ATO ADMINISTRATIVO DISCRICIONÁRIO - VINCULADO:
Insusceptível de apreciação por outro Poder, que se concretiza, ou não, conforme a autoridade competente julgue conveniente ou oportuna a adoção da medida. O ato discricionário, resultado do poder discricionário possibilita a Administração de agir ou não, de operar ou não operar, dentro de uma área perfeitamente circunscrita pelo direito. "Opondo-se ao ato vinculado, que é a manifestação obrigatória da Administração, desde que se reunam determinados pontos fixados pela lei, o ato discricionário movimenta-se num campo muito mais livre, visto ser a manifestação unilateral da vontade da Administração que, fundamentada em regra objetiva de direito, que a legitima e lhe assinala o fim livremente, se concretiza desvinculada de qualquer lei que lhe dite previamente a oportunidade ou a conveniência da conduta, sendo por esse motivo mesmo insusceptível de revisão judiciária neste campo" (Cretella Jr., in Direito Administrativo, Direito Administrativo, 4a . edição, Ed. Forense, RJ, 1975, p. 28). O ato discricionário fica vinculado aos seguintes requisitos: 1) legalidade; 2) finalidade; 3) objeto.
II - ATO ADMINISTRATIVO - ATO JURÍDICO – CONCEITO:
A definição de ato administrativo é a mesma utilizada para o ato jurídico prevista no art. 81, de nosso Código Civil, isto é: "todo ato lícito que tem por efeito imediato adquirir, resguardar, transferir, modificar ou extinguir direitos". Acrescentando as duas expressões - manifestação de vontade em matéria administrativa - e teremos uma definição de ato administrativo, partindo do conceito do que seja ato jurídico.
III - ATO DISCRICIONÁRIO – REVOGAÇÃO - CONVALIDAÇÃO:
A revogação é privativa do poder administrativo, haja vista que a mesma diz respeito ao mérito do ato. O anulamento pode tanto emanar da Administração Pública como do Poder Judiciário". A anulação está destinada a retirar um ato inválido, isto é, ato que desde a origem contém vício de legitimidade. A revogação só procede relativamente a atos válidos, ou seja, atos que, em sua formação preencheram todas as exigências legais. A anulação do ato administrativo pode ser feita pela própria administração a qual editou o ato ou pelo Poder Judiciário, sendo que em ambos os casos, sempre que ocorrer ilegalidade ou ilegitimidade. A Administração pode desfazer seus próprios atos, com base na auto-tutela ou na justiça interna, isso quando eles atentam contra a legalidade. Apesar de ilegal, o ato produz efeitos a terceiros de boa-fé, apesar de não produzir efeitos entre as partes nem gerar direitos subjetivos públicos para a sua permanência. A anulação do ato administrativo pelo Poder Judiciário poderá ser feita por meio de mandado de segurança, ação popular, ação ordinária e especial, ação executiva fiscal, o habeas corpus, ação expropriatória, ação de nulidade de invenção, ação ordinária, ação cominatória, ação possessória. A Administração pode anular ou revogar seus próprios atos sempre e em qualquer tempo, para tanto, basta que o ato se torne inoportuno ou inconveniente. A revogação situa-se na esfera discricionária da Administração, salvo se o ato tenha gerado direitos. A Administração pode proceder de ofício à anulação do ato ilegítimo. Entretanto, se o ato foi editado a muito tempo, recomenda-se verificar se a sua retirada do mundo jurídico não poderá perturbar a ordem das coisas e se não vai atingir também situações realmente consolidadas. Em se tratando de anulação de ofício é pacífico entre diversos doutrinadores o entendimento de que não pode ser exercida depois de longo período, em prejuízo de situações consolidadas e sem um extraordinário motivo de interesse público. Difícil de se compreender, ao silêncio da Lei, o que se deva entender por prazo razoável para a decretação da anulação do ato administrativo pela Administração. Em se tratando de defeito insanável e que torne o ato inexistente. Cabe a Administração o poder de desfazimento do ato em qualquer tempo, como por exemplo, a falta de diploma em curso superior para cargo que só possa ser exercido por pessoa com tal condição muitos anos após a sua edição, pequeno defeito de forma ou ausência de requisito não essencial não vai possibilitar a invalidação do ato muitos anos após a sua edição.
JURISPRUDÊNCIA:
STF:
“É facultado à Administração, constatado o erro ou ilegalidade do ato, revê-lo por seus próprios meios, não se exigindo formalidades especiais” (RMS n. 423, Min. Pedro Acioli, RT 665/173).
Ato administrativo - anulação:
"A Administração pode anular seus próprios atos, quando eivados de vícios que os tornem ilegais, porque deles não se originam direitos, ou revogá-los, por motivo de conveniência ou oportunidade, respeitados os direitos adquiridos, e ressalvada, em todos os casos, a apreciação judicial" (Súmula 473, STF).
Ato administrativo – anulação – processo administrativo:
“(...) Ato administrativo em desconformidade com a Lei – Cassação – desnecessidade da instauração de processo administrativo – vício evidente – prescindibilidade de ampla defesa e contraditório – ausência de direito líquido e certo – ordem denegada (...)” (MS n. 98.003476-0, Capital, Rel. Des. Alcides Aguiar, DJ n. 10.496, de 11.07.2000, p. 17).
Promoção Merecimento - Anulação de Ato:
"O ato administrativo pode ser anulado pela administração quando eivado de vício que o torne ilegal (Súmula n. .. 473, do STF), mas o desfazimento, quando se trata de ato complexo, deve dar-se com audiência sucessiva e conjugada dos vários órgãos que participaram do nascimento do ato (aplicação de doutrina de Miguel Reale e Caio Tácito, 'Revogação e Anulamento de Ato Administrativo', p. 43/4, do primeiro). - A promoção por merecimento obedece a avaliação e mensuração de critérios subjetivos, não se podendo aplicar os mesmos critérios (tempo de serviço na classe) da promoção por antigüidade. Desprovimento ao apelo" (Apel. Civil. 35.581, da Capital, Rel. Des. João José Schaefer, DJ 9.074, de 15.09.94, p. 13).
Anulação de ato jurídico:
"O ato jurídico é anulável por vício resultante de dolo ou erro substancial. Cumpre, entretanto, à parte interessada, demonstrar a ocorrência de tais atos como elementos viciadores da vontade (JC 45/112)" (Apel. Civ. 33.272, da Capital, Rel. Des. Genésio Nolli, DJ 8.813, de 24.08.93, p. 12).
"(...) 'O poder de a Administração Pública anular seus próprios atos não é absoluto, sob pena de malferir, como na hipótese, os princípios de ampla a defesa e do devido processo legal. Por isso insólito de pleno direito o ato que anula outro sem preceder ao processo administrativo exigido como condição para que o servidor estável possa perder o cargo' (STJ)" (Apel. Civ. em MS 4.847, Lages, Rel. Des. Eder Graf, DJ 9.353, de 08.11.95, p. 18).
"Constitucional e administrativo - Anulação de ato pela própria administração - impossibilidade sem observância do devido processo - remessa desprovida. É pacífico entre doutrinadores e jurisprudentes que a administração pode anular os seus próprios atos quando maculados pelo vício da ilegalidade, mas é indispensável que a autoridade demonstre, no devido processo legal, a nulidade com que foi praticado" (Apel. Civil n. 51.807, de Criciúma, Rel. Des. Amaral e Silva, DJ n. 9.704, de 14.04.97, p.7).
“(...) A Administração Pública, como instituição destinada a realizar o direito e a propiciar o bem comum, não pode agir fora das normas jurídicas e da moral administrativa, nem relegar os fins sociais a que sua ação se dirige. Se, por erro, culpa, dolo ou interesses escusos de seus agentes, a atividade do Poder Público desgarra-se da lei, divorcia-se da moral ou desvia-se do bem comum, é dever da Administração invalidar, espontaneamente ou mediante provocação, o próprio ato contrario à sua finalidade, por inoportuno, inconveniente, imoral ou, ilegal’(Hely Lopes Meirelles). 2. A Administração pode anular seus próprios atos, quando eivados de vícios que os tornem ilegais...(Súmula 473, STF) (...)” (Rec. Extr. Civ. N. 97.004876-9, Imaruí, DJ n. 9.931, de 16.3.98, Rel. Des. Wilson Guarany, p. 8).
“(...) no mesmo vértice, aparentemente o ato foi editado por autoridade competente, aliás, a mesma que indevidamente efetivara a impetrante, porquanto ‘a faculdade de anular os atos ilegais é ampla para a Administração, podendo ser exercida de ofício, pelo mesmo agente que o praticou, como por autoridade superior que venha a ter conhecimento da ilegalidade através de recurso interno, ou mesmo por avocação, nos casos regulamentares’ (Hely Lopes Meirelles, Dir. Administrativo Bras., 18a ed., Malheiros, 1993, p. 190)’ (...)” (MS 98.005288-2, Rel. Des. Álvaro Wandelli, Capital, DJ 9.973, de 20.5.98, págs. ½).
Anulação e revogação de ato administrativo:
“(...) Hely Lopes Meirelles em sua obra Direito Administrativo Brasileiro, assim estabelece: ‘Revogação: a revogação, como já vimos, assenta em motivos de oportunidade e conveniência administrativa. Por essa razão, ao contrário da anulação, que pode ser decretada pelo Judiciário, a revogação é privativa da Administração. São as conveniências do serviço que comandam a revogação e constituem a justa causa da decisão revocatória, que, por isso mesmo, precisa ser motivada, sob pena de se converter em ato arbitrário. E o arbitrário é incompatível com o Direito. A revogação da licitação opera efeito ex nunc, isto é, a partir da decisão revocatória, porque até então o ato ou procedimento revogado era eficaz e válido (...)” (MS 98.018484-3, Capital, Rel. Des. João Martins, DJ 10.140, de 26.01.99, pág. 7).
“(...) A garantia constitucional da ampla defesa é inerente a todo e qualquer processo que resulte na desconstituição de ato administrativo com reflexos negativos sobre direito de terceiros. O Estado pode e deve rever seus atos quando praticados com violação de dispositivos legais, mas, sendo escravo da lei, não pode desconstituí-los de maneira arbitrária. Impondo a Carta Magna observância do contraditório, é nulo o ato administrativo que desconstitui, sem processo, relação jurídica anteriormente consumada. ‘A garantia da defesa, como princípio de eficácia, no processo administrativo, constitui na ordem jurídica imperativo categórico de ordem constitucional’. Não há incompatibilidade entre a Súmula 473 do Colendo Supremo Tribunal Federal e a garantia do devido processo” (ACMS n. 4.752, de Tijucas)” (MS n. 98.013735-7, Capital, Rel. Des. Cláudio Barreto Dutra, DJ n. 10.249, de 07.07.99, pág. 11).
Ato administrativo – anulação – processo administrativo:
“(...) 2. Ato administrativo flagrantemente contrário à lei é nulo e deve a Administração Pública corrigi-lo. O prévio processo administrativo somente é necessário quando a decretação da nulidade é condicionada a prova de fatos que podem ser contestados pela parte interessada na sua manutenção. ‘Não viola direito líquido e certo. O ‘devido processo legal é necessário quando a nulidade não ‘conste de instrumento ou prova literal, quando os fatos que a caracterizam dependem de comprovação. ‘Não viola direito líquido e certo, nem constitui outro ato anterior, tornando-o sem efeito, por inobservância a princípio de lei que o não permita. Ao tomar conhecimento do erro em que havia laborado, a autoridade administrativa, in casu, decidiu acertadamente e em consonância com o enunciado das Súmulas 346 e 473 do Pretório Excelso, tornando sem efeito o ato manifestamente ilegal. Na espécie, não há falar em violação ao princípio do contraditório e da ampla defesa, nem no descumprimento de decisão judicial’ (RMS n. 1.544-0, Min. Demócrito Reinaldo; RE n. 185.255-1, Min. Sydney Sanches)” (MS n. 97.010883-4, Capital, Rel. Des. Newton Trisotto, DJ n. 10.314, de 07.10.99, pág. 27).
Ato administrativo. Anulação. Efeito ex tunc:
"(...) Reconhecida e declarada a nulidade do ato, pela Administração ou pelo Judiciário, o pronunciamento de invalidade opera ex tunc, desfazendo todos os vínculos entra as partes e obrigando-as à reposição das coisas ao stato quo ante, como conseqüência natural e lógica da decisão anulatória." ( Hely Lopes Meirelles)." ( ACV nº 98.012826-9, de Tubarão, rel. Des. Silveira Lenzi. DJ nº 10.528, de 24.09.2000, p. 12).
Ato administrativo complexo - desfazimento - requisitos:
" (...) Possui legitimidade para vir a Juízo quem é abrangido pelo ato dito violador de direito líquido e certo seu, objetivando a manutenção do ato complexo. "Informa o sistema de extinção do ato administrativo complexo o princípio do paralelismos das formas, a querer significar que o ato não pode ser objetivo de desfazimento ou retratação por iniciativa exclusiva de apenas um dos órgãos que participaram do seu nascimento. É necessário que se observem exatamente os mesmos trâmites legais seguidos em seu processo de formação, com o pronunciamento de todos os órgãos envolvidos" (Do Ato Administrativo Complexo", Sandra Julien Miranda). ( MS nº 99.010266-1, da Capital, Rel. Des. Alcides Aguiar. DJ nº 10.423, de 24.03.2000, p. 39.).
Administração Pública – Princípios:
“Administração pública – princípio da legalidade – observância obrigatória – “princípios básicos da administração pública estão consubstanciados em quatro regras de observância permanente e obrigatória para o bom administrador: legalidade, moralidade, impessoalidade e publicidade. Por esses padrões é que se há de pautar todos os atos administrativos. Constituem, por assim dizer, os fundamentos da validade da ação administrativa, ou, por outras palavras, os sustentáculos da atividade pública. (...). A legalidade, como princípio de administração (Const. Rep., art. 37, caput), significa que o administrador público está, em toda a sua atividade funcional, sujeito aos mandamentos da lei, e às exigências do bem comum, e deles não se pode afastar ou desviar, sob pena de praticar ato inválido e expor-se à responsabilidade disciplinar, civil e criminal, conforme o caso”(Hely Lopes Meirelles)” (Apel. Cível em MS 99.001693, Itapiranga, Rel. Des. Eder Graf, DJ 10.226, de 04.06.98, pág. 19).
Ato administrativo - Licença - interesses particulares - concessão - benefício na vigência de legislação anterior:
“(...) Constituída situação jurídica sob a égide de legislação pertinente, e não contendo o ato, eiva de vício capaz de maculá-lo, há irrecusável direito ao seu exercício. Revogando a Lei Complementar n. 36, de 18.04.91, o parágrafo 5° acrescentado ao art. 77 do Estatuto dos Funcionários Públicos Civis do Estado pela Lei n. 6.801, de 23.06.86, mesmo assim licença para tratamento de assuntos particulares anteriormente deferida é de ser acatada (...)” (MS 98.006164-4, da Capital, Rel. Des. Francisco Oliveira Filho, DJ n. 10.124, de 04.01.99, pág. 9)
Ato administrativo - coisa julgada administrativa:
" (...) Acrescente-se, ainda, que consoante a melhor doutrina não há óbice legal à Administração rever as suas próprias decisões, pois a coisa julgada administrativa não passa de uma preclusão de efeitos internos, não tendo o mesmo alcance da coisa julgada judicial. Nesse sentido Hely Lopes Meirelles ilustra com propriedade que a chamada coisa julgada administrativa resultante de definitividade da decisão tomada pela Administração, limita-se ao caso apreciado e extingue-se com seu encerramento, pelo exaurimento de seus efeitos, respeitadas as situações jurídicas subjetivas, que se constituíram, ressalvada a hipótese de novo processo administrativo, com nova instrução e ampla defesa (Direito Administrativo Brasileiro, Malheiros, São Paulo, 1996, pp. 588 e 589) (MS nº 00.015912-3, da Capital, rel. Des. Genésio Nolli, DJ nº 10.543, de 15.09.2000, p. 2).