DESVENDANDO PIERRE BOURDIEU: NOTAS DE PRIMEIRA LEITURA

Por Luana Queiróz | 17/09/2012 | Educação

Luana Queiróz, Josiane de Oliveira Silva, Elisangela Da Silva, Janislei Marcia Da Silva, Rita De Cássia Barros Nogueira, Pedrosa Francisca Da Silva e William B. G. Dos Santos

Desvendando Pierre Bourdieu

Para a elaboração do presente artigo, realizamos a leitura de dois textos: A sociologia da educação de Pierre Bourdieu: limites e contribuições, de autoria de Claudio Marques Martins Nogueira e Maria Alice Nogueira, publicado em 2002, na Revista Educação e Sociedade, e: As primeiras lições da sociologia de Pierre Bourdieu, escrito por Patrice Bonnetwitz, publicado pela editora Vozes em 2003. A partir desses textos fizemos uma reflexão de sua sociologia que será objeto deste artigo, começando por sua biografia. Pierre Bourdieu é considerado hoje um dos maiores sociólogos das ultimas décadas, sua sociologia fundamenta as práticas individuais e coletivas no habitus que se constrói na historia individual e coletiva. A obra As primeiras lições da sociologia de Pierre Bourdieu nos informa que Bourdieu nasceu em 1930 em Denguin, sua família era campesina, casou-se em 2 de novembro de 1962 e desta união nasceram 3 filhos. Estudou no Liceu de Pau, no Liceu de Louis-le-Grand, na Faculdade de Letras de Paris e na Escola Normal Superior. Prestou serviço militar na Argélia, onde retomou a carreira acadêmica e escreveu seu primeiro livro, Bourdieu publicou mais de 300 títulos, entre livros e artigos. Em 1982, propôs a criação de uma “Sociologia da Sociologia”. Morre com câncer em 2002, ao falecer se tornou o cientista social mais citado no mundo. A sociologia de P. Bourdieu enxerga a socialização como um mecanismo de reprodução social, dentro dos costumes de cada indivíduo no contexto da classe a qual pertence. Sendo que, este conceito esta na base da reprodução da ordem social, o ser social tem suas práticas, características e o estilo de cada época, e as diferenças entre cada costume age de acordo com as trajetórias sociais e experiências. Podemos afirmar que as diferenças, as vontades e costumes individuais, são, para Bourdieu, habitus de classe social, a construção da individualidade, está ligada a história, sendo a sociedade responsável por exercer ações culturais, conduzem normas e valores, com a percepção que os costumes são adquiridos pelo individuo durante o processo de socialização. Cada classe tem seus hábitos e valores individuais, comportamentos que se produzem através do sentido prático como a aptidão no espaço social. Sendo os costumes principais geradores de práticas distintas e distintivas, gerando princípios de visão e divisão ou até mesmo gostos diferentes de cada grupo social. Cada escola tem seus habitus, incluindo as disposições em relação a escolarização, sendo que, o individuo não é mais um simples receptáculo de normas e valores, a sociedade é responsável por coagir uma ação, já os defensores do individualismo acreditam em normas e os valores são as possibilidades oferecidas a cada um, onde a liberdade social se faz escolhas para obter lógica de suas práticas. A ação não é apenas a busca do interesse econômico, ele diz que o individuo é um agente social, onde age do interior para o exterior, encarando varias determinações: econômicas, sociais, culturais, simbólicas. Os efeitos estruturais do habitus explicam o funcionamento da sociedade, havendo muitas diferenças no estilo de vida da sociedade; gostos, crenças, costumes. E o estilo de vida compreende opiniões políticas, crenças filosóficas, convicções morais, práticas sexuais, alimentares, culturais de acordo com cada classe econômica, diferenciando a característica de vida de cada individuo, identificando o que é bom e o que é mau, entre distinto e vulgar, sendo que, podendo determinados comportamentos parecer pretensioso ou até exibicionista a outra pessoa. Bourdieu destaca três estilos de vidas diferentes da sociedade francesa contemporânea, e esses estilos correspondem a diferenças de gostos e práticas sociais: a boa apresentação corporal, a linguagem correta e a preferência de móveis antigos, a escola, o lugar onde se passe as férias, opondo dois estilos de vida diferentes o capital econômico havendo a necessidade cultural de viagens, obras de arte, carros de luxo, os detentores desse capital cultural adquirem amor a leitura, a música clássica, teatro, se opondo aos burgueses onde os mesmos devido ao capital econômico aderem a um consumo maior, onde muitos burgueses agem de forma individual ou ate mesmo coletiva, mas esta classe não constitui um grupo homogêneo sob o estilo de vida, já a pequena burguesia sente prazer em possuir hábitos saudáveis, alimentação equilibrada. As classes populares se adaptam facilmente a realidade do que todas outras classes por causa da necessidade de adaptação, segundo Bourdieu, eles valorizam sua força física, tem atração por exercícios de força e isto se relaciona à situação dessa classe, geralmente são assalariados vendendo a sua força de trabalho sendo essa a realidade social, já a ação pedagógica insere conhecimentos nas relações sociais do individuo. O habitus é um potente fator de reprodução social, onde cada um escolhe sua profissão, realizando seu projeto de vida e se harmonizando com outros indivíduos do mesmo habitus, onde acontece o funcionamento da sociedade mobilizando seus costumes, desempenhando um forte papel na escola, no mercado matrimonial mantendo uma posição social, onde acabam a se envolver com um individuo da mesma classe social. Podemos explicar então o que certos autores chamam de “conflito de gerações” ou habitus de pais e filhos, devido a socialização nas escolas, mídia, causando incompreensão entre eles a exemplo do conflito cultural entre duas gerações, causado por habitus diferentes como a tradição e a realidade, os pais possuem tradição, já os filhos introjetam a realidade. Em relação a cultura, Bourdieu afirma que a cultura é um quesito importante pela qual os dominantes de uma determinada sociedade garante sua denominação, é pela cultura que as classes dominantes impõem regras, consequentemente acabam dividindo os grupos sociais. É através da cultura, no sentido corrente, que se define o comportamento, conhecimento científico, artístico, literário de um individuo em sua sociedade. Em um sentido sociológico, a cultura corresponde a um conjunto de valores, normas e práticas adquiridas e compartilhadas por outras pessoas, não são considerados como culturais os bens ligados apenas a obras de artes, literatura, mas também tudo aquilo que se refere a comunicação , imprensa, radio, assim como lazer, cinema, teatro, gosto, enfim, as práticas sociais. Em suma, Bourdieu considera a cultura não apenas como acesso a um patrimônio artístico e cultural, mas também como uma hierarquia de valores. Coloca, ainda, em discussão, o acúmulo de capital simbólico, que seriam os bens materiais e personalidades conquistadas. A obra as primeiras lições de Pierre Bourdieu cita como exemplo a situação de um morador de rua que possui um enorme patrimônio e transmite para a sociedade uma imagem de miséria onde não é bem aceita pela maioria dos membros que a compõem, pois poderia transmitir uma imagem de grandeza, superioridade que seria teoricamente natural para as normas sociais. Dessa forma o autor quer dizer que, o capital simbólico, é um crédito que pode trazer reconhecimento, e esse conceito faz com que seja reconhecido positivamente acarretando ganhos imaginários, como acesso a lugares que apenas pessoas de posição social ou influentes possuem status de poder, etc. Em um grupo ter identidade social própria, faz com que possa existir socialmente, ser reconhecido, existir para uma sociedade é essencial, ter uma reputação é acumular capital simbólico. De certa forma constrói um carisma essencial para uma presença marcante. Outro tema interessante é a divisão de classe em relação a consumo cultura, há uma variação, a classe dominante tem seus objetivos de manter sua posição, hegemonia onde tudo aquilo que fazem ou consomem é considerado de bom gosto, impondo para o resto da sociedade esse “gosto dominante”. Temos como exemplo no lazer esportivo, onde o hábito de jogar tênis era sinal de grandeza por parte da classe dominante. De fato esse esporte possui nos dias de hoje um elevado custo para praticá-lo, mas com a democratização da prática do tênis, fez com que acompanhasse o abandono do esporte por parte da classe dos nobres, que só era praticado por eles. Já nas classes populares os seus hábitos são marcados por suas necessidades, possuem práticas culturais que a burguesia não assimila, Bourdieu afirma que a legitimidade cultural dos dominantes não é questionada. Segundo Tocqueville as sociedades democráticas se caracterizam pela igualdade social e é nessa concepção que a escola toma sentido no sistema educativo, com ideal igualitário, oferecendo a educação igual para todos independentes de sua classe social e aqueles que se destacasse em seu dom individual seriam levados a avançar em suas carreiras escolares, porém Pierre Bourdieu contradiz essa concepção em sua teoria, que vai explicar como a escola vai legitimar a desigualdade de forma mascarada sem que todos percebam. Para ele a escola é uma legitimadora da desigualdade social favorecendo os das classes dominantes. Segundo Bourdieu, quanto menos distante estiver a cultura escolar da cultura de filiação maior vai ser o sucesso na instituição. Sendo assim, por exemplo, aquele aluno que viaja muito, escuta música clássica, visita museus de artes, etc. estará mais próximo do sucesso escolar do que aquele aluno que nunca saiu da sua cidade, pois tudo ficará muito abstrato para esse aluno. E para que a escola possa garantir a dominação dos dominantes ela deve admitir um sistema negando essa função, assim ela toma a forma da “ideologia do dom” que afirma que todo indivíduo pode ter sucesso escolar e assim ter acesso a posições sociais mais elevadas desde que seus talentos, seu trabalho e seus gostos o permitirem e Bourdieu vai mais longe ao dizer que as classes populares sofrem uma violência simbólica quando se submetem aos valores da cultura dominante e esquecem a sua cultura de origem fazendo assim um processo de desculturação e extinção da cultura popular, pois o que é exigido na escola e na sociedade são os valores da cultura dominante, e isso pode ser verificado nas avaliações feitas pela escola, Bourdieu observa que a avaliação escolar do aluno é além da verificação da aprendizagem, a escola julga o cultural e o moral dos alunos, exigem que tenham um estilo elegante de falar, de escrever e de se comportar, que se adéqüem as regras da “boa educação”. O êxito escolar das crianças é quase exclusivamente cultural e econômica, pois os filhos de famílias menos favorecidas não terão as mesmas oportunidades de acesso aos diferentes níveis do sistema escolar, que os alunos oriundos de famílias com posse cultural. Um jovem da camada superior terá mais chances de entrar na Universidade que um filho de um assalariado não qualificado. E muitas das vezes o seu ingresso na Universidade se dá depois de uma longa caminhada nos estudos, pagos com sacrifícios, assim seu titulo se torna desvalorizado, pois um diploma não dá mais acesso a postos de executivos a concorrência entre os diferentes usuários da instituição escolar torna o diploma desvalorizado. Bourdieu coloca essa diferenciação nos estudos no sentido do investimento, pois as classes bem favorecidas podem investir mais em seus filhos e podem apoiá-los em caso de incerteza, dando oportunidades de bons cursos preparatórios, ficando fácil sua entrada na melhor Universidade e o filho dos que não provem de benefícios se tornam desfavorecidos, o pouco que se tem investe muitas vezes em um momento não oportuno. E nessas desigualdades para esses estudantes ficam os cursos de relegação, por falta de capital para investir, assim os melhores diplomas fica para os que possuem capital cultural elevado. Assim, a Sociologia bourdieusiana afirma que a escola não é neutra, ela é uma das instituições centrais de reprodução dos privilégios culturais, e por a escola ser uma instituição onde a função é transmitir o aprendizado e as aptidões para o homem se tornar “culto”, a escola teria por obrigação compensar as desvantagens daqueles que não possuem em seu meio familiar a prática cultural para poder suprir parcialmente as desigualdades sociais. Segundo Bourdieu a educação deixa de ser vista como transformadora, e passa a ser reprodutora onde o individuo seria submetido a certas condições impostas pela sociedade de maneira que o sistema educacional acaba reproduzindo o que está fora da sala de aula como forma de dominação, pois, o conhecimento é adquirido, na verdade, conforme o nível de experiência da social e cultural que os indivíduos têm em sua classe social, em suas experiências familiares e práticas sociais, estas formas de comportamentos seriam incorporadas pelo individuo de acordo com sua estrutura social herdada. Em outras palavras, a bagagem social tem uma grande influência na escola e contribui para o desempenho escolar, e estas são transmitidas pela família que nelas constitui certos capitais culturais já incorporados pelo individuo como gostos em matéria de arte, leitura, culinária, decoração, vestuários, esportes etc. E que reflete no desempenho escolar de modo que passa a fazer parte do conviver social, sendo assim as estruturas são adquiridas através das relações sociais, passando a fazer parte das atitudes dos indivíduos, onde o sujeito estaria em uma ação dinâmica não mecânica, mais ou menos rígida. O capital cultural da mesma forma que contribui para o desempenho escolar gera desigualdade social, haja vista que esta ligada a bagagem cultural trazido desde a casa, e as crianças que possuem tais aptidões como o domínio da língua culta seriam as que vieram de uma trajetória educacional culturalmente provida de conhecimento e apresentaria um sucesso escolar, já que possuem esses hábitos e a realidade escolar não se distancia de sua realidade não escolar (casa, família, rede social). Por outro lado, as crianças desprovidas deste capital cultural não conseguiriam muito êxito na escola, justamente pela distância existente entre os conhecimentos escolares dela exigidos e sua cultura familiar, social. A escola forneceria apenas aos alunos que possuidores deste domínio, no caso seriam aqueles que trouxeram heranças culturais, as posições mais elevadas e prestigiadas dentro do sistema de ensino. Sendo assim, o aprendizado, é como um julgamento cultural e moral destes alunos. Neste caso possibilitaria o reconhecimento do tipo de linguagem as formas de falar e escrever, e algumas conquistas esta relacionada com o capital econômico. Bourdieu entende o individuo como um sistema de disposições que são adquiridos culturalmente pelos hábitos do seu grupo social, como o fracasso e o sucesso, que são definidos como hábitus, desta maneira cada grupo social dependendo de sua classe teria que investir na escolarização dos seus filhos de acordo com a necessidade, e cada individuo passa a ser visto conforme seu titulo escolar, as escolhas dependem da bagagem social herdada. Assim pode se considerar que as elites não precisariam se preocupar tanto com uma ascensão social, pois se encontra em uma posição superior e que assegura o controle da sua posição social. Essas famílias estariam atuando em função de sua condição socioeconômica, sendo que elas teriam um retorno de seus valores perante a sociedade. Enquanto que a classe media tende a disponibilizar de todos os seus recursos no sucesso escolar dos seus filhos uma busca de ascensão superior em direção às elites. As classes populares seriam mais desprovidas dos recursos econômicos, culturais e sociais, as que menos investiriam na educação de seus filhos, devido suas chances de conquistar o curso superior ser reduzido, e sua perspectiva de vida escolar serem pequenas devido a situação econômica, e não suportaria esperar já que haveria a necessidade de entrar no mercado de trabalho. Além disso a escolaridade e aprendizagem desses alunos não seria cobrado por parte de seus pais, já que eles vieram de uma cultura diferente e que deram pouca importância aos estudos. Bourdieu aponta o MALTHUSIANISNO como preocupação das famílias desprovidas de recursos em controlar a fecundidade das classes medias, por uma estratégia de investimento, sendo que as classes populares e mesmo como das elites tendem a reduzir os números de filhos devido à preocupação de investimento escolar, para que tenham êxito em sua formação, como na carreira profissional. As elites tendem a investir de formas pesada em educação, mas de fato o sucesso escolar no caso dessas famílias é tido como algo natural, que não depende exclusivamente da cobrança familiar, haja vista que as posições sociais, culturais e econômicas tornariam o fracasso desses estudantes pouco provável, além disso, estariam livres da ascensão social, pois, fazem parte das posições dominantes de sociedade, sendo necessário mantê-las.