DELEGADA MARIA ELISA (PARTE CLXXX): “O CLÃ BORNHAUSEM PRÓCERE DO ‘VELHO’ IRINEU (EX-DELEGADO DE ITAJAÍ). O ENCONTRO COM O DELEGADO WANDERLEY REDONDO E TODA A SUA ARGÚCIA CÊNICA. A AUTISTA ANGÉLICA”

Por Felipe Genovez | 03/09/2019 | História

Os “Bornhausem” próceres do ex-Delegado Irineu Bornhausem (Itajaí): 

Dia 04.09.08, horário: oito horas e quarenta e cinco minutos,   continuava hospedado no Hotel Susim (Mafra/SC) e me dirigi para o local onde era servido o café da manhã. Logo que entrei no recinto olhei numa mesa do canto e reconheci sentado numa das mesas o Deputado Paulinho Bornhausem. Me dirigi diretamente para uma mesa quase que embaixo de um televisor de LCD e fiquei de frente para o parlamentar que estava tomando café com alguns políticos da cidade (candidatos à prefeitura). Era engraçado estar tão próximo do parlamentar e procurei me conduzir com certa indiferença. Paulinho se comportava como se tivesse sangue azul enquanto os políticos regionais mais pareciam “babões”. A leitura imediata que fiz era que Paulinho estava ali defendendo sua base eleitoral, ou seja, eram seus cabos eleitorais, sim, estava ali um político profissional prócere de uma escola das mais experientes:  “os Bornhausen”. Seu avô, o velho Irineu Bornhausem, começou sua vida política como Delegado de Polícia de Itajaí, isso por volta do ano de 1915. Em seguida se elegeu vereador (UDN), depois Prefeito, chegando ao Governo do Estado em 1950. Por último, foi eleito Senador (1960).

Um encontro com o Delegado Wanderley Redondo: 

Quando já estava próximo de deixar a área do café dou de cara com...? Sim, era o Delegado Wanderlei Redondo em carne e osso. Não dava para acreditar e logo foram caindo minhas fichas: “Sim, tudo haver, Paulinho está circulando pelo Estado e Wanderlei Redondo seria uma espécie de “guarda-costas”, ou homem de ‘informações’...”. Logo que me viu Redondo veio me cumprimentar com um sorriso amistoso. De imediato perguntei se ele estava realmente acompanhando o parlamentar e ele confirmou que estava fazendo uma turnê pelo Estado a fim de acompanharem o quadro eleitoral. Acabei servindo mais um café e Redondo me apresentou o candidato a Vice-Prefeito de Mafra que estava próximo de nós. Depois, curioso, retornei para minha mesa. Redondo veio até minha mesa com uma xícara de café e se sentou comigo, ficando bem na minha frente. Conversamos um pouco sobre aposentadoria e Redondo relatou que até o final daquele ano iria gozar suas licenças-prêmio, entretanto, muito embora tivesse requerido sua aposentadoria a mesma estava sustada. Relatei que também estava pensando em requerer minha aposentadoria, mas por enquanto aguardaria a tramitação do projeto que tratava da “indenização aposentatória”. Perguntei para Redondo se ele tinha conhecimento da matéria e ele respondeu que estava com o Deputado Hernes de Nadal. Estranhei aquela informação e intui que Redondo poderia estar dando um chute, ou melhor, poderia estar um pouco confuso considerando o relato que o Delegado Alber Rosa havia feito dias atrás que o projeto desse parlamentar era sobre uma possível melhoria salarial para todos os policiais prevista para o mês de outubro. Passamos a dar peso ao assunto, o que me fez argumentar que um projeto daqueles só poderia entrar em vigor no início do ano próximo ano, porque teria que mexer no teto salarial do governador, o que somente seria  possível no final do ano, com vigência a partir de janeiro de 2009. Redondo deu a entender que concordava com meu raciocínio e ao mesmo tempo quis dizer que na verdade estávamos era sendo enrolados. Em razão disso resolvi externar minha opinião:

- “Bom, a Sonêa tem viajado o Estado todo e repassado para os Delegados uma voz de esperança. O pessoal tem me perguntando se é verdade, e o que eu vou dizer? O pessoal é fácil de ser iludido, imagina, com um salário defasado desses...”.

Acabei externando que se pudesse daria mais dez anos de trabalho por conta do projeto da criação da “Procuradoria-Geral de Polícia”. Depois, fiz um relato de projetos que apresentei na época do Secretário de Segurança Sidney Pacheco e do Delegado-Geral Jorge Xavier. Procurei dividir com Pacheco e Jorge Xavier o sucesso desses projetos, desde o sistema de  entrâncias para os Delegados, a inamovibilidade relativa, a reclassificação das carreiras policiais civis (exigência de níveis superior para Comissários, Escrivães e Técnicos Criminalísticos e segundo grau para Investigadores, Escrevente e Técnico em Necropsia), bem como o fim dos militares na direção de Delegacias de Polícia, como forma de implementar o sistema de entrâncias, a lei especial de promoções, a gratificação vintenária, o anuênio permanência... Redondo ouviu tudo atentamente e eu pensei em silêncio: “Meu Deus, não é fácil, Redondo é o tipo do cara ‘areia movediça’, ou seja, seu jogo parece mesmo político, e você nunca sabe o que ele está realmente pensando, ou o que está informando, para quem está trabalhando...”. Lembrei em fração de segundos daquela reunião no Hotel Floph, em Florianópolis, quando Esperidião Amin veio me cumprimentar, dispensando toda a atenção, sob o olhar espreito de Redondo ao meu lado, denotando talvez um certo quê de ciúme... Dias depois, Amin me encontrou dispensando descaso, frieza... e logo imaginei: “Redondo se encarregou de me queimar para Amin, provavelmente advertindo para tomar cuidado comigo que eu era da máfia dos Delegados mordedores de ‘bicheiros’, do time do Delegado Wilmar Domingues (desafeto de Redondo, pois prendeu sua esposa suspeita de envolvimento com jogos...). Não havia dúvida que na época a tática de Redondo foi me queimar, anular nossas possibilidades de ascender ao poder na SSP, especialmente, perante Esperidião Amin, e conseguiu com muito êxito. Agora estava ali Redondo a serviço de Paulinho Bornhausem, e fiquei pensando: “Ah, se ele estivesse a serviço da instituição, que desperdício, tudo se resumiria a ambição por parte de um homem...?” Voltei minha atenção a Redondo e procurei ser o máximo de puro, procurei fazer relatos sobre projetos institucionais, sonhos, utopias... Redondo acompanhava minhas considerações, muito embora percebesse no seu olhar que a Polícia Civil estava muito aquém das suas ambições, sua mente vibrava noutra dimensão, noutro mundo, na política, na proximidades com os políticos da vez... Resolvi perguntar sobre o Delegado Júlio Teixeira e se tinha conversado com o ex-parlamentar que era seu amigo. Redondo foi fulminante:

- “Não, não tenho mais conversado com ele. Outro dia encontrei ele no centro, estava com o rosto inchado (Redondo fez um gesto com as duas mãos demonstrando que o rosto dele estava daquele tamanho...), sabe o que acabou com ele? Foi o ‘p.’, o ‘p.’ acabou com o Júlio...”.

Fiquei pensando na forma como Redondo me derrubou perante a Amin, pobre Amim, pobre Ângela, pobre de mim..., somos todos uns sobreviventes no meio de serpentes, muito embora eles também tenham se transformado muito provavelmente em seres “leviatanos”, até como forma de se manterem vivos.  Acabei me reportando ao Imperador Tibérius e sua teoria da convicção, querendo dizer que um dos problemas de Júlio Teixeira foi que ele não conseguia passar convicção nas suas ideias e, assim, perdia em credibilidade, convencimento... Terminamos a conversa de pé, próximo à porta de saída, sob o olhar de través de Paulo K. Bornhausem. Na saída Redondo tinha que aprontar das suas, pois ao me despedir ele em voz imposta e grave, para todos ouvirem, deu um ‘tapinha’ no meu ombro, dizendo:

- “Tá bom, Genovez, tá bom!”.

Lamentei ter oportunizado aquele tipo de espetáculo, mas Redondo era assim, a Polícia Civil e os Delegados estavam muito aquém da sua capacidade de processar emoções num nível tão sem sabor, já Paulinho Bornhausem parecia curioso ao perceber à distância os ótimos contatos do seu pupilo útil e nada inocente.  

Por volta das nove horas e quinze minutos, embarquei na viatura, sob a companhia do Investigador Fernando e fomos para a Delegacia Regional de Mafra para as audiências. No trajeto relatei o que tinha ocorrido momentos antes, ou seja, o encontro com o Delegado Redondo e indiretamente com Paulinho Bornhausem.

O ouvinte e a autista angélica:

Por volta das dezessete horas, estava viajando com destino à cidade de Videira e percebi que a certa altura minha secretária Patrícia Angélica estava com seu MP3 a todo volume, sem ouvir nada nada do que eu e o Investigador Fernando Luiz da Silva conversávamos. Aproveitei para fazer alguns relatos sobre a da Segurança Pública, desde a vinda de D. João VI para o Brasil, passando por Elesbão Pinto da Luz, concunhado do ex-Governador Hercílio Luz  (ex-Delegado de Blumenau e ex-Deputado federalista fuzilado a mando do Cel Moreira César no final do Século XIX na Fortaleza de Anhatomirim - Florianópolis), passando pelas reformas de Gustavo Richard na Chefia de Polícia, pelo governo Nereu Ramos e a criação da Secretaria da Segurança Pública em 1936 (e o DOPS), depois o governo Celso Ramos (1961), com a turma do integralistas no comando policial do Estado (Jade Magalhães e Jucélio Costa), o governo Ivo Silveira (década de sessenta), com as reformas do General Rosinha, o retorno de Jucélio Costa (criou a Superintendência da Polícia Civil - 1971), o período Heitor Sché (1982) e, finalmente, Sidney Pacheco (1991). Aproveitei para falar um pouco sobre meus livros e lamentei não ter entrevistado o Delegado Manuel Fogaça (um dos responsáveis pela implantação de uma doutrina e nova mentalidade entre os Delegados calcadas no conhecimento jurídico e científico...) e, principalmente, lembrei do Coronel Lara Ribas, um dos grandes homens da Segurança Pública no Estado. Também aproveitei para falar dos projetos que tinha ainda para reformular a Polícia Civil, da necessidade de haver um alinhamento dos astros (politicamente falando) para que isso pudesse se transformar em realidade, aliás, como ocorreu em outras épocas. Assim, a viagem transcorreu rápida demais e quando nos demos conta já estávamos chegando em Fraiburgo. Agradeci por ter a companhia de uma pessoa da estirpe do policial Fernando, formado em Geografia, certamente que com sua educação, sensibilidade, interesse, visão mereceria um melhor reconhecimento e aproveitamento. Lamentei que não tivesse poder para implementar reformas que pudessem realmente valorizar nossos bons policiais. Por fim, lamentei o autismo de Patrícia Angélica que certa vez teria me dito que um dia  iria cursar Direito para crescer na Polícia...