DELEGADA MARIA ELISA  (PARTE CIV):  “BRUTOS TAMBÉM AMAM? UM ENFRENTAMENTO INDÔMITO ENTRE OS DELEGADOS THOMÉ E MARCUCCI?  E O ‘DESARMADO’ INVESTIGADOR ‘ZICO’ TERIA EMPRESTADO SUA ARMA?”.

Por Felipe Genovez | 24/04/2019 | História

Os Delegados brutos também amam?

Dia 09.10.07, exatamente às dez horas e trinta minutos, me dirigi para o cartório  da Escrivã Margarete e logo que cheguei, sem cumprimentar ninguém, me posicionei em pé próximo a mesa dos trabalhos e assim aguardar a chegada dos vogais para iniciar a audiência de ouvida da testemunhas Delegado Thomé. A minha pretensão era ter dispensado essa testemunha, porém, o Delegado Marcucci e seu advogado insistiram na sua oitiva... Já tinha cumprimentado anteriormente o Delegado Marcucci e seu advogado na recepção e o Delegado Ricardo Thomé esteve no meu gabinete momentos antes quando conversou  rapidamente comigo na presença do Delegado Acácio Sardá. Logo a seguir chegou  Marilisa e coloquei minha mão direita em cima do seu ombro em sinal de “boas vindas”. Era um quadro inenarrável, de um lado Marco Aurélio Marcucci  e do outro o seu algoz Ricardo Lemos Thomé que sentou ao lado de Marilisa, com os braços curzados, um olhar de poucos amigos, fazendo algumas trejeitos que poderiam sinalizar para um misto de tensão e raiva, como caretas com a boca e o canto dos lábios. Marcucci se acomodou bem a  frente de Thomé, passando a encará-lo, pronto para qualquer embate, disposto a revidar qualquer “pedrada”, uma provocação ou até revidar uma possível agressão..., especialmente, considerando tudo que havia passado no cárcere, as humilhações... A impressão era que Marcucci queria aparentar uma certa  tranqüilidade, talvez uma  forma de ir a desforra com “categoria”, no tapete, pois para quem passou pelo inferno,  quem sorveu antes a glória dos cargos públicos e depois viveu o reverso permeado pelo amargor extremo, para quem teve que enfrentar  “demônios” interiores..., se portava como um predestinado, mas para um errante,  detentor de uma missão errática, como se não tivesse mais nada a perder... Já Thomé, coletor do plantio facultativo, desafiante recorrente dentro do seu próprio destino traçado a granel ou ao léu, vivente nas sombras,  “absorssor” intrépido de extremos, convivente mordaz da solidão,  pautador  de figuras caminhantes e agonizantes com que se defrontava...,  mais parecia um ser caricato e liquefeito que não dava sinais de perder a sua dignidade e altivez.  Sem dúvida duas entidades em seus contrafortes interiores inexpugnáveis, cujos espíritos nos distanciavam, apesar de estarmos  juntos num mesmo barco.

O boa-gente Delegado Gentil:

Devaneios à parte, tivemos que aguardar mais uns instantes porque o vogal Delegado Gentil ainda não havia chegado. Independente disso resolvi iniciar os trabalhos. Tomei o processo disciplinar nas mãos e dei uma folheada para ganhar um respiro e não ter muito o que falar. Todos os olhares estavam dirigidos a mim, como se aguardassem os próximos lances, o início dos trabalhos, o porvir... Procurei manter a calma, muito embora fosse difícil dentro daquele círculo polar e na presença de partes deprimentemente tão “assindéticas”, depois de  legados provindos de mares tão imprecisos em suas vidas.  Observei que Thomé em momento algum olhava para Marcucci e seu advogado, dando a impressão que queria denotar  talvez raiva ou algum ódio mortal, indefectível e que não se curvava ao fato de ter sido convocado para estar naquela “cadeira”. Pedi que Thomé desse uma olhada num documento que o Delegado Luiz Felipe Fuentes (Joinville) havia redigido e que constava dos autos e ele respondeu que desconhecia o seu teor.  Em seguida passei a palavra para o advogado de defesa e o mesmo fez umas três perguntas. Thomé respondeu que no mês de julho de 2004, por meio de resolução, extinguiu a Divisão de Investigações Criminais de Joinville e que o acervo documental deveria ter sido encaminhado para a Central de Polícia, cuja responsabilidade seria do Delegado Regional na época, no caso “Marcucci”. Enquanto presidia a audiência pude notar que em certas momentos  Thomé estava se sentindo muito mal com o que estava ocorrendo, sua face parecia pálida, seus olhos  cheios de amargura, desprezo... Procurei permanecer atento porque seres humanos sob certas circunstâncias são capazes de tudo, conheci “Marcucci” recluso espumando ódios como se fosse o senhor das trevas, depois parecendo uma alma penada... Já tinha visto também Thomé no poder e como isso o transformava em “senhor dos anéis”, agora estava ele sentado ali na minha presença...

O até mais, "meu irmão":

Como não havia mais perguntas encerrei a audiência e o advogado de defesa pediu desistência da ouvida do Delegado Hilton Vieira.  Encerrado os trabalhos, o Delegado Thomé se levandou se despediu primeiro a Escrivã Margarete, em seguida veio até mim  e estendeu a mão dizendo:

- “Até mais, meu irmão”.

Pensei comigo: “puxa, esse cara não conhece o passado, o seu tratamento tem tudo haver, tudo que eu já fiz por ele no passado e ele não sonha com isso, não tem nem noção, o seu concurso na Acadepol em 1989, depois, ainda sob o frescor do logo após estágio probatório, os conflitos com o pessoal da Justiça em Joaçaba, cujas denúncias foram encaminhadas à direção da Polícia Civil e acabou vindo para que eu mais uma vez decidisse na condição de “Assessor Jurídico” e “braço direito” do Delegado-Geral sobre a instauração ou não de procedimento disciplinar (representações de um Juiz de Direito e de um Promotor de Justiça), acredito que ele nunca saberá...”. Apenas retribui o seu cumprimento de despedida, sem praticamente dizer nada. Thomé também se despediu da Delegada Marilisa e com relação ao Delegado Gentil fez uma pausa mais demorada, com direito a abraços e sorrisos de ambas as partes. Thomé se foi e com ele  um abismo... 

O desarmado Investigador "Zico":

Por volta de meio dia Marilisa estava na minha sala e resolveu ligar para o Deputado Darci de Matos a fim de ver se ele nos recebia para tratar do anteprojeto do “Fundo de Garantia dos Policiais Civis”. Fez o contato e do outro lado veio a confirmação. Então, o próximo passo seria irmos até a Assembléia Legislativa. Preparei o documento, redigi um requerimento em nome da “Reajup” (Rede de Assistência Jurídica aos Policiais Civis) e pedi que o policial “Zico” nos conduzisse até em frente ao parlamento estadual. No caminho “Zico” confidenciou  que estava na frente da Corregedoria quando o Delegado Thomé chegou e, logo que o viu ele teria perguntado:

- “Zico, estais com a tua arma aí contigo?”

“Zico” comentou que achou que aquilo era brincadeira e que não tinha entendido, tendo respondido  que não estava portando sua arma. Também, que percebeu  que “Thomé” realmente queria mesmo a sua arma emprestada para que – caso fosse necessário – a utilizaria contra “Marcucci”. Achei aquilo um exagero por parte de  “Zico”, e resolvi não levar aquela informação muito a sério até porque tudo transcorreu relativamente bem. Lembrei que tempos antes Thomé queria conversar comigo sobre a audiência, talvez estivesse mesmo preocupado, e eu já tinha decidido indeferir a sua oitiva, no entanto, o Delegado Marcucci e seu advogado insistiram..., podendo inferir que o objetivo não era esclarecer nada, apenas colocá-lo naquela condição de “enfrentamento”, e nesse aspecto eu estava certo, me arrependi de não ter solicitado os quesitos previamente para as perguntas.