DELEGADA MARIA ELISA  (PARTE C): “LOTAÇÕES E REMOÇÕES DE POLICIAIS DENTRO DO ‘BALCÃO DE NEGÓCIOS’? O ‘MANEIRO DELEGADO CARLÃO’ (CARLOS EVANDRO LUZ) E  O ‘MAGNETISMO ELISIANO’”.

Por Felipe Genovez | 17/04/2019 | História

O DELEGADO REGIONAL FLARES DO ROSAR:

Dia 05.10.07, horário: onze horas, estava na cidade de Videira pronto para me despedir momentaneamente do  Delegado Regional Flares do Rosar, em cuja circunstância (intervalo de audiência) comentei que iria fazer uma visita para os dois novos Delegados que estavam estreando na Delegacia da comarca. O casal de Delegados Luiz Felipe Fuentes e Priscila Cemin haviam conseguido  finalmente retornar  para Joinville, o que certamente se constituiu parte de mais um pacote de “bondades” e “concessões” do Delegado-Geral Maurício Eskudlark. Logo imaginei  que o casal de Delegados  muito provavelmente iriam entrar para as estatísticas daqueles que iriam se eternizar numa determinada cidade em afronta ao espírito da legislação que instituiu o sistema de entrâncias que deveria ser aplicado nas mesmas bases aplicadas aos magistrados e membros do Ministério Público.  Quando disse que estava me dirigindo  para a Delegacia da Comarca  Flares argumentou  que me acompanharia até àquela repartição  a fim de me apresentar aos novos colegas. No começo me surpreendi  com a atitude do Delegado Regional, mas logo entendi que era parte de uma finesse razão porque assimilei o fato numa boa, apesar do viés formal que eu pretendia evitar àquela visita. Logo que chegamos no gabinete do Delegado Guilherme coube a Flares  fazer minha apresentação e,  em seguida, deixou o recinto e eu pude ficar mais à vontade. O Delegado Guilherme me pareceu uma pessoa simples e logo soube que tinha sido aprovado no concurso para Delegado no Estado do Paraná, cujo salário inicial era de nove mil reais contra quatro mil e quinhentos em Santa Catarina. Por esse motivo, intuindo qual seria a sua opção, entendi que não iria prosperar qualquer assunto de natureza institucional, porém,  resolvi deixar cópia do parecer sobre “termos circunstanciados” que havia encaminhado ao  Delegado-Geral Maurício Eskudlark para que colocasse em discussão no Conselho Superior da Polícia Civil. Também, deixei cópia da “emenda constitucional” sobre a criação da “Procuradoria-Geral de Polícia” (alteração do art. 106, CE) e do anteprojeto de lei que tratava sobre o “Fundo de Aposentadoria dos Policiais Civis”. 

Nesse momento a Delegada Marilisa chegou para nos fazer companhia e conhecer o novato Delegado Guilherme. Durante nossa conversa soube que o outro Delegado (natural do Estado do Maranhão), também havia sido aprovado no concurso para Delegado do Paraná e que certamente já tinha o seu destino traçado. Nisso fomos surpreendidos pela visita do Vereador Serafim que também era Secretário Municipal da Agricultura e mais o Vice-Prefeito de Videira. Apesar de ter achado aquele fato inusitado resolvi dar toda atenção aos dois políticos me perguntando em silêncio: “O que essas duas figuras  estão fazendo aqui neste momento?” Com habilidade elogiei a “empreitada” e deixei de lado o computador que estava operando na mesa do Delegado Guilherme. Os dois políticos argumentaram que era importante que os policiais se fizessem presente na cidade para aumentar a sensação de segurança, que era um fator que gerava mais visibilidade à sociedade, em especial, por parte dos policiais militares.

Delegados ao Paraná!

Por volta das onze horas e trinta minutos retornei à DRP de Videira para terminar as últimas audiências com  Flares e mais o Delegado de Tangará. Aproveitei para argumentar:

- “Doutor Flares, eu espero que o senhor como Delegado Regional comunique a direção da Polícia Civil que nós estamos perdendo dois Delegados aqui para o Estado do Paraná por conta dos salários e que isso é uma vergonha. Doutor Flares, são vários anos sem reajuste dos nossos salários. Eu espero que informa também a nossa presidente da Adpesc, a doutora Sonéa que só tem olhos para Brasília...”.

Flares interrompeu:

- “Doutor, não são só dois, são três Delegados nossos que passaram no concurso no Estado do Paraná. Nós somos o décimo sexto salário do país, perdemos para o Piauí, Pernambuco...”.

O Delegado de Tangará chegou a comentar:

- “Puxa, se eu ganhasse uns dois mil reais a mais eu não saia mais de Santa Catarina, mas aqui o salário é de quatro mil e quinhentos reais e lá é nove mil, imagina a diferença...”.

Depois dessa argumentação pensei: “Com a palavra os nossos iluminados Delegados da cúpula, da Adpesc... e tantos outros que costumam dizer que ganhamos muito bem...”.

O “maneiro” Delegado “Carlão” e o “Magnetismo Marilisiano:

Horário: dezessete horas e trinta minutos, chegamos na Delegacia Regional de Caçador e fui direto para o gabinete do Delegado Carlos Evandro Luz. Logo que me anunciei diretamente observei que “Carlão” estava sentado na sua mesa despachando sem dar muita relevância a minha chegada. O gabinete era um local simples, mais parecia um cartório, uma sala qualquer, menos um recinto típico  de autoridade policial. Dava para observar que não havia “diferenciais”, nem brasões, ornamentos, florais, vasos, tapeçaria, algum quadro na parede... Marilisa chegou logo em seguida. A pérola ocorreu nesse instante, no momento em que  “Carlão” percebeu a presença da cintilante Delegada Marilisa, o que acionou um gatinho que o impulsionou  na sua direção para recepcioná-la com um misto de efusão e garbosidade . Fiquei observando os acontecimentos, o antes e o depois, me mantendo de pé assistindo “Carlão” elétrico dando beijinhos em Marilisa, a ponto de se “enrubecer”, passando a impressão de que eram velhos conhecidos. Permaneci em segundo plano, apenas  na condição de observador, percebendo uma certa e contagiante proximidade entre ambos, a ponto de me sentir meio que “peixe fora d’água”. Depois de alguns instantes me vi forçado a pedir licença e deixei que os dois ficassem mais à vontade para continuarem suas trocas e me dirigi  à sala que ficava em frente para dar início às audiências agendadas. Antes de sair fiz o seguinte comentário:

- “Vou iniciar os trabalhos, mas vocês podem ficar conversando à vontade”. 

Parece que era tudo que “Carlão” queria ouvir, estava diante de um cenário de êxtase e acredito que fiz a coisa certa. Iniciei as audiências  e nada da vogal  Marilisa aparecer, o que me fez intuir que “Carlão” havia conseguido obrar o seu encapsulamento verborrágico ou emocional, pois ficou conversando com Delegado Regional durante um bom tempo. Depois que terminei os trabalhos resolvi voltar até o gabinete de “Carlão”  e me sentei ao lado de Marilisa para ver qual seria o passo seguinte de ambos, tipo algum almoço em vista... e, também, para  que ela se decidisse, além de dar um toque que eu já estava de saída. O problema era que “Carlão” não deixava ninguém falar, estava turbinado no uso da sua fala, não dava espaços para ninguém e isso parecia dificultar  a iteração. Podia observar que raramente ele olhava para mim, exceto em algumas frações de segundos e a impressão era de que ainda estava num processo de “encantamento” talvez ocasionado pelo “magnetismo marilisiano”. Com relação a minha presença (apesar de há anos não nos vermos), seu olhar não era um olhar franco, não era uma visão com aquele misto de receptividade e satisfação, mais parecia pura formalidade forçada, algo que parecia travado e que tinha que ser suportável, ligeiro e rápido. No entanto, quando se dirigia à Marilisa ele se “contursionava” na cadeira, demorava, gesticulava, parecia extasiado, digamos que havia devoção, veneração e muitas categorias cênicas  na condução dos gestos, da fala... Achei complicado investir em qualquer diálogo, entendi por derradeiro que estava proscrito, mesmo em se tratando de  assuntos institucionais e ao percebê-lo a impressão era que havia um deserto à minha dianteira, alguém  aéreo, entorpecido... Fiquei pensando: “Caçador é uma cidade complicada, sempre foi, os policiais parecem estar noutro planeta, vivem noutra dimensão, como se não pertencessem a uma corporação, autônomos, independentes...”. “Carlão” pediu ajuda para Marilisa, no sentido de tentar vender seu apartamento na praia da Enseada (São Francisco do Sul) e relatou  que já veraneou em todo o litoral catarinense, desde Jurerê Internacional, Camboriú, mas as praias que mais gostou ficavam  São Francisco. Num dos raros momentos que ele me fitou nos olhos  para puxar uma conversa, comentou:

- “E daí, como estão as coisas?”

Confesso que não me surpreendi e respondi com um sorriso lacônico:

- “Tudo bem, tudo bem! Puxa, mas como tu ficasses parecido com o teu pai.”

Sem nada acrescentar,  “Carlão” voltou com força total sobre a Delegada Marilisa. Era quase que engraçado, cômico e fiquei pensando: “Ele ficou de barba e cabelos grisalhos. Suas mãos estavam bastante envelhecidas, achei aquilo cruel, ou seja, o fator tempo fazia se notar, e talvez aquela sessão de “adoração” também tinha haver com isso, ou seja, o instinto de sobrevivência da espécie falando mais alto, tudo em nome do “cavalheirismo lacelotiano” ou, ainda, talvez até resquícios do fator “epavandecido”. Em determinado momento, tive que interromper a conversa para avisar  que iria até a Delegacia da Comarca (andar térreo) a fim de conhecer a Delegada Ana Elisa que iniciou o seu exercício há pouco tempo. Marilisa me olhou com aqueles olhos “pedintes” de socorro, como se quisesse dizer “me leva junto, por favor, me salva dessa saraivada...!”. Fiquei sem jeito, eram impressões fracionadas por segundos e a minha vontade era alcançar minha mão, alçá-la e puxá-la daquela “canseira ‘triturante’ emocional”. Só que “Carlão” com tintas de impetuosidade se antecipou dizendo:

- “Vai lá, vai lá, deixa a Marilisa aqui comigo, depois eu levo ela lá para conhecer a nova Delegada”.

Marilisa mais parecendo pávida ficou sem argumentos e muito menos eu. Fui até o andar térreo e encontrei a Delegada Ana Elisa que me atendeu prontamente, sem saber quem eu era. Acabei me identificando como Delegado de Florianópolis. Ana Elisa perguntou em que local eu trabalhava e tive que responder que era na “Corregedoria”. Diante disso não pude imaginar  que ela seria acometida de um “mal súbito” (brincando), e argumentou:

- “Meu Deus, o que, isso me dá uma coceira, uma coceira, ai meu Deus...”.

Nisso chegou “Carlão” na companhia de Marilisa e novamente pude perceber que nos apequenávamos, pois ele dava a impressão que se comportava como  um astro, deixando transparecer uma certa dose de  insensibilidade, humildade... Acabei deixando ele assumir novamente o  papel de autoridade máxima, que poderia ocupar  solertemente todos os espaços sob às vistas das Delegadas, deixando transparecer ares de político, autoridade, homem dotado de habilidades para argumentar, orar...

A bem da verdade,  achei “Carlão” meio doente, fora da realidade, como quem precisava externar poder, uma pseudo autoridade diante de uma seleta platéia, como se fosse o “coronel da terra”, talvez por sua condição de vereador e Presidente da Câmara de Vereadores de Videira e sua posição de Delegado Regional..., era uma sensação que não havia experimentado  em lugar nenhum. Acabei lembrando que o DRP Flares de Videira também se comportava com aquele jeito “coronélico”, diferente das outras vezes, mas tudo dentro de uma dosagem aceitável, talvez até como reflexo da confusão que existia no comando da instituição. Assim, os Delegados Regionais  pareciam buscar uma compensação, uma certa auto-afirmação, pois se não recebiam apoio da cúpula da Polícia Civil, de governos, de políticos, de outra parte tentam equalizar  isso externando uma conduta, uma postura, uma atitude absolutista, permeada por um certo ar de pedantismo.