De volta pra casa
Por Silvane Luz | 03/04/2009 | SociedadeQuando criança, admirava os autores de estórias infantis, o "Era uma vez..." me encantava. Não nasci com o dom de atingir esse público, mas como tenho liberdade de escolha e ação, resolvi contar uma, iniciada com a famosa frase "Era uma vez..." não é bem infantil, mas procura ter uma moral na estória.
Era uma vez, no planeta azul, um ser imaginário que estava cansado de sofrer, de se decepcionar com seus semelhantes, de dar murro na ponta da faca e resolveu "voltar para casa", abandonou todos seus deuses, crendices e preconceito e foi procurar o Criador, querendo morar com Ele, voltar à sua essência como criação divina, já que na terra nada conseguia satisfazer sua sede por algo que não sabia o que era.
Engraçado que ninguém sabia onde o Criador morava, mas como o ser imaginário queria encontrá-lo de coração puro, logo Ele indicou-lhe o caminho e a criatura se viu diante de seu criador.
---- Posso entrar? – pediu ele humildemente, talvez esperando repreensão por todas as transgressões que fizera na terra.
---- Claro, meu filho – respondeu o Criador- Mas você está um pouquinho sujo... entre pela porta dos fundos, pegue água e sabão e se lave na bacia de ouro que está lá.
O ser imaginário obedeceu, embora achasse que seria recebido com palmas e flores pelo Criador, por ter se regenerado e voltado pra casa. Mas enfim... lá foi ele pela porta dos fundos. Pegou água e sabão e foi até a bacia de ouro. Um jovem bem humilde aproximou com uma toalha branca e entregou-lhe, dizendo:
--- Se precisar de alguma coisa, é só pedir.
O ser imaginário sorriu meio com desdém e agradeceu ao rapaz pacato, sem muita expressividade no rosto, que se afastou como um cordeiro e foi sentar-se embaixo de uma árvore florida, de onde ainda podia vê-lo se banhando.
Conforme passava a água com sabão, o ser imaginário percebeu manchas pelo corpo, de todos os tamanhos e cores, infinitas manchas. Entrou em pane e pensou: como ousei me aproximar do Criador sujo desse jeito? Foi quando um jovem luminoso apareceu. Tinha um sorriso cativante, olhos indescritíveis e voz macia
---- Essas manchas são teus erros passados – disse ele - Cada mancha representa um momento. Por exemplo: lembra quando você concordou que sua namorada abortasse? Então, essa mancha aqui representa isso. Essa outra, foi quando você trocou seu amigo por outros que tinham vida mundana e te levaram a prostituir com mulheres fáceis e com bebida, essa foi quando você magoou teus pais....
E assim o doce anjo foi relatando os episódios da vida do ser imaginário. Para ajudá-lo, deu vários tipos de esponjas para tirar as manchas: de pedra, de arame, de espinhos e tantas outras que causavam enormes danos no corpo do ser imaginário, mas valia a pena, queria se livrar das manchas do passado.
Quando seu corpo já estava todo machucado, sangrando, o Criador entrou e perguntou:
---- O que você está fazendo?
---- Procurando me limpar, senhor. Esse anjo está mostrando onde pequei em relação aos teus mandamentos e estou tentando arrancá-los de mim, mesmo sentindo tanta dor.
---- Até quando vocês, humanos, vão escutar o filho errado? Este que você chama de anjo é meu filho Lúcifer e ele despreza a raça humana, quer me convencer de que vocês são indignos e merecem desaparecer da face da terra. Meu outro filho, aquele que você sorriu com desdém, te resgatou com o próprio sangue, bastava você pedir e Ele tirava todas as manchas sem te causar tanta dor.