De volta aos trilhos

Por Vanessa Stollar | 27/07/2009 | História

Há cinto e trinta e três anos, Jacareí escutava pela primeira o apito da maria-fumaça, que trazia não só os passageiros da viagem inaugural, mas a promessa de uma nova era. A história do trem se mistura com a história do Vale do Paraíba, de suas pessoas, de sua cultura e até da arquitetura. O trem ultrapassou o caminho dos trilhos e chegou à música, à literatura, à pintura e criou um novo estilo arquitetônico que influenciará as demais construções da época.

A história do Vale do Paraíba está povoada de personagens e seus criadores que deixaram por aqui suas marcas eternas. Monteiro Lobato, Cassiano Ricardo, Euclides da Cunha, Mazzaropi, entre tantos que fazem este vale ser singular em toda a história do Brasil. Destacado durante o ciclo do café, a região prosperou, gerou riquezas e atraiu como moradores os barões do café, o ouro verde.Luxo e requinte eram ostentados nos casarões, no modo de se vestir, andar e falar, trazendo para a região um pouco da belle époque que vigora na Europa.

O Vale do Paraíba possui diversos paradoxos que o tornam particular. Conservador e vanguardista ao mesmo tempo, foi a última região no estado de São Paulo a extinguir a mão de obra escrava, mas foi uma das pioneiras no Brasil na construção da estrada de ferro que passa por essa região. E a história dessa estrada de ferro, assim como a história do Vale do Paraíba, não poderia deixar de ser singular e repleta de verdades que parecem lendas e lendas que parecem verdades.

O Brasil terá sua primeira ferrovia em trinta de abril de mil oitocentos e cinqüenta e quatro, com a Estrada de Ferro Petrópolis, depois chamada de E.F. Maúa, com percurso de 14,5km de extensão, vencido em 23 minutos.

Em 1855, foi fundada a Cia. Companhia Estrada de Ferro Dom Pedro II, pelo contrato assinado entre o imperador, o engenheiro Edward Price e o empresário Cristiano Benecdito Ottoni, com a promessa de ser a ferrovia que promoveria a integração do território nacional através dos trilhos. A locomotiva Princesa Imperial inaugura a E.F. Dom Pedro II, em 1858, ligando a estação da corte a Pouso dos Queimados no Rio de Janeiro, com 47,21km de extensão.

Em 1861, iniciam-se os trabalhos em direção a Serra do Mar e o Vale do Paraíba foi finalmente atingido em 1864, com a chegada de trens de passageiros à Barra do Piraí. Mas ainda não era o que queriam os poderosos barões de café que lançavam olhares e objetivos na estrada de ferro que se aproximava.

A estrada de Ferro D. Pedro II, no projeto inicial, chegaria até Cachoeira Paulista, e dali a mercadoria seria escoada pelo rio Paraíba do Sul até chegar a Freguesia da Escada pertencente na época a Jacareí, hoje localizada em Guararema.

A primeira movimentação significativa para a construção da Ferrovia do vale paulista aconteceu no final da década de 1860.

A Cia. São Paulo-Rio foi organizada no início de 1870 por importantes cafeicultores da região, dentre eles o Barão Gomes Leitão de Jacareí e o Barão de Castro Lima de Pindamonhangaba.

Na Assembléia Legislativa da Província de São Paulo de 24 de agosto de 1871, ficou resolvido que a companhia adotaria bitola de um metro, devido à economia de custos. Esse erro acabou deixando essa estrada ilhada entre duas ferrovias de 1,60m de bitola.

A Sede da companhia era na cidade do Rio de Janeiro, e tinha como marco inicial a estação do Norte, no bairro do Brás. A ferrovia foi construída em três secções, e chegou a ter a visita do Imperador D. Pedro II em 1875 para acompanhar a construção.

O trem chega a Mogi com grandes comemorações no dia 6 de novembro de 1875. E em 02 de julho de 1876, foi a vez de Jacareí, toda a extensão foi concluída em 7 de julho de 1877, com festas e convidados ilustres como o Conde d'Eu, marido da princesa Isabel.

Um dia o trem passou por essas cidades e não voltou mais, porém deixou no imaginário popular um repertório de sons e imagens que nunca serão esquecidos. Contar a história da estrada de ferro é reviver um importante capítulo de nossa memória, que pode ser resgatado na preservação de cada uma dessas estações no Vale do Paraíba.