DAS ESPÉCIES DE OBRIGAÇÃO TRIBUÁRIA E O NASCIMENTO DO FATO GERADOR

Por Giuliana Maria Nogueira Pereira | 04/08/2011 | Direito

Introdução


Busca-se com o presente artigo discorrer sobre um dos mais importantes institutos do Direito Tributário: a obrigação tributária e os institutos que dela decorrem, como a questão da atividade financeira do Estado e o fato gerador.
O principal questionamento, que tenta-se responder é de que forma o fato gerador influencia na atividade financeira e se do mesmo decorrem ou não receitas que mais tarde podem tornar a virar objeto de arrecadação para Poder Público ou se o valor pago será utilizado pelo contribuinte.
Assim, a presente pesquisa não tem um caráter finalístico nem pretende esgotar seu objeto de estudo, caso em procura analisar a obrigação tributária e o fato gerador, ambos como produto de vida do Poder Tributário atual, fazendo um estudo sistemático acerca do tema.

1 Da obrigação tributária

Primeiramente vale destacar que o Direito Tributário não criou um conceito jurídico próprio de obrigação, importou este conceito do Direito Civil e adaptou-o às suas reais necessidades.
Desta forma, a obrigação, no Direito Tributário, não possui uma conceituação diferente daquela que lhe é conferida no direito obrigacional. Todavia, consiste a obrigação tributária no poder que o estado tem de exigir do contribuinte uma prestação positiva ou negativa. Sua principal finalidade é a arrecadação de tributo.
No entanto, a obrigação tributária tem suas peculiaridades que lhe asseguram a autonomia. Tem como causa, invariavelmente, a lei e não a convergência de vontades, essencial na obrigação de natureza civil.
De acordo com Alexandre Tavares (2009, p. 118):


Obrigação tributária in genere, pode ser encarada como o vínculo obrigacional decorrente da relação jurídica de direito público travada entre Fisco e contribuinte, em que, face do prévio consentimento legal (obligatio ex lege), nasce infalivelmente ao sujeito ativo (credor) o direito subjetivo de exigir do contribuinte (=sujeito passivo) o cumprimento de seu dever jurídico de entregar dinheiro aos cofres públicos, a título de tributo (obrigação de dar) e/ou de efetuar prestações ? positivas ou negativas ? de interesse da arrecadação ou da fiscalização (obrigação de fazer, não fazer ou tolerar).


Após o nascimento da obrigação tributária, o sujeito passivo responde pelo pagamento do crédito tributário com a totalidade de seu patrimônio, conforme previsto pelo art. 184 do Código Tributário Nacional:


Art. 184: Sem prejuízo dos privilégios especiais sobre determinados bens, que sejam previstos em lei, responde pelo pagamento do crédito tributário a totalidade dos bens e das rendas, de qualquer origem ou natureza, do sujeito passivo, seu espólio ou sua massa falida, inclusive os gravados por ônus real ou clausula de inalienabilidade ou impenhorabilidade, seja qual for a data da constituição do ônus ou da cláusula, excetuados unicamente os bens e rendas que a lei declare absolutamente impenhoráveis.


O dever jurídico de pagar o tributo será sempre obrigatório, não podendo o contribuinte escusar-se desse encargo, sob pena de sofrer sanções pelos atos e omissões praticadas. Nos dizeres de Tavares (2009, p. 118):


Configura-se pois num dever jurídico que, não cumprido nos moldes e condições legalmente preestabelecidos, tanto pode dar ensejo ao surgimento de um ilícito administrativo tributário, como até mesmo, dependendo do elemento um nuclear da conduta praticada, poderá configurar um ilícito penal tributário.


Por fim, pode-se concluir que a obrigação tributária corresponde ao direito do Estado em exigir do contribuinte tributo e/ou uma prestação positiva ou negativa, nas condições previstas pela lei tributária.


2 Da atividade financeira do Estado

A atividade financeira do Estado, nas palavras de Sérgio Jund (2007, p. 6), é aquela que se caracteriza pelo instrumento necessário à obtenção de recursos, visando à viabilização do atendimento e à satisfação das necessidades públicas.
O direito financeiro, como organizador da atividade financeira do Estado, abrange todas as prestações pecuniárias exigidas pelo Estado, contidas no conceito de tributo. Sendo objeto do direito financeiro o orçamento público, as receitas públicas e a dívida pública (AMARO, 2005, p. 01).
Ferreira Filho e Silva Junior (2007, p. 37), explicam que o Estado para cumprir com seus objetivos na prestação dos serviços aos administrados, precisa continuamente angariar recursos. Para isso, cuida da obtenção, gestão e dispêndio das necessidades econômicas necessárias às atividades policiais, sociais, judiciais, educacionais entre outras.
A atividade financeira do estado efetiva-se por meio das receitas originárias e receitas derivadas. As receitas originárias são oriundas do patrimônio do próprio Estado. Provêm das relações jurídicas constituídas com predominância da autonomia da vontade individual, como nos contratos. São auferidas pelo Estado a partir de relações de direito privado travadas com particulares, sem a utilização do poder soberano do Estado. A administração pública, nessas relações figura, figura como pessoa comum, em relação com outras pessoas igualmente comuns. São exemplos dessas receitas: aluguéis recebidos, receita de venda de bens, lucro de empresas estatais, etc.
Já as receitas derivadas caracterizam-se pela utilização do poder de império do Estado, exteriorizado pela soberania estatal. O particular recolhe a receita dos cofres públicos por vontade própria, mas por determinação legal. Tais receitas são, obtidas coercitivamente pelo estado, a não deixar para o particular a opção de inadimplir, sob pena de sanções. São exemplos de receitas derivadas os tributos e penalidades pecuniárias.
Nesse ínterim, os tributos como aludidos por Leandro Paulsen (2007, p. 15), constituem a principal receita do Estado, classificada como receita derivada (porque advinda do patrimônio do particular) e compulsória, pois decorrente de disposição legal, irrelevando a vontade do contribuinte em custear a atividade estatal.

3 Das espécies de Obrigações Tributárias

A obrigação tributária é classificada de acordo com o objeto à que se acha sujeito o contribuinte ou o responsável. Se ela for de cunho pecuniário, a obrigação será principal; por outro lado, se ela não for pecuniária, sê-lo-á acessória (SABBAG, 2004, p. 160).
A obrigação principal é representada pelo ato de pagar, sendo, portanto, uma obrigação de dar, com cunho de patrimonialidade. A obrigação a que se obriga o sujeito passivo é de natureza patrimonial. É sempre uma quantia em dinheiro.
Ressalta Amaro (2005, p. 248) que não deve se confundir, pelo conceito de dar, tributo com penalidade, pois não se pode incorporar no conceito de obrigação tributária principal algo que não é tributo, mas sanção administrativa. Precisamente a sanção administrativa, devidamente fundada em lei, deve ser cumprida, mas não possui natureza de tributo.
Ainda nos dizeres de Amaro (2005, p. 249), este explica que a existência da obrigação acessória não está atrelada à prévia existência da obrigação principal a que se submete. Elas visam à instrumentalização da fiscalização tributária para se investigar o recolhimento dos tributos a que se acham submetidos os sujeitos passivos. Daí as obrigações acessórias compreendem emitir documentos fiscais, escriturar livros, entregar declarações, não embaraçar a fiscalização, etc.

4 Do nascimento do Fato Gerador

O CTN utiliza a expressão "fato gerador" para diferenciar a situação de fato ou situação jurídica que, ocorrendo, motivará a incidência do tributo. Porém, com base na lição de Eduardo Sabbag (2004, p. 98), o fato gerador seria uma mera "hipótese de incidência".


Logo se percebe a imprecisão terminológica encerrada pelo desígnio "fato gerador", vez que assume um hibridismo conceitual inaceitável que, no dizer abalizado de Alfredo Becker, "não gera coisa alguma além de confusão intelectual". Melhor explicando, diz-se equivocada a locução fato gerador, vez que aplica tanto para fazer alusão à descrição abstrata de um comportamento passível de tributação, como para retratar a concretude factual dessa mesma hipótese no mundo fenomênico (TAVARES, 2009, p. 124).


No entanto, cabe realizar a diferenciação das denominações, sendo que a hipótese de incidência seria a descrição legislativa de um fato, o qual vai ensejar a incidência tributária, já o fato gerador seria a concretização da hipótese prevista em lei.
Segundo Paulsen (2007, p. 662): "aquela, a hipótese de incidência, corresponde à previsão em lei, abstrata, da situação que implica a incidência da norma tributária; este, o fato gerador, é a própria concretização da hipótese de incidência no plano fático".


Costuma-se definir o fato gerador como uma situação abstrata, descrita na lei, a qual, uma vez ocorrida em concreto enseja o nascimento da obrigação tributária. Logo, essa expressão fato gerador pode ser entendida em dois planos: no plano abstrato da norma descritiva do ato ou fato e no plano da concretização daquele ato ou fato descritos (HARADA, 2006, p. 484).


O CTN classifica a obrigação tributária em duas espécies: principal e acessória. Em razão desse fato foram definidas também duas espécies de fato gerador.
O primeiro trata do fato gerador da obrigação principal e está previsto no art. 114 do CTN: "fato gerador da obrigação principal é a situação definida em lei como necessária e suficiente à sua ocorrência".
Primeiramente, é possível identificar que o fato gerador da obrigação principal somente pode ser estabelecido por lei, conforme enfatiza o art. 97, inciso III, do CTN.
Sem a previsão legal, não se configurará o fato gerador. O requisito da legalidade é essencial para a própria constituição do fato gerador. Assim leciona Tavares (2009, p. 125): "inexistindo a completa e rigorosa subsunção do conceito do fato ao conceito da norma (descrição in abstracto da situação eleita como tributável), não se opera o nasci mento válido da obrigação tributária principal correspondente".
Assim, quando a situação descrita na lei (hipótese de incidência) materializar-se, ocorrerá a incidência do tributo, momento em que concretiza-se o fato gerador, fazendo nascer a obrigação tributária.

Considerações Finais

Como o tributo é uma prestação pecuniária compulsória, não é facultado ao sujeito passivo a escolha de pagar ou não um tributo. E ainda, pela exigência prevista no art. 150, I, da Constituição de 1988, sabe-se que o tributo só pode ser instituído ou majorado por lei.
Observou-se, outrossim, que a obrigação tributária é o vínculo obrigacional decorrente da relação jurídica de direito público existente entre o fisco e o contribuinte. Nasce com a ocorrência do fato gerador descrito em lei e, divide-se em obrigação principal e acessória, sendo que uma possui como objeto o pagamento de tributo ou penalidade pecuniária, extinguindo-se juntamente com o crédito dela decorrente; e a segunda caracteriza-se por tratar de prestações positivas ou negativas (fazer e não fazer) e na maioria dos casos elas não dependem de uma obrigação tributária principal.
Com efeito, após o nascimento da obrigação tributária, esta ainda não é exigível, pois, não se encontra revestida dos requisitos da liquidez e da certeza, motivo pelo qual é imprescindível o artifício do Lançamento Tributário, que apurará e quantificará matematicamente o valor da obrigação tributária, tornando-a um Crédito Tributário líquido, certo e exigível.


Referências

AMARO, Luciano. Direito Tributário Brasileiro. 11.ed. São Paulo: Saraiva, 2005.

FERREIRA FILHO, Roberval Rocha; SILVA JUNIOR, João Gomes. Direito Tributário: teoria, jurisprudência e questões. Salvador: Podivm, 2007.

HARADA, Kiyoshi. Direito financeiro e tributário. 15 ed. São Paulo: Atlas, 2006.

JUND, Sérgio. Direito Financeiro e orçamento público. Rio de Janeiro: Elsevier, 2007.

PAULSEN, Leandro. Direito Tributário: constituição e código tributário à luz da doutrina e da jurisprudência. 9.ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2007.

SABBAG, Eduardo. Elementos do Direito Tributário. 5.ed. São Paulo: DPJ, 2004.

TAVARES, Alexandre Macedo. Fundamentos do Direito Tributário. 4.ed. São Paulo: Saraiva, 2009.