Da função notarial do tabelião e de sua função social como mediador...

Por Bernardo Luiz Daltoé | 07/11/2016 | Direito

Da função notarial do tabelião e de sua função social como mediador em matéria de escritura pública

Da função do tabelião

No exercício da atividade notarial e de registros particulares, devidamente aprovados em concurso público exercem uma função pública delegada pelo Poder Público, com vistas a garantir a segurança jurídica dos atos praticados e torná-los oponíveis erga omnes em virtude de sua fé pública.

Impende mencionar, acerca do conceito de fé pública, que decorre do art. 3º, da Lei n. 8.935/1994 e é explicado por ERPEN, Décio Antônio; PAIVA, João Pedro Lamana (2004, p. 174):

[...] a fé pública atribuída aos Notários e Registradores afirma a certeza e a veracidade dos atos notariais/registrais realizados. Os translados e certidões são os documentos representativos de fé pública, pois geram autenticidade, segurança e eficácia jurídica aos atos praticados nas Notariais e nos Ofícios de Registros.

Para que os notários e registradores gozem de fé pública, seus atos são submetidos a severas regras de procedimentos, previstas na lei, para que cumpra com o objetivo de documentar a verdade, tendo em vista que em algumas circunstâncias especiais, a lei exige que determinados atos sejam escriturados e devidamente registrados; exige-se o exercício desses representantes do Estado, que atuam mediante delegação para que os atos praticados sejam dotados de fé pública, lhes atribuindo presunção de validade e a certeza de que o ato foi praticado de acordo com as exigências do ordenamento jurídico.

Nesse sentido, Chossani (2015, texto digital), ensina que:

O Tabelião e o Registrador são, nos termos da lei, profissionais do direito, dotados de fé pública, a quem é delegado o exercício da atividade notarial e de registro. Tais profissionais desenvolvem em caráter privado, o serviço delegado pelo Poder Público, e importante não pode, evidentemente, ser prestado de qualquer maneira, haja vista que traz sérias implicações jurídicas, sociais, econômicas, dentre outras.

Cada ato deverá ser devidamente escriturado em livros encadernados, com tamanho padrão, sujeitos à correição da autoridade judiciária competente (art. 3º, da LRP), podendo ser escriturados mecanicamente, em folhas soltas, obedecidos os modelos aprovados pela autoridade judiciária competente (art. 3º, § 2º, LRP).

Por sua vez, a função notarial consiste-se em lavrar os instrumentos adequados na concretização das vontades das partes interessadas, formalizando juridicamente sua vontade, intervindo nos atos e negócios jurídicos, autorizando a redação ou redigindo os instrumentos públicos. Portanto, resume-se na legalização, instrumentalização e autenticação da vontade das partes, conforme refere o Colégio Registral do Rio Grande do Sul (2003, texto digital):

A função da legalização consiste-se no fato de que o notário atua como conselheiro, confidente e assessor jurídico das partes. No exercício de sua função, o tabelião deve manter sigilo sobre as informações que lhe são trazidas ao seu conhecimento.

A instrumentalização consiste em passar para as notas aquilo que lhe foi declarado conforme permite a lei, amoldando a vontade das partes às normas de direito.

A autenticidade coroa o ato jurídico solenemente, instrumentalizado na forma da lei.

Assim, a função do notário é dar fé pública a documentos particulares, tornando-os públicos por meio de sua aptidão de produzir efeitos jurídicos.

A doutrina definiu a questão que existia se o notário era ou não funcionário público. Conforme o Colégio Registral do Rio Grande do Sul (2003, texto digital) refere:

Definiu serem o notário, bem como o registrador, agentes delegados do Poder Público. Em sua definição são agentes públicos encarregados de exercerem uma função pública, na condição de particulares que executam serviço público em nome próprio, por sua conta e risco, sendo assim profissionais do direito.

Podemos concluir assim, que o tabelião, ou o registrador, são profissionais prestadores de serviços à comunidade em caráter privado, porém com função delegada pelo próprio Poder Público, que dotou-lhes de fé pública para oficializar os documentos firmados.

Da função social do tabelião: competência como mediador em matéria de escritura pública

A função notarial é de substancial importância para o ordenamento pátrio, bem como para a sociedade, tendo em vista a segurança jurídica gerada pelos atos praticados pelo notário, contudo, a função social exercida por tal profissional também merece destaque.

No que se refere à prevenção de litígios, o notariado contribui para a diminuição do número de ações nos cartórios judiciais e confere otimização a procedimentos, graças ao mérito na sua organização e estruturação. Nesse sentido, Chossani (2015) refere que “sem sombra de dúvidas, na promoção da desjudicialização, o extrajudicial mostra-se como salutar aliado” uma vez que a sociedade, que sofre com a prestação jurisdicional ineficiente, morosa e é carente de serviços públicos que gozem de prestígio e credibilidade, pode contar com serviço público (exercido em caráter particular, ver item 4.2), de qualidade, devidamente fiscalizado pelo Poder Judiciário.

Bolzan de Morais e Spengler (2011, p. 111) ressaltam a importância da resolução de conflitos extrajudicial:

Vivemos uma transição de paradigmas, e a contrapartida que se apresenta, nestes termos de crise dos sistemas judiciários de regulamentação de conflitos, é percebida pelo crescimento em importância dos instrumentos consensuais e extrajudiciários.

Conforme ensina Álvarez (1990, p. 01):

A função notarial se resume na autorização do instrumento público, porém, complementada por uma série de atos. Assim, a função do notário consiste em receber ou indagar a vontade das partes; assessorar como técnico as partes e com isso dar forma jurídica à vontade das partes: redigir o escrito que se converterá em instrumento público; autorizar o instrumento público, dando-lhe forma pública e credibilidade; conservar o instrumento autorizado; expedir cópias do instrumento.

Portanto, o assessoramento técnico-jurídico às partes faz parte do trabalho do tabelião, devendo ele fazer o aconselhamento e esclarecer os riscos que o negócio jurídico poderia trazer, não cabendo a cobrança de emolumentos, que serão devidos somente se a lavratura do ato seja concretizada (COLÉGIO REGISTRAL DO RIO GRANDE DO SUL, 2015, texto digital).

Dessa forma, o tabelião exerce função social de grande relevância, exercendo um juízo preventivo e informativo, assegurando a realização voluntária do direito, agindo com imparcialidade, agindo dentro dos ditames legais e atendendo de forma igualitária as partes.

Assim, pode-se observar que, tanto na função notarial quanto na mediação, a autocomposição está presente, sendo que ela, conforme Didier (2009, texto digital) é “a solução do conflito é construída pelas partes, pelos conflitantes. Eles próprios resolvem o conflito. Um não impõe ao outro, nem é um terceiro que impõe”. Completa Sander (2005, texto digital):

[...] uma visão mais moderna do direito se fundamenta na noção de que um sistema jurídico, para ser considerado eficiente, deve contar com procedimentos, bem como instituições, que visam prevenir e resolver conflitos levando-se em consideração a real necessidade e, assim, o trabalho dos notários, em alguns de seus aspectos, se assemelham à função do mediador.

Porém, mister frisar que a função notarial tem caráter preventivo à litigiosidade, intervindo apenas quando procurado pelas partes, com o objetivo de evitar a lide, pacificando os interesses preventivamente, enquanto o mediador atua após o conflito.

Cavalcanti Neto (2011, texto digital), assevera que:

É de notar que a função notarial é um instituto de grande relevância jurídico-social, dado seu caráter de prevenção de litígios, fazendo com que os indivíduos possam ver assegurada a eficácia de seus negócios jurídicos, através de um agente público delegado, vinculado a parâmetros normativos que regem o exercício de sua função.

Conclui-se, portanto, que o procedimento administrativo no tabelionato, para a realização do inventário extrajudicial, apresenta como benefícios a praticidade, facilidade, celeridade e economia, sem perder a eficiência e a qualidade dos atos praticados.

REFERÊNCIAS:

ÁLVAREZ, Pedro Ávila. Derecho notarial. 7. ed. Barcelona: Bosch, 1990.

BRASIL. Lei n. 6.015, de 31 de dezembro de 1973. Dispõe sobre os registros públicos, e dá outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L6015original.htm>. Acesso em: 31 out. 2015.

CAVALCANTI NETO, Clóvis Tenório. A evolução histórica do direito notarial. Jus Navigandi, Teresina, ano 16, n. 2855, 26 abr. 2011. Disponível em: <http://jus.com.br/artigos/18978>. Acesso em: 30 out. 2015.

______. Linhas preliminares da atividade notarial. Jus Navigandi, Teresina, ano 16, n. 2896, 6 jun. 2011. Disponível em: <http://jus.com.br/artigos/19262>. Acesso em: 30 out. 2015

ERPEN, Décio Antônio; PAIVA, João Pedro Lamana. Princípios do registro imobiliário formal In: DIP, Ricardo Henry Marques (Coord.). Introdução ao direito notarial e registral. Porto Alegre: SAFE/IRIB, 2004. p. 169-184.

CHOSSANI, Frank Wendel. Registradores, Tabeliães e o Concurso Público – Profissionalismo de Ponta. Colégio Registral do Rio Grande Do Sul. Porto Alegre, 17 jul. 2015. Disponível em: <http://www.colegioregistralrs.org.br/publicacoes/doutrinaCompleta?id=30258>. Acesso em: 30 out. 2015.

COLÉGIO REGISTRAL DO RIO GRANDE DO SUL. A Função do Tabelião na Prevenção de Litígios. Porto Alegre, 02 jan. 2003. Disponível em: <http://www.colegioregistralrs.org.br/publicacoes/doutrinaCompleta?id=13141>. Acesso em: 30 out. 2015.

SANDER, Tatiane. O Notário como Instrumento de Mediação do Direito e como Agente da Paz Social. Boletim Jurídico, Uberaba/MG, a. 3, n. 133. Disponível em: <http://www.boletimjuridico.com.br/m/texto.asp?id=686> Acesso em: 13 nov. 2015.