Da Filosofia Ao Ensino Da Língua: Aprender A Pensar Ou Aprender A Pensar Melhor?
Por Djalmira Sá Almeida | 18/06/2008 | Filosofia1. Contexto Escolar
Para muitos professores, os motivos por que se estuda ou se deve estudar Filosofia para bem falar e escrever confundem-se com os objetivos do ensino em geral. Supõem que o aluno adquira hábitos de pesquisa, treino de raciocínio, espírito crítico, criatividade, imaginação e participação dialogante; e, se esquecem que esses são objetivos gerais de todo o ensino, e não especificamente da Filosofia. Por isso, é muito comum ouvir a afirmação de que os jovens ingressam nas universidades sem saber pensar ou sem saber estudar e que somente a implantação da matéria Filosofia em todos os cursos de nível superior é que poderia ajudá-los a aprender a pensar.
No meu entendimento, o papel da Filosofia é fazer o aluno pensar melhor, pois fortalece as habilidades do pensamento que ele já possui. Porém, em se tratando de ensino de língua, a Filosofia pode contribuir, se for explorada como um processo e não só como um produto, ou seja, se for ensinada através da articulação das quatro abordagens existentes no ensino: tradicional, evolucionista, conceitual e lingüística (SOUZA, 1995). Isto porque, no ensino de redação o que é preciso é buscar meios de manifestar esse pensamento na sua dupla forma (oral e escrita) e através de outras linguagens não verbais.
Para conciliar entre processo e produto, Severino (1989:2) sugere algumas possibilidades de abordagem da matéria de Filosofia que também podem ser utilizadas em termos de ensino da língua. Segundo ele, para atingir os fins propostos à aprendizagem da Filosofia, o professor pode fazer uso das seguintes formas de abordagem: sistemática, histórica, temática e textual.
Em se tratando de abordagens de ensino, a sistemática ou tradicional concebe o conhecimento, tanto o filosófico quanto o lingüístico, como conjunto de dados previamente organizados e estruturados que privilegiam a forma em detrimento do conteúdo. Esse conteúdo, sendo apropriado pelo aluno como um produto pronto, geralmente é transmitido através da repetição de teorias já consolidadas.
Na abordagem histórica ou evolucionista porém, tanto a filosofia quanto a linguagem são encaradas como manifestações culturais que se apresentam ao longo do tempo, fruto da reação do pensamento humano diante dos acontecimentos presentes nos diversos momentos do processo social que evolui e se transforma constantemente. Essa abordagem incentiva o aluno a pensar como resposta criativa para resolver problemas novos.
A abordagem temática ou conceitual, através da reflexão, convida o aluno a aprender a aprender, desafiando a consciência humana, tomando como ponto de partida os problemas que ele enfrenta no seu cotidiano. Assim, parte-se da experiência concreta para se chegar à elaboração de conceitos os quais se apresentam como solução aos desafios da experiência.
A abordagem textual retoma e acompanha o processo instaurador da reflexão de autores expresso em seus escritos. Desse modo, o aluno aprende a estudar e a buscar saídas por meio da leitura e análise de obras escritas que lhe revelam o pensamento do autor, suas intenções, seus propósitos, para repensar os seus problemas.
Essas abordagens se complementam. Através da abordagem sistemática, o estudante pode identificar as áreas de problematização (Epistemologia, Axiologia e Antropologia). Por meio da abordagem histórica o aluno resgata a maneira encontrada pelos homens, através dos tempos, de enfrentar os desafios de sua época.
Isso ajuda a compreender de forma dialética os problemas que ele deve encarar no presente. Pela abordagem textual, o aluno pode buscar exemplos concretos do pensar expresso nas obras dos autores, tendo em vista um novo pensar para a experiência problemática vivida.
O uso isolado dessas formas de abordagens revela uma escolha entre duas posturas possíveis: o ensino da língua como processo ou como produto.
Desse modo, à medida que se enfatiza a abordagem sistemática ou a histórica, assume-se a postura do ensino como produto, reduzindo os alunos a meros repetidores de categorias e conceitos consolidados, alheios à realidade vivida pelos alunos; transforma os alunos em contadores de casos que se limitam a relatar fatos históricos do passado sem articulação dialética com o presente. Aulas assim podem transformar a escola em espaço aberto apenas ao exercício de erudição retórica.
Por outro lado, o uso apenas da análise temática também pode transformar as aulas em um debate animado, porém desprovidas de conteúdo, correndo o risco de tomarem como problema algumas situações escolhidas pelos alunos ou manifestações espontâneas e sem fundamentação.
Enfim, a abordagem textual por si só transforma a análise e a leitura de textos em um fim em si mesmo, deixando de ser fio condutor para uma efetiva compreensão da realidade.
No entanto, o uso articulado das quatro abordagens pode revelar, por parte dos professores, uma nova opção pelo ensino como processo. Adotando essa postura, as aulas passam a ser espaço para que o aluno aprenda a pensar melhor, estimulando-o a fazer uso de suas habilidades de pensamento a partir de conhecimentos que alcancem todos os aspectos do conhecimento humano.
2. Métodos
Do ponto de vista didático-pedagógico, o ensino da Língua Portuguesa não se esgota na questão do uso isolado ou articulado das quatro formas de abordagem descritas, nem se restringe à ênfase dada a uma das posturas possíveis ao seu uso integrado. O processo didático completa-se com a escolha de métodos que possibilitem a aprendizagem.
Segundo Souza (1995:11-16), os pensadores sempre se utilizaram de métodos para produzir conhecimentos que são adotados, até hoje, no ensino tanto da Filosofia quanto da língua. Embora cientificamente existam apenas dois métodos, o dedutivo e o indutivo, esses podem variar tanto quanto são os educadores. As variações desses métodos, os mais comuns entre os que se dedicam ao ensino são: expositivo, interrogativo, socrático (dialogado), da análise textual, da análise lingüística e do estudo dirigido.
O método expositivo consiste na apresentação oral sistemática e dosada de um tema ou assunto pelo professor para um grupo de alunos. São as aulas expositivas que atualmente vêm sendo rejeitadas na literatura didático-pedagógica, porém ainda muito praticadas no dia-a-dia das escolas especialmente nas universidades.
Quanto ao método interrogativo, este é um dos recursos mais comuns e eficazes da didática que consiste no uso de perguntas feitas pelo professor a um aluno em particular, ou a uma classe sobre fatos, teorias, conceitos e relações entre eles. As perguntas são utilizadas em situações didáticas para incitar o aluno a fazer uso de suas habilidades de pensamento.
O método de exposição dialogada, porém, na visão de muitos educadores, é o mais adequado para o processo de ensino da língua. A aprendizagem desenvolve por meio de um encadeamento de perguntas e respostas através do qual o pensamento do aluno é incorporado no processo dialético da reflexão.
Há uma diferença fundamental entre o método interrogativo e o de exposição dialogada, uma vez que perguntas isoladas não bastam para produzir a articulação de conceitos como ocorre na exposição dialogada. Esse método tem origem com Sócrates, mas não mantém nenhum vínculo com a doutrina filosófica.
Considerações finais.
No método de leitura e análise de textos, usado quando se lêem e se comenta em classe obras de autores consagrados ou não, tem-se a finalidade de exercitar o aluno na compreensão do conteúdo presente nessas obras. Primeiro, por meio de leitura e análise de textos em sala de aula, sem pretensão de controlar ou avaliar. Depois, pelo incentivo ao interesse pedagógico da leitura com o objetivo de permitir ao aluno a apreensão da consistência do pensamento e da capacidade explicativa das obras e dos autores escolhidos, e, no caso da redação, com o objetivo de incluir análise de aspectos literários e lingüísticos, bem como, aspectos da lógica e da retórica, comuns aos textos acadêmicos.
BIBLIOGRAFIA
SOUZA, Sonia Maria Ribeiro de. Um outro olhar: Filosofia. São Paulo: FTD, 1995.
SEVERINO, Antônio Joaquim. Educação, produção do conhecimento e função social da escrita. São Paulo: Idéias. SE/FDE, 1989.