Crise eleva diferença entre ganhos com fundos de crédito privado

Por Agência Goodae | 14/08/2009 | Economia

AE Investimentos
3/3/2009

Mariana Segala - AE

A crise financeira mundial tem aumentado a diferença entre as melhores e piores rentabilidades dos fundos que incluem títulos de crédito privado na carteira, o que aumenta o risco – de ganhar ou perder – neste tipo de aplicação. A conclusão é de um levantamento elaborado pela consultoria PR&A, especializada em análise de risco para investimentos. O levantamento incluiu fundos de renda fixa, multimercados e previdenciários.

Segundo pesquisa com 56 fundos, entre janeiro e agosto do ano passado, antes da intensificação da crise, o retorno do fundo de crédito privado que teve o pior desempenho foi de 5,99%, enquanto o melhor resultado atingiu 13,43% - uma diferença de 2,24 vezes. No mesmo período, o Certificado de Depósito Interbancário (taxa de juros dos empréstimos feitos entre bancos) foi de 7,59%. Já nos primeiros 45 dias de 2009 (até o dia 17 de fevereiro), o fundo que teve pior retorno amargou prejuízo de 24,70%, e o melhor retorno atingiu 2,97%. O CDI do período foi de 1,57%.

Neste ano, os piores desempenhos foram de fundos que incluíam papéis emitidos pela empresa de confecções Zoomp, que teve falência decretada pela Justiça paulista no início de fevereiro, explica o sócio-diretor da PR&A, Sérgio Malacrida. Apesar de a empresa ter conseguido uma liminar que deixou o processo falimentar em suspenso, os administradores dos fundos provisionaram perdas de 100% para seus títulos – o que significa dizer que os papéis passaram a valer zero. Mas, mesmo excluindo esses fundos do levantamento, houve aumento da diferença entre as rentabilidades. Nesse caso, o fundo com melhor desempenho atingiu 2,97%, enquanto o pior rendeu apenas 0,58%. A diferença é de 5,12 vezes - bem maior que a de 2,24 vezes verificada entre janeiro e agosto de 2008.

As empresas emitem títulos de crédito – ou papéis de dívida – como forma de captar recursos no mercado financeiro, com o compromisso de devolver o valor principal mais juros na data prevista para o vencimento.

Efeito marcação
Segundo Malacrida, a dispersão da rentabilidade desses fundos tem crescido nos últimos meses principalmente devido à marcação a mercado dos papéis. Ou seja, pelo processo que atualiza diariamente o valor de uma carteira a partir do preço corrente das aplicações que a compõem.

“Basicamente, o que fez aumentar substancialmente a dispersão depois da crise foi a marcação a mercado”, afirma Malacrida. Com falta de crédito no sistema financeiro, as empresas passaram a oferecer juros maiores nas novas emissões de papéis privados. Com isso, papéis antigos, que ofereciam taxas menos atrativas sofrem uma desvalorização. “Se tenho uma debênture pagando uma taxa e outra empresa, com a mesma classificação de crédito (ou rating que mede a chance de uma companhia dar calote na sua dívida), emite outra debênture pagando juros maiores, preciso marcar a debênture antiga ao novo preço estabelecido pelo mercado”, explica.

Ao mesmo tempo em que a aumentou a diferença entre os melhores e os piores retornos nos dois períodos estudados, a rentabilidade média dos fundos de crédito privado melhorou, segundo o levantamento da PR&A. De acordo com o estudo, pouco menos de um terço dos 56 fundos conseguiu rentabilidade acima do CDI, entre janeiro e agosto do ano passado. Já em 2009, quase 60% dos fundos conseguiram superar o CDI.

Isso ocorreu porque, a despeito da marcação a mercado, alguns fundos conseguiram aproveitar as boas oportunidades de investimento que apareceram desde setembro. “Surgiram papéis com boas taxas de juros que os fundos compraram, capturando esse retorno”, explica o sócio da consultoria Beta Advisors, Rogério Betti.

Betti, da Beta Advisors, lembra o caso da emissão de debêntures feita em janeiro pela Bradespar, empresa de participações do Bradesco que hoje integra o bloco de controle da mineradora Vale. A companhia ofereceu juros equivalentes a 125% do CDI. “O mercado teve de se ajustar a essa emissão”, diz. Afinal, se uma empresa do porte da Bradespar teve de oferecer 125% do CDI para conseguir captar dinheiro, empresas menores tiveram de oferecer boas taxas para conquistar investidores.

Betti ressalta que, muito provavelmente, os fundos com crédito privado que registram as menores rentabilidades possuem na carteira “piores créditos” em relação aos “melhores créditos” incluídos nas aplicações dos fundos que se saem bem. “É provável que alguns fundos tivessem uma concentração maior de papéis de empresas com ratings menores”, afirma.

No levantamento, o corte foi feito a partir da composição da carteira. Foram considerados todos os fundos da indústria que tivessem, ao menos, 20% da carteira formada por títulos de crédito privado de empresas não financeiras – ou seja, nesta conta não entraram, por exemplo, os CDBs (Certificados de Depósito Bancário) de bancos, títulos privados dos mais comuns e populares. A maior parte dos fundos selecionados é de gestoras independentes, voltados para grandes investidores, com investimento inicial de R$ 20 mil.