Crianças invisíveis. (Os velhos e bons amigos)

Por Pablo Araujo de Carvalho | 01/05/2016 | Crônicas

Crianças invisíveis. (Os velhos e bons amigos) Brincávamos todos juntos… éramos 5 ou 7, brincávamos para esquecer o vazio que preenchia o nosso íntimo… A palavra vazio é muito forte… o que tínhamos em nosso peito eram marcas profundas da dor, essa mesma dor que se irradiava em nossos labios como um sorriso discreto de esperança. Corríamos de peito aberto e a brisa que soprava aliviava a cicatriz que se mostrava de fora a fora em nosso peito branco, preto, amarelo e mulato… O que nos unia era a dor e uma ponta de esperança, podíamos nos olhar sem nada falar e descrevíamos a dor um do outro… a vida tão cedo nos marcava, éramos dor que corria, pulava, sorria e cantava… éramos dores saltitantes… O que nos unia era a dor e só uma ponta de esperança… o grito de revolta era mascarado pelo grito de gol, as lágrimas de tristeza era sufocada pela salada mista da brincadeira: beijo, abraço ou aperto de mão… dissimulávamos a dor quando tínhamos fôlego para fazê-la, nossa revolta diminuía ao som dos atabaques que nos acalmavam. Éramos crianças e a esperança era brincadeira… O que nos unia era a dor… Tornamo-nos adulto e a dor de tanto sufoca-la deu lugar à um imenso vazio, e a esperança, essa já não existe, pois já não tem mais brincadeiras, nem salada mista, já não tem pique esconde, pois esconder não é mais brincadeira e sim um vício moral… ficamos adulto e ficamos fadado a não mais sentir dor, somente um eterno vazio… a nossa cicatriz já não se refresca com o banho de chuva e nossa angústia já não explode com o grito de gol… O que nos unia era a dor e se já não temos mais dor, não temos esperança, pois crescemos e ela mudou de nome e passou a chamar-se ócio e nós néscio... Éramos bons amigos pois o que nos unia e o que nos igualava era a dor… crianças invisíveis, adultos vazios… Éramos bons amigos e com toda a certeza, o que nos unia e o que nos igualava era dividir a nossa dor… éramos dor, mas com a dor dividida eramos menos dor. Éramos dor no fim, mas no fim não há culpados, mas só dores...dores que se procuram, dores que se abraçam, dores que soluçam, dores que se estilhaçam, dores que se arrependem, dores que se enlaçam e dores... Dores de Dolores, dores de Das Dores, dores...dores que despertam amor...No final só há cura... No final só há dores...No final só há curadores...Éramos, fomos, somos, bons, velhos, dor? Amigos...