COTAS NAS UNIVERSIDADES: UMA POLÍTICA DE INCLUSÃO SOCIAL

Por Laércio Silva dos santos | 05/07/2014 | Educação

FATEFFIR – Faculdade de Teologia Fides Reformata

Pólo de Jataí


Curso de Mestrado em Educação Holística
Disciplina Educação Inclusiva


Laércio Silva dos Santos

 

 

 

 

 

 

COTAS NAS UNIVERSIDADES: UMA POLÍTICA DE INCLUSÃO SOCIAL

Artigo apresentado à FATEFFIR – Faculdade de Teologia Fides Reformata – Pólo de Jataí – Curso de Mestrado em Educação Holística, na disciplina Educação Inclusiva, sob a orientação do professor Dr. Marcílio Sampaio dos Santos.

Jataí – GO

Dezembro /2012

COTAS NAS UNIVERSIDADES: UMA POLÍTICA DE INCLUSÃO SOCIAL

Laércio Silva dos Santos

RESUMO

 

Este trabalho tem como objetivo fazer uma reflexão acerca da polêmica que o tema Política de Cotas para negros nas universidades brasileiras trouxe para a nossa realidade.  Neste trabalho serão apresentados estudos de cinco artigos científicos de estudiosos que tratam do assunto, cada um com seu  posicionamento, o que nos proporciona uma análise mais acurada para compreender quais os principais pontos de confluência e divergência entre as diversas teses apresentadas, para buscar uma compreensão madura sobre este problema social sério que o Brasil enfrenta.

Palavras-chave: Discriminação. Inclusão Social. Negros. Política de Cotas. Educação Superior. Acesso  e  permanência.

ABSTRACT

This work aims to reflect about the controversy that the theme of Quota
Policy for blacks in Brazilian universities brought to our reality. In this
paper we present studies of five scientific papers of scholars dealing with
the subject, each with its positioning, which gives us a more accurate
analysis to understand what the main points of convergence and divergence
between the various submissions made to seek an understanding mature about
this serious social problem facing Brazil.

 

 Keywords:  Discrimination. Social Inclusion. Negros. Quota Policy. Higher Education. Access and retention.

 

 

 

INTRODUÇÃO

 

As cotas para negros na universidade pública se tornaram um assunto recorrente na sociedade brasileira e transformaram-se numa polêmica que agita as mais diversas opiniões pelo Brasil afora.  Neste artigo analisaremos algumas opiniões acerca desta temática cheia de controvérsias.  Dentre as opiniões analisadas nas leituras encontraremos algumas que são mais moderadas, outras mais radicais,  muitas com pontos em comum: que a mazela da desigualdade social existe e que de alguma forma ela deve ser extirpada da sociedade, e o mal tem de ser reparado.

Encontramos também, nas leituras, posições acerca do assunto, com firmeza para a manutenção dos privilégios e do poder. Este tipo de discurso vai ser encontrado ao longo de muitos textos, mas a maioria dos textos pesquisados aponta para um único caminho: a estruturação do sistema de ensino brasileiro. Só dessa forma as desigualdades poderão ser minoradas e o povo poderá ter mais acesso aos meios de produção, inclusive os negros, que são os mais excluídos do processo social, educativo e econômico.

A seguir faremos uma breve revisão bibliográfica, para elucidar com maior clareza a questão apresentada. São textos de artigos científicos publicados que abordam o assunto de forma bem detalhada, contudo de fácil compreensão.

 

COTAS NAS UNIVERSIDADES: UMA POLÍTICA DE INCLUSÃO SOCIAL

O Brasil é principiante em políticas públicas no que diz respeito a ações afirmativas para minimizar a desigualdade racial.  A partir da década de 90, aqui no território nacional, foram intensificados os debates sobre a democratização do acesso ao ensino superior.  Junto a essa movimentação, obrigatoriamente, sobreveio às discussões, as idéias sobre a política de cotas nas universidades, como forma de Inclusão das classes menos favorecidas, dos negros e pardos, que são alvos da discriminação social, excluídos do processo educativo, portanto sem perspectivas de aceso aos meios de ascensão social.

O debate acerca das cotas hoje é posto na ordem do dia, desde as conversas do dia-a-dia e até como objeto de debates acalorados no judiciário.

Esse debate, acerca das cotas raciais no ensino superior, passou a ser uma bandeira política do movimento negro no Brasil que, a partir dos anos 80, teve uma intensificação. Porém, somente a partir de 2001 é que esses debates tomam fôlego e começam a tomar corpo no sentido de fazer valer a luta, com elaboração de propostas e documentos que garantissem os direitos aos excluídos.

Para Maio & Santos (2005, p. 188) o que impulsionou o Brasil a tomar rumo às ações afirmativas foi a Conferência Mundial Contra o Racismo, Discriminação Racial, Xenofobia e Formas Correlatas de Intolerância, realizada em Durban, África do Sul, sob o patrocínio da ONU. Os autores apontam que, apesar da Conferência em Durban ter dado foco maior aos conflitos que existiam entre EUA, Israel e países árabes, acerca da afirmação de que o “sionismo seria uma forma de racismo”, o saldo foi extremamente positivo para o Brasil no que diz respeito à preparação das ações afirmativas futuras que o Brasil passaria a tomar a partir daquele momento histórico.

“Os efeitos de Durban se fizeram sentir no Brasil de imediato. O governo estava atento a demonstrar, no plano internacional, seu interesse em cumprir resoluções elaboradas em fóruns multilaterais em nome dos princípios da igualdade, inclusive racial, sob o signo dos direitos humanos.”  Maio & Santos (2005, p. 188)

Logo após a Conferência realizada em Durban o governo brasileiro estabeleceu um programa de cotas no âmbito de alguns ministérios. Nos estados e nos municípios muitas ações foram empreendidas pelo Brasil afora, com destaque para a criação de vagas nas Universidades Estaduais do Rio de Janeiro. “Aquela que obteve maior destaque no final do ano de 2001 foi a da Assembléia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro, que estabeleceu uma porcentagem das vagas das universidades estaduais para pretos e pardos.” Maio & Santos (2005, p. 189).  

A  UnB foi a primeira a adotar o programa e, além disso, estabeleceu critérios adicionais à autodeclaração para definir quem seriam os “negros”, ou seja, quem seriam os beneficiários dentro do programa. Justamente por causa da utilização desses critérios de seleção o vestibular da UnB  “transformou-se em uma espécie de pedagogia racial, de conversão identitária de pardos e pretos em “negros”, culminando no trabalho da comissão encarregada de identificar os “verdadeiros” beneficiários das cotas.” (Maio & Santos, p. 193).  A seleção das cotas da UnB passou a ser definida pelo seu departamento de antropologia, equipe de Anatomia Racial, que constituía uma comissão para avaliar a negritude dos candidatos seguindo padrões ou “fenótipos” da raça como tom da pele, formato dos lábios e cabelos. Além disso, passaram a recorrer ao recurso da fotografia, para que a comissão tivesse maior subsidio para apresentar uma avaliação consistente e seleção dos prováveis beneficiários negros dentro do programa de cotas.  Isso fazia com que houvesse constrangimentos diversos, pois só os negros que precisavam ser fotografados. Notadamente isso configurava em uma separação entre brancos e negros, com a separação desde as filas para inscrição, pois tinham de passar pelo procedimento do registro fotográfico. Vários cenários foram construídos a partir disso, contudo a polêmica acerca do assunto nunca acabou. Sabe-se que encontrar um denominador comum neste debate é muito difícil, pois há muitos aspectos históricos, culturais, de miscigenação, envolvidos nesta temática.

Considera-se que a UnB realizou uma ruptura entre os acordos que vigoravam no início da implantação do sistema de cotas no Brasil, pois estabeleceu critérios e valorizou-os dentro do sistema criado, de modo que o vestibular com o sistema de cotas foi rotulado por alguns órgãos de imprensa como o “tribunal das raças”, Maio & Santos (2005). Ao contrário, as outras instituições, que seguiram adotando o benefício das cotas, utilizando-se apenas da autodeclaração do candidato.  O caso da UnB aponta para uma articulação entre os movimentos sociais e as instâncias governamentais para a inserção da política de cotas em uma Universidade Federal, Maio & Santos (2005).  E mais, a simbologia que isso representou, pois a UnB é uma Universidade Federal que está localizada geograficamente ao lado dos três poderes da República. Mais que uma ação afirmativa a Implantação das Cotas Raciais na UnB, passa a ter um caráter de “exemplo”, de “vitrine” para a sociedade, que de certo modo em uma grande parcela discute isso com muito calor. Em todas as esferas de poder no Brasil há que se combater as iniqüidades existentes na educação, saúde ou em condições de desenvolvimento econômico. Porém, o maior problema reside nas formas de enfrentamento dessas mazelas, visto que há consenso na existência delas e na relevância desses problemas na sociedade. Contudo, na luta pela liberdade, pela construção de uma sociedade mais justa e pelo desfazimento das mazelas racistas, corre-se o risco de tomarmos rumo para a construção de categorias distintas, fixadas por normas e leis sob determinação das políticas públicas, Maio & Santos (2005). E por ser um assunto essencialmente polêmico, continua presente na ordem do dia até hoje.

Já para Maggie & Fry (2004), as reservas de vagas para negros, propostas como ações afirmativas, conseqüência das ações pós Durban, são ações em benefício da população negra, e além do a-racismo e do anti-racismo fazem uma ruptura com a ideologia que concebe o Brasil como o país das misturas de raças. Entretanto, segundo esse raciocínio passa-se, após essas ações afirmativas, a conceber o Brasil como o país de grupos estanques, ou seja, com grupos que não tem direito (brancos) e grupos que têm direito à ação afirmativa (negros). Ainda considera que o cidadão brasileiro não poderá mais se identificar como o Macunaíma do Modernismo Brasileiro; agora ele terá de pertencer a uma “raça” ou a outra. Isso na visão deles pode ocasionar uma segregação, um apartheid de raças no Brasil.

Não se convencem de que seja possível “corrigir” as desigualdades, seja ela de qualquer forma, com políticas afirmativas a custo zero. Neste contexto, afirmam que o argumento de que as cotas incentivarão as animosidades raciais são presentes na sociedade e que isso não pode ser subestimado.

“Não se vence o racismo celebrando conceito de “raça”, sem o qual, evidentemente, o racismo não pode existir. Iniciativas de ação afirmativas oriunda da sociedade civil produzem conseqüências semelhantes para aquelas poucas pessoas envolvidas. Mas quando são cotas raciais se tornam política de Estado, determinando a distribuição de bens e serviços públicos, ninguém escapa à obrigação de se submeter à classificação racial bipolar. O impacto sobre a sociedade como um todo não pode ser subestimado, portanto.” (Maggie & Fry 2004, p. 77).

Seguindo este raciocínio, as ações afirmativas anti-raciais deveriam ser substituídas por uma solução “universalista”, como por exemplo, o projeto que se refere à repetência e a distorção idade/série. No lugar das cotas, que impõe uma racialização, sugerem que ofereça pra comunidade uma escola pública de qualidade nas periferias das metrópoles, ao invés de instalar essa mesma escola nos bairros de classe média alta, isso propiciaria maior oportunidade aos negros, considerando que a maioria dos pobres é constituída por negros. Entretanto, isso teria um custo material muito grande e segundo (Maggie & Fry 2004) seria difícil ou até impossível convencer a classe média a aceitar um sacrifício dessa natureza. Então, para aqueles que perderiam muito com a política de transferência de recursos, é mais fácil apoiar as cotas que não afetam e não custam nada.

Do mesmo modo, no calor do debate nacional sobre as cotas, (QUEIROZ, 2006), numa análise de uma pesquisa realizada sobre a inserção do sistema de cotas na Universidade Federal da Bahia, mostra que os resultados obtidos apontam para uma dinâmica e idêntica percepção de políticas públicas pela sociedade brasileira no que diz respeito às cotas para negros na Universidade Pública. Inicialmente, numa pesquisa de opinião as pessoas se posicionaram sobre o assunto cotas, e as preocupações principais eram: o futuro do país, se não poderia se tornar uma sociedade racializada como nos EUA e África do Sul; dificuldades que os estudantes cotistas encontrariam nos cursos; a ideologia da mestiçagem em contraposição à utilização do conceito de raça; a qualidade do ensino na universidade, por conseqüência a manutenção do mérito. (QUEIROZ, 2006, p. 725).

De acordo com a leitura, os argumentos nos levam a entender que há uma clara defesa de privilégios para aqueles que se posicionam contra o sistema de cotas. Para entender isso de forma mais concreta (QUEIROZ, 2006) realiza comparativos de dados de vestibulares realizados na Universidade Federal da Bahia. Passa-se então a compreender que a realidade começa a mostrar sinais de mudanças.

Com o aumento da participação dos estudantes de escola publicas e, conseqüentemente, dos negros, realizou-se exames de desempenho dos cotistas, o que trouxe resultados animadores nos cursos em diversas áreas de conhecimento na UFBA. Esses resultados vieram de encontro às preocupações daqueles que se mostravam resistentes à implantação do sistema na universidade.  De acordo com (QUEIROZ, 2006, p. 734) “a análise dos dados nos leva, portanto, a argumentar que o debate entre os intelectuais manteve-se no aspecto político ideológico.”  A resistência faz com que as pessoas tenham uma concepção dualista da realidade, ou seja, a vejam com dois princípios opostos: o grupo favorável e o contrário ao sistema de cotas.  Contudo, segundo (QUEIROZ, 2006), Esta polarização ampara-se em argumentos frágeis, principalmente se observados os dados de desempenho no vestibular e nos cursos, ou mesmo se analisadas as experiências de projeto de permanência de estudantes cotistas.”  A tendência dos alunos negros ingressantes nas universidades é de se auto-afirmarem como negros, o que é positivo para a sua afirmação como indivíduo na sociedade. De certo, o que se depreende do sistema de cotas para negros, e das análises bibliográfica realizadas até agora, é que o sistema trata-se de respostas ao crescente nível de desigualdade existente em nosso país. E que o preocupante e divulgado medo da racialização brasileira, representado por intelectuais contrários, não é nada mais do que um discurso de manutenção de privilégios e poder. A política de inclusão dos negros na universidade reflete a demanda existente no país, à desigualdade sócio-racial, que precisa ser extirpada. Para isso o poder público terá de investir nas escolas públicas, para dar-lhes mais qualidade e nas universidades, visto que as cotas têm caráter transitório.  E, contrariamente aos argumentos de que o nível da universidade cai com a inclusão dos cotistas, as pesquisas mostram que a diferença na entrada entre os cotistas e os não cotistas não é tão grande, e que os alunos cotistas tendem a ter excelente desempenho no decorrer dos cursos, não importa qual seja.

No texto “Mitos e controvérsias sobre a política de cotas para negros na educação superior” de (BITTAR & ALMEIDA, 2006) realiza-se uma análise do processo de implantação da política de cotas para negros na Educação Superior tendo como indicador as implementações realizadas na Universidade Federal do Mato Grosso do Sul. Para essa finalidade foi realizado um trabalho de entrevistas a alunos ingressantes em vários cursos. O que se entendeu do trabalho de pesquisa é que os alunos ingressantes das cotas dos negros entenderam o processo como direito e que a permanência deles nos cursos se condicionava a algumas ações efetivas, como por exemplo, bolsas de estudos e apoio pedagógico. Dentro deste contexto as cotas representam uma forma de garantir o respeito à diversidade racial e a superação das desigualdades que foram construídas ao longo da história. Contudo, só o acesso não representa a conquista, é preciso acessar e poder tirar desse acesso os benefícios necessários para a mudança na vida.

O respeito à diversidade é necessário porque em todos os momentos, essas discussões no Brasil,  trazem à tona as concepções racistas e discriminatórias, que estão arraigadas no meio social. É preciso discutir essas diferenças com maturidade. É preciso entender que as mazelas existentes hoje em nosso sistema foram criadas pelas desigualdades nos acessos aos bens de produção ao longo do desenvolvimento da história humana.  A luta pela igualdade, contra a discriminação racial já se arrasta a muito tempo.

“A luta do homem contra a discriminação racial teve sua origem nas idéias defendidas pela Independência Americana, em 1776, e na Revolução Francesa, em 1789, no surgimento dos ideais democráticos e, principalmente, na luta dos homens pelos seus direitos naturais. Consideramos essas verdades como sendo auto-evidentes, que todos os homens são criados iguais, que eles são dotados pelo criador com certos direitos inalienáveis, que entre esses (direitos) estão a vida, a liberdade e a busca da felicidade, proclamou a Declaração de Independência Americana em 1776 (Fundação Cultural Palmares, 2005). (BITTAR & ALMEIDA, 2006, p.142).

Apenas uma pequena parcela dos rendimentos do país fica com os negros. Há um pouco de pardos que são bem sucedidos, mas a esmagadora maioria que detêm o poder é a branca. Esse panorama econômico do nosso Brasil nos força a pensar que verdadeiramente a desigualdade tem um explicito componente racial. Isso deveria ser diferente porque o nosso país é um dos países que tem a segunda maior população de negros do mundo. O IDH do Brasil, em pesquisa da Fundação Palmares em 2005, a posição do Brasil é a 69ª considerada uma posição média. Considerando a questão racial a posição cai para 101ª, considerado médio-baixo. Tirando os negros o IDH eleva o país para a posição 46ª, classificado como IDH alto. A partir daí dá pra tirar algumas conclusões fortes. É visível que há uma grande distância entre o mundo dos brancos e dos negros.

“Esses dados indicam que a população negra encontra-se em condição social, econômica e educacional inferior aos demais segmentos da população, uma vez que, ao ser realizado o recorte racial, separando a população negra da população branca, o IDH nacional é alterado significativamente.” (BITTAR & ALMEIDA, 2006, p.145).

Temos mais de 79 milhões de afrodescendentes em nosso país, mas na universidade tínhamos menos de 3% de negros na Educação Superior em 2006. É uma desigualdade muito grande que de forma contundente traduz um grande atraso para o país que já é uma das grandes potências econômicas do mundo. Enquanto o nível das Escolas Fundamentais e Médias não melhorarem ficará difícil a entrada de alunos de classes menos favorecidas nos cursos superiores. Melhorando o nível a entrada será facilitada e a permanência garantida, pois não haverá mais a desculpa de que o nível da universidade vai baixar por conta da presença de aluno negro ou de escola pública, por conseqüência dessas ações as cotas deverão acabar com certeza, mas ainda faz parte dos nossos sonhos essa melhoria.

Para garantir os direitos consignados na Constituição Federal a Universidade Federal do Mato Grosso do Sul desenvolveu um atendimento voltado para as necessidades regionais, visando garantir o desenvolvimento cientifico, tecnológico e social do estado.  Na realidade da UFMS havia negros e índios que moravam no estado e não tinha acesso á educação superior. Os Movimentos Sociais, buscando minimizar a desigualdade, passou a pressionar o poder público, para que formulasse políticas públicas com vistas a mudar o panorama do estado, que mudassem os dados estatísticos que eram aterradores em relação ás desigualdades sociais.  Assim a discussão sobre a política de cotas tomou o calor do debate, principalmente por iniciativa do movimento negro no estado. Estes debates frutificaram numa lei que garantiu a implantação do sistema de cotas, fundamentada na Constituição Federal do Brasil, na garantia da igualdade dos direitos. Muitos especialistas criticam a fundamentação, argumentando que dar direito a uma parte fere a questão fundamental da igualdade. Entretanto, pesa sobre essa decisão da União, dos estados e das Universidades o fator histórico, da exclusão, do distanciamento dos bens de produção da sociedade.

É preciso entender como as coisas aconteciam e como acontecem no Brasil. É preciso ter noção de como as questões raciais permeiam as nossas conversas do dia-a-dia e como interferem em nossas relações sociais, como as pessoas acessam os bens que são em tese acessíveis a todos. Para melhorar um pouco este entendimento, com foco na discussão de entrada de alunos nos cursos superiores via cotas, é que (VASCONCELOS & SILVA, 2005) faz uma reflexão a partir da percepção dos alunos de um pré-vestibular inclusivo. O quadro da dificuldade, pra melhor entendimento, se dá basicamente assim: realizar um curso superior no Brasil é tarefa super difícil não é? Agora imaginem o estudante oriundo de escola publica. Vamos complicar mais: escola pública de uma favela. E mais ainda: escola pública de favela e com alunos negros. Tem quadro pior que este pra pensar a desigualdade dentro de um sistema. Que chances esses alunos oriundos dessa favela teriam numa disputa no vestibular, onde a maioria inscrita é branca e tem garantido os diversos acessos a todos os recursos. É uma disputa muito desigual, a entrada torna-se uma missão quase impossível e a permanência uma dificuldade sem precedentes.

O grande desafio é aumentar o ingresso das populações marginalizadas no ensino superior. Entretanto, esse propósito não deve ser feito com apenas essas ações isoladas de liberar cotas. Essa política, que sabemos que é de reparação, deve ser realizada, mas ao mesmo tempo deve ser empreendidas ações para melhorar a educação no Brasil. É preciso melhorar o ensino Fundamental e é preciso estruturar o Ensino Médio de modo que o aluno secundário passe a ser um pesquisador, para que quando ele entre no Ensino Superior ele tenha autonomia de estudo, possa desenvolver os seus estudos de forma sólida e segura.  Ações afirmativas são políticas de combates a desigualdade estrutural de grupos vulneráveis à discriminação. Discriminação que o próprio sistema criou, pois não deu condições de atendimento a todos de forma homogênea. Por isso que as políticas compensatórias não devem ser permanentes, mas enquanto as desigualdades no atendimento, na discriminação perdurar essas políticas tem de existir.

São vários os debates, são vários os teóricos que discutem o assunto, entretanto a grande discussão hoje reside nos critérios de acesso. Os critérios de avaliação pra julgar a entrada dos grupos beneficiários das cotas. As medidas encontraram uma grande dificuldade, dizer como seria o acesso. Segundo (VASCONCELOS & SILVA, 2005, p. 4),

“Tais medidas causaram grande polêmica  em torno de questões como “mérito x oportunidade”, “falta de critérios sólidos” para determinar a veracidade dos candidatos que se consideram afro-descendentes e “proporcionalidade de beneficiados”, ou seja, o somatório de percentuais estipulados pelas leis, ao invés de sua sobreposição e complementação.”

Há um questionamento latente nas discussões hoje em dia. Segundo (VASCONCELOS & SILVA, 2005) essa discussão tem fundamento, pois não é tão simples definir quem é negro no Brasil. E provocam com o questionamento “mas existe “raça” negra?” (VASCONCELOS & SILVA, 2005, p. 461).  No Brasil nos dias atuais, as cotas fazem parte da realidade de muitas instituições: empresas públicas e privadas, escolas, partidos políticos, mas notadamente a polêmica se alarga quando se trata da cota para negros e pardos. É difícil avaliar quem seja negro ou branco. Segundo (VASCONCELOS & SILVA, 2005, p. 461), “O Brasil para o bem ou para o mal – apresenta complexidade superior quando o assunto é autodefinição das raças.”  Há uma infinidade de auto-identificação racial  nas pesquisas como a do IBGE por exemplo. A maioria da população se declara branca, na seqüência uma grande parcela declara-se parda, mas tem ainda os amarelos pretos e os indígenas.  Em alguns estados do Brasil o termo pardo quase não é conhecido. “Como definir o negro em uma população que insiste em se chamar de morena?” (VASCONCELOS & SILVA, 2005, p. 462). Há muita resistência e dificuldade de identificação de representantes das populações negra e branca, principalmente do ponto de vista biológico, pois segundo especialistas as variações de genes são mínimas. Não é muito fácil essa definição. Realmente a polemica se arrasta e o poder público terá de investir na estruturação das escolas para que as mesmas possam atender com qualidades todos os alunos de forma igualitária, só assim as cotas deixarão de existir e esses debates cessarão, pois todos estarão no mesmo patamar de igualdade. Será que isso um dia vai acontecer? Escola atendendo a todos de forma igual, acesso aos meios de produção de forma igual, rendimentos econômicos dentro das faixas de conhecimento e de níveis de atuação iguais? Como dizia Paulo Freire devemos sempre marchar para as conquistas. Só se conquista algo quando se busca com altivez e coragem. Nesse caso as cotas não é humilhação pra ninguém, nem pros negros nem pra nenhum outro dos excluídos. É apenas uma política compensatória que está na ordem do dia, com um debate acalorado que merece a nossa reflexão e análise. Pode-se até depreender da análise deste artigo que há um posicionamento contrário ao sistema de cotas, não, não é este o objetivo e nem o de esgotá-lo, pois isso é impossível num artigo.  O que se dispõe aqui é analisar visões diferentes e diferenciadas sobre um assunto que permeia a nossa vida na atualidade. É de trazer à tona discussões para que possamos compreender melhor, com uma análise situacional e histórica do porque dos sistemas instituídos.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

     Este pequeno artigo nos possibilitou, dentre muitas coisas, analisar, mesmo que de uma forma breve, a polêmica que existe acerca da instituição do Sistema de Cotas nas Universidades Publicas do Brasil. A proposta não é uma proposta de execução simplória, do mesmo modo que o problema ao qual ela está vinculada não é de fácil resolução. É um problema que dependendo da forma que for debatido pode polarizar a sociedade em favoráveis e contrários ao sistema de cotas pra negros.  Mas o mais grave que pode ser gerado dessa discussão é o sentimento de que se liberam cotas para negros por conta da incapacidade intelectual, o que alargaria mais ainda a discriminação, e na verdade a intenção da proposta não tem nada a ver com isso. Extraiu-se das idéias discutidas na elaboração deste artigo que sempre vai haver controvérsias, visto que a nossa população é multifacetada, multicolorida e multicultural. Acredito que o sistema deveria ser implantado juntamente com a consideração de negros e pardos, colocando como prioridade as famílias de menor poder aquisitivo, as famílias que vivem em dificuldades, não enfocando somente os negros. Mesmo que não tenha um cunho discriminatório à proposta instiga a isso, principalmente das classes que querem manter os privilégios.  Não tem como não afirmar que há fundamentos nesta  discussão, existe sim fundamentação e sólida.

Porém, os anos de discriminação e exclusão social falam mais alto e  as ações afirmativas são necessárias para garantir acesso às pessoas discriminadas ao Ensino Superior e aos meios de produção e afirmação social como cidadãos. Contudo, o verdadeiro problema reside na ausência de uma educação de qualidade na base, no Ensino Fundamental e no Ensino Médio.  Enquanto não forem corrigidos esses problemas enfrentaremos esses dilemas: os negros que ingressaram na universidade estão sendo discriminados pelos outros alunos que não ingressaram pelo sistema de cotas.  A conclusão que se tira disso é que tanto os meios utilizados, os programas criados (as cotas), tentativa de corrigir as injustiças sociais, quantos os preconceitos e a discriminação que  permanecem,  não estão corretos. O Governo Federal e os governos estaduais poderiam proporcionar uma escola de qualidade aos estudantes de baixa renda, e aí se enquadrariam também os negros de classe baixa, oportunidades para desenvolverem, acessarem à Universidade e aos meios de produção na sociedade.  Isso  pode ser feito de duas formas:  turbinando os  investimentos da educação pública a fim de melhorar sua qualidade, pois a própria História prova que sem investir em educação um Estado não é capaz de se desenvolver.  A outra forma é incentivar as escolas particulares de Educação Fundamental e Média a garantir formas de acesso às pessoas que não tenham condições de bancar os estudos em escola privada. Isso pode ser proposto pelo estado através de incentivos diversos, como os fiscais com  isenções  de impostos.  As instituições particulares,  que existem aos montes pelo Brasil afora, criaria o que poderia ser chamado de sistema de cotas para alunos de baixa renda nas escolas particulares. Seria revolucionário e ajudaria até a diminuir as discriminações e o distanciamento racial que existe nas escolas particulares, nas públicas e na própria universidade.

Mas enquanto isso não acontece, enquanto o estado não investe nas escolas e as desigualdades são cada vez mais acentuadas, as cotas servirão como paliativo, como reparador imediato daquele aluno que tenta acessar o ensino superior. Mas isso não cura o mal original. É preciso matar o mal pela raiz, é preciso cuidar para que as desigualdades não sejam geradas de forma tão aterradoras na sociedade, as distâncias sociais não precisam ser tão grandes. Os direitos mínimos precisam ser atendidos em sua plenitude. Em permanecendo as desigualdades, a única forma imediata de resolução é a ação com política compensatória. Mas ninguém quer isso eternamente em nosso país.

REFERÊNCIAS

 

MAGGIE, Yvonne & FRY, Peter. A reserva de vagas para negros nas universidades brasileiras. Estudo.  Av. (online). 2004, vol. 18 n. 50, PP 67-80.

 

QUEIROZ, Delcides Mascarenhas & SANTOS, Jocélio Teles dos. Sistemas de cotas: um debate. Dos dados à manutenção de privilégios e de poder. Educ. Soc. (online). 2006, vol. 27, n. 96, PP. 717-737.

 

MAIO, Marcos Chor & SANTOS, Ricardo Ventura. Política de cotas, os “olhos da sociedade” e os usos da antropologia: o caso do vestibular da universidade de Brasília (UnB. Horiz. Antropol. (online). 2005, VOL. 11. N. 23, PP. 181-214.

 

VASCONCELOS, Simão Dias & SILVA, Ednaldo Gomes da. Acesso à Universidade Pública através de cotas: uma reflexão a partir da percepção dos alunos de um pré-vestibular inclusivo. Ensaio: aval.pol.públ.Educ. (online).  2005, vol. 13, n. 49, PP 453-467.

 

BITTAR, Mariluce & ALMEIDA, Carina E. Maciel de. Mitos e controvérsias sobre  a política de cotas para negros na educação superior. Educ. ver. (online). 2006, n.28, PP. 141-159.

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