CORONEL LARA RIBAS NA POLÍCIA CIVIL DE SANTA CATARINA (Felipe Genovez)
Por Felipe Genovez | 04/02/2014 | HistóriaCoronel Lara Ribas na Polícia Civil (HST-PC I)
Conheci o lendário e octagenário Coronel/PM Lara Ribas no dia 25 de outubro de 1991, quando completou oitenta e nove anos de idade, em cuja ocasião representei a Secretaria de Segurança Pública nas homenagens pela passagem do seu aniversário, cujo evento ocorreu no Clube Penhasco (Bairro Saco dos Limões, nesta Capital), por iniciativa do Coronel Sidney Pacheco (Deputado Estadual e Secretário Estado da Segurança Pública – 1991 – 1993).
Lara Ribas que era natural de Palmas (PR), também viveu e estudou em Campinas/SP. No mês de setembro de 1924 ingressou como 1ºSGT/PM num Batalhão de Voluntários Patriotas de Santa Catarina (reforço ao 2º Batalhão de Infantaria da PM/SC, sob o comando do Coronel Lopes Vieira, natural de Ponta Grossa/PR), cuja atribuição era se juntar as tropas federais e lutar contra os revolucionários paulistas (disponível em: http://www.pm.sc.gov.br/institucional/historia/galeria-de-personagens/coronel-antonio-de-lara-ribas.html. Acesso em 03.02.2014).
Após fazer Curso para o Oficialato/PM/SC (Academia/PM Marechal Guilherme), ainda no posto de “Tenente” passou a prestar serviços na Polícia Civil (após a "Revolução de 30", quando caiu nas graças do General Ptolomeu de Assis Brasil - Interventor-Geral do Estado - apud: jornal "O Estado", 09.05.1931), mais especificamente, quando o Capitão/PM João Cancio de Souza, Delegado de Polícia da Capital assumiu interinamente a Chefia de Polícia (órgão que antecedeu a SSP/SC), no lugar do Tenente do Exército Nery Kurtz (posteriormente Interventor-Geral do Estado). Nesse momento o Tenente Antonio Lara Ribas que já ocupava o cargo de 1º Suplente de Delegado da Capital foi nomeado Delegado de Polícia titular, quando ao que tudo indica "pegou gosto pela Polícia Civil" (Jornal O Estado, 18.03.1931).
Uma das primeiras diligências exitosas que teve a participação de Lara Ribas na condição de Delegado de Polícia da Capital envolveu a fuga de um preso da recém inaugurada Penitenciária da Pedra Grande (Penitenciária de Florianópolis – Bairro Trindade - inaugurada em setembro/1930), conforme segue:
“Fuga de preso. Fugiu suavemente. Preso: Carlos Otto Huber. Chefe de Polícia Capitão João Cancio de Souza e o Ten Lara Ribas fazem a captura do fugitivo (apud jornal: “O Estado”, 10.04.1931).
Lara Ribas foi se destacando paulatinamente, cuja atuação passou a ser acompanhada por seus superiores que creditaram confiança nos seus serviços, como ocorreu na escolta do ex-Prefeito de Curitibanos (que teve participação na Guerra do Contestado, além de se constituir chefe político caudilhista daquela região):
"Lara Ribas, Tenente da Força Pública escolta o Coronel Henrique de Almeida até a Ilha de Fernando Noronha - estava preso com mais sete companheiros na Penitenciária de Florianópolis - ex-chefe político de Curitibanos (apud jornal: "A Notícia", 07.03.1931).
Em setembro de 1931 Lara Ribas foi promovido a 1º Ten PM (apud: Jornal O Estado, 21.09.1931), entretanto, teve que retornar para a PM onde passou a atuar como chefe da "Contadoria" (foi substituído na DP/Capital pelo Tenente Silveira D’Ávila). Certamente que Lara Ribas não era homem talhado para atuar em serviços burocráticos e não se adaptou as novas funções. No dia 05.08.1932 o General Ptolomeu de Assis Brasil promoveu Lara Ribas ao posto de Capitão, sendo comissionado ao posto de ‘Tenente-Coronel’” (apud Jornais: "O Estado", 05.08.1932 e "A Notícia" de 15.09.1932).
De volta às funções finalísticas, em meio ao frevo causado pelos conflitos provocados pela “Revolução Constitucionalista” que eclodiu a partir da paulicéia, ainda no mês de setembro de 1932, Lara Ribas acabou se envolvendo nos embates acirrados de "Cruzeiro" (atual Joaçaba e Herval do Oeste), quando foi preso (07.08.1932) pelo Prefeito Passos Maia (Ivo de Aquino, Fúlvio Aducci e Nereu Ramos, eram todos pró-constitucionalistas e simpatizantes dos Generais Klinger e Isidoro Dias Lopes, dentre outros, também apoiados por Borges de Medeiros e Batista Luzardo, estes gaúchos). De um dia para o outro, graças a reação das bases da PM o Major Lara Ribas conseguiu reverter a situação prendendo "Passos Maia". Sobre assunto muito se escreveu naquela época, vejamos a síntese da nota:
“Cruzeiro - Força estabelecida na cidade em organização sob o comando do Major Lara Ribas. Rebelados em apoio a São Paulo, sob influência dos gaúchos. Tropas revoltosas comandadas pelo Coronel Manoel dos Passos Maia. Os revoltosos pretendiam restaurar no país o velho sistema desmontado pela Revolução (apud jornal: “O Estado”, 06.08.1932).
No que diz respeito aos acontecimentos em “Cruzeiro”, José Waldomiro Silva, assim se reportou:
"Neste ano, ocorreu a Revolução constitucionalista de São Paulo, que teve, como é óbvio, seus reflexos também em Joaçaba. Houve levante no quartel da 1a. Cia Isolada em Herval (...). Na ocasião foram presos, entre outros, o Capitão Lara Ribas e Álvaro da Nova, que ficaram detidos na varanda do hotel (...). Tambóm foi preso e ficou 'hospedado' na casa do Cel. Passos Maia, o Sr. Aristiliano Ramos, guardado pelo Sr. Gabriel Almeida (vulgo Gato Preto)... Em Videira foi preso o Dr. Wenceslau Breves e outros companheiros que para ali havia seguido de trem, fazendo ligação (...). Com o retrocesso da Revolução, ficaram escondidos pelas matas (costa do Pelotas, até passar a 'onda'. Cel. Passos Maia, Dr. Breves e outros companheiros mais categorizados, após sua prisão, foram conduzidos para o Rio de Janeiro (...). Após o fracasso da Revolução, foi aberto inquérito, presidido pelo Capitão Lara Ribas, no qual servi como escrivão 'ad hoc' ..." (in “O Oeste Catarinense - Memórias de um Pioneiro, Florianópolis: IOESC, 1987, p. 92).
Sobre a prisão de Lara Ribas e sua "soltura" um dos principais jornais esclareceu como tudo ocorreu, conforme sintese:
“Revolução Constitucionalista. Quarenta reacionários revoltosos comandados por Ivo de Aquino ocupam Campos Novos. Lara Ribas e seu estado maior foram traídos e todos presos. Do dia 07 para 08.08.1932 Lara Ribas, ajudado pelo prefeito de Cruzeiro (João Fontoura), conseguiu dar um golpe e prender os infiéis, inclusive o Coronel Manoel Passos de Maia. O Major Lara Ribas e o Prefeito de Cruzeiro (João Fontoura) são elogiados. No dia 08.08.1932 Ivo de Aquino ciente da vitória de Lara Ribas foge para Anita Garibaldi. Campos Novos volta para as mãos dos simpáticos do governo do Estado (Jornal O Estado, 09.08.1932).
"Acontecimentos em Herval do Oeste – Revolução Constitucionalista – prisão de Lara Ribas – Aldo Fernandes – ligado a 'Passos Maia'. Lara Ribas é encontrado chorando. Prisão do Capitão Clemente (Chefe de Polícia revolucionário) e do Coronel Passos Maia – contra-movimento – não foi realizado pelos oficiais presos. Não cabe a eles nenhuma glória e sim aos “Sargentos e praças” (Jornal O Estado, 23.02.1933).
Nessa mesma época, assim como o Coronel/PM Heitor Lopes Caminha que foi reverenciado por sua participação no "front" de batalha contra as tropas “constitucionalistas” no Estado de São Paulo, também Lara Ribas veio a ser tratado como celebridade por conta dos acontecimentos em “Cruzeiro”:
"Lara Ribas - pena de talião - "Perguntava-me há dias um amigo se o Capitão Antonio Lara Ribas , herói de Cruzeiro, alguma vez estivera na China. Cel Passos Maia prendeu o Capitão Lara Ribas - trancando-o na Prefeitura, no dia seguinte Lara Ribas prendeu Passos Maia no mesmo lugar... Justiça chinesa - Júpiter (apud: Jornal "A Notícia", 20.09.1932).
Já no final de 1932 Lara Ribas passa à condição de "assistente" do General-Interventor Ptolomeu de Assis Brasil (apud jornal "O Estado", 12.12.1932).
O envolvimento emocional e profissional de Lara Ribas com a repressão às doutrinas extremistas o acompanharam ao longo de duas décadas, digamos até 1946, quando deixou a titularidade da Delegacia de Ordem Política e Social e retornou para a Polícia Militar onde exerceu mais tarde o cargo de Comandante-Geral, vejamos:
"Capitão Renato Tavares. ANL em Lages. Apoio popular. Lara Ribas presta informações sobre o conflito em Canoinhas. Vítima: Cid Vieira e Juventino Jungles. Acusados presos na Cadeia de Canoinhas. Uvaroff será deportado da Penitenciária para a Chefatura de Polícia com a proibição de usar a camisa verde. Chefe de Polícia determina a Lara Ribas que estava em Canoinhas (apud jornal: "O Estado", 09.07.1935).
Como DRP de Porto União Lara Ribas passou a reprimir a “bandidagem” na região do “ex-contestado”, como pode se verificar pela seguinte nota:
“Delegacia de Polícia de Porto União. João de Botas foge da cadeia pública juntamente com João Pacheco dos Santos, chefe de uma quadrilha de ladrões. Major Lara Ribas, Delegado Regional de Porto União iniciou um inquérito policial secreto porque João de Botas era protegido de algumas autoridades. Uma noiva teve todo o enxoval de casamento roubado pela quadrilha. Promotor Público Alves Pedrosa recebeu o inquérito” (Jornal O Estado, 01.02.1933).
Apenas para demonstrar a preocupação de Lara Ribas com a Polícia Civil, no ano de 1938, como Delegado Regional de Porto União, apresentou relatório em que mencionou o feito notável do Capitão Solon Coelho de Souza a respeito de diligências que resultaram na recaptura de “João de Botas”, ao mesmo tempo sugeriu várias providências por parte do governo para a região do ex-Contestado, tecendo críticas às autoridades que não apuravam crimes, mencionou as dificuldades em executar mandados de prisões, criticou a incompetência dos Delegados municipais, suplentes e inspetores de quarteirão e ao despreparo dessas autoridades naquela região, citando como exemplo que um Delegado de Polícia nunca tinha ouvido falar sobre a lei de acidentes de trabalho. Ao final Lara Ribas propôs que o governo mandasse um contingente policial para prender os bandidos que atuam no norte do Estado, além de informar que proibiu o porte de armas naquela região (apud: "Jornal O Estado, 03.02.1933").
O DRP/Porto União Antonio Lara Ribas passou a reprimir o banditismo em toda a região do ex-Contestado, entretanto, suas propostas para combater a criminalidade não foram aceitas (apud Jornal: "O Estado", 27.07.1933).
Posteriormente (1934), Lara Ribas foi nomeado Delegado Especial de "Ouro Verde" (atual Canoinhas), sendo exonerado e em seu lugar nomeado o 2o Tenente Orion Augusto Platt (apud jornal: "O Estado", 13.11.1935).
A conjunção de acontecimentos que culminaram com o ingresso de Lara Ribas como SGT/PM em 1924 (combate aos insurretos paulistas, sob o comando do Coronel Lopes Vieira, este paranaense de Ponta Grossa e um dos responsáveis pelo ingresso de Lara Ribas na Polícia Militar catarinense) e, também, a sua ação nos acontecimentos na cidade de "Cruzeiro" (subelevação dos "Constitucionalistas"), as posições políticas de seus superiores (Republicanistas) e, mais tarde, ao governo revolucionário que rompeu com o regime anterior (Getúlio Vargas e Nereu Ramos) conduzem a certeza que moldaram sua formação não só como policial militar, mas como Delegado de Polícia, considerando o forte conteúdo político de suas participações que tiveeram como desígnio maior a repressão de doutrinas extremistas e a contraposição ao regime de governo establecido no poder: a) A Velha República (representada na sua última fase no plano Federal pelos Presidentes Washington Luiz e Julio Prestes e, no plano Estadual, pelo Governador Adolpho Konder e, também, pelo próprio Coronel Lopes Vieira, dentre outros), e b) Presidente Getúlio Vargas que em outubro de 1930 foi responsável pela ruptura com a “República Velha”.
Registre-se que foi a frente do "DOPS" que o Major Lara Ribas, como sucessor do Des. Ari Pereira Oliveira (na época advogado) permaneceu quase que uma década (1937 - 1946), com uma folha de serviços digna de registro, especialmente no que diz respeito à repressão aos avanços das doutrinas extremistas como também na valorização da Polícia Civil dentro da sociedade. O ponto máximo desse seu momento à frente do "DOPS" ocorreu quando - juntamente com o Comissário de Polícia João Kuhne (ex-jornalista da "A Notícia" de Joinville e quem fazia a tradução de textos germânicos) - escreveram a primeira obra literária da instituição que se tornou uma referência histórica: "Punhal Nazista no Coração do Brasil". Nessa época Lara Ribas trouxe seu irmão para a Polícia Civil (Pedro Lara Ribas) que foi nomeado “Comissário de Polícia” e passou a chefiar os serviços de Armas e Munições no Estado.
No “DOPS”, auxiliado pelo Capitão Timóteo Braz Moreira (posteriormente ingressou na carreira de Juiz de Direito), Lara Ribas criou o “Museu” daquela Delegacia de Polícia com os artefatos que foram apreendidos ao longo dos anos em razão das ações policiais que protagonizou no cambate às doutrinas extremistas, cuja repartição funcionava na atual Rua Nereu Ramos, onde estava localizada
A meteórica passagem de Lara Ribas pelas Polícias do Estado de Santa Catarina (começou na Polícia Militar ainda no Governo interino de Pereira Oliveira - 1924 – 1926 , Vice de Hercílio Luz -1922/1924, pelas mãos do Coronel Lopes Vieira - político "Republicanista" e Comandante-Geral da PM/SC) sempre constará também dos anais da História da Polícia Civil. A bem da verdade, Lara Ribas passou quase que todas as Décadas de Trinta e Quarenta na Polícia Civil exercendo cargos de Delegado de Polícia no interior do Estado e na Capital.
Alguns meses antes de falecer (10 de junho/1992) Lara Ribas me escreveu uma carta de próprio punho (acredito ter sido a última em vida), onde externou reservadamente toda a sua emoção e agradecimento ao discurso que fiz em sua homenagem no seu último aniversário, às citações históricas que permearam sua passagem na Polícia Civil e o reconhecimento por este subscritor ter rememorado fatos e personalidades contemporâneas a seu tempo, numa época em que o Governador Nereu Ramos - também atendendo seus apelos - iniciou a construção de prédios em quase todas as regiões policiais (muitos deles ainda de pé, como as DRPs de Itajaí e Lages) e a nomear bacharéis em Direito para essas funções, como foi o caso da DRP/Lages, cujo titular foi seu primo - Dr. Celso Ramos Branco (também exerceu o cargo de DRP/Mafra, foi Deputado Estadual-UDN/1951-1955 e Secretário de Justiça), responsável pela edificação da DRP/Lages - 1941. Entrevistei Celso Ramos Branco já nonagenária no ano de 1995 quando o mesma fez importantes revelações a respeito de suas relações com Nereu Ramos, sobre as dificuldades no exercício das funções de Delegado de Polícia e, em especial, fez um relato sobre a construção daquele prédio que que se constituiu um marco histórico pois passou a centralizar o controle de todas as Delegacias de Polícia, além dos serviços de: identificação, armas e munições, perícia, jogos e diversões, controle de estrangeiros, cadeia pública, dentre outros).
*Fontes: jornais mencionados; acervo do autor e obra de José Waldomiro Silva.