COPA 2014 NO BRASIL : NECESSÁRIA E ÚTIL

Por Eduardo Pereira | 09/02/2014 | Economia

Uma coisa é certa:  O Brasil está passando muita vergonha na preparação para a Copa do Mundo e é quase certo que passará mais vergonha ainda: não sei se em todos os aspectos, mas não dá para ser otimista por exemplo, quanto aos aeroportos e a segurança dos turistas. Um país com péssima infra-estrutura portuária, aeroportuária, hoteleira, péssimas estradas, sem contar que a população que arca com impostos pesados, não tem o retorno devido: temos um péssimo sistema de ensino, uma péssima saúde pública e o país não é seguro para os brasileiros nem para os estrangeiros. Como pensar em Copa do Mundo num país assim ?

Mesmo assim sou a favor.

Somos um país atrasado e sem maturidade:  precisamos desse choque.  Daremos um “salto” de 5, 10, 20 anos, não sei, mas sairemos dessa, melhores. Quando digo “sairemos dessa”, estou falando da Copa – com ou sem título – dos aeroportos ampliados, mesmo com muito atraso, das manifestações – caso sejam pacíficas ou piores e mais violentas que em 2013, da nossa imagem projetada para o mundo, mesmo que péssima, pois isso, pode ajudar nos vermos como somos e motivar ações concretas da sociedade, não somente do governo, que passará a ser cobrado de forma mais objetiva. Nossos contrastes, que não são novidade nenhuma, serão expostos como nunca.  Essa vergonha é salutar.

Talvez a FIFA não queira mais que haja Copa do Mundo num país africano ou latino-americano.  Se for assim, sorte nossa, pois o Chile, Argentina, Uruguai e México, seriam candidatos naturais aqui do continente e mereceriam - mais ou menos que nós - sediar uma Copa.

Estes argumentos esbarram no dinheiro que está sendo gasto, que é uma soma muito grande: as planilhas de orçamento não são divulgadas, aumentam frequentemente de valor, não temos noção de quanto pagam pelos sacos de cimento, pelos painéis eletrônicos, pela grama plantada, para verificar se os preços estão dentro da realidade do mercado – isso dá margem a uma suspeita bem fundamentada de um gigantesco desvio de verba – e para piorar, pelo menos quatro, destes estádios são inviáveis economicamente por não terem público e bilheteria suficiente nos respectivos campeonatos regionais que justifique a sua a construção. Após a Copa portanto, 1/3 dos estádios, será deficitário. A menos que haja uma mirabolante engenharia financeira e de negócios, o dinheiro dos estádios deficitários  será literalmente jogado no lixo, e por enquanto, é a previsão mais acertada.

Diante desta realidade do nosso país e de como está sendo organizada esta Copa, é lugar comum, dizer que todo esse dinheiro deveria ser gasto em saúde e educação, mas vamos refletir: O dinheiro para a construção dos estádios,  é em boa parte do BNDES.  Ora, esses recursos podem ser utilizados para a construção de escolas e hospitais, mas a princípio, privados, ou seja: para aqueles que tem condições pagar convênios médicos caríssimos e dispensar os péssimos serviços do governo, apesar de pagarem impostos:  as classe A e B, a grosso modo.

O dinheiro do BNDES, veio certamente de um aporte inicial do Tesouro, quando foi fundado há mais de 50 anos, e ao longo das décadas, esse montante foi expadindo com a quitação com débitos a juros por parte de empresas privadas que tomavam empréstimos. Portanto, o capital privado na forma de juros, também compõe o caixa do BNDES.  No entanto, o governo ainda hoje, faz aporte de recursos e os tira de fundos como o FAT e o PIS-Pasep. Ou seja, a rigor, no BNDES tem dinheiro público, sem esquecer que esse dinheiro, deve ser quitado, e portanto, retornar com juros. Qualquer irregularidade que possa ocorrer quanto ao recebimento destes valores, colocaremos na conta da corrupção e sobre isso, falarei mais adiante.

Deve se esclarecer, que quando se fala de investimentos em educação e saúde, essa conta não inclui investimentos privados, e sim da parte do governo, para a imensa maioria da população, que paga impostos e deveria ter um retorno de qualidade nos serviços públicos. Ocorre que um hospital e uma escola públicos, “não se pagam”: continuam a necessitar de recursos permanentes do governo em equipamentos – no caso dos hospitais – caríssimos, em profissionais especializados e demais despesas afins. Algo que se costuma falar de modo perverso, ”a fundo perdido”, ou seja, esse dinheiro “não volta”.

Estou falando apenas do fluxo financeiro, mas é evidente que investir na saúde e na educação, tem retorno, um imenso retorno na qualidade de vida da população e na capacidade de produção do país, e a longo prazo, também financeiro, portanto o “fundo perdido” se refere apenas ao fluxo financeiro de curto e médio prazo. Prazo que pode se estender por décadas. Volto a dizer : há uma lógica perversa nisso tudo, que pretendo aqui explicar e não justificar. Assim, sendo, os estádios dão retorno financeiro, ou no mínimo, se pagam: estou falando dos 2/3 que não são “elefantes brancos”, ao passo que o investimento público em saúde e educação, é saida de dinheiro no curto e médio prazo e retorno financeiro, no apenas no longo prazo.

Isso é motivo para deixar de se investir em saúde e educação ? Claro que não !

Mas se o governo for utilizar recursos do BNDES, para investimento público em saúde e educação, sabe-se que esse dinheiro, não voltará para o caixa do BNDES, portanto seria o caso de extinguir o Banco, pois rapidamente ficaria sem fundos. Ok, sem problema, a causa é nobre e válida. Com estes recursos, se construiriam e reformariam escolas, se ampliaria a ofertas de leitos nos hospitais públicos, mas.....de onde viria o dinheiro para contratar profissionais e a manutenção de equipamentos tão caros ?

Se estamos falando serviço público, teria que vir da arrecadação dos impostos, e aí é que está entrave. O governo gasta muito e gasta mal. O salários dos parlamentares brasileiros, estão muito acima do salário de um parlamentar de país rico. Os salários do funcionalismo no setor público são altíssimos, inclusive para cargos de ensino médio - algo impensável no setor privado - o número ministérios, quase 40, ultrapassa de longe a sua necessidade, e para completar, o dinheiro da corrupção, sempre estimado numa fortuna. A redução desta sangria, traria o recurso necessário para investimentos sociais tão urgentes, pois o pais arrecada muito.

O futebol não é responsável por nada disso e o cancelamento da Copa, que causaria euforia em muitos manifestantes, não levaria recursos para saúde e educação, mesmo se o governo tomado pelo pânico eleitoral,  gastasse 100% dos recursos do BNDES para construir e equipar escolas e hospitais. Após a inauguração destes equipamentos, se perguntaria : de onde tirar dinheiro para o custeio ? A resposta está no parágrafo anterior, mas o governo não quer fazer isso, e se quisesse, teria uma barreira intransponível no Congresso Nacional. A arrecadação ainda que astronômica de tributos no Brasil, não é suficiente, para: 1) investir em qualidade de vida para a população, e 2 ) garantir ao mesmo tempo, a distribuição de rios de dinheiro – esse sim – a fundo perdido, para o bolso de uma classe política corrupta e inoperante. Assim, sendo, sacrifica-se o primeiro e salva-se o segundo.
Os manifestantes estão com ódio e sabem disso. Eles apenas têm esse pensamento na cabeça: “ sabemos que não é o futebol, mas queremos estragar a sua festa e lhes causar vergonha “

Os países estrangeiros, em particular, os europeus, que têm futebol de alto nível e títulos mundiais, divulgam à exaustão – isso virou um esporte – as noticias negativas referentes à nossa miséria, à violência urbana, os protestos, e claro – o nosso despreparo para sediar grandes eventos, mas há que se perguntar: como um país se prepara para uma Copa ?

Não quero em nada defender o desleixo, a corrupção e o atraso no Brasil, mas os europeus, vieram numa toada mais leve, além de já contarem com uma população de uma cultura mais complexa e eficiente que a nossa – isso não se pode negar – foi sediando Copas em épocas em que as exigências do futebol business eram bem menores, tanto que o Brasil e outros países latinos, também já sediaram Copas. Verdade é que os Europeus cederam essa oportunidade nos anos 50 ao Brasil, porque estavam destruídos pela 2º Guerra, sem dinheiro para investir.

Noutras palavras: o "Padrão Fifa" foi se estabelecendo junto com o "Padrão Europeu".

Sediar uma Copa é bom para qualquer país que tenha condições financeiras para isso, e o Brasil tem de sobra. Nossa saúde, educação, e infra-estrutura são péssimas e não foram causadas pelo futebol, haja visto países como a Alemanha e Itália, com torcedores fanáticos, futebol de alto nível, como o Brasil e indicadores sociais anos-luz acima dos nossos. Os Europeus estão contrariados porque a Copa veio para cá. Eles queriam o dinheiro do turismo, já que estádios modernos e bons aeroportos, eles já tem. Mas esse dinheiro virá para o Brasil. Por isso, indignados com a oportunidade perdida, e embalados pelo "complexo de superioridade",   divulgam à exaustão nossos atrasos, nossos acidentes, nossa corrupção e nossa incompetência.

Mas é exatamente por isso que iremos melhorar. Por essa superexposição, mesmo que negativa. Nossos aeroportos vão melhorar e o transporte urbano também, mesmo que pouco e a custo elevado, mas não melhorariam nada se não fosse por causa da Copa.  No curto prazo, tenho certeza que a Copa será deficitária, mas no longo prazo, não.

Não pelo Governo, nem pela FIFA, mas por nós, acharia divertido que a Copa fosse um sucesso e os estrangeiros dissessem: “ esperávamos que fosse um fracasso total, mas até que foram bem..” No entanto, o maior legado - não me canso de dizer - não estará nas poucas melhorias materiais com seus preços altíssimos e fora do prazo, mas na censura externa e auto-censura. Teremos muita vergonha de vermos que somos um país imaturo, que deixa sujeira nas ruas, que não cumpre prazos, que contribui com a corrupção, que pouco lê, que valoriza a diversão de baixo nível e menospreza a cultura de qualidade e até mesmo a educação, porque se o brasileiro realmente valorizasse a educação, os políticos fariam algo melhor – investir em educação não rende voto ! – Estou falando portanto, muito mais de nós – empresários e trabalhadores, estudantes, velhos e adolescentes – do que do governo. Temos que agir rápido para fazer esse país mais justo.  A Copa vai nos ajudar nesse sentido.