Contribuições Da Neurociencia Para A Formação De Professores

Por Fátima Noronha | 04/03/2008 | Educação

 INTRODUÇÃO

A educação é uma arte em permanente construção. Tem seu primeiro degrau no olhar sobre a criança de 0 a 6 anos, em creches e pré-escolas, que cresce em importância à medida que a formação desses sujeitos, antes majoritariamente a cargo das famílias, é cada vez mais institucionalizada em creches e pré-escolas.

Contudo, a educação é o feixe central da interdisciplinaridade que engloba aspectos antropológicos, filosóficos, biológicos e psicológicos da espécie humana. Transpondo essa colocação para o foco desta pesquisa, pode-se dizer que o cérebro desempenha o papel deste feixe na formação do intelecto humano, através de conexões neurais que são a polarização dos opostos em busca de caminhos para o aprendizado.

Por entender a importância do cérebro no processo de aprendizagem, consideram-se, aqui, as contribuições da Neurociência para a formação de professores, com o objetivo de oferecer aos educadores um aprofundamento a esse respeito, para que se obtenham melhores resultados no processo de ensino-aprendizagem, especialmente, na educação básica.

A metodologia utilizada caracteriza-se como uma abordagem exploratória do tema alicerçada em pesquisa bibliográfica em autores pertinentes, dentre os quais foram citados Assmann (2001), Bear, Connors, Paradiso (2002), Demo (2001), Fernàndez (1991),Johnson & Myklebust (1983), Markova (2000), Morim (2007; 2002), Smith (1999), Soares (2003),Sternberg & Grigorenko (2003) e Vygotsky (1991). Assim, descrevem-se a função e as finalidades da Neurociência; a relação entre o cérebro e a aprendizagem e as disfunções cerebrais verbais e não verbais.

1.1 FUNÇÃO E AS FINALIDADES DA NEUROCIÊNCIAS

A Neurociência é e será um poderoso auxiliar na compreensão do que é comum a todos os cérebros e poderá nos próximos anos dar respostas confiáveis a importantes questões sobre a aprendizagem humana, pode-se através do conhecimento de novas descobertas da Neurociência, utilizá-la na nossa prática educativa. A imaginação, os sentidos, o humor, a emoção, o medo, o sono, a memória são alguns dos temas abordados e relacionados com o aprendizado e a motivação. A aproximação entre as neurociências e a pedagogia é uma contribuição valiosa para o professor alfabetizador.Por enquanto os conhecimentos das Neurociências oferecem mais perguntas do que respostas, mas cremos que a Pedagogia Neurocientífica esta sendo gerada para responder e sugerir caminhos para a educação do futuro.

Ao ignorar as peculiaridades da infância e as bases necessárias ao seu adequado desenvolvimento, a educação infantil brasileira caminha entre acertos e experimentações. É alvo fácil de propostas novidadeiras, por vezes apoiadas em uma visão pseudocientífica, carente de sustentação mais sólida. A bola da vez são as neurociências, mais precisamente as ciências cognitivas, que se propõem a promover uma compreensão maior dos processos de ensino-aprendizagem.

Enquanto pesquisadores de todo o mundo reforçam a tese de que os primeiros anos são fundamentais para a constituição cerebral, há quem aponte para os perigos desse determinismo científico e de uma visão que induza à hiperestimulação infantil.

O futuro da neurociência é brilhante. O perigo é que se está no pé da montanha e muitas pessoas pensam que já completamos a escalada. É uma grande montanha e vai levar um século [para que a escalemos]. Não se trata, contudo, de negar a contribuição das neurociências para a esfera pedagógica. A própria história da pedagogia como disciplina acadêmica construiu seus alicerces a partir do diá­logo com diferentes saberes. Traz em sua natureza contribuições que vão da filosofia rousseauniana à Escola Nova da psicologia experimental; da psicogênese descrita por Piaget  (1983); aos estudos antropológicos e, no caso da pedagogia infantil e, também, à visão recente da sociologia da infância, difundida na década de 1990, com quase um século de atraso.

A questão não é condenar as neurociências. O importante é saber se serão encontradas nelas as contribuições para o que parece central: conhecer o papel da educação infantil. Seu agir educativo deve moldar-se a partir das referências do ensino fundamental ou buscar caminhos para construir sua própria identidade? Enfatizar o que a criança já é ou valorizar o que lhe falta?

Há conflitos de sobra que precisam ser resolvidos e proposições que parecem transcender a esfera pedagógica e caminhar para um debate que é também ideológico. Afinal, quais são os mitos e as verdades extraídos das recentes descobertas das neurociências e o que de tudo isso interessa à educação, em particular à educação infantil?

Por enquanto, os conhecimentos oferecem mais perguntas do que respostas, mas cremos que a pedagogia neurocientífica está sendo gerada para responder e sugerir caminhos para a educação do futuro, mas, como alertou o pensador Morin (2007) em palestra realizada em São Paulo, a neurociência, como outros aspectos da evolução humana, carrega em si uma promessa e uma ameaça. A promessa é de um melhor entendimento dos processos cerebrais. A ameaça é bastante cinzenta: a de que esse conhecimento possa levar à pior manifestação totalitária, a de controlar seres humanos com informações advindas do conhecimento científico.

O foco da educação tem sido o conhecimento a ser ensinado de maneira mecânica e igual a todos os alunos, sem a devida atenção à individualidade, numa demonstração de total falta de consciência da força que possuem os modelos mentais e da influência que eles exercem sobre o comportamento. Por sua vez os alunos, acostumados a perceber o mundo a partir da visão do docente, aceitam passivamente essa proposta pedagógica, desempenhando um papel de receptor de informações, as quais nem sempre são compreendidas e geram conhecimento. Muitas pesquisas no campo educativo apontam o professor como um dos principais protagonistas da educação (DEMO, 2001; ASSMANN, 2001; MORIN, 2002).

Entretanto, proporcionar uma boa aprendizagem para o aluno não depende só do professor, pois é fundamental para uma educação que pretende ajudar o aluno a perceber sua individualidade, tornando-o também responsável pelo ato de aprender, proporcionar a otimização de suas habilidades, facilitar o processo de aprendizagem e criar condições de aprender como aprender. Nesse contexto conhecer o seu padrão de pensamento pessoal e saber como usá-lo é o primeiro passo para ser um participante ativo no processo de aprender. A compreensão de como podemos lidar com certas características pessoais ajudará o aluno a identificar, mobilizar e utilizar suas características criativas e intuitivas, pois cada um aprende no seu próprio ritmo e à sua maneira.

É fundamental que professores estimulem individualmente a inteligência das crianças, empregando técnicas que permitam a cada aluno aprender da maneira que é melhor para ele, aumentando sua motivação para o aprendizado, pois cada pessoa tem de encontrar seu próprio caminho, já que não existe um único para todos (STERNBERG & GRIGORENKO, 2003). Considerando que alunos diferentes lembram e integram informações com diferentes modalidades sensoriais, analisar como as pessoas se relacionam, atuam e solucionam problemas, identificar os estilos específicos da aprendizagem, torna-se bastante útil (WILLIAMS, apud MARKOVA, 2000).

Partindo desse pressuposto, ao professor cabe oferecer, através de sua prática, um ambiente que respeite as diferenças individuais permitindo que os aprendizes se sintam estimulados do ponto de vista intelectual e emocional. Daí a necessidade do educador, consciente de seu papel de interventor responsável pela mediação da informação, buscar estruturar o ensino de modo que os alunos possam construir adequadamente os conhecimentos a partir de suas habilidades mentais. E para isso, é imprescindível que conheçam os significativos estudos da neurociência, uma vez que esses, sem dúvida, influenciam na compreensão dos processos de ensino e de aprendizagem.

 No cérebro humano existem aproximadamente cem bilhões de neurônios (unidade básica que processa a informação no cérebro) e, cada um destes pode se conectar a milhares de outros, fazendo com que os sinais de informação fluam maciçamente em várias direções simultaneamente, as chamadas conexões neurais ou sinapses (BEAR, CONNORS, PARADISO, 2002, p. 704).

Se os estados mentais são provenientes de padrões de atividade neural, então a aprendizagem é alcançada através da estimulação das conexões neurais, podendo ser fortalecida ou não, dependendo da qualidade da intervenção pedagógica.

A pesquisa e o interesse em neurociências tem crescido em resposta à necessidade de, não somente entender os processos neuropsicobiológicos normais, mas também para respaldar a ciência da educação.

É sabido que ocorrem dificuldades de comunicação entre neurocientistas e educadores devido à linguagem diversa empregada em suas terminologias específicas profissionais, bem como a utilização de temas, métodos, lógicas e objetivos diferentes. No entanto, novos desafios históricos têm redimensionado e emergidos novos paradigmas, os quais impulsionam a ciência e a todos aqueles que se preocupam com a integridade humana, nos aspectos físico, emocional e, em particular, sócio-cultural. Nesse âmbito atuam os processos sócio-educacionais, cujos reflexos encontram eco na plasticidade das células cerebrais.

 Todas as reflexões desta pesquisa tiveram como intuito maior compreender e ainda que minimamente, contribuir na discussão e na procura de respostas de como instrumentalizar o professor do ensino fundamental, através do conhecimento das conexões neurais e plasticidade cerebral envolvidos no processo de aprendizagem, visto ser este de vital importância para todos os seres humanos. Através da aprendizagem, o indivíduo constrói e desenvolve os comportamentos que são necessários para sua sobrevivência, pois não há realizações ou práticas humanas que não resultem do aprendizado.

O estudo dos processos de aprendizagem e de todos os fatores que os influenciam, constitui um dos maiores desafios para a educação, pois ao entendê-lo e explicitá-lo, ocorre o desenvolvimento do sujeito dentro do contexto sócio-histórico, e é através dele que se forja a personalidade e a racionalidade humana para que o indivíduo esteja apto a exercer sua função social.

 Durante todo ensino fundamental I, o professor é visto pelo aluno como um exemplo a ser seguindo e sua opinião é de extrema consideração para o aprendiz. Assim, todo e qualquer parecer do professor em relação ao aluno, torna proporções determinantes para a formação da auto-estima do estudante.

Para a sala de aula, para a educação a Neurociência é e será uma grande aliada para identificar cada ser humano, como único e para descobrirmos a regularidade, o desenvolvimento, o tempo de cada um.

 A Neurociência traz para a sala de aula o conhecimento sobre a memória, o esquecimento, o tempo, o sono, a atenção, o medo, o humor, a afetividade, o movimento, os sentidos, a linguagem, as interpretações das imagens que fazemos mentalmente, o "como" o conhecimento é incorporado em representações dispositivas, as imagens que formam o pensamento, o próprio desenvolvimento infantil e diferenças básicas nos processos cerebrais da infância, e tudo isto se torna subsídio interessante e imprescindível para nossa compreensão e ação pedagógica. Os neurônios espelho, que possibilitam a espécie humana progressos na comunicação, compreensão e no aprendizado. A plasticidade cerebral, ou seja, o conhecimento de que o cérebro continua a desenvolver-se, a aprender e a mudar, até à senilidade ou à morte também altera nossa visão de aprendizagem e educação. Ela nos faz rever o fracassoe as dificuldades de aprendizagem, pois existem inúmeras possibilidades de aprendizagem para o ser humano, do nascimento até a morte.

Figura 1 – O cérebro humano

O cérebro realiza várias tarefas incríveis:

·   controla a temperatura corpórea, a pressão arterial, a freqüência cardíaca e a respiração;

·   aceita milhares de informações vindas de teus vários sentidos (visão, audição, olfato); 

·   controla o movimento físico ao andar, falar, ficar em pé ou sentar;

·   deixa você pensar, sonhar, raciocinar e sentir emoções.

 Todas essas tarefas são coordenadas, controladas e reguladas por um órgão que tem mais ou menos o tamanho de uma pequena couve-flor: teu cérebro.

O cérebro, medula espinhal e nervos periféricos compõem um sistema de controle e processamento integrado de informações. O estudo científico do cérebro e do sistema nervoso é chamado de neurociência ou neurobiologia. começar dando uma visão geral sobre esse órgão.

É no cérebro que está o "mundo intrincadamente organizado e internamente consistente, construído como resultado da experiência, não da instrução, e integrado em um todo coerente como resultado de uma permanente aprendizagem e pensamentos adquiridos com total desenvoltura" (SMITH, 1999).

Isso significa que em nossa mente há uma "teoria" de como o mundo é para o indivíduo. Essa teoria é complexa e corresponde à síntese de toda experiência vivida, valores, conhecimentos, lugar social. Somente conseguimos atribuir sentido ao mundo através da relação com a nossa teoria pessoal; ou seja, aprendemos algo, modificando e elaborando nossa teoria.

É, portanto, através da experimentação que se desenvolvem as teorias de mundo; pois levantamos hipóteses sobre os fatos, fenômenos, eventos; testamos, modificamos, alteramos, confirmamos, confrontamos ou não essas hipóteses através de experimentos. Podemos dizer que experimentos são situações de aprendizagem e a aprendizagem é a base da compreensão e vice-e-versa, conforme nos apresenta (SMITH,1999, p. 87):

Não podemos separar a aprendizagem da compreensão. A compreensão é essencial para aprender e aprender é a base da compreensão. A compreensão e a aprendizagem são, fundamentalmente, a mesma coisa. Para compreender, precisamos prever, para aprender, devemos construir hipóteses, e tanto a previsão como a construção de hipóteses surgem da nossa teoria de mundo. A única diferença é que as previsões são baseadas em algo que já faz parte de nossa teoria de mundo.

Figura 2 – Tipos de cérebros

A evolução da neurociência permite, atualmente, visualizar cada parte do cérebro vivo em ação, do maior circuito até a sinapse no diminuto espaço entre neurônios. É possível registrar a atividade elétrica de uma única molécula no cérebro. Utilizando essas técnicas está ocorrendo um extraordinário fluxo de estudos científicos sobre a mente e o cérebro, sobre o processo de pensamento e aprendizagem, nos processos neurológicos que ocorrem durante o pensamento e a aprendizagem e no desenvolvimento de competências.

A infância é uma fase da vida definida pela maleabilidade do cérebro e sua predisposição de aprender certas habilidades com pouco esforço como, por exemplo, aprender a falar uma língua e sua dependência de outros para prover os estímulos apropriados à aprendizagem. Já a adolescência caracteriza-se pela predisposição do indivíduo em responsabilizar-se pela sua própria tomada de decisão.

Na medida em que os cientistas estudam o processo da aprendizagem eles verificam que o modelo construtivista de aprendizagem reflete melhor o processo natural do cérebro de fazer sentido do mundo ao seu redor. O construtivismo defende que a aprendizagem é essencialmente ativa.

Uma pessoa aprendendo algo novo incorpora a essa experiência toda a sua bagagem anterior de experiências e padrões mentais. Cada novo fato ou experiência é assimilado num rede viva de compreensão que já existe na mente dessa pessoa. A aprendizagem não é nem uma atividade passiva e nem simplesmente objetiva.

Todos esses novos avanços nos levam a refletir sobre a real utilidade das aulas expositivas e do ensino que se limita em sua grande parte a fornecer informações.

De acordo com as pesquisas realizadas, afirma-se que o cérebro divide-se em dois hemisférios e que o temperamento de cada pessoa tem relação direta com a utilização desses hemisférios. As pessoas que apresentam o lado esquerdo mais desenvolvido são tendentes a usarem de forma adequada à lógica, a matemática possuindo habilidades para planejar e organizar suas ações. Já que é o lado mais intuitivo do homem. Por isso são introspectivas, amorosas, delicadas e mais racionais.

O lado direito do cérebro é responsável pela imaginação criativa, a serenidade, a capacidade de síntese, a facilidade de memorizar. As pessoas que utilizam mais esse lado do cérebro possuem habilidades para analisar esquemas e técnicas em oratórias.

Para que a memória funcione adequadamente no processo de informação, se faz necessária a busca da integração entre os dois hemisférios, equilibrando o uso de nossas potencialidades. Como se processam muitas informações diárias, o cérebro acaba seletivo, guardando apenas informações que o impressionem, desenvolvendo a capacidade para fixação dos fatos.

Figura 3 – Principais partes do cérebro humano

Manter ativada a atenção é de suma importância, visto que, normalmente, o ser humano distrai-se com facilidade.

Alguns pesquisadores sugerem que se recorra à música, pois o uso de uma música apropriada diminui o ritmo cerebral, contribuindo para haver uma equilibração no uso dos hemisférios cerebrais. Enfatizam ainda que a música barroca, especialmente o movimento "largo" propiciam um bom aprendizado.

Diante dos estudos realizados pelos pesquisadores conclui-se que se torna necessário estimular as áreas do cérebro objetivando auxiliar aos neurônios a desenvolverem novas conexões; educar as crianças desde a mais tenra idade em um ambiente enriquecedor, estimulando a linguagem falada, cantada, escrita criando um clima estruturado com afetividade diversificando positivamente as sensações, com a presença de cor, de música, de interações sociais, e de jogos visando o desenvolvimento de suas capacidades cognitivas e memórias futuras, favorecendo assim o seu processo de aprendizagem.

Nesse sentido observa-se que devido às inúmeras pesquisas desenvolvidas sobre o cérebro no processo de aprendizagem, se verifica que cada indivíduo possui diferentes potenciais de inteligência. E que ela não é fixa, já que todo ser humano possui habilidade para expandir e aumentar sua própria aprendizagem. Segundo Rogers (1967), o aluno deve ter desejo de aprender e o professor, como o facilitador do aprendiz, deverá ser o motivador da aprendizagem. Apreciando, escutando e respeitando o estudante, criando um estabelecimento de vínculo positivo confiando na capacidade de crescer e aprender do aluno.

Por fim, a escola tem um importante desafio, que é o de aproveitar o potencial de inteligência de seus alunos para conquista do sucesso no processo de aprendizagem. Os professores são os principais agentes, por meio do desenvolvimento de projetos de interesse para a realidade do ensino e aprendizagem. Quando compreendem que aprendizagem envolve cérebro, corpo e sentimentos, adotam uma ação mais competente, levando em conta a influência das emoções para o desenvolvimento na construção do conhecimento.

1.2 A RELAÇÃO ENTRE O CÉREBRO E A APRENDIZAGEM

Segundo Johnson & Myklebust (1983) o cérebro funciona de forma semi – autônoma, ou seja, um sistema pode funcionar sozinho; pode funcionar com dois ou mais sistemas; ou pode funcionar de forma integrada (todos os sistemas funcionando ao mesmo tempo).

Os sistemas mais presentes no nível de distúrbios neurogênicos são: auditivo, visual e tátil.

Se o professor toma conhecimento deste funcionamento cerebral, pode ressignificar sua prática docente adotando uma didática que caminhe na forma sensório-motora ao funcionamento operatório formal (SOARES, 2003).

 Existem três formas de aprendizagem:

1) aprendizagem Intra – Neurosensorial;

2) aprendizagem Inter- Neurosensorial;

3) aprendizagem Integrativa.

 Vale ressaltar que um tipo ou forma de aprendizagem não é exclusivamente intra-neurosensorial, o que precisa ser pontuado é que se, um sistema estiver comprometido, não necessariamente irá comprometer outros. É neste sentido que uma aprendizagem pode ser estudada como intra – neurosensorial. Já a aprendizagem inter- neurosensorial é o tipo que mais nos interessa (educadores), quando se estabelece uma atuação preventiva.

Estudos mostram que certa aprendizagem ocorre quando dois ou mais sistemas funcionam de forma inter – relacionada. Fazer uso da música em atividades escolares é um recurso valioso, pois há a possibilidade de trabalhar simultaneamente os sistemas auditivos, visuais e até mesmo o sistema tátil (caso a música desencadeie uma dramatização).

A proposta é dar uma aula que 'facilite' o funcionamento inter desses sistemas, sem necessariamente o professor ter que saber, se a melhor forma daquele sujeito em lidar com os objetos externos é: auditiva, visual ou tátil. Montar um planejamento com esses pré- requisitos é uma forma de atuação saudável, onde Educação e Saúde possam caminhar lado a lado.

Conseqüentemente, esta atuação sob este ponto de vista, facilitará outro tipo de aprendizagem – Integrativa.

Se o professor tiver conhecimento da modalidade de aprendizagem do seu aluno, poderá transformar- se em um facilitador do processo ensino – aprendizagem.

Exigir uma atuação padrão dos alunos é um caminho improdutivo; cada um é um, com o seu próprio tempo lógico e psicológico e cada um tem uma maneira específica de lidar com o conhecimento. Respeitar esta "veia", este "canal" para o ato de aprender é preservar o cérebro de uma possível sobrecarga que só contribuiria para uma desintegração total da aprendizagem.

Proporcionar uma aula trabalhando com as crianças os quatro níveis de aprendizagem: Organismo – Corpo - Desejo - Inteligência (FERNÀNDEZ, 1991) permeado pelos princípios ligados ao ato de aprender: Atividade – Criatividade – Autoridade – Liberdade (Borges, 1994) com certeza favorecerá uma atuação psicopedagógica preventiva de forma a não construir nas crianças os problemas de aprendizagem em função do desconhecimento da relação que há entre cérebro e os modos pelos quais o homem aprende. 

[...] o professor precisa estar ciente de que algumas crianças formam conceitos espontaneamente quando adquirem a facilidade verbal necessária. Por outro lado, muitas precisam ser ajudadas a aprender a generalizar e categorizar. Freqüentemente, essas crianças têm dificuldades com os significados múltiplos de uma palavra, com provérbios e metáforas.(JOHNSON E MYKLEBUST, 1987).

1.3 DISFUNÇÕES CEREBRAIS – VERBAIS E NÃO VERBAIS

O cérebro atua como um todo interligado, como um receptor, coordenador e processador de todos os estímulos do ambiente através do Sistema Nervoso. Fazendo uma análise das variáveis envolvidas no processo de aprender, o funcionamento cerebral estaria inserido na categoria orgânica. Qualquer alteração nele observada será refletida na corporeidade do sujeito. 

Segundo Fernàndez (1991), o gráfico a seguir representa os níveis de aprendizagem:

Figura 4 – Os quatro níveis de aprendizagem

Figura 5 – Níveis de aprendizagem

A aprendizagem baseia-se em hierarquia de experiências. Dá-se em espiral dialética, com funções superpostas e interligadas.

Dessa forma, os distúrbios de aprendizagem conseqüentes de disfunções cerebrais também terão uma esfera de atuação relacionada ao nível hierárquico onde o distúrbio se observa.

No esquema apresentado (figura 4) , podemos observar como um distúrbio no nível da formação de imagens afetará os níveis da simbolização e da conceituação, e não influirá nos níveis mais primitivos (sensação e percepção).

Nos deteremos, aqui, na discussão dos processos de aquisição das linguagens interna, receptiva e expressiva, pontuando alguns dos distúrbios que podem ocorrer em relação a cada uma delas.

 Linguagem Interna

 É o primeiro aspecto a ser adquirido, correspondendo à internalização do vivenciado com a língua materna na construção de sua própria linguagem. A criança nasce num mundo simbólico sem saber simbolizar, portanto é a partir da organização de sua linguagem que se faz a regulação deste processo.

Vygotsky (1991) diz que "a palavra sem significado não é palavra"; para que tenha significado, precisa representar a experiência vivenciada, isto é, a língua com a qual se pensa.

A linguagem interna será sempre estruturada na língua nativa, mesmo que o sujeito utilize mais de um código de linguagem. Com exemplo disto, temos que no bilingüismo terá sua organização de pensamento vinculada à língua nativa; o surdo à linguagem dos sinais, eoutros.

 Como a linguagem interna pode estar alterada?

·Dificuldades da capacidade de adquirir conceitos – não categoriza, nem classifica, nem conceitua. ( afeta a conceituação)

·A criança lê bem, mas não consegue compreender o significado (afeta a simbolização).

·Dificuldade para adquirir o significado; lê, ouve, vê e não decodifica a experiência vivida (verbal ou não – verbal).

     Exemplos:

·Afasia Global ou central – dificuldade de organização da linguagem interna. (afeta a percepção)

·Dislexia simbólica – dificuldades de decodificar símbolos (afeta simbolização).

 Nos distúrbios da Linguagem interna, simbolização e formação de imagens deverão estar alteradas, ficando o indivíduo apenas no nível de sensação e percepção.

Por isso é considerada um dos distúrbios mais complexos, apesar de não haver, necessariamente, comprometimento mental.

 Linguagem Receptiva

Segunda faceta da linguagem a ser adquirida, é responsável pela capacidade para compreender a palavra falada composta pelo feedback auditivo e visual. Existe uma relação intrínseca e recíproca entre a recepção e expressão. No que diz respeito à palavra falada, a compreensão antecede a expressão; é preciso compreender antes que a palavra possa ser usada com significado na comunicação. Da mesma forma, em termos de sistema verbal visual, a leitura antecede a escrita. 

Como as capacidades receptivas são abrangentes, elas podem ser afetadas de várias formas:

·A criança surda e cega que não recebe estímulos a nível auditivo e visual (afeta a sensação)

·A criança percebe erroneamente o que ouve e vê em decorrência de: disacusia – dificuldade da capacidade da audição via área – periférica (não afeta nervo auditivo)

 Má discriminação auditiva e visual, não percebendo as palavras que soam de modo parecido ou têm formas semelhantes. Ex: fonemas com o mesmo ponto articulatório( /p/ e /b/ , /q/ e /g/, /f/ e /v/); fonemas com formas semelhantes ( /b/ e /d/, /q/ e /g/).

A criança não compreende ordens complexas, ficando paralisada sem saber o que fazer. Ex: "Vá lá em cima, tire seu casaco, pendure no cabide, pegue seu livro e traga para mim."

A criança com memória em seqüência alterada no mecanismo de repetição de palavras, números e sentenças;

E com memória momentânea prejudicada. (formação de imagens).

A percepção, como processo receptivo, não subentende somente a discriminação, a capacidade de distinguir entre os sons ou estímulos visuais, mas também a capacidade de organizar a sensação num todo significativo, a capacidade de estruturar a informação que está sendo recebida. O processo global de recepção é uma faceta complexa de experiências, exigindo atenção, organização, discriminação e seleção. Neste sentido, a percepção é o que está mais alterado.

 Linguagem Expressiva

Quando a criança adquire unidades significativas de experiências e quando a compreensão encontra-se estabelecida, ela está pronta para comunicar-se com outras pessoas utilizando sua linguagem expressiva. A expressão pressupõe a recepção; portanto se a criança não conseguir discriminar as palavras que tem sons ou aparências semelhantes, sua linguagem expressiva está deficiente. Por outro lado, conforme vimos, a recepção pode estar intacta sendo deficiente apenas a expressão; já que os sistemas de expressão e recepção do cérebro são interdependentes de um modo semi- autônomo. No entanto, é raro uma criança manifestar uma condição pura.

 Como pode estar alterada?

Apraxias – desconexão de sistemas cerebrais descoordenando a ação da criança tanto a nível verbal como não – verbal.

·Afasia expressiva – Área de Broca lesada – área da palavra falada (afeta a simbolização)

·Disfasia – devido a lesões no sistema nervoso central e / ou periférico; a paralisia em que os músculos têm sua ação inervadora dificultada, afetando a produção articulatória da fala.

·taxia – devido a lesões somente no sistema nervoso central, sem paralisia, os músculos estão inervados, mas a atividade motora não pode ser coordenada normalmente.

Os 'neuromitos' e a educação

1. A popularidade de uma alegação neurocientífica não significa, necessariamente, que ela seja válida;

2. A metodologia e a tecnologia da neurociência cognitiva estão ainda em formação;

3. A aprendizagem não está totalmente sujeita ao controle da consciência ou da vontade;

4. O cérebro passa por mudanças naturais de desenvolvimento durante a vida;

5.Muitas pesquisas da neurociência cognitiva têm buscado compreender ou resolver patologias ou doenças relacionadas com o cérebro;

6. Uma ciência satisfatória da aprendizagem deve considerar fatores emocionais e sociais, além dos cognitivos.

CONCLUSÃO

 Constatou-se, pelo estudo aqui apresentado, que determinadas áreas do cérebro podem ser mais responsáveis que outras, assim como os níveis hierárquicos em questão, mas parece que qualquer disfunção cerebral que altere a aprendizagem pode destruir a capacidade de conceituar que é a realização máxima do homem, englobando todas as facetas de sua aprendizagem e experiência; é vulnerável correlacionando com as variáveis do ato de aprender a questão afetiva, cognitiva, orgânica, inconsciente, consciente e transcendental. É importante sinalizar como são interdependentes, e intrinsecamente interligadas, já que o ser humano, paradoxalmente é o que nos faz sempre estar em busca, de e sempre evoluindo, para além de nós mesmos.

 Afinal, a ciência explica muito sobre a infância, a vida adulta e sobre a velhice, mas ainda não tem explicações efetivas a respeito da melhor maneira de ensinar a ajudar, da melhor forma possível, ao ser aprendente, a construir seu conhecimento de forma atuante e autônoma, pois é na relação do não saber x saber que se dá a beleza da vida humana.

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