CONSIDERAÇÕES DE UM QUASE LEIGO I

Por Eduardo Augusto Conde Cavalcante | 20/02/2014 | Crônicas

 

A realidade é que a rotina escolar não atrai, não empolga, não estimula.

 

CONSIDERAÇÕES DE UM QUASE LEIGO I

                   Há pouco, através da mídia televisiva, professores e outros profissionais atuantes no ensino fundamental, médio e superior teceram algumas considerações interessantes quanto à qualidade do ensino brasileiro, em todos os seus níveis.

                   Todos foram unânimes: a qualidade da educação brasileira anda longe de atingir o patamar da excelência. E, ao longo do debate, vieram à tona algumas das causas que obstruem o deslanchar do processo ensino-aprendizagem.

                   Embora não sendo profissional da área, arriscaria-me a dar alguns palpites quanto essa problemática que persiste há décadas, tendo como subsídios as minhas observações, embora no bojo dessas considerações, não haja nada de excepcional ou inédito.  

                   Parto da premissa de que o processo ensino-aprendizagem e todo o aparato que o envolve, parece sempre caminhar a passos lentos, no que diz respeito as significativas mudanças qualitativas e renovadoras no processo como um todo. As dificuldades vivenciadas hoje numa sala de aula, em termos de assimilação dos conteúdos, por exemplo, são as mesmíssimas de décadas atrás, realidade muito diferente da arrancada excepcional sentida e experimentada em outros campos de atividades.

                   É aquela velha história: Se “ressuscitássemos” hoje um professor e/ou um especialista em educação que permaneceram hibernados por, digamos, cinco ou dez anos, esses profissionais pouco ou quase nada ficariam maravilhados com os atuais procedimentos metodológicos, com as técnicas didáticas, com os progressos alcançados numa sala de aula. Quase nada a comemorar e assim não se sentiriam tão fora de “órbita” tanto quanto outros profissionais de outras áreas, submetidos às mesmas circunstâncias.

                   Quando nos meus saudosos tempos de estudante, eu e muitos colegas, enfrentávamos dois terríveis bichos-papões: Língua Portuguesa e Matemática, essa então nem se fala! Não havia força de vontade que me fizesse assimilar todas aquelas proposições matemáticas, aqueles teoremas, equações, integrais, alfas, betas, incógnitas e por aí vai.

                   Pois bem, falando-se a nível nacional, essas duas disciplinas citadas e consideradas “bicho de sete cabeças”, ainda hoje continuam detentoras do titulo. Vejamos, por exemplo, o caso da Língua Portuguesa. Verifiquemos algumas redações elaboradas por alguns candidatos que se submetem aos exames vestibulares. Que tal observarmos os índices impressionantes de reprovações dos recém formados que se submetem às provas exigidas pelas - OABs - Ordem dos Advogados do Brasil -, notadamente em termos de elaboração, interpretação e compreensão de textos. Detalhe: são profissionais, já egressos do ensino superior!

                   Alguns professores argumentam, e com absoluta razão que, se inexiste o hábito da leitura, aluno nenhum será suficientemente capaz de produzir bons textos. É uma verdade, mas o estranho é que proclamam essa “verdade”, como se o fato de não se ter o hábito de ler estivesse decretado, como se fosse uma verdade sacramentada que estaria definitivamente selada.

                   Prefiro crer que falta incentivos, motivação, estimulação tanto por parte dos pais, como do próprio ambiente escolar, dos gestores da educação desse país. Na mídia brasileira, por exemplo, vemos propagandas de tudo: xampus, CDs, DVDs, desodorantes, cremes de beleza, bronzeadores, laxantes... Menos de livros, bons livros.

                   Por outro lado, detendo-se especificamente no âmbito escolar, o que se esperar, em termos de incentivos, por parte de um professor de literatura, por exemplo, que se restringe tão somente a repassar, apática e mecanicamente, o conteúdo programático de sua disciplina? Que não mexe com o emocional de seus alunos; que não se empolga com o lirismo poético contido num texto, numa poesia, crônica, prosa ou num simples verso? Esse mestre pode até ser excelente profissional, em termos de ter pleno domínio do conteúdo programático de sua disciplina, mas jamais será capaz de envolver o emocional de seus alunos, de desenvolver habilidades para com a leitura, a escrita, a reflexão; aptidões essas que talvez estejam escondidas, ali, no aluno, aguardando uma oportunidade para aflorar.

                   É bem verdade que a ineficiência do ensino no país já não é nenhuma novidade. Determinados indicadores já não nos assustam, ao contrário, nos tornam apáticos, afinal, são as mesmíssimas ladainhas de discursos tão deprimentes. Reconheço que é enorme a gama de variáveis entranhadas no Sistema Educacional Brasileiro que emperram o processo ensino-aprendizagem, mas, convenhamos, muitas dessas variáveis estão inseridas no próprio ambiente escolar.

                   A “onda da vez” agora se volta para o aparato tecnológico, já decantado por alguns profissionais da educação, como a solução para quase todas as mazelas do processo educacional.

                   Acho que não é bem por aí. De pouca valia terá essa onda de tecnologia de informação e comunicação, se as mudanças não ocorrem nos agentes mediadores, que direta ou indiretamente, ainda possuem a função de disseminarem conhecimentos. Apesar de todo o aparato tecnológico, professores e especialistas da educação, continuam sendo imprescindíveis no bojo de todo processo. Mudanças na essência do conjunto, esse me parece um dos pontos cruciais dessa problemática.

                   Você, enquanto professor, alguma vez já se perguntou por que a escola, o ambiente escolar e muitas das atividades desenvolvidas numa sala de aula, no ensino básico, principalmente, não conseguem ser tão atrativas ao aluno? Por que as atividades desenvolvidas em sala de aula não despertam o prazer pelo aprender? 

                   Alguns especialistas já se questionaram quanto esse detalhe, ao propalarem o lema do “aprender-se brincando”, há, inclusive, projetos educacionais belíssimos nesse sentido, mas a realidade é que a rotina escolar não atrai e muito menos cria expectativas para a clientela escolar. A verdade então parece ser só uma: enquanto houver essa apatia, enquanto a relação professor versus aluno não for uma vinculação atrativa, estimulante, motivadora, o resultado final de toda empreitada sempre será medíocre.

                   Você, caro leitor, quando estudante, quantas vezes não vibrou ao chegar à escola, até mesmo à faculdade e de repente surgir a noticia de que não haveria aula?  Hoje você é pai de família e já deve ter visto um sorriso estampado no rosto do seu filho, quando ele sabe que não precisará ir à escola porque é feriado. Na realidade, vai-se mesmo é por imposição!

                   Já é praxe se argumentar que a péssima remuneração desses profissionais é a principal causa de toda problemática. É verdade, talvez uma das tantas variáveis, mas precisamos ver que o que entra em jogo é a figura do profissional. E mais, até arriscaria uma pergunta: será mesmo que se o professor “ganhasse bem”, a situação seria melhor?

                   Sim, é uma pergunta pertinente, levando-se em consideração que há incentivos ao profissional que deseja se qualificar. Ultimamente há um contingente enorme de profissionais da educação em busca de qualificação e aperfeiçoamentos, através de cursos de especialização, pós-graduação, mestrados e doutorados, mas me parece, em alguns casos, que esse afã está mais voltado para o interesse em rechear currículos, obter status, engordar salários, alimentar a vaidade pessoal. O resultado final desses “aprimoramentos”, parece nunca chegar às salas de aula. Toda aquela bagagem de conhecimentos adquirida pelo professor parece em nada melhorar ou impulsionar o processo.                    

                   E o que se dizer do Ensino Superior? Há professores e especialistas atuantes no ensino superior alegando que a universidade está sendo invadida por legiões de novos universitários que galgam os degraus do ensino superior, mas não apresentam base sólida de conteúdos; aqueles conteúdos que deveriam ter sido adquiridos em níveis de ensino anteriores. A Universidade, argumentam, seria então a grande vítima do Sistema.

                   Nesse contexto vejo duas considerações: primeiro, quando o aluno, no caso o pré-universitário, submete-se a um exame vestibular e logra êxito, ele passou por um processo de avaliação. Portanto, se esse aluno obteve êxito nas baterias de provas as quais foi submetido, supõe-se que a sua bagagem de conhecimento, atendeu ao que lhe foi exigido; se não, o processo de avaliação é falho, até demais. Segundo, se a universidade está sendo invadida por alunos que demonstram não ter base sólida dos conteúdos que deveriam ter sido assimilados em níveis de ensino anteriores, não podemos esquecer que a universidade é uma das principais formadoras dos profissionaisqueestão atuando naeducaçãobásica(níveis infantil, fundamental e médio). Isto é, são professores egressos da universidade, cumpriram sua parte ao galgarem os degraus do saber.  

                   O fato é que muitos deles são vítimas de um sistema manco, acadêmico demais, quase desvinculado do contexto da realidade. Ao concluírem seus estudos e partirem para o mercado de trabalho, parece lhes faltar experiência, vivência, prática. Principalmente a prática, que ao longo de alguns cursos, é reduzido a meros estágios supervisionados.

                   Há muito discursos, falácias, teorias, linguajares técnicos de novas propostas de ensino, de novas técnicas pedagógicas, belíssimas na essência, mas não conseguem romper os limites da inoperância.. De repente tem-se a impressão de que todo esse aparato pedagógico discutido nas universidades, principalmente, é produzido em laboratórios, distante da realidade das nossas escolas.

eduardo.conde@uol.com.br

ISBN 85-7463-078-0