CONCRETO SUSTENTÁVEL APLICADO NA CONSTRUÇÃO CIVIL

Por Antônio Vitor Barbosa Fernandes | 28/09/2016 | Engenharia

Como citar esse artigo:
FERNANDES, A. V. B.; AMORIM, J. R. R. Concreto sustentável aplicado na construção civil. Caderno de Graduação - Ciências Exatas e Tecnológicas, v. 2, p. 79-104, 2014.

CONCRETO SUSTENTÁVEL APLICADO NA CONSTRUÇÃO CIVIL

ANTÔNIO VITOR BARBOSA FERNANDES

JOSÉ RICARDO RIBEIRO AMORIM

RESUMO

Os avanços da tecnologia e do sistema econômico globalizado proporcionaram uma produ-  ção em larga escala de todos os setores. A construção civil está entre os mais importantes investimentos, pois está presente em qualquer desenvolvimento urbano. Assim tornou-se res- ponsável por praticamente a metade do consumo de recursos naturais, gerando preocupação para os ambientalistas, não só pela extração da matéria-prima, mas também pelos processos de fabricação dos materiais. Desse modo, com o advento da sustentabilidade, foram realizadas várias pesquisas voltadas para o reaproveitamento ou reciclagem dos resíduos descartados  nas obras ou gerados pela demolição, em especial para o concreto, principal componente da construção. Alguns aspectos foram identificados como necessários para um gerenciamento mais adequado: uma fiscalização mais eficaz ou novas formas de fiscalização podem reduzir    o número de deposições clandestinas; um contínuo investimento na educação da população para tomada de consciência; a adoção de novas diretrizes que também objetivem a minimiza- ção dos resíduos, o que implicaria na diminuição de resíduo entrando no sistema de limpeza urbana. Os resultados encontrados são favoráveis em termos de viabilidade e economia, po- rém em alguns países ainda se encontram dificuldades em relação à gestão desses resíduos por ser algo relativamente  recente.

1 INTRODUÇÃO

O desenvolvimento econômico, o crescimento populacional, a urbanização e a revolu- ção tecnológica causaram alterações no estilo de vida e nos modos de produção e consumo da população. Como decorrência direta desses processos, vem ocorrendo um aumento na produção de resíduos sólidos, tanto em quantidade como em diversidade, principalmente nos grandes centros urbanos. Além do acréscimo na quantidade, os resíduos produzidos atu- almente passaram a abrigar em sua composição elementos sintéticos e perigosos aos ecos- sistemas e à saúde humana, em virtude das novas tecnologias incorporadas ao cotidiano (FERREIRA e ANJOS, 2011).

Diariamente, são coletadas no Brasil entre 180 e 250 mil toneladas de resíduos sólidos urbanos (RSU) e estima-se que a geração dos resíduos sólidos oriundos da construção e de- molição (RCD) seja na ordem de 68,5 x 10 t/ano (ÂNGULO et al., 2002; IBGE, 2010). Em cidades brasileiras de médio e grande porte, os resíduos das construções civis (RCC) variam entre 45% a 70% da massa total dos RSU gerados em Salvador, entretanto a Prefeitura de São Paulo, que gerencia 40% dos RCC, tem uma estimativa de 280 kg/hab.ano (RESÍDUOS.., 2003). Quando ignorados pelas prefeituras, os RCD são responsáveis por deposições ilegais tanto no Brasil como no exterior (PINTO, 1999). A imprecisão nessa estimativa se deve a diferentes metodo- logias empregadas nos levantamentos realizados e as dificuldades inerentes a essa avaliação.

O setor da construção civil é responsável por 15 a 50% do consumo dos recursos na- turais, e com certeza é o maior gerador de resíduos de toda a sociedade (JOHN e   AGOPYAN, 

2013). Além disso, a habitação consome muita energia em todo o seu ciclo de vida, como   pode ser visto na Figura 1, que mostra a maneira como se consome energia no Planeta, sendo que a habitação é responsável por 50% desse consumo.

 

A perspectiva de aumento no número resíduo sólido tem gerado estudos em vários paí- ses, quanto às possibilidades de reaproveitamento desses resíduos como agregados (PEREIRA et al., 2012). Comparado a países de primeiro mundo, a reciclagem de resíduos no Brasil como materiais de construção é ainda tímida, com a possível exceção da intensa reciclagem prati- cada pelas indústrias de cimento e de aço (ÂNGULO et al., 2001).

Segundo Pinto (1999), é aceitável a afirmação de que a perda varia entre 20 e 30% da massa total de materiais para a construção empresarial (construção residencial em edifícios),    a depender do nível tecnológico do    construtor.

As atividades de construção demandam uma quantidade notável de materiais inertes, tais como areia e cascalho, usualmente fornecidos por meio da extração de sedimentos aluviais, que modifica o perfil e o equilíbrio dos rios, além de introduzir problemas ambientais, tais como mo- dificações em sua estrutura hidrológica e hidrogeológica. A extração de material inerte de forma- ções rochosas em áreas acidentadas e montanhosas, também, é uma atividade danosa ao meio ambiente, pois altera e desestabiliza a paisagem (BIANCHINI et al., 2005). Por isso a substituição dos agregados convencionais por agregados reciclados apresenta diversas vantagens, como eco- nomia na aquisição de matéria-prima, redução da poluição gerada pela produção dos agregados e melhora na preservação das reservas naturais de matéria-prima do planeta (PEREIRA et al., 2012).

As características dos resíduos usados influenciam em muitas das propriedades do concreto com agregados reciclados. As alterações podem ser percebidas tanto no estado

fresco como no estado endurecido do concreto moldado a partir de resíduos. As carac- terísticas do agregado reciclado, incluindo alta porosidade e elevado nível de impurezas, afetam a resistência mecânica de concretos produzidos  com  esses  materiais  e  limitam suas aplicações (PEREIRA, 2012).

As principais aplicações do RCD e do dos agregados reciclados de concreto (ARC) ocor- rem em bases e sub-bases de pavimentação (POON et al., 2006). Os processos e custos de transporte, moagem e separação do agregado de concreto, entretanto, são fatores limitantes para a aplicação. Perante essa ótica, a utilização do ARC em aplicações mais nobres, como na fabricação de novos concretos, é uma alternativa   interessante.

Deste modo, o objetivo central deste trabalho é avaliar a aplicação da reciclagem do concreto na construção civil diante das novas tendências de preservação ambiental e de or- dem econômica, mostrando as vantagens e dificuldades deste processo, observando as reco- mendações da Resolução 307 do Conselho Nacional do Meio Ambiente (CONAMA).

2 REVISÃO DE LITERATURA

Segundo a Resolução 307 do Conselho Nacional do Meio Ambiente – CONAMA (2002), os resíduos de construção civil são:

os provenientes de construções, reformas, reparos e demolições  de  obras de construção civil, e os resultantes da preparação e da escavação de terrenos, tais como: tijolos, blocos cerâmicos, concreto em  geral,  solos, rochas, metais, resinas, colas, tintas, madeiras e compensados, forros, argamassa, gesso, telhas, pavimento asfáltico, vidros, plásticos, tubulações, fiação elétrica etc., comumente chamados de entulhos de obras, caliças ou metralha.

Do ponto de vista ambiental, o principal problema com os resíduos sólidos oriundos da construção e demolição (RCD) e os resíduos das construções civis (RCC) está relacionado à sua deposição irregular que na maioria dos municípios brasileiros são depositados em bota-

-fora clandestino, nas margens de rios e córregos ou em terrenos baldios, gerando grandes volumes (JOHN e AGOPYAN, 2013). No Brasil, os números estimados por PINTO (1999) para cinco cidades médias variaram entre 10 e 47% do total gerado. De acordo com John e Agopyan (2013) estes resíduos quando são depositados irregularmente promovem enchentes, prolifera- ção de vetores nocivos à saúde, interdição parcial de vias e degradação do ambiente urbano.

Acrescentando, Gouveia (2012) relata que o grande desafio para as grandes cidades na gestão de resíduos sólidos, neste início de século, pode ser enfrentado pela elabora-  ção de políticas públicas que tenha como objetivos a eliminação dos riscos à saúde e ao ambiente, colaborando com a suavização das mudanças climáticas relacionadas à ação humana e, ao mesmo tempo, garantindo a inclusão social efetiva de parcelas significa-  tivas da população.

 

O grande desperdício de materiais na construção civil brasileira é muito elevado. Carnei- ro e outros autores (2001 apud MOTTA e FERNANDES, 2003), relatam que os resíduos gerados nessa atividade possuem uma considerável heterogeneidade em termos da sua composição. Sua quantidade varia de 54% a 70% dos resíduos sólidos urbanos de cidades brasileiras, como o Rio de Janeiro e Belo Horizonte, representando uma geração per capita entre 0,4 e 0,76 t / hab./ano (MOTTA; FERNANDES, 2003).

Schuchovski (1995) considera importante fazer distinção entre perdas e desperdícios. Segundo ele, as perdas de materiais, tempo e dinheiro, são decorrentes de diversos fatores, entre eles o desperdício puro e simples. Ele considera que o desperdício de 30 % preconizado pelo setor da construção civil, deve ser considerado como perdas, e apenas 3,5% (em relação ao custo final das obras) podem ser vistos como desperdícios (jogar fora por desídia, descuido, relaxamento e mau gerenciamento).

Segundo Leal (2001) estima-se que no Brasil em média 65% do material descartado é de origem mineral, 13% madeira, 8% plásticos e 14% outros materiais. Estima-se, também, que argamassa, concreto e cerâmica vermelha correspondem, juntos, a mais de 60% do total do RCD gerado (CABRAL, 2007), enquanto que na Europa, esses materiais correspondem a algo em torno de 50% do total do RCD (HENRICHSEN, 2000).

Em relação à geração de entulho, a situação da cidade de Goiânia é igual das demais cidades brasileiras. Segundo a prefeitura, a geração de entulho na capital de Goiás gira em torno de 586.276 t/ano, sendo que desse total 60% é entulho passível de reutilização (OLIVEIRA et al., 2005).

O entulho é composto por restos de todos os materiais de construção (concretos, pe- dras, tijolos, areia, argamassa, cerâmicas, metais, madeira, papéis, plásticos, tintas, etc.). Mas Zordan (1997) afirma que a maior fração de sua massa é formada por material não mineral (madeira, papel, plásticos, metais e matéria orgânica).

Em alguns países existem regulamentações que proíbem e punem os responsáveis pela deposição de resíduos no meio-ambiente. No Reino Unido, a cobrança de taxas pela depo- sição de resíduos de concreto no meio ambiente, tem incentivado as usinas de concreto pré-misturado a reduzir substancialmente a quantidade de resíduo produzido (SEALEY et al., 2001). Buttler (2003) relata que na Inglaterra, o Estado cobra uma taxa da construtora de todo o resíduo gerado na obra; a preocupação, em princípio, não é apenas com o desperdício em si, mas sim com o provável impacto que esse resíduo gerará no meio ambiente; caso esse resíduo seja previamente separado na obra, a taxa a ser cobrada será menor.

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