CONCEPÇÕES DE DOCENTES E DISCENTES ACERCA DE METODOLOGIAS...

Por Tiago José Silveira Teófilo | 12/10/2016 | Educação

CONCEPÇÕES DE DOCENTES E DISCENTES ACERCA DE METODOLOGIAS DE ENSINO-APRENDIZAGEM: Análise do Caso do Curso de Enfermagem da Universidade Estadual do Vale do Acaraú em Sobral-CE

TIAGO JOSÉ SILVEIRA TEÓFILO

 

INTRODUÇÃO 

O movimento da Reforma Sanitária Brasileira representa, desde a década de 1970, um pensamento contra-hegemônico que objetiva a transformação/construção do sistema de saúde vigente. Nesse movimento, incentivados pelo fim do período de expansão econômica e a abertura política da década de 1980, os movimentos sindicais, profissionais da saúde, das ciências sociais etc., questionaram a política social e as demais políticas governamentais e buscaram participar da organização do sistema nacional de assistência social (ANDRADE, 2002).

Com a democratização e otimização das Conferências Nacionais de Saúde–CNS, já em 1986, na 8a Conferência Nacional de Saúde, onde houve participação efetiva de vários setores organizados da sociedade, discutiu-se fortemente sobre a saúde como direito de cidadania, a reformulação do Sistema Nacional de Saúde e o seu financiamento. Isso culminou com a criação do Sistema Único de Saúde-SUS, junto à Constituição de 1988, onde se iniciou uma “reformulação institucional e ideológica” da saúde no Brasil. Assim, ao estabelecer a “saúde como direito de todos e dever do Estado”, o princípio central da Reforma Sanitária passa a ser garantido pela Constituição Federal.

Em tal constituição, tem-se como atribuição do SUS, em seu artigo 200, a ordenação e formação de trabalhadores na área da saúde e o incremento em sua área de atuação ao desenvolvimento científico e tecnológico. Contudo, somente na Lei Orgânica da Saúde de 1990, é que vemos um verdadeiro planejamento para a formação de profissionais de saúde. Por esta Lei, a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios participarão na formulação e na execução da política de formação e desenvolvimento trabalhadores para a saúde no Brasil (BRASIL, 2004).

Desde então, através das CNS, a ordenação da formação de trabalhadores para a saúde foi se desenvolvendo e se tornando primordial para a construção/efetivação do SUS. Foram criados programas permanentes de capacitação, escolas de saúde pública, sistemas de acompanhamento institucional de projetos de mudança curricular, redes de integração ensino-serviço-sociedade, pólos de educação permanente em saúde, entre muitas outras ações (BRASIL, 2004).

Nesse contexto de discorrer sobre a construção histórica do ensino das profissões de saúde, limitaremos nossa busca, na formação de enfermeiros, que no Brasil tem seu início de forma sistematizada, apenas no início da década de 1920. Inicialmente, o ensino básico de Enfermagem, que ainda não tinha caráter de ensino superior era baseado na necessidade de se constituir corpos de profissionais de saúde para a guerra, para melhorar o atendimento hospitalar e na demanda social de erradicação de doenças da Era Campanhista, visando-se garantir o saneamento nos portos, principalmente no Rio de Janeiro. O ensino de Enfermagem é introduzido no Brasil com forte valorização do ensino prático atrelado aos hospitais e de caráter coadjuvante da prática médica (BONETTI, 2004, apud KRUSE, 2003; GERMANO, 1985).

De acordo com Bonetti (2004), esse sistema hospitalocêntrico de ensino permanece hegemônico até meados de 1980, quando ocorre uma grande mobilização da categoria para construção de um currículo mínimo que não limitasse o ensino de Enfermagem apenas à prática do hospital. Porém, somente em 1994/5, quando o Ministério da Educação e Cultura - MEC propôs os Parâmetros Curriculares Nacionais, esse currículo entrou em vigor, o qual ainda mantinha o ensino centrado no modelo médico-assistencialista de desarticulação entre conteúdos e disciplinas, de práticas pedagógicas tradicionais de reprodução do conhecimento e de dicotomia  entre teoria e prática.

Logo, em 2001, através da instituição da Política de Sustentabilidade pela Associação Brasileira de Enfermagem - ABEn e pelo Ministério da Saúde, articulou-se um movimento nacional de formulação, baseados numa multiplicidade de propostas construídas ao longo dos últimos anos, assim como nas outras áreas, das Diretrizes Curriculares Nacionais – DCN para os cursos, faculdades e escolas de enfermagem.

A formulação das DCN para a formação superior em enfermagem baseou-se nas concepções de que profissional de enfermagem era desejado pela sociedade, pois o investimento na incorporação intensa de tecnologia e a centralidade no hospital para o desenvolvimento das práticas de saúde não têm produzido impacto desejado nos indicadores sanitários mostrando uma necessidade de uma redefinição dos papéis dos profissionais de saúde que se dá com o movimento da Reforma Sanitária (HENRIQUES & RODRIGUES, 2003 apud BONETTI, 2004; KRUSE & MEYER, 2002).

A partir dessas DCN, os cursos de Enfermagem deveriam adaptar suas concepções político-padagógicas às propostas das mesmas. Contudo, poucos processos de mudança estruturais dos processos político-pedagógicos para a formação desse profissional desejado foram observados no Brasil, pois buscar formas de “traduzir” tais diretrizes em currículos ou projetos pedagógicos, tem sido uma tarefa que ainda exige grande reflexão e quebra de paradigmas educacionais centenários.

Acredita-se que o processo de educação de adultos pressupõe a utilização de metodologias ativas de ensino-aprendizagem que proponham concretamente desafios a serem superados pelos estudantes e docentes, que lhes possibilitem ocupar o lugar de sujeitos na construção dos conhecimentos, participando da análise do próprio processo assistencial em que estão inseridos e que coloquem o professor como orientador e facilitador desse processo, pois o motor da aprendizagem é a superação de desafios, a resolução de problemas e a construção do conhecimento novo (REDE UNIDA, 2001; BRASIL, 2006).

Percebe-se, então, que para a formação de enfermeiros se dá em consonância com as DCN é necessário que haja uma mudança no modelo pedagógico utilizado nas escolas de enfermagem. Nesse ínterim, dois conceitos chave são colocados por diversos autores como objetivos fundamentais na aprendizagem de um curso de graduação: aprender a aprender, que envolve o desenvolvimento de habilidades de busca, seleção e avaliação crítica de dados e informações disponibilizadas em livros, periódicos, bases de dados locais e remotas, além da utilização de fontes pessoais de informação, incluindo com particular destaque, a informação advinda da própria experiência e aprender fazendo, que pressupõe a inversão da seqüência clássica teoria/prática na produção do conhecimento e assume que ela ocorre de forma dinâmica através da ação-reflexão-ação (REDE UNIDA, 2001).

Nesse processo de ensinar e aprender, o contexto da supervalorização da técnica tem ocasionado uma aprendizagem superficial quando a técnica é posta como um fim em si mesma. Sendo assim, acreditamos que a memorização de dados não garante a formulação do pensamento em sua totalidade. Para que ocorra uma aprendizagem significativa é necessário se criar um “processo de interação” para que ocorra um “ambiente pedagógico”. Assim, concordamos com Coll (1990 apud MEDEIROS, 2001) quando mostra que a construção do conhecimento é gerada pelas relações interpessoais onde ocorra uma aprendizagem significativa, uma compreensão da memorização e por fim a funcionalidade do que é aprendido. Acreditamos ser esse o desafio do ensino e da aprendizagem (MEDEIROS, 2001).

1.2 JUSTIFICATIVA DO ESTUDO E SUA RELEVÂNCIA

A inquietação em explorar o tema da formação em enfermagem surgiu com a vivência durante a graduação. Porém, somente no início de 2004, com a pactuação pelo Ministério da Saúde, as Executivas Nacionais dos Estudantes dos cursos da saúde e o serviço, controle social, gestão e formação do município de Sobral-CE do Projeto VER-SUS/Brasil–Vivências e Estágios na Realidade do Sistema Único de Saúde do Brasil, e o conseqüente planejamento/desenvolvimento do projeto pelo quadrilátero municipal e, principalmente pelos estudantes de saúde de Sobral – enfermagem, medicina e educação física – com a comissão estudantil local, da qual fiz parte, é que vi e refleti sobre as contradições na formação que recebi e recebia. Isso porque o objetivo principal do projeto era justamente incentivar o processo de mudança na formação profissional em saúde para o SUS.

Desde então, essas muitas “vivências” me levaram à vontade/necessidade de compreender e participar dos processos de mudança nesse sentido. As visitas a muitos serviços os quais ainda não havia visitado em Sobral e as discussões a respeito da formação e funcionamento do SUS me colocaram diante de um enorme compromisso de participar de políticas públicas de transformação, como fazemos hoje, os estudantes, quando participamos junto ao Ministério da Saúde do “APRENDER-SUS” – Política de Mudança na Formação de Profissionais para o SUS.

O presente estudo tem a proposta desafiadora de contribuir com o processo de mudança na orientação político-pedagógica do Curso de Enfermagem da Universidade Estadual do Vale do Acaraú em Sobral, e, ao mesmo tempo em que pretende conhecer concepções, logra-se passar de forma direta e indireta para os participantes desse estudo à socialização-construção de idéias transformadoras.

A escolha dos estudantes e professores como sujeitos, baseou-se na visualização da carência em docências e discências contraditórias observadas nas vivências como estudante desse Curso. Deseja-se com esse estudo buscar compreender o que pensam e como agem estudantes e professores diante da necessidade de se incorporar metodologias ativas de ensino-aprendizagem a fim de se almejar uma formação crítica e humanizada.

Essa necessidade de transformação, que pode ser desencadeada por difusão de discussão/reflexão sobre os modelos de formação ideais, traz à tona a relevância de construções de conhecimento a esse respeito na academia.

Tendo sempre em vista o ditado “o estudante de hoje reflete o profissional do amanhã”, entendemos que toda atenção deve ser dada à formação deste na academia, por isso, acreditamos que esse estudo tem sua relação de construção direta de contribuição com a construção e efetivação do SUS que queremos.

2 OBJETIVO

Analisar a concepção de docentes e discentes do Curso de Enfermagem da Universidade Estadual do Vale do Acaraú em relação às metodologias de ensino-aprendizagem.

3 MARCO TEÓRICO-CONCEITUAL

3.1 LINHAS DE PENSAMENTO DOMINANTES NO CAMPO DAS CIÊNCIAS SOCIAIS EM SAÚDE

As concepções sociais predominantes sobre saúde são a base para entendermos a prática da educação profissional em saúde que vigora.  Baseados no trabalho de Minayo (2000), O Desafio do Conhecimento: Pesquisa Qualitativa em Saúde, apresentaremos algumas idéias dominantes na área de Ciências Sociais em Saúde, e uma breve discussão acerca da representação social de saúde-doença, para, assim, podermos nos embasar teoricamente viabilizando a efetivação do trabalho proposto.

  1. O Positivismo Sociológico

As teses básicas do positivismo podem ser assim resumidas: -1- A realidade se constitui essencialmente naquilo que nossos sentidos podem perceber; -2- As Ciências Sociais e as Ciências Naturais compartilham de um mesmo fundamento lógico e metodológico, elas se distinguem apenas no objeto de estudo; -3- Existe uma distinção fundamental entre fato e valor: a ciência se ocupa do fato e deve buscar se livrar do valor.

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