Concepções Contemporâneas De Educação: Teoria Anarquista
Por Mauri Daniel Marutti | 07/03/2008 | EducaçãoRESUMO
São várias as concepções educacionais, dentre estas, destacam-se as denominadas progressistas, uma tendência pedagógica seguida por um bom número de educadores. Suas características primam pela autonomia, criticidade, democracia plena, aproximação de classes, reflexão, dentre outras. A concepção anárquica de educação tem em seus princípios muitas das características descritas na concepção progressista, isto porque ao analisarmos o desenvolvimento da educação brasileira identificamos no final do século 19 e primeiras décadas do século 20 a forte presença dos imigrantes portugueses, espanhóis e principalmente os italianos que trouxeram na bagagem os princípios anarquistas para as Américas. É neste período de convulsão social vivido pela expansão industrial que nasce a Escola Moderna e seus ideais de universalidade, gratuidade e laicismo que serão os baluartes da educação brasileira.
Palavras – chave: Anarquia; Educação; Progressista.
1 INTRODUÇÃO
As variantes relacionadas às concepções de educação são inúmeras, muitas consideradas em total desuso ou em descompasso com os propósitos inerentes ao atual modelo de sociedade vigente. Dentre estas variantes e suas ramificações optamos pela corrente anárquica e sua influência nos programas educacionais, bem como, a dificuldade de aplicabilidade de seus preceitos. A simples menção em relacionar a educação ao anarquismo é motivo de preocupação para o sistema econômico e social que apresenta suas raízes no capitalismo.
O atual movimento anárquico é "filho bastardo" do próprio capitalismo, nasce como uma alternativa por muitos descrita como utópica, mas que ao longo do tempo tem permeado a mente de vários pensadores, o que prova sua capacidade de sedução. Várias correntes pedagógicas e sociais mascaram o anarquismo presente em suas idéias com rótulos menos agressivos e passíveis de aceitação no tecido social. A busca incessante de liberdade pelo homem torna o ideal anarquista agradável aos ouvidos e olhos que o mantêm sempre próximo, prestes a aflorar.
A concepção anárquica de educação embora envolta por áurea de adjetivos hostis e segredos insondáveis, está presente nas ações de muitos profissionais da educação que se valem de seus princípios de contestação e anseio pela liberdade. O que dizer da Pedagogia Libertária e toda a sua evolução, quantos profissionais da educação ostentam infindável orgulho em afirmar que são seus seguidores.
As tendências educacionais contemporâneas descritas como libertadora, libertária e crítico-social estão impregnadas pela essência dos ideais anarquistas, quando o educador diz estar preparando o educando para ser crítico, contestador, reflexivo, autônomo e independente, corrobora para a afirmação anárquica. Neste caso identificamos traços destes ideais na LDBEN[1], nos Planos Nacionais para a Educação, nas Propostas Curriculares Estaduais e nos PPP(s)[2] dos educandários.
Os estudos e análises foram realizados a partir do século 18, muito embora existam relatos de questionamento ante a necessidade da tutelagem do poder por parte de um governante e / ou forma de governo, na Grécia Antiga e China, passando pelo Renascimento e a Reforma entre os séculos 15 e 17. Não esqueçamos a Revolução Francesa e Americana com seus ideais anarquistas [igualdade, liberdade e fraternidade]. A escolha pelo anarquismo a partir do século 18 se fez pela capacidade organizativa e coletiva de forma Filosófica e Sociológica, com impregnações em todos os extratos sociais e conseqüentemente em todas as instituições constituintes da sociedade.
2 ANARQUIA E / OU ANARQUISMO
Quando o termo anarquia e / ou anarquismo é usado normalmente rende sinônimos de desordem, caos e desgoverno, normalmente nos transmite instabilidade e repulsão. Quando analisamos a anarquia como movimento social percebemos que se trata da ação libertadora do homem sobre o próprio homem, onde o governo deixa de existir como forma coercitiva e passa a ser a ação livre de todos os cidadãos. Vejamos os conceitos de anarquismo fornecidos pela enciclopédia virtual (Wikipédia, 2008):
Anarquismo é uma palavra que deriva da raiz grega αναρχία — an (não, sem) e archê (governador) — e que designa um termo amplo que abrange desde teorias políticas a movimentos sociais que advogam a abolição do capitalismo e do Estado enquanto autoridade imposta e detentora do monopólio do uso da força. Exemplificando, Anarquismo é a teoria libertária baseada na ausência do Estado. De um modo geral, anarquistas são contra qualquer tipo de ordem hierárquica que não seja livremente aceita, defendendo tipos de organizações horizontais e libertárias. Para os anarquistas, Anarquia significa ausência de coerção, e não ausência de ordem.
Partindo dos conceitos de anarquia e / ou anarquismo identificamos ao longo da evolução do homem e dos constantes embates pela liberdade, seja, individual ou coletiva, como manifestações primitivas da anarquia. Este anseio de liberdade passa pelas revoltas na Grécia e Roma, onde a primazia era meramente buscar liberdade para os agrilhoados. Já durante o Renascimento os pensamentos entorno da liberdade tornam-se organizados e contínuos. Com a Reforma e os pensamentos ortodoxos de Lutero, a Igreja tradicional começa a preocupar-se com a ameaça das idéias libertárias. Advém a Revolução Francesa e a posterioris a Revolução Americana também impregnada pelos princípios anárquicos.
Com o aparecimento do capitalismo pragmático no século 18, surge, o movimento anarquista organizado que responde frontalmente ao poder do capital.São várias as revoltas deflagradas a partir de princípios anárquicos, em especial a Revolução Russa de 1917 e que mais tarde tornar-se-á uma ditadura monopartidária. Hoje os mesmos ideais de liberdade são explorados pelos movimentos sociais frente ao descaso da economia liberal imposta às nações.
3 A TEORIA ANÁRQUICA E A EDUCAÇÃO
Uma das primeiras tentativas de aplicação dos princípios anarquistas na educação ocorreu na França em 1861 no orfanato de Prévost. Foi o nascedouro do que hoje denominamos de Pedagogia Libertária, ao contrário do que se pensa as regras existiam, mas a dinâmica educacional era revolucionária para a época. Machado (2006) descreve o diretor Paul Robin, administrador anarquista como:
[...] o primeiro a conseguir levar para a prática as idéias que vinham sendo discutidas entre os socialistas. Defensor ardoroso da educação integral, ainda na rede pública de ensino, ele organizava passeios com os alunos estudando botânica, astronomia, geologia, fazia visitas periódicas aos artesãos e às fábricas e organizava cursos técnicos e de música. Na sua proposta de educação integral, dividia a educação em duas fases: a primeira, que ele denominou período espontâneo, na qual as crianças são essencialmente consumidoras, e a segunda, período dogmático, quando a criança passa a poder ser também produtora. Em Prévost haviam oficinas de sapateiro, de costura, uma tipografia, uma forja e uma marcenaria, para que as crianças as utilizassem nas atividades práticas do segundo período.
No Brasil a despeito da Pedagogia Libertária do início do século 20, também conhecida como Escola Moderna, pouco restou em termos documentais, porém sua contribuição para a educação em especial dos trabalhadores urbanos foi fundamental. Durante a década de 1930 surge a Escola Nova amparada por vários ideais modernistas e anárquicos, porém, com a liderança de vários intelectuais, entre eles Anísio Teixeira, que mantém os desejos de uma educação universal, gratuita e laica.
Hoje o maior representante da Pedagogia Libertária no Brasil é Paulo Freire e seu discípulo Moacir Gadotti. Tendências como: pedagógica progressista, progressista libertadora,progressista libertária, progressista crítico-social dos conteúdos, dialética ou progressista libertadora, carregam traços inegáveis e incontestáveis dos princípios anarquistas. Para reforçar o que descrevemos vejamos o que nos diz Antonio (2006) acerca das similaridades entre as tendências atuais e os preceitos anárquicos, "As tendências progressistas libertadora e libertária têm, em comum, a defesa da autogestão pedagógica e o antiautoritarismo. A escola libertadora, também conhecida como a pedagogia de Paulo Freire, vincula a educação à luta e organização de classe do oprimido".
4 CONCLUSÃO
O anarquismo parece ser uma condição nata ao homem, desde os primórdios anseia por liberdades, seja, de seu senhor, seja, do sistema de governo que de alguma forma o oprime. A expressão da condição anárquica é que sofre desdobramentos constantes, se na sua fase inominal era representada por revoltas decorrentes de aglutinação sem grande ideologia e capacidade organizacional, mais tarde passa ser sistêmico e de constante difusão.
A ideologia anarquista foi e é responsável pela resistência natural do homem a governabilidade, seja esta representada por pelo(a): Estado, economia, educação, cultura dentre outros. Por ser visto como movimento de desordem o anarquismo revestiu-se de formas mais sutis. Hoje a ideologia anárquica encontra-se na maioria dos movimentos sociais, organizações estudantis e nas tendências educacionais. Portanto devemos considerar o anarquismo como fonte motriz de nossos desejos libertários.
Quando falamos de concepções anárquicas puras na educação não encontramos grande respaldo, mas se atentarmos a história da educação brasileira a partir da recepção dos imigrantes, espanhóis, portugueses e especialmente os italianos durante a segunda metade do século 19 e as três décadas iniciais do século 20, perceberemos a presença do movimento anarquista. O reflexo deste movimento foi à criação da Escola Moderna, onde grandes expoentes locais dos ideais anárquicos se manifestaram. Embora este modelo educacional tenha desaparecido precocemente seus preceitos de universalidade, gratuidade e laicismo perpetraram-se nos modelos que se seguiram.
Hoje a educação brasileira caminha para as concepções ditas progressistas onde encontramos forte presença dos ideais anarquistas; autonomia, reflexão, criticidade, antiautoritarismo, aproximação de classes, entre outros. Educadores como Paulo Freire, Moacir Gadotti, Pedro Demo e tantos outros, progressistas permeiam o pensamento dos profissionais da educaçãoe apresentam alternativas para um desenvolvimento educacional próximo do desejo de libertação.
REFERÊNCIAS
ANTONIO, José. Correntes pedagógicas. Disponível em: <http://www.grupos.com.Br/blog/ivan.Lima/ permalink/5275.html>. Acessado em: 16 de fev. 2008.
MACHADO, Wilton Rodrigues. Pedagogia Libertária: projeto e utopia educacional na sociedade capitalista. Disponível em: <http://www.urutagua.uem.br/010/10machado.htm>. Acessado em: 16 de fev. 2008.
WIKIPÉDIA. Anarquismo. Disponível em: <http://pt.wikipedia.org/wiki/Anarquismo>. Acessado em: 16 de fev. 2008.
[1] Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional
[2] Projeto Político Pedagógico