Compensação de Crédito Tributário com crédito de terceiro

Por Steffani Carvalho de Santana | 12/05/2017 | Direito


  •  Tributos Federais Administrados pela SRFB

 A Secretaria da Receita Federal do Brasil (RFB) é um órgão específico, singular, subordinado ao Ministério da Fazenda, exercendo funções essenciais para que o Estado possa cumprir seus objetivos. É responsável pela administração dos tributos de competência da União, inclusive os previdenciários, e aqueles incidentes sobre o comércio exterior, abrangendo parte significativa das contribuições sociais do País.

Também subsidia o Poder Executivo Federal na formulação da política tributária brasileira, previne e combate a sonegação fiscal, o contrabando, o descaminho, a pirataria, a fraude comercial, o tráfico de drogas e de animais em extinção e outros atos ilícitos relacionados ao comércio internacional.

Além disso, tem como responsabilidade o controle aduaneiro, além de atuar no combate à elisão e evasão fiscal (sonegação), contrabando, descaminho, pirataria e tráfico de drogas e animais, e a administração dos tributos federais.

São tributos federais de sua competência: (i) IRPF (Imposto sobre a renda das pessoas físicas); (ii) IRPJ (Imposto sobre a renda das pessoas jurídicas); (iii) IRRF (Imposto sobre a renda retido na fonte); (iv) CSLL (Contribuição social sobre o lucro líquido); (v) IOF (Imposto sobre operações financeiras); (vi) ITR (Imposto territorial rural); (vii) IPI (Imposto sobre produtos industrializados); (viii) II (Imposto de importação); (iix) IE (Imposto de exportação); (ix) Contribuições previdenciárias das pessoas físicas; (x) Contribuições previdenciárias das pessoas jurídicas; (xi) Contribuição para o PIS/Pasep e Cofins; (xii) Cide-combustíveis (Contribuição de intervenção no domínio econômico incidente sobre as operações realizadas com combustíveis); (xiii) AFRMM (Adicional ao frete para renovação da marinha mercante).

Posto isso, o sujeito passivo que apurar crédito, inclusive os judiciais com trânsito em julgado, relativo a tributo ou contribuição administrado pela Receita Federal do Brasil (RFB), passível de restituição ou de ressarcimento, poderá utilizá-lo na compensação de débitos próprios relativos a quaisquer tributos e contribuições administrados pelo respectivo órgão, observando-se o disposto na Lei 9.430/96 e na IN RFB 1.300/2012.

Consideram-se débitos próprios os débitos por obrigação própria e os decorrentes de responsabilidade tributária, apurados por todos os estabelecimentos da pessoa jurídica.  Assim, pode-se compensar um débito tributário da matriz com um crédito tributário da filial, por exemplo.

A restituição, ressarcimento ou compensação de tributos federais será requerida pelo contribuinte mediante utilização do programa Pedido de Restituição, Ressarcimento ou Reembolso e Declaração de Compensação (PER/DCOMP).

A Declaração de Compensação é gerada pelo programa PER/DCOMP - Pedido Eletrônico de Restituição, Ressarcimento ou Reembolso e Declaração de Compensação e transmitida via internet por meio do Receitanet. Na impossibilidade de sua utilização, poderá ser apresentado o formulário Declaração de Compensação, ao qual deverão ser anexados documentos comprobatórios do direito creditório.

Todavia, mediante entrega da declaração de compensação há possibilidade restrições quanto à possibilidade do procedimento, dentre elas a “cessão de crédito tributário”, tendo em vista a possibilidade futura de uma pessoa jurídica vir a ser responsável tributária por débitos de outras pessoas jurídicas não permite que esses débitos sejam objeto de compensação com créditos daquela pessoa jurídica.

Portanto, conclui-se que, no âmbito dos tributos administrados pela RFB, não é possível compensar débitos tributários próprios com créditos tributários de terceiros, e vice-versa (operação vulgarmente conhecida como “cessão de crédito tributário”).

O fundamento legal para tal vedação consiste na alínea “a”, inciso I, § 3º do artigo 41 da Instrução Normativa RFB 1.300/2012, a saber:

Art. 41. O sujeito passivo que apurar crédito, inclusive o crédito decorrente de decisão judicial transitada em julgado, relativo a tributo administrado pela RFB, passível de restituição ou de ressarcimento, poderá utilizá-lo na compensação de débitos próprios, vencidos ou vincendos, relativos a tributos administrados pela RFB, ressalvadas as contribuições previdenciárias, cujo procedimento está previsto nos arts. 56 a 60, e as contribuições recolhidas para outras entidades ou fundos.

Não poderão ser objeto de compensação mediante entrega, pelo sujeito passivo, da declaração referida no § 1º:

I - o crédito que:

a) seja de terceiros. (grifamos)

 

Já o parágrafo único, artigo 68 da Instrução Normativa RFB 1.300/2012 apresenta exceções à vedação do procedimento:

 

Art. 68. É vedada a compensação de débitos do sujeito passivo, relativos a tributo administrado pela RFB, com créditos de terceiros.

Parágrafo único. A vedação a que se refere o caput não se aplica ao débito consolidado no âmbito do Refis ou do parcelamento a ele alternativo, bem como aos pedidos de compensação formalizados perante a RFB até 7 de abril de 2000. (grifamos)

 

E, além disso, na Solução de Consulta Cosit 88/2015:

 

ASSUNTO: NORMAS GERAIS DE DIREITO TRIBUTÁRIO 

EMENTA: COMPENSAÇÃO. DÉBITOS DE OUTRAS PESSOAS JURÍDICAS. RESPONSABILIDADE TRIBUTÁRIA NÃO CONFIGURADA. IMPOSSIBILIDADE.

 O sujeito passivo que apurar crédito, inclusive os judiciais com trânsito em julgado, relativo a tributo ou contribuição administrado pela Receita Federal do Brasil, passível de restituição ou de ressarcimento, poderá utilizá-lo na compensação de débitos próprios relativos a quaisquer tributos e contribuições administrados por aquele Órgão, salvo exceções contidas na lei.

Consideram-se débitos próprios os débitos por obrigação própria e os decorrentes de responsabilidade tributária apurados por todos os estabelecimentos da pessoa jurídica.

A possibilidade futura de uma pessoa jurídica vir a ser responsável tributária por débitos de outras pessoas jurídicas não permite que esses débitos sejam objeto de compensação com créditos daquela pessoa jurídica.

 A condição de sócia majoritária de outra pessoa jurídica não enseja, por si só, a responsabilização tributária prevista nos arts. 134 e 135 do CTN.

DISPOSITIVOS LEGAIS: Lei nº 5.172, de 1966, arts. 134 e 135; Lei nº 9.430, de 1996, art. 74, § 14; IN RFB nº 1.300, de 2012, art. 41, § 9º.

 

Assim, é possível concluir que a compensação de débitos próprios com créditos advindos de outras pessoas jurídicas é inadmissível. A autoridade competente da Receita Federal do Brasil considerará não declarada a compensação nas hipóteses previstas no § 3º do art. 41 da Instrução Normativa RFB nº 1.300/2012[1].

  •  Créditos de terceiro no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF).

Havendo discordância fiscal quanto à validade do crédito, a compensação não é homologada, surgindo à oportunidade para o contencioso administrativo, mediante apresentação de manifestação de inconformidade para a Delegacia da RFB de Julgamento (DRJ) e, em segunda instância, recurso voluntário para o Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF). Rito é estabelecido pelos §§ 9º a 11 do artigo 74 da Lei 9.430/96 e disciplinado pelo Decreto 70.235/72.

O Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF) é um órgão paritário, de composição dividida entre representantes da Fazenda Nacional e dos contribuintes, vinculado ao Ministério da Fazenda, criado através da Lei nº 11.941, de 27 de maio de 2009. Atualmente é organizado e regido pelo Portaria MF 343, de 9 de julho de 2015.

Esse órgão é o responsável pelo julgamento em grau recursal de irresignações de contribuintes relativas aos tributos administrados pela Secretaria da Receita Federal do Brasil.

Também é responsável pela análise de recursos voluntários, que são apreciados pelo CARF nos casos em que a impugnação do contribuinte é acolhida pela primeira instância do contencioso administrativo, que se denomina Delegacia de Julgamento, os quais são manifestados pelos próprios julgadores de primeiro grau.

Há, também, a competência do órgão para julgar, em Câmara Superior de Recursos Fiscais, os recursos especiais dos contribuintes e da Fazenda Nacional, nos casos de divergência entre as turmas julgadoras.

Há tempos se estende o empasse entre contribuinte e Receita Federal quanto à utilização de créditos adquiridos de terceiros para o abatimento de débitos próprios. Essa restrição sempre esteve expressa em Instruções Normativas e, à época, na IN 900, e também na Lei n.º 9.430/96, na redação dada pela Lei 11.051 de 2004.

Todavia, tal questionamento encontra precedentes poucas vezes positivos desde o julgamento da Câmara Superior do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) que entendeu pela possibilidade do pedido de compensação de créditos de terceiros quando este tem origem de cessão de crédito homologada por decisão judicial transitada em julgado[2]:

 

Acórdão: 9303-001.524

Número do Processo: 13709.001612/2001-83

Data de Publicação: 01/11/2013

Contribuinte: RDC FOCCAR FACTORING FOMENTO COMERCIAL LTDA

Relator(a): RODRIGO CARDOZO MIRANDA

Ementa: Assunto: Normas Gerais de Direito Tributário Período de apuração: 01/09/1988 a 30/04/1990 PEDIDO DE COMPENSAÇÃO. CRÉDITOS DE TERCEIRO. CESSÃO JUDICIAL. POSSIBILIDADE. A cessão de créditos homologada judicialmente é válida, passando ao cessionário todos os direitos sobre os valores cedidos, como se dele fossem, viabilizando, então, a compensação de valores, nos moldes do art. 74 da Lei n° 9.430/96, não cabendo discutir na via administrativa decisão proferida na esfera judicial. (grifamos)

Decisão: Vistos, relatados e discutidos os presentes autos. Acordam os membros do Colegiado, por maioria de votos, em negar provimento ao recurso especial. Vencidos os Conselheiros Henrique Pinheiro Torres, Judith do Amaral Marcondes Armando, Rodrigo da Costa Pôssas e Otacílio Dantas Cartaxo, que davam provimento. O Conselheiro Henrique Pinheiro Torres irá apresentar declaração de voto. Otacílio Dantas.

 

Este foi o entendimento adotado pela 3ª Turma da Câmara Superior de Recursos Fiscais no julgamento do Processo nº 13709.001612/2001-83. Em sede de Recurso Especial, o STJ decidiu pelo seguinte:

 

RECURSO ESPECIAL. TRIBUTÁRIO. SENTENÇA CONDENATÓRIA DO DIREITO À COMPENSAÇÃO DO INDÉBITO. CESSÃO DE CRÉDITOS ENTRE PESSOAS JURÍDICAS DISTINTAS. COMPENSAÇÃO COM DÉBITOS PREVIDÊNCIA RIOS. POSSIBILIDADE

É cediço na Corte que ao contribuinte cabe manifestar a opção de receber o respectivo crédito por meio de precatório regular ou compensação, haja vista que constituem, ambas as modalidades, formas de execução do julgado colocadas à disposição da pane quando procedente a ação.

Precedentes do STJ: RESP 232002/CE, Relator Ministro João Otávio de Noronha, DJ de 16.08.2004; AGA 471645/RS, Relator Ministro Castro Meira, DJ de 19.12.2003; RESP 551184/PR. Relator Ministro Castro Meira, DJ de 01.12.2003; AGA 3480I5/RS, Relator Ministro Francisco Falcão, Di de 17.09.2001.

O direito à restituição do indébito é direito de crédito (art 165, do CTN), sendo, portanto, disponível, consoante a norma insculpida no art. 286, do Código Civil Por isso que, na ausência de regra tributária expressamente proibitiva, aplica-se a regra geral que trata de cessão de créditos, máxime por não se tratar, o crédito tributário, de direito intransferível, indisponível ou personalíssimo.

 Por outro lado, o art. 123, do CTN estabelece a impossibilidade de que convenções particulares venham a alterar a definição legal do sujeito passivo, não sendo ao Fisco oponíveis. Isto significa dizer que as referidas convenções não podem pretender modificar a parte legitimada para a restituição do indébito - pólo passivo da obrigação tributária -, transferindo a responsabilidade pelo pagamento de tributos.

Nesse segmento, verifica-se que, no caso sub judice, há o direito de crédito contra o INSS reconhecido por decisão transita em julgado, o qual foi cedido, nos termos da lei civil - haja vista tratar-se de um direito de crédito como qualquer outro -, à ora recorrente, sujeito passivo de relação tributária com a própria autarquia previdenciária, com vistas a compensá-lo com os respectivos débitos previdenciários.

 Ressoa inequívoca, portanto, a impertinência da alusão ao art. 123, do CTN, como óbice legal à compensação de débito previdenciário com créditos cedidos por terceiro em face do mesmo Instituto, porquanto não se antevê hipótese de substituição do sujeito passivo da relação jurídico-tributária.

7. Consequentemente, cedido o crédito tout court, é lícito ao cessionário compensá-lo com os seus débitos, sendo certo que o art. 66, § 3; da Lei 8.383/91, permite o recebimento ou a compensação do indébito tributário, máxime por não haver qualquer prejuízo ao INSS. (grifamos)

Recurso especial provido. 

(STJ - 1ª Turma - Resp 789.453/RS - ReI. Min. Luiz Fia - DJU 17/05/2007)

 

Portanto, conclui-se que, salvo casos sui generis onde há previa autorização do reconhecimento do acumulo de crédito e da possibilidade de cessão homologada em via judicial, o Conselho Administrativo de Recursos Fiscais não se opõe ao direito do contribuinte, uma vez que isso seria ir contra coisa julgada e uma afronta a Constituição Federal. 

  • Homologação de cessão de crédito tributário na via judicial

Cessão de Crédito de Prêmio IPI

Uma vez não homologada a cessão do credito tributário de terceiro pela RFB passa a ser considerada indevida a compensação de tributo ou contribuição, assim, já confessada ou lançada de ofício, o sujeito passivo será comunicado da não-homologação da compensação e intimado a efetuar o pagamento do débito no prazo de trinta dias, contado da ciência do procedimento.

Porem, como mencionado acima, existem situações no qual é plenamente possível a cessão do credito tributário a terceiros, fato possível graças a homologação judicial previa.

Atualmente, exemplificando, tal possibilidade dá-se devida à procura de diversas sociedades empresárias interessadas em ceder seu crédito tributário decorrente do incentivo fiscal criado pelo Decreto Lei nº 491/69, no qual regula Estímulos Fiscais a exportação de manufatura, chamado "crédito-prêmio IPI", a outras pessoas jurídicas de direito privado que possuem débito tributário perante a Fazenda Pública.

Isso é possível tendo em vista que este credito origina-se de um titulo executivo judicial, quer seja uma decisão de mérito transitada em julgado em ação ordinária de ressarcimento de incentivo fiscal, que condena a União federal a restituir o crédito-prêmio IPI por determinado período, acrescido de correção monetária e juros de mora; quer seja um precatório.

Como já mencionado, a cessão de crédito é instituto do Direito Civil, em regra não oponível nas relações fiscais, regulamentado pelo artigo 286 do Código Civil brasileiro, no qual dispõe que o credor pode ceder o seu crédito a terceiro, desde que não seja contrário à natureza da obrigação, à lei ou à convenção com o devedor.

Segundo Cáio Mário[3], a cessão de direito consiste no "negócio jurídico em virtude do qual o credor transfere a outrem a sua qualidade creditória contra o devedor, recebendo o cessionário o direito respectivo, com todos os acessórios e garantias" e ainda complementa Pontes de Miranda, a certeza do crédito "é a ausência de dúvida quanto à sua existência, tal como está no título executivo judicial."[4].

Esclarece-se que o crédito tributário reconhecido em decisão transitada em julgado em ação ordinária, de caráter condenatório, de ressarcimento de créditos oriundos de incentivos fiscais, constitui-se em título executivo judicial, o que demonstra a certeza do crédito, logo, pode ser perfeitamente objeto de cessão, pois não se opõe à natureza da obrigação, à lei ou convenção[5].

Ademais, cumpre lembrar que o crédito tributário decorrente de decisão judicial traduzido em precatório possui permissão expressa na Constituição Federal para ceder a terceiros, conforme art. 78 do ADCT, in verbis:

 ADCT. Art. 78. Ressalvados os créditos definidos em lei como de pequeno valor, os de natureza alimentícia, os de que trata o art. 33 deste Ato das Disposições Constitucionais Transitórias e suas complementações e os que já tiverem os seus respectivos recursos liberados ou depositados em juízo, os precatórios pendentes na data de promulgação desta Emenda e os que decorram de ações iniciais ajuizadas até 31 de dezembro de 1999 serão liquidados pelo seu valor real, em moeda corrente, acrescido de juros legais, em prestações anuais, iguais e sucessivas, no prazo máximo de dez anos, permitida a cessão dos créditos."(grifamos)

Portanto, a legislação supracitada reforça o entendimento de que o crédito oriundo de decisão judicial transitado em julgado pode ser objeto de cessão de crédito, desde que decorra de precatório pendente em 13.09.2000 ou de ações iniciais ajuizadas até 31 de dezembro de 1999, conforme autorização expressa da Constituição: 

  • Compensação e Cessão na Cisão

Inicialmente, transcreve-se os artigos 229 da Lei nº 6.404/1976, que tratam da cisão:

Art. 229. A cisão é a operação pela qual a companhia transfere parcelas do seu patrimônio para uma ou mais sociedades, constituídas para esse fim ou já existentes, extinguindo-se a companhia cindida, se houver versão de todo o seu patrimônio, ou dividindo-se o seu capital, se parcial a versão.

1º Sem prejuízo do disposto no artigo 233, a sociedade que absorver parcela do patrimônio da companhia cindida sucede a esta nos direitos e obrigações relacionados no ato da cisão; no caso de cisão com extinção, as sociedades que absorverem parcelas do patrimônio da companhia cindida sucederão a esta, na proporção dos patrimônios líquidos transferidos, nos direitos e obrigações não relacionados.(grifamos)

 

Desta forma, pode-se definir que a cisão é uma operação pela qual a companhia transfere parcelas de seu patrimônio para uma ou mais sociedades constituídas para esse fim ou já existentes, com a extinção da companhia cindida, caso ocorra versão de todo o seu patrimônio ou apenas dividindo-se o seu capital na hipótese de versão parcial do patrimônio.

Para esta operação societária, aplica-se a empresa resultante a responsabilidade solidária prevista no artigo 132 do Código Tributário Nacional, ainda que tal dispositivo legal não faça menção expressa à cisão. Nesse sentido, assim se posicionou o Superior Tribunal de Justiça:

 

“Com efeito, a cisão não consta nesse rol de operações que importam responsabilidade dos sucessores. Tal omissão se explica, no entanto, conforme consignado no arresto recorrido, pelo fato de que, quando editado o Código Tributário Nacional (Lei 5.172/66), não haver previsão na legislação comercial para a operação de cisão, o que somente veio a ocorrer com a Lei 6.404/76. Inobstante, não há dúvida de que a norma do CTN incide também na hipótese, porquanto a cisão opera o efeito de sucessão de empresas, eis que há continuidade da atividade da pessoa jurídica primava pela sociedade dela resultante. Assim, embora não conste de seu rol o instituto da cisão, é certo que também se trata de modalidade de “mutação empresarial”, razão pela qual deve receber o mesmo tratamento jurídico dado às demais espécies de sucessão.

(Recurso Especial 852972/PR, 1ª Turma, Min. Teori Albino Zavascki, DJe de 25/05/2010).

 O mesmo ocorre nos casos de cisão parcial, tem sido imputado o disposto no artigo 5º, § 1º do Decreto 1.598/1977, segundo o qual respondem solidariamente pelos tributos da pessoa jurídica a sociedade que absorver patrimônio de outra por cisão. Vale ressaltar que o artigo 5º do referido Decreto também é aplicado aos casos que tratam dos demais tributos federais.

Portanto, por uma questão de simetria e tratamento isonômico não há que se negar também a possibilidade de transferência e utilização de créditos tributários na cisão, tendo em vista que a cisão determinaria a responsabilidade tributária das sociedades que absorverem parcela ou totalidade do patrimônio da entidade cindida.

Quanto à compensação, a Procuradoria Geral da Fazenda Nacional se posicionou no Parecer PGFN/CDA/CAT 1.499/2005, segundo o qual é considerada ineficaz “a cessão de créditos a terceiros com a finalidade de compensação”. Note-se, entretanto, que a PGFN não se manifestou sobre a utilização de créditos decorrentes de cisão ou qualquer outra espécie de sucessão empresarial, tratando, tão somente, da cessão de créditos.

Também manifestou-se na Solução de Consulta nº 119 – Cosit de 22 de maio de 2014, no sentido de que na cisão “os créditos fiscais apurados pelo sujeito passivo provenientes da não cumulatividade da Contribuição para o PIS/Pasep e da Cofins em operações de exportação, ou em vendas com suspensão, isenção, alíquota zero ou não incidência, somente se tornam próprios da cindida se acompanhadas de transferência de unidade produtiva ou outro estabelecimento vinculado ao surgimento desse crédito”.

Todavia, na sucessão por cisão, os créditos provenientes de pagamento indevido ou a maior de IRPJ e CSLL somente podem ser aproveitados na proporção do patrimônio líquido cindido. Por fim, ficando vedada a cisão sem fim econômico quando feita com finalidade fraudulenta: 

ASSUNTO: NORMAS DE ADMINISTRAÇÃO TRIBUTÁRIA A operação societária da cisão parcial sem fim econômico deve ser desconsiderada quando tenha por objetivo o reconhecimento de crédito fiscal de qualquer espécie para fins de desconto, restituição, ressarcimento ou compensação, motivo pelo qual será considerado como de terceiro se utilizado pela cindida ou por quem incorporá-la posteriormente. Dispositivos Legais: Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966, art. 170; Lei n o 10.637, de 30 de dezembro de 2002, art. 5o , § 1º; Lei nº 10.833, de 29 de dezembro de 2003, art. 18; Lei no 11.033, de 21 de dezembro de 2004, art. 17; Lei nº 9.430, de 27 de dezembro de 1996, arts. 73 e 74; IN RFB no 1.300, de 20 de novembro de 2012. (grifamos)[6]

Sendo assim, pode-se afirmar que, no caso de cisão é possível à compensação dos débitos de pessoa jurídica com créditos que ingressarem em seu capital mediante operação de incorporação de parcela cindida de outras entidades.

Novamente os créditos reconhecidos em decisão judicial transitada em julgado possibilitam a compensação de créditos tributários. A Instrução Normativa n 1.300/2012, da Secretaria da Receita Federal do Brasil, estabelece as normas sobre restituição, compensação ressarcimento e reembolso.

O inciso V, parágrafo 1º, do artigo 82, do referido diploma normativo autoriza a compensação de créditos tributários decorrentes de decisão judicial transitada em julgado, mesmo quando decorrentes de eventos de fusão, incorporação ou cisão:

 

Art. 82. Na hipótese de crédito decorrente de decisão judicial transitada em julgado, a Declaração de Compensação será recepcionada pela RFB somente depois de prévia habilitação do crédito pela DRF ou pela Delegacia Especial da RFB com jurisdição sobre o domicílio tributário do sujeito passivo. (Redação dada pelo(a) Instrução Normativa RFB nº 1661, de 29 de setembro de 2016)

1ºA habilitação de que trata o caput será obtida mediante pedido do sujeito passivo, formalizado em processo administrativo instruído com:

V - cópia dos atos correspondentes aos eventos de cisão, incorporação ou fusão, se for o caso.

 Para tanto, os créditos reconhecidos em decisão judicial transitada em julgado devem ser previamente habilitados com a apresentação de cópia dos atos correspondentes aos eventos de cisão, fusão ou incorporação, conforme o caso:

Art. 82. § 1º A habilitação de que trata o caput será obtida mediante pedido do sujeito passivo, formalizado em processo administrativo instruído com:

 V - cópia dos atos correspondentes aos eventos de cisão, incorporação ou fusão, se for o caso.

 

Logo, no âmbito das operações de cisão, a vedação constante do parágrafo 12, II do artigo 74 da Lei 9430/1996.

  •  Compensação e Cessão de Precatórios

Os precatórios decorrem de decisões judiciais transitadas em julgado contra a Fazenda Pública, as quais se originam, necessariamente, em litígios havidos com terceiros. A sistemática dos precatórios tem como fundamento o princípio da impenhorabilidade dos bens públicos, a qual impede a execução contra a Fazenda Pública pelo rito comum.

Por tal razão a Constituição Federal prevê que o pagamento de débitos da Fazenda Pública reconhecidos em decisão judicial transitada em julgada será efetuado por meio dos chamados "precatórios", que seguirão a ordem de apresentação:

Art. 100. A exceção dos créditos de natureza alimentícia, os pagamentos devidos pela Fazenda Federal, Estadual ou Municipal, em virtude de sentença judiciária, far-se-ão exclusivamente na ordem cronológica de apresentação dos precatórios e à conta dos créditos respectivos, proibida a designação de casos ou de pessoas nas dotações orçamentárias e nos créditos adicionais abertos para este fim. (grifamos)

O termo "precatório" serve tanto para designar o sistema a que se submetem as obrigações do Poder Público, reconhecidas por decisão judicial transitada em julgado, como para fazer referência a denominação atribuída ao documento que relata essa obrigação da Fazenda Pública. Conforme leciona Regis Fernandes Oliveira[7]:

"precatório ou ofício precatório é a solicitação que o juiz da execução faz ao presidente do tribunal respectivo para que ele requisite (à Fazenda Pública devedora) verba necessária ao pagamento de credor de pessoa jurídica de direito público, em face de decisão judicial transitada em julgado."

Quanto à cessão de precatórios, os §13 e §14 do artigo da Constituição Federal, dispõem que:

13. O credor poderá ceder, total ou parcialmente, seus créditos em precatórios a terceiros, independentemente da concordância do devedor, não se aplicando ao cessionário o disposto nos §§ 2º e 3º.(Incluído pela Emenda Constitucional nº 62, de 2009).

14. A cessão de precatórios somente produzirá efeitos após comunicação, por meio de petição protocolizada, ao tribunal de origem e à entidade devedora.(Incluído pela Emenda Constitucional nº 62, de 2009).

Portanto, nada impede que aquelas empresas interessadas na compra de precatórios façam a cessão dos créditos para o seu nome no próprio processo. O procedimento ocorre através de simples petição informando ao juízo da cessão, que deverá ser instrumentalizada em escritura pública de direitos, da qual deve ser cientificada a Fazenda.

Após constada nos autos e remetidos estes para nova autuação, o contribuinte pode pleitear junto à Secretaria de Receita Federal, não a compensação de débitos com créditos de terceiros, mas compensação de débitos próprios, como dispõe o artigo 74, da Lei 9.430/96:

Art. 74. O sujeito passivo que apurar crédito, inclusive os judiciais com trânsito em julgado, relativo a tributo ou contribuição administrado pela Secretaria da Receita Federal, passível de restituição ou de ressarcimento, poderá utilizá-lo na compensação de débitos próprios relativos a quaisquer tributos e contribuições administrados por aquele Órgão.

Desta forma, o investimento naquilo que se convencionou chamar de "compra de precatórios" continua sendo um planejamento tributário viável para muitas empresas, lícito e de retorno financeiro bastante vantajoso, haja vista os grandes deságios praticados no mercado. Neste sentido, Leandro Paulsen[8] ensina:

"Tem-se destacado, em diversos julgados, o direito à compensação com parcelas vencidas e vincendas porque o Fisco passou a buscar interpretação do art. 66 da Lei 8.383/91 no sentido de só autorizar a compensação com tributos ainda não vencidos por ocasião da compensação. Sob tal perspectiva, tem-se de admitir que a Lei 8.383/91 autorizou a compensação com tributos "vencidos" ao tempo da compensação, desde que fossem "vincendos" ao tempo do indébito".

  Referências: 

[1] Disponível em https://economia.uol.com.br/ultimas-noticias/colunistas/valdir-amorim/2015/11/19/pessoas-juridicas-nao-podem-compensar-creditos-de-outras.htm. Acesso em 26/03/2017

[2]Disponível em: https://carf.fazenda.gov.br/sincon/public/pages/ConsultarJurisprudencia/consultarJurisprudenciaCarf.jsf. Acesso em 20/03/2017

[3] PEREIRA, Cáio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil. Vol. 2, 4 ed., Rio de Janeiro: Forense, 1976, p. 309-310). No mesmo sentido, dispõem Orlando Gomes (Obrigações. 11 ed., Rio de Janeiro: Forense, 1996, p. 203-213); Pontes de Miranda (Tratado de Direito Privado. Direito das Obrigações. Vol. 23, Rio de Janeiro: Borsoi, 1958, p. 290-334); e Silvio Rodrigues (Direito Civil. Vol. 2, 2 ed., São Paulo: Max Limonad, 1965, p. 345-358).

[4] MIRANDA, de Pontes. Comentários ao Código de processo Civil, tomo IX, RJ, Forense, p. 378

[5]Disponível em https://jota.info/colunas/pauta-fiscal/a-operacao-de-cisao-e-o-aproveitamento-de-creditos-24022017. Acesso em 28/03/2017.

 

[6] Disponível em: https://www.receita.fazenda.gov.br/publico/Legislacao/SolucoesConsultaCosit/2014/SCCosit1192014.pdf. Acesso em 26/03/2017.

[7] OLIVEIRA, Regis Fernandes. Curso de Direito Financeiro. Revista dos Tribunais. 5ª ed. Rio de Janeiro: 2013, p. 607

[8] In Direito Tributário – Constituição e Código Tributário à Luz da Doutrina e Jurisprudência , 10 ed. Ver. Atual. – Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora; ESMAFE 2008, p. 995.