COMO EDUCAR PARA O PENSAR?

Por Deusdanison Rocha Pelais | 01/03/2011 | História

COMO EDUCAR PARA O PENSAR?

A importância de se ensinar para o pensar é reconhecida por professores e escritores da educação. Aponta-se na teoria e na prática um desejo de fazer com que os estudantes conquistem um pensar por si mesmos, de forma que consigam autocorrigir-se de maneira crítica e criativa. Entendemos que o pensar é uma maneira de aprender, de investigar o mundo e as coisas, para melhor interpretá-los e, assim, melhor conhecer o mundo que habitamos. É pela atividade critica e criativa do pensamento que nos libertamos da submissão de sistemas e pessoas com ideologias manipuladoras e desumanizadoras. Não considerar a importância de uma atividade educacional voltada ao desenvolvimento do pensar é subestimar a capacidade humana de raciocínio.
O pensamento é uma atividade produtiva e o próprio produto da capacidade de pensar, portanto para o ser humano, por si mesmo é a condição primária de sua liberdade. Neste sentido, amparamos nossas idéias sobre a importância de um ensino voltado ao pensar no livro "Como Ensinar a Pensar", de Louis E. Raths, Selma Wasserman e outros. Nesta obra, os autores procuram relacionar a tarefa da educação com o desenvolvimento dos processos do pensamento a partir da definição das funções, operações e categorias do pensar, bem como procuram verificar as aplicações práticas no campo educacional. Neste sentido, os autores apresentam a educação para o pensar, tendo em vista a seguinte reflexão:
A importância do pensar e do pensamento é teórica e verbalmente reconhecida. Ansiamos que nossas crianças sejam capazes de pensar por si mesmas, de autodirigir-se, de meditar e refletir; não queremos que sejam precipitadas em seus juízos.
Porém, por que queremos tudo? Em parte, porque suponhamos que a sobrevivência depende desses fatores, quem sabe porque pensamos que o ser humano não pode ser tolo e simultaneamente livre. A sociedade livre que nos esforçamos por construir exige uma inteligência também livre. Pouco tempo durará a liberdade e a independência ao povo que não possa ou que não queira pensar sobre seus problemas. Não cabe dúvida de que os pilares de toda sociedade democracia são a capacidade de compartilhar as idéias e empregar a inteligência. (RATHS et al. , 1971,p.21).
Desta forma, consideramos que o pensar é a articulação racional que fazemos ao questionar e criticar conhecimentos cristalizados ou as relações de poder e autoridade presentes na sociedade. Convencionalmente, identifica-se uma propensão para cultivar a disciplina e docilidade de um pensar receptivo e passivo ao invés de educar um pensar critico, criativo e investigativo. Certamente, é mais fácil ensinar a um grupo de alunos passivos e submissos do que aguçar para um pensar inquieto e desafiador. Porque este, uma vez recuperado, questiona os conhecimentos dogmatizados e a idéia subjetiva de autoridade de um saber arbitrário. Muitos professores sabem da importância de se ensinar a pensar, porém desconhecem os caminhos que promovem este pensar.
Muitos alunos, professores e pais ainda entendem que a aprendizagem é mais eficaz quando a escola se aplica na pura transferência das principais informações dos conhecimentos tidos como verdadeiros. Notamos que esta é uma tendência conservadora, que busca apenas repassar as habilidades básicas de ler, escrever, contar e memorizar informações convencionadas. Esta atitude de pais, professores e alunos tende a desencadear limites à capacidade de pensar. Simultaneamente, é possível observar que o aluno desenvolve uma dependência excessiva para com o professor, tendo como conseqüência: dificuldade para concentrar-se, falta de significado no que estuda, faz as atividades por obrigação, tem dificuldade para interpretar, assimila e reproduz uma postura dogmática (conduta rígida e inflexível), falta de confiança em seu próprio pensamento, resistência para o pensar, etc.
A palavra pensamento pode ser entendida por diferentes significados, mais amplos ou mais restritos. Dewey é um dos filósofos que muito contribuíram na reflexão do que podemos entender sobre o ato de pensar.
Dewey (1953) considera que existem pelo menos quatro concepções distintas sobre a palavra pensamento. Veja cada uma:
Num sentido amplo, o primeiro significado atribuído à palavra pensar se refere a tudo o que vem à cabeça. Este significado não leva em conta se existe ou não, uma forma lógica ou verdadeira de pensar. Qualquer coisa que venha à mente é considerada uma forma de pensar. O ato de pensar, neste sentido, não depende de uma seqüência de idéias, ocorre ao acaso.
Num segundo entendimento, o significado do ato de pensar está ligado à idéia de que se algo não pode ser diretamente observado, pode ser imaginado, pensado. Pensar é, neste sentido, a capacidade de organizar as informações disponíveis para imaginar uma possível continuidade que leve a uma nova conclusão.
Um terceiro significado indica que o ato de pensar está ligado às idéias que nos levam a uma convicção. O ato de pensar é caracterizado pela capacidade de organizar convicções, ou por formular suposições aceitáveis.
Num sentido mais amplo, o ato de pensar é entendido como a capacidade de refletir sobre o fundamento das convicções, é o exame da base que dá sustento às razões. Agrega-se ao significado de pensar a capacidade de duvidar das concepções convencionadas. É o ato de pensar sobre o já pensado. Neste entendimento, pensar significa refletir, o que consiste em uma seqüência lógica, e não causal, de idéias. Cada reflexão engendra uma seqüência de reflexões subseqüências.
Estes diferentes significados do ato de pensar, interpretados a partir de Dewey, fazem perceber que há alguns conceitos vagos. O quarto entendimento se harmoniza com a concepção que desenvolvemos. A característica reflexiva do ato de pensar combina com a atitude filosófica, cujas características também se assentam na dúvida e na investigação continua.
E o emprego das atividades que fazem pensar, Lipman identifica que para alguns professores ensinar a pensar exige muito tempo, diminui a autoridade do professor e, a curto prazo, pouco se observa como resultado positivo. Diante disto, o filósofo investigou os resultados obtidos em uma prática diferenciada que leva em conta as operações do pensamento. Para isso, identificou a necessidade de se proporcionar um ambiente de questionamento e liberdade para observar comparar, supor, etc. Para ele, esta prática ajuda a desenvolver a autonomia do pensamento.
Pensar com autonomia é pensar por si mesmo, o que parece redundante, porque não podemos pensar de outra forma se não pelas próprias faculdades de raciocínio. Contudo, o que pretendemos afirmar com isto, é que quando as coisas são apresentadas de forma concluída levam a um conformismo por parte daquele que não foi educado a questionar e a refletir. Pensar por si mesmo vai além do memorizar conclusões ditas certas para desafiar-se a "reaprender a ver o mundo".
Ao procurar definir o que é o pensamento, recorremos à explanação das diversas atividades mentais, também chamadas por Lipman de habilidades de raciocínio e tratadas como operações do pensamento. As operações do pensamento são todas aquelas atividades racionais que se fazem presentes no momento que pensamos. As principais operações do pensamento são: comparar, resumir, observar, classificar, interpretar, buscar suposições, imaginar, reunir e organizar dados, formular hipóteses e tomar decisões.
A educação para o pensar contribui significativamente para o crescimento pessoal e interpessoal do educando. Ela ajuda a criança ou o jovem a se tornar uma pessoa moral; a criar relações autênticas com seus pares e consigo mesma. Eles aprendem a confiança e o respeito. Eles aprendem a participar ativamente no fortalecimento do bem comum e assim a elaborar relações sociais eficazes. Em outras palavras, a educação para o pensar garante experiências ricas em significados.


Conforme Matthey Lipmam e Ann Margaret Sharp, a escola que considera a educação como sua missão, se dedica a ajudar seus educandos a encontrarem significados relevantes para suas vidas. Eles não captarão esses significados simplesmente aprendendo os conteúdos do conhecimento adulto. Eles precisam ser incentivados e desafiados a pensar e em particular pensar por si mesmos. O pensar é a habilidade por excelência que nos habilita a captar os significados.
A educação para o pensar além de incentivar as crianças e jovens a serem críticos, também os incentiva a pensarem de modo criativo. Eles são também desafiados a fazer perguntas. Não incentivar e alimentar a busca de nossos jovens por compreensão, introduzindo-os no diálogo filosófico, por meio do qual podemos nutrir sua curiosidade e esclarecer suas intuições, significa obrigá-los a aceitar a aridez da visão especializada do conhecimento como acontece na escola, hoje.

Infelizmente a filosofia tem sido tratada tradicionalmente, como disciplina reservada aos adultos. Existe uma crença de que as crianças e jovens não estariam interessados por temas tão abstratos e não seriam capazes de lidar com eles.

Pelo que temos visto e vivenciado, os temas filosóficos não são interessantes só para os adultos e nem precisam ser formulados de maneira tão técnica, que as crianças e jovens não possam lidar com eles. O que é maravilhoso na filosofia é que as pessoas de qualquer idade podem refletir sobre os temas filosóficos e discuti-los. As crianças ficam tão fascinadas quanto os adultos com noções de amizade, justiça, preconceitos etc. E tanto as crianças quanto os adultos podem reconhecer que ninguém ainda disse a última palavra sobre esses temas. .

Obviamente o sucesso desta proposta de Educação para o pensar na sala de aula, depende basicamente da formação oferecida aos professores, não só para que compreendam a dimensão filosófica das disciplinas que lecionam, mas também para que aprendam a alimentar e aguçar sistematicamente as investigações filosóficas realizadas com os alunos. .
É importante lembrar que "pensar não é saber dar respostas".

O psicanalista e educador Rubens Alves tem feito severas críticas as formas de se tratar o conhecimento numa visão tradicional, principalmente quando se pensa nos cursos preparatórios para o vestibular. Preocupa-se muito com as respostas, mas pouca importância é dada ao aprender a perguntar. .

Os argumentos usados por Rubens Alves se apóiam no pensamento do filósofo Kant. Na "Crítica da Razão Pura" Kant coloca que "o conhecimento se inicia com perguntas que fazemos a natureza. Mas essas perguntas surgem quando contemplando a natureza nos sentimos provocados por seus assombros". Conforme Rubens Alves é este assombro que a preparação para os vestibulares destrói. .

Acredito que a Educação para o pensar tendo como apóio a discussão filosófica, poderá alimentar esses assombros, ajudando-nos a pensar e a transformar o mundo.

Este modo de pensar pode ser utópico, mas o educador precisa sonhar porque "educamos em função de um futuro que achamos e julgamos melhor". O sonho faz parte da nossa competência técnica, política e pedagógica, e essencialmente.
A nossa prática. (Moacir Gadotti - IV Congresso de Educação dos Estabelecimentos Particulares de Ensino do D.F.). .

Acredito que educação para o pensar deve ser conhecida não só pelas pessoas que se preocupam com a pedagogia, mas também por todas aquelas que se preocupam com a evolução da sociedade. A educação para o pensar não é apenas mais uma mera situação do nosso dia-a-dia, mas de primordial importante para os escolares da nossa educação. É um instrumento que possibilita o contato dos educando consigo mesmo, com os outros e com o mundo, ajudando-o a ser mais autônomo mais consciente e mais responsável.

Referências
CORDI, C. et. Al. Para à Filosofar. São Paulo: Scipione, 2000.
DEWEY, John. Como pensamos. São Paulo: Cia Editorial Nacional, 1953.
FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia: saberes necessários à prática educativa. São Paulo: Paz e Terra,1996.
SHARP, Ann Margaret. A Filosofia na Sala de Aula. Nova Alexandria: São Paulo.
DALRI, Emanuelle S. Comunidade de Aprendizagem Investigativa. Florianópolis, SC: Sophos, 2003;
DANIEL, Marie-France. A Filosofia e as Criançãs. São Paulo: Nova Alexandria, 2000.
Inteligências Múltiplas - IV Congresso de Educação dos Estabelecimentos Particulares de Ensino no Distrito Federal;
Philos - Revista Brasileira de Filosofia no Ensino Fundamental. Ano 09 - n.º 17 - Janeiro/Julho 2002.