Chico Dólar Narra A Guerrilha Do Araguaia

Por Félix Maier | 02/12/2007 | Política

“Em 24 de janeiro de 1974, encontrava-me na base de operações de combate em Bacaba, quando recebemos uma informação de que o guerrilheiro Piauí (cuja prioridade para captura ou destruição era número ‘um’), juntamente com outro não identificado, foi visto nas proximidades de São Domingos das Latas, um pequeno povoado localizado no meio da selva.

O Tenente Miracis (Miracis Rogério Flores), hoje Coronel do Quadro do Estado-Maior (QEMA) do Exército, e eu saímos numa camioneta do INCRA, com a finalidade de confirmar a informação. Lá chegando, ouvimos alguns moradores que nos afirmaram tê-los visto numa cabana a uns 5 km do povoado.

Como estávamos somente em dois, fomos até um posto policial, no Km 46 da rodovia Transamazônica, nos identificamos e solicitamos ao sargento PM comandante o apoio para prendermos os guerrilheiros. Prontamente nos colocou à disposição quatro soldados. Cabe aqui ressaltar que este posto era aquele que os guerrilheiros haviam atacado e roubado em outubro de 1973.

Não fomos até a nossa base em Bacaba, no Km 68 da rodovia Transamazônica, pegar o meu GC porque ficava muito longe e poderíamos perder a oportunidade de capturar ou matar estes dois. Retornamos para o povoado e prosseguimos até a cabana onde supostamente estariam os guerrilheiros.

Lá chegando, bem antes do local onde eles se encontravam, deixamos a viatura e adentramos na selva a pé. Próximo da cabana a cercamos, eu e dois soldados pelo lado direito, e o Ten Miracis com os outros dois pelo lado esquerdo, combinamos um horário para invadi-la.

No horário pré-determinado, o Ten Miracis não apareceu, então eu e um soldado invadimos a cabana, deixando o outro do lado de fora, nos dando cobertura e com ordens para atirar, se os guerrilheiros saíssem em fuga.

Ao entrarmos, os dois guerrilheiros estavam sentados no chão, comendo farinha. Foram pegos de surpresa e pularam em direção de suas armas que estavam próximas deles, mas foram por nós impedidos na base de coronhadas, travamos luta corporal e quando conseguimos domina-los, colocando-os deitados de cara no chão, com as mãos na cabeça, entrou o Ten Miracis com outro soldado PM.

Capturamos Antônio de Pádua Costa ‘Piauí’, chefe de um grupo de guerrilheiros encarregado de manter a moral deles elevada, e ‘Zezinho’, um camponês jovem que havia sido recrutado pelos guerrilheiros, um inocente útil. Ambos estavam magros e desnutridos, com suas roupas em farrapos. ‘Piauí’ tinha um revólver cal. 38, uma espingarda cal. 44, e ‘Zezinho’ uma espingarda cal. 20 e um facão.

Retornamos para nossa base em Bacaba, porém quando passamos pelo povoado de São Domingos das Latas os conduzimos a pé, com uma corda amarrada no pescoço para que a população os visse.

Todo guerrilheiro capturado vivo pelas nossas equipes era conduzido para a base de Bacaba e ficava ali de três a cinco dias, onde era submetido a interrogatório preliminar, com a finalidade de dar seqüência às missões, que se baseavam nas informações que os mesmos nos passavam. Depois, eram levados para a ‘Casa Azul’, no Amapá-PA, no Quartel-General das Operações de Comando, onde seriam interrogados por militares do CIE.

Dos guerrilheiros que foram interrogados, ‘Piauí’ foi o mais corajoso e valente. Não era como os outros que não agüentavam as técnicas de interrogatório que lhes eram aplicadas e gritavam pedindo pelo amor de Deus que os matássemos.

‘Piauí’ agüentava o interrogatório sem gritar ou reclamar, eram um dos poucos guerrilheiros bem preparados para a luta. Depois de alguns dias em Bacaba, ele e ‘Zezinho’ foram levados para a ‘Casa Azul’.

As técnicas de interrogatório a que eram submetidos os guerrilheiros em Bacaba consistiam em: choques com corrente elétrica gerada por baterias de telefones de campanha portáteis; telefone (consistia em dar tapas com força, simultaneamente nos dois ouvidos com as mãos abertas); coloca-los em pé, descalços em cima de duas latas de leite condensado se apoiando somente com um dedo na parede; socos em pontos vitais como no fígado, rins, estômago, pescoço, rosto e na cabeça, além de faze-los passar fome e sede.

O guerrilheiro Antônio Pádua da Costa ‘Piauí’, que eu capturei vivo e hoje consta como ‘desaparecido’, quando fui evacuado da região, em 27 de fevereiro de 1974, ainda se encontrava vivo colaborando conosco, nos ajudando a encontrar diversos depósitos de alimentos e materiais dos guerrilheiros. O seu desaparecimento ocorreu em março de 1974.

O camponês ‘Zezinho’, recrutado pelos guerrilheiros, permaneceu vivo e passou a nosso colaborador” (pg. 55 a 57).

Vale aqui fazer um parêntesis para comentar a prática da tortura como método para obter informações. Claro, trata-se de um crime inominável, hediondo. É uma prática maquiavélica, de modo a obter informações que irão facilitar o final da guerra, na medida em que se conhecem as movimentações do inimigo, o efetivo de sua tropa, suas armas, as ações que pretendem praticar. Nada degrada mais um ser humano do que a prática da tortura. No entanto, de maneira cínica, a tortura é condenada por todo o mundo e é, ao mesmo tempo, praticada em todo o mundo. Ainda hoje se pratica a tortura sistemática nas prisões brasileiras, como comprovou recente relatório das Nações Unidas, considerado “impreciso” pelo governo Lula. As esquerdas brasileiras, quando condenam a tortura empregada pelas Forças de Segurança durante os governos dos militares, na verdade estão querendo apenas monopolizar a tortura, na medida em que esta mesma esquerda, farisaica, fingida, mentirosa, não condena a tortura ainda hoje existente, p. ex., nas prisões cubanas. Pelo contrário: essa mesma esquerda, incluído aí o excelentíssimo senhor presidente Lula da Silva, tece elogios cada vez mais acalorados ao Abutre do Caribe, Fidel Castro. Se existe um filme Caminho para Guantánamo, é para, antes de tudo, azucrinar o governo dos EUA e esconder as torturas praticadas atualmente pelos terroristas talibãs no Afeganistão e pelos da Al Qaeda e associados no Iraque. Nada mais do que isso. Uma última pergunta às esquerdas: o que teria ocorrido com Chico Dólar, caso ele tivesse sido capturado vivo por “Piauí”?

Morte do guerrilheiro “Osvaldão”

“No dia 7 de fevereiro de 1974, próximo a São Geraldo, na região de um grande capinzal, o guerrilheiro mais famoso da Força Guerrilheira do Araguaia e que possuía curso de guerrilha feito na China, Osvaldo Orlando da Costa ‘Osvaldão’, foi morto com um tiro de espingarda cal. 12, que o atingiu em cheio no peito, pelo mateiro Arlindo Vieira da Silva (Piauí), quando este guiava uma equipe de pára-quedistas de Xambioá.

Seu cadáver foi levado pendurado num helicóptero para as bases de Xambioá, Bacaba e alguns povoados onde ‘Osvaldão’ era conhecido e temido, sendo exposto à população com a finalidade de acabar com sua fama (mito).

‘Osvaldão’, na primeira fase de combate entre as Forças Armadas e os guerrilheiros, no dia 8 de maio de 1972, em uma emboscada matou o Cabo do Exército, Odílio da Cruz Rosa (Cabo Rosa) com um tiro na virilha e feriu com um tiro nas costas (clavícula) o 3º Sgt Wellisbeth Moraes Macedo, hoje Tenente Moraes. Ambos serviam na 5ª Cia Gd em Belém-PA. Além de ter feito o restante do GC fugir.

Eu servi na 8ª RM em Belém-PA com o Ten Moraes. Ele sofre até hoje as seqüelas deixadas pelo tiro recebido nas costas do guerrilheiro ‘Osvaldão’. A bala continua alojada em seu corpo e conforme diagnóstico de junta médica não pode ser retirada por intermédio de uma operação cirúrgica, pois correria risco de morte, por isso permanece na sua clavícula” (pg. 58).

Relação de guerrilheiros mortos de outubro de 1973 a fevereiro de 1974

“Os guerrilheiros mortos no período em que eu estive atuando na guerrilha foram:

Mês de outubro de 1973: Dia 14 – André Grabois (Zé Carlos), João Gualberto Calatroni (Zebão) e Antônio Alfredo de Lima (Alfredo); dia 24 – Lúcia Maria de Souza (Sônia) e posteriormente Divino Ferreira de Souza (Nunes ou Goiano).

Mês de novembro de 1973: Dia 24 – Arildo Airton Valadão (Ari).

Mês de dezembro de 1973: Dia 3 – Adriano Fonseca Fernandes Filho (Chicão ou Queixada); dia 19 – Antonio Guilherme Ribeiro Ribas (Ferreira); dia 22 – Jaime Petit da Silva (Jaime); dia 25 – Maurício Grabois (Velho Mário), Paulo Roberto Pereira Marques (Amauri), Paulo Mendes Rodrigues (Paulo), José Humberto Bronca (Zeca Fogoió), Orlando Momente (Landin ou Alexandrine), Gilberto Olímpio Maria (Pedro Gil), Guilherme Gomes Lund (Luiz) e Marcos José de Lima (Ari Armeiro) e dia 31 – Luiz Vieira de Almeida (Luizinho).

Mês de janeiro de 1974: Dia 2 – Nelson Lima Piauhy Dourado (Nelito); dia 16 – Pedro Pereira de Souza (Pedro Carretel), camponês recrutado na área pelos guerrilheiros; dia 12 – Rodolfo de Carvalho Troiano (Manoel do A); dia 17 – Vandick Reidner Pereira Coqueiro (João Goiano); dia 24 – José Lima Piauhy Dourado (Ivo). Outros: Luiz René Silveira da Silva (Duda), Maria Célia Correa (Rosa) e Telma Regina Cordeiro Correa (Lia).

Mês de fevereiro de 1974: Dia 7 – Osvaldo Orlando da Costa (Osvaldão); dia 11 – Jana Moroni Barroso (Cristina); dia 14 – Tobias Pereira Júnior (Josias); dia 15 – Custódio Saraiva Neto (Lauro); dia 27 – Cilon da Silva Brun (Simão) e Antônio Teodoro de Castro (Raul)” (pg. 60). 

(Obs.: A relação de todos os guerrilheiros mortos na Guerrilha do Araguaia pode ser vista em http://www.usinadeletras.com.br/exibelotexto.php?cod=2738&cat=Ensaios&vinda=S.)

Relação de militares mortos e feridos, de outubro de 1973 a fevereiro de 1974

“Os miliares mortos e feridos neste período foram:

Mortos: Dia 16 de outubro de 1973, 3º Sgt Francisco das Chagas Alves de Brito, do 2º BIS; dia 8 de dezembro de 1973, Soldado Raul Marques de Brito, da 5ª Cia Gd; e dia 16 de fevereiro de 1974, Cabo Ovídio Gomes França, da 1ª/34º Batalhão de Infantaria.

Feridos: Dia 16 de outubro de 1973, Soldado Manoel Pestana da Silva, do 2º BIS; e no dia 24 de outubro de 1973, Major Lício Augusto Ribeiro Maciel (Dr. Asdrúbal) e o Capitão Sebastião Rodrigues de Moura (Curió), ambos do CIE” (pg. 63).

Outras situações que ocorreram durante a guerrilha

Chico Dólar narra outras situações vividas durante a guerrilha:

“Certa vez, ‘Curió’ saiu com meu GC, a fim de confirmar informação de um encontro entre guerrilheiros e um camponês que os apoiava. Preparamos então uma emboscada no local, porém só apareceu o camponês de nome Frederico Lopes, que foi feito prisioneiro.

Foi interrogado no mesmo local por métodos convencionais e como se recusou a falar sobre qual grupo de guerrilheiros estava esperando e o assunto que tratariam, recebemos ordem para mudar a tática do interrogatório. Foi então amarrado nu, num pau viveiro de formigas (pau-de-arara) e seu corpo todo lambuzado com açúcar e sua boca cheia de sal.

Quando as formigas começaram a andar pelo seu corpo e pica-lo, nos relatou tudo o que queríamos saber. Depois o desamarramos, retiramos do pau-de-arara, deixamos que tomasse banho num igarapé e o conduzimos prisioneiro para nossa base em Bacaba” (pg. 64).

“Numa outra oportunidade, depois de oito dias vasculhando a selva, ao entardecer, Curió solicitou nosso resgate por helicóptero. Como a mata da clareira onde iríamos ser resgatados estava um pouco alta, o que dificultaria o pouso do helicóptero próximo ao solo para podermos embarcar, a não ser que subíssemos por cordas, eu em meu GC, com nossos facões, começamos a baixar a mata.

Curió e um outro combatente ficaram fazendo nossa segurança, porém Curió estava apressado e começou a gritar: ‘Rápido, Chico Dólar. Vamos Chico Dólar. Estão muito moles, Chico Dólar’. Aqueles gritos forma me deixando mais nervoso do que já estava, meu sangue foi esquentando e como vivíamos um clima de guerra, onde poderíamos morrer a qualquer momento, sem pensar respondi a Curió, gritando: ‘Pára de gritar e vem aqui ajudar, Curió FDP’. (...) Ao chegarmos em Bacaba, quem comentou o assunto foram os homens de meu GC que disseram: ‘Chico Dólar, se Curió engrossa com você nós íamos mata-lo e diríamos que foi um acidente’. Como comandante deles fiquei envaidecido e emocionado pela atitude que disseram que tomariam em minha defesa. Naquele momento percebi que eu havia conquistado a confiança deles e lhes agradeci, dizendo que não era necessária uma atitude radical daquelas, pois o que tinha acontecido era porque todos estávamos com os nervos à flor da pele, pela situação que nos encontrávamos e o que devíamos fazer era matar guerrilheiros e não a nós mesmos, esclarecendo-lhes de que a vida de cada um de nós dependia do outro” (pg. 64-65).

Esse fato narrado por Chico Dólar mostra o caráter e o profissionalismo de Curió, que não levou em conta as palavras de baixo calão proferidas por seu subordinado, e que gostava de acompanhar o GC do Sgt Vargas e sempre era voluntário para fazer o turno de vigia à noite, enquanto o GC dormia, pois nunca era escalado para tal, por ser superior ao Sgt Vargas. Isso prova o caráter, o profissionalismo, a camaradagem e o alto senso de cumprimento do dever de Curió, pois na guerra todos dependem de todos, sem distinção de “gemadas” ou “divisas”.

 

Chico Dólar relata o fato de que muitas vezes os militares eram confundidos com os “paulistas” (os guerrilheiros do PC do B, vindos, em sua maioria, de São Paulo), por andarem, como eles, barbudos, cabeludos, à paisana e armados:

“Algumas famílias ficavam com medo que as maltratássemos e nos ofereciam suas filhas adolescentes para que dormissem conosco. Evidente que jamais aceitamos essas ofertas, pois o que queríamos era contar com o apoio da população. Interrogávamos, depois solicitávamos que nos fizessem uma galinhada ou carreteiro (quando havia carne de caça) e, ao partirmos, pagávamos com dinheiro e lhes deixávamos comida e medicamentos” (pg. 65-66).

“Com relação à comunicação por meio de rádio-transmissor portátil entre as equipes, não havia, porque a densidade da selva impedia. No entanto, havia o contato Terra-Ar, com dois helicópteros, que eram chamados de ‘Papão um’ e ‘Papão dois’ e com dois aviões monomotor ‘Teco-Teco’, chamados de ‘Paquera um’ e ‘Paquera dois’. (...)

Certa vez, eu pensei ter ouvido o ‘ronco’ de um avião, imediatamente solicitei ao guerreiro que transportava o rádio-transmissor que fizesse contato com ele. Percebi então que todo meu GC começou a rir de mim. Perguntei-lhes qual o motivo do riso, no que me responderam que o ruído que eu tinha ouvido não era o ‘ronco’ do avião, e sim de um besouro que havia passado perto de minha cabeça, aí eu também passei a rir” (pg. 66-67).

“A caça que mais comíamos durante a guerrilha, no meio da selva, era a de jabuti (uma espécie de tartaruga), por ser muito fácil de apanhá-lo. Além dos alimentos que transportávamos, também consumíamos palmito, mandioca, coco de babaçu, castanha-do-pará e outros.

Todos os dias, aproximadamente às dezesseis horas, parávamos para acampar, porque na selva anoitece rapidamente. Fazíamos uma fogueira e jogávamos o jabuti vivo no fogo e quando o retirávamos, já estava cozido, ficando fácil de retirar as vísceras e o casco” (pg. 67).

“A cada dois meses que os GC ficavam na selva combatendo guerrilheiros eram dispensados, juntamente com seu comandante, por dois dias, para irem à cidade de Marabá-PA, fazerem ‘higiene mental’, divertir-se e fazer outras necessidades fisiológicas que o corpo humano pede, nas casas noturnas e boates da cidade. Neste período, ficávamos alojados na ‘Casa Azul’, no bairro de Amapá, sede da nossa base de comando. Quando saíamos dali, para ir a Marabá, tínhamos que atravessar o Rio Itacaiúna em canoas, barcos ou balsas que transportavam carros e caminhões” (pg. 68).

“O Comando da ‘Operação Marajoara’ incentivou a população a dar informações ou capturar guerrilheiros vivos ou mortos, pagando a eles uma certa quantia em dinheiro para cada situação.

Foi criada pelos camponeses uma milícia chamada de Grupo de Auto Defesa (GAD), que obteve êxito, pois saía em busca de guerrilheiros e os capturavam, entregando-os na base de Bacaba ou de Xambioá (pg. 68).

 

Chico Dólar narra que toda correspondência recebida pelos militares era censurada, assim como as cartas enviadas às famílias. As cartas que comentavam alguma coisa sobre o combate a guerrilheiros eram queimadas.

Com o tempo, vendo muitos companheiros doentes, feridos ou morrendo em combate, as técnicas de segurança aprendidas no COSAC eram muitas vezes deixadas de lado, de sorte que a abordagem de muitas cabanas e depósitos era feito de “peito aberto”. Chico Dólar conta que toda vez que capturavam um guerrilheiro, tinha que segurar seus homens “para que não o matassem” (pg. 69).

Chico Dólar ficou surpreso ao saber que as diárias recebidas eram mais que o dobro do salário mensal. “Porém, a alimentação durante o período que ficamos combatendo na selva era por nossa conta. Toda vez que saíamos para uma missão, tínhamos que levar comida pelo menos para cinco dias. Quando acabava e havia necessidade de permanecer na selva, emboscando ou seguindo pegadas de guerrilheiros, os helicópteros ou aviões nos abasteciam de alimentos e medicamentos.

Evidente que na base de combate em Bacaba foi montada uma estrutura para nos atender. Havia um depósito de mantimentos onde comprávamos todo o material básico que necessitávamos” (pg. 69).

“As jovens adolescentes, filhas dos camponeses que haviam sido feitos prisioneiros, bem como suas mulheres que ficaram sozinhas nos seus sítios no meio da selva, abandonavam suas casas e iam para os vilarejos que existiam à beira da rodovia Transamazônica, ou para as cidade de Marabá e Xambioá, onde procuravam sobreviver, se prostituindo, até que seus pais ou maridos, que se encontravam prisioneiros, fossem soltos” (pg. 69).

Evacuação

“No dia 27 de fevereiro de 1974, fui evacuado de Bacaba por motivos familiares, não mais retornando para a região do conflito, por ter sido transferido da 1ª/3º B Fron, com sede em Clevelândia do Norte-AP, organização militar onde eu servia, quando começou esta última fase que exterminou os guerrilheiros do PC do B, para a Escola Preparatória de Cadetes do Exército (EsPECEx), em Campinas-SP.

Chegando a esta cidade e à nova organização militar para onde fui transferido, me instalei e, posteriormente, revelei um filme de vinte e quatro poses de fotos que eu havia tirado escondido na base de Bacaba, do meu GC e de alguns guerrilheiros que haviam sido capturados ou mortos. Mostrei-as aos meus colegas militares e as guardei na gaveta da minha mesa, na sala de instrução da própria Escola. Todas me foram furtadas pelo Serviço de Inteligência do Exército da EsPECEx (2ª Seção). Não pude nem reclamar, pois poderia ter sido punido por ter desobedecido às ordens recebidas de não tirar fotos da Operação Marajoara. Se estas fotos estivessem comigo, com certeza ilustrariam muito mais este livro histórico” (pg. 73).

Opinião de Chico Dólar sobre a Guerrilha do Araguaia

Nesta parte do livro, Chico Dólar apresenta as falhas e os acertos observados durante os seis meses em que participou dos combates nas selvas do Pará.

Falhas:

- Falta de uma senha, contra-senha ou outro sinal de reconhecimento, entre os GC (120 militares de Bacaba e 100 pára-quedistas de Xambioá) e outras Forças Auxiliares, como a PM do Pará, que fazia blitzen nas rodovias Transamazônica e PA-70, o que ocasionou o “fogo amigo” que provocou mortos e feridos.

- Com as baixas na tropa, ocasionadas por doenças tropicais ou problemas psicológicos, houve necessidade de se fazer o recompletamento. “Os militares que vieram substituir os evacuados, oficiais, sargentos, cabos e soldados, não tiveram o mesmo treinamento que a primeira tropa teve, o que ocasionou inúmeros acidentes, culminando com mortos e feridos” (pg. 74).

- “A falta de planejamento e coordenação de nossos superiores, que lançavam um GC em uma determinada área, onde já havia outro atuando e não os avisava, ocasionando confronto armado entre os mesmos” (pg. 74).

- Falta de coordenação no emprego dos GC; alguns eram mais explorados que outros: “Nem bem chegavam à base de Bacaba, depois de oito ou dez dias na selva e no outro dia já eram mandados a retornar para cumprirem outra missão, sendo que sempre havia um ou dois GC descansados na base” (pg. 74-75).

- “Falta de um médico em Bacaba. Só no mês de dezembro de 1973 mandaram um” (pg. 75).

P.S.: Para aquisição do livro, de R$ 40,00, entrar em contato com o autor, e-mail jos_vargas@yahoo.com.br.