CENTRO CULTURAL OSCAR NIEMEYER, UM SONHO INGÊNUO DEIXADO A BEIRA DO CAMINHO

Por Maria Natália Paulino Araújo Alcântara | 22/09/2010 | Arte

Desde o Antigo Egito, podemos perceber que as obras de grande porte sempre foram concebidas pelos arquitetos famosos. No Renascimento, por exemplo, as obras mais famosas pertenceram a Michelangelo, sendo impossível lembrar a arquitetura renascentista e não mencioná-lo. Em virtude dessa prática as cidades imergiram na paisagem global, e atualmente isso se relaciona cada vez mais aos meios de comunicação social.
O que seria de Nova York sem os seus maravilhosos arranha-céus que desde o Flatiron Building (1902), projetado por Daniel Burnham, que começaram a se difundir pela cidade passando pelo Empire State Building (1931), hoje o prédio mais alto da Big Apple, que já foi cenário de tantos filmes, que nenhum outro edifício no mundo o supera nesse quesito. 
A maioria das obras famosas espalhadas pelo mundo foram selecionadas em concursos públicos internacionais. Isso permite um efeito maravilhoso visto que as vastas soluções propostas estimulam o arquiteto a ir atrás de novas tecnologias para o projeto. O mais adequado às necessidades pré-estabelecidas é selecionado e ganha um prestígio mundial.
Há alguns anos os chefes de Goiânia acharam que a cidade poderia tomar um rumo parecido das demais cidades, deixando de ser a pacata capital do cerrado goiano para se tornar algo a nível nacional. Foi daí que surgiram os vários projetos nas tentativas de inserir a cidade no ambiente nacional, como por exemplo, a Galeria Aberta que se tornou parte de um cenário de uma novela exibida em rede nacional, e o Centro Cultural Oscar Niemeyer.
O que um Centro Cultural pode representar para a cidade? Nos últimos séculos, os centros andam significando praticamente o exibicionismo da expansão econômica. Vale lembrar que a essência dos centros culturais é proporcionar cultura a população, porem para esse desempenho tantos os intelectuais quanto os cidadãos em geral tem que colaborar para a idealização dos conceitos primordiais. No caso de Goiânia, há uma alienação por parte da população no que se diz respeito à cultura. O regionalismo goiano é demasiado, isolando a sociedade das demais culturas do país e do mundo. O Centro Cultural Oscar Niemeyer (CCON) se fosse bem dirigido, o que inclui a valorização da cultura propriamente dita (não basta apenas ter o lugar é preciso incentivá-lo), isso seria capaz de proporcionar a tão sonhada conexão com as demais culturas nacionais e internacionais.
Com relação ao Museu, é importante lembrar como o acervo do MASP foi montado. Depois da Segunda Guerra Mundial o mercado de arte internacional estava propício para adquirir obras de qualidade. São Paulo se enquadrava em uma época de enorme prosperidade. Com isso Chateaubriand possibilitou que obras de Van Gogh, Picasso, Rafael e outros renomados artistas, tivessem acesso a população brasileira. É com base nesse e outros exemplos bem sucedidos que o Museu do CCON precisa se fundamentar para o crescimento cultural da população, sendo que a experiência atual é praticamente inexistente em relação às artes plásticas. É importante ressaltar, que o museu do CCON é designado à arte contemporânea, tendo a mesma forte ligações com o passado, podendo constituir um acervo importante e variado.
Em questão de Arquitetura, a obra quis ser tão contemporânea, mas na verdade passa muito mais a imagem de obsoleta. A questão mais discutida na arquitetura atual é a sustentabilidade, mas com relação ao CCON parece que o tão prestigiado arquiteto não levou muito esse fator em relevância. A obra não articula idéias vinculadas a redução de energia, nem ao aproveitamento das águas pluviais, sem contar que em mais de 17.000 m² não tem uma área destinada a permeabilidade. Será que vale a pena pagar tão caro pela obra de Niemeyer?
O CCON foi concebido com as tecnologias da época da construção de Brasília, e atualmente não provocaram o mesmo choque arquitetônico de 50 anos atrás. Uma questão importante a ser levada em consideração é a construção mal feita e inacabada da obra. Infiltrações e fissuras por toda parte, sem contar que o piso da biblioteca foi mal calculado estruturalmente e não suporta o peso dos livros. Onde já se viu um edifício projetado para abrigar funcionalmente uma biblioteca e não suportar o peso de seus livros? Parece até uma piada, mas é a dura realidade do centro cultural.
Helvécio Cardoso faz um comentário bastante crítico e altamente relevante sobre o CCON em um artigo para o Jornal da Imprensa no dia 25 de fevereiro de 2010:
Ninguém discute que Oscar Niemeyer é o maior arquiteto do mundo. Seus palácios e edifícios são esculturas que alegram os olhos e comovem o espírito. Mas, no caso de Goiânia, a regra encontrou exceção. O projeto é bem xinfrin. As unidades foram jogadas de modo esparço no espaço, faltando harmonia ao conjunto. Suas formas são absolutamente banais, pecando por um certo maneirismo niemeirano. Mas esse tipo de coisa nem pode ser dita aqui no cerrado. Vai ferir suscetibilidades. Afinal, não importa quão ruim seja o projeto ? vale, sobretudo, a assinatura - a grife Niemeyer insuflando a nossa vaidade provinciana.
A população goiana não interessa se a obra arquitetônica está adequada da melhor maneira, o que realmente importa é que Goiânia tenha uma obra do famoso arquiteto brasileiro. Com isso, o que era pra ser a porta de entrada da cidade em relação à arquitetura internacional, não passou de um sonho ingênuo deixado a beira do caminho. Ensaio Crítico feito por Maria Natália Paulino Araújo Alcântara para disciplina de Cultura, Cidade e Arquitetura - UFG.
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