CDLXV – “CAVALEIROS DO APOCALÍPSE ENTRE RESGATES E ‘CONCESSÕES’: ASSIM FALARAM OS DELEGADOS ADEMIR SERAFIM E RENATO HENDGES?”

Por Felipe Genovez | 19/06/2018 | História

PROJETO DE UNIFICAÇÃO DOS COMANDOS DAS POLÍCIAS NO ESTADO DE SANTA CATARINA

Data: 14.08.2007, horário: 07:40 horas – “”: 

A Gerência de Orientação e Controle criada a partir das reformas da LC 243/2003 (criou a Corregedoria-Geral da Segurança Pública e o cargo de Corregedor da Polícia Civil vinculado a esse órgão). Também, por meio dessa mesma legislação foi extinta a “Delegacia-Geral da Polícia Civil” e em seu lugar foi criada a “Chefia da Polícia Civil”.  A LC 381/2007 recriou o cargo de Delegado-Geral (art. 159, inciso I, "c") e, também, criou o cargo de Delegado-Geral Adjunto (inciso II, "d"), além de recriar a Corregedoria da Polícia Civil no lugar da “Gerência de Orientação e Controle”. Esses resgates vieram a ocorrer graças à ascensão do Delegado Maurício Eskudlark na direção da instituição. Posteriormente, a Corregedoria da Polícia Civil foi mantida, com as posteriores alterações da LC 534/2011 (art. 61).

Estava na Corregedoria da Polícia Civil e fui até a cozinha para tomar um cafezinho. Logo que entrei encontrei a Delegada Magali Nunes Ignácio bastante gripada e reclamando que no dia anterior teve que ficar até mais tarde acompanhando o Delegado Ademir Serafim numa reunião no gabinete do Secretário de Segurança Pública, onde os comandos das Polícias Civil e Militar discutiram um “acordo”. Magali fez um relato:

- “...Nós estávamos lá no gabinete do Secretário e a ‘PM’ queria fazer ‘TCs’ e propôs um acordo com a direção da Polícia Civil. A cúpula da ‘PM’ quer lavrar ‘TCs’ e daqui para frente eles se comprometem a não fazer mais escutas telefônicas, a realizar buscas e apreensões... O senhor sabe que a Justiça está concedendo todos os pedidos deles de buscas?  Eles também propuseram no acordo que os ‘TCs’ de desacato à autoridade sejam feitos no âmbito da Polícia Civil. O doutor Ademir chamou o Maurício e disse para ele não assinar o acordo. O doutor Ademir afirmou que se ele assinasse ele nunca mais conseguiria se fazer respeitar pelos Delegados, perderia todo o prestígio que ele conseguiu...  Participaram da reunião representando a cúpula da Polícia Civil o Neves, a Sonéa, o Adriano Luz... ah, também estava lá o doutor Renato Hendges, mas ele só falou besteira, não dizia coisa com coisa... A certa altura mandaram o Renatão calar a boca, disseram para ele não falar mais nada, ele ficou o tempo todo criticando, falava coisas que não tinha nada com o assunto...”.

Interrompi:

- “Sim, quer dizer que estavam lá os ‘quatros cavaleiros do apocalípse?” 

Magali ficou meio sem entender e perguntou: “Que cavaleiros do apocalípse, doutor?”

Respondi:

- “Bom, não sei se tu lembras, mas T., N., S. e A. foram os principais responsáveis por aqueles planos do governo Luiz Henrique... que acabaram com a nossa Academia de Polícia, com a Corregedoria-Geral, Polícia Científica... E se não bastasse concordaram com o governo que os salários dos Oficiais ficassem vinculados aos dos Delegados, não foram eles?”.

Magali intercedeu:

- “Ah, doutor, perdemos também o Detran, lembra? Antes ele estava vinculado à estrutura da Polícia Civil. O doutor Renato disse lá para os Coronéis: ‘ah, vocês podem ficar com o Detran...’ Imagina, doutor, o Detran ser entregue para a Polícia Militar, ele sempre foi nosso...”.

Interrompi:

- “É, essa é aquela ideia do T., como lá no Rio Grande do Sul, logo o Detran que é o órgão que mais arrecada tributos, logo o Detran que assegura boa visibilidade e relações públicas... Bom, com o fim da Polícia Técnica e o Detran podem extinguir também as Delegacias Regionais de Polícia...”.

Magali concordou  e eu fui saindo de fininho porque a Delegada Sandra Mara Pereira havia acabado de entrar na cozinha. Na saída fui mostrando os quatros dedos da mão direita erguida e dizendo ao mesmo tempo:

- “Não esqueça os quatro cavaleiros do apocalipse!” 

Mas evidente que não poderíamos esquecer outros personagens nesse processo de “entregação”, como o pessoal da “Adpesc”: lá estavam “M. N.”, “A. R.”, “A. S.” e tantos outros. Também não dava para esquecer aquele presidente do ‘Sintrasp’ que já está há quinze anos cumprindo mandatos ininterruptos, bom em contar estórias para os policiais civis enquanto assistia tudo de camarote, invocando discursos fáceis e rasantes quando acuado...  Bom, melhor nem falar nesse pessoal porque era muito triste nominá-los. Ah, também, existiam os Delegados Regionais , preocupados cm seus cargos e posições, por se garantir no poder, como muitos, conforme pude sentir nas conversas com alguns conhecidos, como no caso de Dirceu Silveira, Juraci Darolt, Gilberto Cervi e Silva, Leonísio Marques, José Castro... e mais todos os Delegados Regionais. Fiquei imaginando como mobilizar esses Delegados mais esclarecidos para uma cruzada como no caso da nova investida no sentido de alavancar o projeto da “Procuradoria-Geral de Polícia”, a começar pela Polícia Civil? Parecia que estavam todos mergulhados nos seus “mundinhos”, desprovidos de capacidade e interesse de se envolverem em projetos que se antagonizassem com governos, que lhes dessem visibilidade...? Bem mais confortável permanecerem em suas zonas de conforto, como sempre foi...

Horário: 16:50 horas:

Cheguei na Delegacia Regional de Polícia de Concórdia para ouvir o Escrivão André Noal. Imediatamente me dirigi para o gabinete do Delegado Büchele que me recepcionou com cordialidade e descrição. Olhei para ele com aquele seu “bigode vaqueano”, estilo gauchesco,  jeito simples e calmo de ser e se vestir, externando uma personalidade bem definida e identificado com o oeste gaucho. Büchele foi logo perguntando para sua secretária sobre o policial que ainda não havia chegado. A secretária informou que o investigado já tinha saído de Ipumirim e que esteve na Delegacia da Comarca...  Büchele parecia aborrecido com a conduta do Escrivão André e foi fazendo um desabafo ácido, ao mesmo tempo que ordenava sua secretária:

- “Se ele não chegar até às dezessete...! Liga para a Delegacia da Comarca agora...!”.

Ouvi aquilo e na frente da policial secretária fui tentando acalmar o Delegado Regional:

- “Ah, mas se ele está na ‘Comarca’ resolvendo algum problema a gente espera. Não tem problema não, enquanto isso a gente conversa um pouco aqui, eu espero dez, quinze, vinte minutos...”.

Büchele me olhou meio desconfiado e vaticinou:

- “Eu me dou com o policial André, não dá mesmo, ele é muito agitador aqui na região. Ele fica colocando fogo na turma aí, fica difícil administrar assim, eu vou ter que dar uma dura nele.”.

Ouvi atentamente suas palavras e procurei aliviar a situação:

- “Bom, depende, existem agitadores para o bem e agitadores para o mal. Jesus, por exemplo, foi um grande agitador para o bem. Então, se o André for esse tipo de agitador...”.

Büchele novamente me olhou em silêncio, parecia ter entendido que eu não era muito fácil de ser sugestionado e argumentou:

- “O André fez a opção para trabalhar no ‘IGP’. Ele quer vir trabalhar aqui na Regional, mas eu não sei se vou aceitar, ele influencia muito o pessoal, forma opinião...”. 

Interrompi:

- “O nosso grande problema hoje é esse processo de ‘acovardamento’. Profissionais com esse perfil do Escrivão André fazem falta. Nós estamos precisando de Delegados com esse perfil, que tenham capacidade de se indignar, tenham coragem de se posicionar, que não se vendem por ‘carguinhos’.  Neste governo, nós, Delegados nunca perdemos tanto. Este governo do Luiz Henrique está sufocando aos poucos a instituição, a começar pelos Delegados. Nós tivemos aquele tempo áureo do Pedro Ivo Campos, não sei se tu pegasses aquela época, ah, que saudade daquele ‘PMDB’, que governador foi o Pedro Ivo! Depois veio o Paulo Afonso, que apesar do atraso dos nossos salários e da falta de projetos no plano legal, fez um excelente governo para a Polícia Civil em termos materiais. Aliás, até procurou acertar uma meia isonomia salarial para nós, lembra?, Foi uma época em que se construiu muitos prédios... Mas agora veio o Luiz Henrique e está fazendo o pior governo da nossa história, além de contar com essa turma de Delegados entregadores, brincadeira¹. Büchele interrompeu:

- “O nosso problema foi o Kleinubing, lembra? Foi ele que começou aquele negócio das letras, como é que é mesmo o nome? ... O Paulo Afonso passou o governo dele todo...”.

Interrompi:

- “Sei, sei, mas não foi o Kleinubing que começou o caso das “Letras”, isso foi o Paulo Afonso. Não, tás enganado, as ‘Letras’ foram emitidas para pagamento de precatórios... O problema do Kleinubing foi com a nossa isonomia salarial com o Ministério Público. Por pressões do Ministério Público, acabaram nos dando uma ‘rasteira’”.

O Delegado Regional Büchele  depois de refrescar a memória acabou concordando com meu relato histórico e pude voltar a falar do governo Luiz Henrique mencionando que desde o início, no ano de 2003, nós perdemos a Academia de Polícia, a Corregedoria-Geral, a Polícia Científica, além dos Oficiais da PM terem seus salários atrelados aos Delegados. Como golpe de misericórdia, os Peritos também conseguiram se atrelar aos salários dos Delegados... Mencionei que os Peritos que não possuíam dedicação exclusiva, trabalhavam em sistema de plantão e poderiam exercer outras funções laborais, como no caso dos médicos legistas.

Ao final da nossa conversa citei a lei que aprovou o “Fundo de Garantia” dos policiais militares, a gratificação de vinte por cento para os Coronéis ao se aposentarem. Büchele me olhou sério e parece que ficou mumificado, sem argumentos, dando a impressão que não tinha outra alternativa a não ser concordar com meus argumentos e foi afirmando que realmente alguma coisa precisava ser feita alguma coisa, que era imperativo reagirmos... Completei, falando do “acordo” que o comando da PM queria celebrar com a cúpula da Polícia Civil sobre a lavratura de termos circunstanciados, sentenciando que se cedessem, amanhã a PM iria querer avançar mais ainda, como por exemplo,  lavrar autos de prisão em flagrante, instaurar inquéritos... 

Em seguida o Escrivão André Noal se apresentou no local e foi nos cumprimentando.  A policial Patrícia Angélica já havia se instalado numa das salas do andar superior da DRP e para lá nos dirigimos eu e André.  Antes de começarmos nossa conversa fui avisando:

- “Sim, quer dizer que tu andas agitando por aí?”

André me observou com aquele seu jeito calmo, silencioso, pensante e curioso, me lançando uma pergunta:

- “Quem disse isso? Eu, agitando?”

Continuei:

- “Sim, o doutor Büchele! O Delegado Regional estava me dizendo que está preocupado contigo. Ele revelou que você é um agitador aqui na região dele!”

André deixou escapar um sorriso que parecia um misto de satisfação e sabor de vivenciar uma situação extrema, considerando seus limites, possibilidades e liderança. Como André parecia em dúvida sobre minha real posição, ou seja, não sabia se eu o estava censurando, cobrando, questionando, avaliando..., então, procurei externar minha opinião:

- “Eu disse para ele que existem agitadores para o bem e para o mal. Também disse que Jesus Cristo foi um agitador para o bem e que se tu és um agitador para o bem...  Eu conversei com ele e disse que a Polícia Civil está precisando de agitadores para o nosso bem, que não era mais possível se conviver com tanta covardia, amordaçamento...”.

André me ouviu atentamente e deixou escapar certo brilho no olhar ao ouvir minhas palavras, parecia mais confiante depois de se certificar qual era a  minha real posição, acredito que sentiu o peso das minhas palavras e minha sensibilidade de compreender as angústias dos policiais.

A audiência foi iniciada e concluída sem que falássemos sobre esse assunto. Ao final, quando já estávamos para sair perguntei se ele havia superado já o acidente trágico em que se envolveu em Joinville onde dos quatro policiais foi o único sobrevivente (tive participação nas apuração disciplinar dessa ocorrência...). André disse que ainda tinha pesadelos, não conseguiu superar o que aconteceu... Sim, ficou aquela impressão de que ele sobreviveu para cumprir alguma missão, isso dentro de uma visão mística.

Horário: 22:00 horas:

Estava retornando de viagem da cidade de Concórdia, com destino a Curitibanos. Durante o curso da viagem, eu e a policial Patrícia Angélica entramos numa conversa envolvendo a família do seu ex-marido policial Leonardo (filho do Procurador de Estado aposentado, ex-Delegado e amigo Ézio Miguel da Luz), irmão do Delegado Adriano Luz. Patrícia Angélica relatou que tempos atrás pôde perceber nas conversas de família que os Delegados Neves, Sonéa e Adriano eram muito ligados, amigos, sempre estavam mantendo contatos. Tudo isso tendo como pano de fundo a esposa do Delegado Adriano que já foi viúva de seu primeiro marido que era da família Dietrich (filho da Procuradora de Estado aposentada Regina Dietrich). Patrícia Angélica contou que o Delegado Neves teria acertado com Adriano que ele seria colocado num cargo de Gerente na “Academia de Polícia”, criando uma expectativa de ser nomeado até Diretor daquele órgão. Durante o lapso de tempo em se cogitava essa importante cartada, Ézio regozijava-se em família – com a satisfação de um grande pai - que Adriano seria nomeado para um cargo importante, entretanto, quando o Delegado Alonso assumiu o cargo de Diretor da Academia acabou “correndo” com Adriano.  Patricia Angélica também relatou a importância que a família de Ézio dava para cargos públicos, status...  Se tudo isso eram verdades ou mentiras não saberia responder, mas que Adriano sempre procurou o poder pelo poder isso ninguém poderia duvidar, pois nunca se viu levantar uma bandeira contra governos..., aliás, ninguém! Também, não menos verdade que enquanto os “quatro cavaleiros do apocalípse” buscaram o poder, monopolizaram decisões... a Polícia Civil só foi afundando. Que ninguém duvide que esses espaços perdidos talvez nunca mais fossem recuperados...

Data: 15.08.2007, horário: 00:15 horas:

Neste exato momento já, já era início da madrugada, estava de frente assistindo o programa “Jô Soares” que falava um monte de abobrinhas e visitava a cidade de “Bofete” no Estado de São Paulo...  Acabei pensando em Marilisa que sequer ligou, mandou uma mensagem, ou deu um sopro de vida para os amigos, já que tinha se comprometido de me dar um retorno.  Nem imaginava se havia recebido meu e-mail com os projetos...