CASE DE PROCESSO CONSTITUCIONAL: CONTROLE DAS DECISÕES DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL

Por Breno Raveli Gomes de Souza | 13/06/2017 | Direito

CASE DE PROCESSO CONSTITUCIONAL: CONTROLE DAS DECISÕES DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL[1]

 

Breno Ravelli Gomes de Souza[2]

 

Gabriel Cruz[3]

 

1 DESCRIÇÃO DO CASO

O Partido Socialismo e Liberdade (PSOL) através do seu diretório nacional entrou com uma Ação Direta de Inconstitucionalidade em relação aos artigos 31, 38, III e 39, §5º, da Lei n. 9.096/95; artigos 23, §1º, 24 e 81, §1º, da Lei n. 9.504/97, que tratam sobre financiamento de campanhas eleitorais por empresas privadas. Após todo o tramite processual, o Supremo Tribunal Federal considerou tais dispositivos inconstitucionais.

Inconformado com a decisão, o Deputado Federal Arnobio do PSDB de São Paulo colheu 1/3 de assinaturas na Câmara dos Deputados e apresentou a Proposta de Emenda Constitucional n. 123/2014. Tal PEC tratava do financiamento de campanhas eleitorais por empresas privadas. Segundo exposição de motivos, tal matéria deveria ter assento constitucional e que retirar o financiamento por empresa privada poderia gerar consequências severas para o pleito eleitoral, em razão dos gastos que uma campanha gera. Após regular trâmite inicial, um Deputado Federal do PSOL impetrou Mandado de Segurança (MS n. 12.345) no âmbito do Supremo Tribunal Federal, pedindo o trancamento da PEC, uma vez que tal proposta violaria a separação de poderes (art. 60, §4º, III, da Constituição Federal). Alega ele ter direito líquido e certo a não votar uma proposta flagrantemente inconstitucional, eis que o STF já declarou a inconstitucionalidade do financiamento de campanhas políticas por empresas privadas, o que impediria o Congresso Nacional de aprovar qualquer proposta legislativa que contrarie tal decisão, sob pena de violar a divisão dos poderes, em razão do possível desrespeito a uma decisão do Supremo Tribunal Federal. Bom tendo assim a descrição do caso, eis que surge o problema, é impedido ao legislativo tratar da renovação da mesma matéria, sendo que ela já foi considerada inconstitucional pelo STF?

 

 

2 DECISÕES POSSÍVEIS PARA O PROBLEMA

  • O STF  possui toda a soberania para tratar de qualquer matéria que venha a infringir a constituição, declarando-a inconstitucional a mesma não poderá ser tratada novamente.
  • O Poder legislativo possui autonomia e soberania para renovar matérias já tidas como inconstitucional pelo STF.

3 ARGUMENTOS CAPAZES DE FUNDAMENTAR CADA DECISÃO

  • Podemos então começar expondo argumentos capazes de fundamentar a primeira decisão. É grande o entendimento que o Supremo Tribunal Federal possui uma soberania absoluta em suas decisões, é papel dele se portar como guardião da constituição no sentido do controle concentrado, que é o caso do nosso problema aqui tratado, não cabendo assim qualquer outra discussão a respeito de suas decisões principalmente no que se refere a constitucionalidade ou não das normas infraconstitucionais, podemos observar tal poder absoluto na afirmação de Luís Roberto Barroso:

De modo que o Poder Judiciário, e notadamente, o Supremo Tribunal Federal, desfrutam de uma posição de primazia na determinação no sentido e do alcance da Constituição e das leis, pois lhe cabe dar a palavra final, que vinculará os demais poderes. Essa supremacia judicial quanto à determinação do que é direito envolve, por evidente, o exercício de um poder político com todas as suas implicações para a legitimidade democrática. (BARROSO, p. [?])

Assim, segundo esta colocação o poder judiciário ao apreciar a propositura da Ação Direta de Inconstitucionalidade proposta pelo partido PSOL agiu de forma convicta e correta, já que o PSOL possui legitimidade ativa para este tipo de ação pois possuem um caráter público. É importante também lembrar que para propor está ação o partido deve ter representação no congresso, requisito que o mesmo possui como afirma Bernardo Gonçalves Fernandes.

Kelsen como bom colaborador da redação constituinte austríaca, e propositor da criação de um órgão único para fim do controle constitucional concentrado, defende veemente a soberania judicial. Em sua teoria Kelsen faz severas críticas á Schmitt que afirma que o verdadeiro guardião da constituição é poder executivo, tal fundamentação Kelsen caracterizaria ao presidente do reich(como denomina Schmitt) poderes semelhantes a ditadura.

Com a teoria do Presidente do Reich como Guardião da Constituição a referida tese seria derrubada para Kelsen, pois, com a extensiva interpretação do artigo 48 realizada por Schmitt, os 1935 poderes do Presidente seriam alargados a tal ponto que este ficaria muito próximo ao de uma ditadura. (KELSEN apud LORENZETTO, p. [1934])

 

Kelsen afirma que o Poder Judiciário é o verdadeiro guardião da constituição pois ele não participa de nenhuma forma de poder e não se comporta antagonicamente ao a nenhuma forma de poder, seja ele o parlamentou ou o executivo, assim podendo tomar suas decisões sem nenhum vínculo aos demais poderes, não permitindo assim alguma influência em suas decisões.“A defesa mais aberta de Kelsen do Tribunal Constitucional acontece quando este expõe as vantagens em se adotar este como protetor dos valores constitucionais, em que este não participaria do exercício do poder e não se colocaria antagonicamente em relação ao Parlamento ou o governo.” (KELSEN, apud LORENZETTO, p. [1936].

Com tais embasamentos podemos afirmar que o Partido Socialista Liberal agiu de maneira correta ao impetrar um mandado de segurança sobre a PEC proposta pelo deputado Arnobio do PSDB de São Paulo, já que o partido é totalmente legitimo para tal ação já que lei 12.016/09 alterou o entendimento que os partidos políticos podem impetrar um mandado de segurança mais somente em relação a seus filiados, mas sim para garantir um interesse ideológico do partido, que é o caso do PSOL nesse problema em que estamos tratando.

A nova lei nº 12.016/09, que regulamentou o mandamus, deixa assente, no seu artigo, que os partidos políticos com representação no Congresso Nacional devem atuar em mandado de segurança coletivo na defesa de seus interesses legítimos relativos a seus integrantes ou à finalidade partidária. Nesse sentido, entendemos que o recente diploma legal corrobora com o posicionamento atual do STF. Ou seja, o dispositivo normativo explicita que os partidos devem impetrar o MS coletivo não só para defesa de seus filiados, mas também para a finalidade partidária, que a nosso ver alcança, devido ao caráter público dos partidos, os interesses da sociedade (...) (FERNANDES, p. [73])

Barroso afirma que o fortalecimento do poder judiciário veio a partir da crise de representividade e da funcionalidade do legislativo, pondo assim os temas de grande repercussão social, e de grandes responsabilidades ao Supremo Tribunal Federal, inclusive ele cita alguns casos, não diferentes do nosso aqui tratados :

 (i) instituição de contribuição dos inativos na Reforma da Previdência (ADI 3105/DF); (ii) criação do Conselho Nacional de Justiça na Reforma do Judiciário (ADI 3367); (iii) pesquisas com células-tronco embrionárias (ADI 3510/DF); (iv) liberdade de expressão e racismo (HC 82424/RS – caso Ellwanger); (v) interrupção da gestação de fetos anencefálicos (ADPF 54/DF) (...) (BARROSO, p. [8])

Ainda na mesma linha de pensamento  Tate em seu livro The global expansionof judicial power afirma que a sociedade não acredita mais no parlamento para decidir sobre questões de extrema importância e relevância social, atribuindo assim ao judiciário o poder político de se debruçar sobre tais fatos e trazer assim uma resposta satisfatória a toda a sociedade.

o povo vê as instituições majoritárias como imóveis e corruptas e acaba por concordar com a criação política através do judiciário. Finalmente, ainda segundo Tate, a última que contribui para a expansão do poderjudicial é a delegação das instituições majoritárias, especificamente de seu poder de decisão aos tribunais. Assuntos polêmicos ou que envolvam política de direitos acabam sendo resolvidos judicialmente porque os custos políticos de uma decisão nesses casos são muito altos e podem prejudicar a imagem dos políticos. (TATE apud MARQUES;LOIS, p. [7])

Tendo assim expostos tais argumentos podemos nesse ponto aferir que o poder judiciário é o legitimo guardião da constituição e suas decisões devem vincular a todos os outros poderes, não podendo as matérias já decididas pelo STF serem renovadas por nenhum aspecto de outra lei pelo parlamento.

 

  • Visando de início a não concentração de poder em uma só instituição foi criada a divisão dos 3 poderes, e já rebatendo os argumentos do poder absoluto do judiciário, é necessário a observação das teorias dialógicas para evitar essa “ditatura do judiciário” como chama Gabriel Lima Marque e Cecilia Lois. “É justamente neste ponto, que as teorias dialógicas pautam-se, uma vez que observando a expansão do poder judiciário no mundo, debatem soluções para que não vivenciemos no futuro uma “ditadura do judiciário”.” (MARQUES; LOIS, p [11])

É importante perceber uma primeira questão para fundamentar os diálogos institucionais, não devemos confundir supremacia judicial com a supremacia da constituição, não cabendo assim somente ao judiciário tomar decisões acerca da constituição.

Para os diálogos institucionais, é necessário a contribuição de distintas instituições para que haja um controle mais eficiente á constituição para isso deve-se seguir determinadas regras que são definidas da seguinte forma:

a) teoria de construção coordenada, que entende que o papel de interpretar a Constituição é repartido entre os poderes, cada qual possuindo a palavra final na interpretação daquilo que é de sua competência; b) teoria dos princípios jurídicos que entende que o judiciário possui competência para solucionar questões que envolvam princípios jurídicos. Haverá então diálogo, se e somente se, o judiciário comete algum equívoco, quando seria corrigido por um controle político; c) teoria do equilíbrio, que exclui o judiciário de qualquer função que o possibilite tratar assuntos relacionados a direito, devendo apenas ser uma das instâncias de discussão, para que a sociedade solucione o conflito. A ideia é a de que toda a sociedade dialogue; e por fim a d) teoria da parceria, que visualiza nos mecanismos institucionais a forma de fortalecer o diálogo constitucional. O parlamento, com o knowhow de estabelecer políticas coletivas, e o Judiciário como o órgão capaz de identificar situações em que a função legislativa prejudica os direitos individuais, se complementariam para o fortalecimento dos direitos fundamentais (BATEUP apud MARQUES; LOIS, p. [13])

Em relação ao trancamento da PEC por meio da impetração de um mandado de segurança, não poderá sustar o andamento da mesma, através de decisão já proferida pelo ministro Gilmar Mendes (MS 32033/DF) a PEC só poderá ser suspensa em caso de erro formal em seu procedimento, ou quando a mesma tender a abolir alguma clausula pétrea.

Pois bem ao observar uma efetiva implementação da democracia brasileira, devemos diminuir os poderes do STF, e alargar os diálogos institucionais, ou seja ambas as instituições contribuindo entre si para a melhor proteção e interpretação da constituição, pois ela sim é suprema e não a instituição do judiciário. Caso o contrário como é feito regularmente, certa parte insatisfeita com a promulgação de determinado ato normativo, poderia simplesmente pedir a vista de constitucionalidade da mesma como forma de atacar o lado contrário a suas opiniões políticas.

Assim sendo, parece claro que parlamentares vencidos nas votações do congresso, não se intimidarão em levar essas matérias para ao STF para uma análise de sua constitucionalidade, o que contribuirá para que também na matéria das reformas eleitoral e partidária, o Supremo tenha a última palavra, o que seria uma evidente contradição (...). Assim, para uma fortificação do parlamento e o consequente fortalecimento da democracia no país, demandas como a diminuição das funções do STF e a possibilidade de Diálogos entre corte e parlamento no que tange a interpretação constitucional se fazem tão necessárias, quanto discussões acerca de alterações no processo eleitoral, que aproximem os eleitores de seus eleitos. (MARQUES; LOIS, p. [17]

Temos que salientar também que o poder legislativo é responsável pelo controle de constitucionalidade preventivo, ou seja ele deve impedir no ato do processo legislativo a promulgação de um certo ato normativo que seja caracterizado inconstitucional, cabe ao executivo também fazer este tipo de controle, através do veto. “Dentro deste procedimento, podemos vislumbrar duas hipóteses de Controle Preventivo de Constitucionalidade, que busca evitar o ingresso no ordenamento jurídico de leis inconstitucionais, ascomissões de constituição e justiça e o veto jurídico.” (MORAES, 2005)

Tendo em vista tais argumentos aqui suscitados podemos concluir que o legislativo também pode ser considerado um guardião da constituição, de acordo com a teoria dos diálogos institucionais não somente sozinho, mas em conjunto com os demais poderes para que a supremacia constitucional seja sempre garantida da melhor forma.

 

 

 

 

4 CRITÉRIOS E VALORES

  • O poder judiciário como a instituição responsável por toda a proteção da constituição, através de suas decisões e vinculações a todos os demais órgãos. Teoria do estado de direito.
  • O poder legislativo como órgão também controlador e interprete da constituição, teoria dos diálogos institucionais, os 3 poderes unidos fazem uma interpretação e proteção maior da constituição.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

REFERÊNCIAS

 

BARROSO, Luís Roberto. O controle Constitucional no direito brasileiro – 6. Ed.- São Paulo: Saraiva, 2012

 

BARROSO, Luis Roberto. CONSTITUIÇÃO, DEMOCRACIA E SUPREMACIA JUDICIAL:DIREITO E POLÍTICA NO BRASIL CONTEMPORÂNEO. Disponível em: Visto em: 30/09/2014

 

BATEUP, Christine. The DialogicPromise: assessingthenormativepotentialoftheoriesofconstitutional dialogue, in Brooklyn Law Review, vol. 71, nº 3.

 

FERNANDES, Bernardo Gonçalves. Curso de direito constitucional – 3. Ed.- Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011

 

FERNANDES, Bernardo Gonçalves. Remédios Constitucionais –2. Ed.- Salvador: JusPodivim, 2011

 

KELSEN, Hans. Jurisdição constitucional. São Paulo: Martins Fontes, 2007.

 

LORENZETTO, Bruno Meneses. O DEBATE ENTRE KELSEN E SCHMITT SOBRE O GUARDIÃO DA CONSTITUIÇÃO.Disponível em: Visto em: 30/09/2014

 

MARQUES, Gabriel Lima; LOIS, Cecilia Caballero. REFORMA POLÍTICA E DIÁLOGOS INSTITUCIONAIS. Disponível em: Visto em: 01/10/2014

 

MENDES, Gilmar. Voto MS: 32.033/DF. Disponível em: Visto em: 02/10/2014

 

MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 17ª Edição. São Paulo: Atlas,

2.005.

 

SCHMITT, Carl.O guardião da Constituição. Belo Horizonte: Del Rey, 2007

 

TATE, Neal; VALLINDER, Torbjörn. The Global Expansionof judicial power. New York: New York University Press, 1995.

 

[1] Case apresentado a disciplina de Processo Constitucional do curso de Direito na Unidade de Ensino Superior Dom Bosco - UNDB

[2] Aluno do 5º período, brenoravelli@gmail.com

[3] Professor Esp. Orientador.

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