Caso de criminologia

Por Louremar Vieira Alves | 29/11/2017 | Direito

Louremar Vieira Alves

Carolina Guimarães Pecegueiro Pereira

1 DESCRIÇÃO DO CASO

O caso para estudo é um episódio ocorrido na casa da família Buarque e tem como protagonista a empregada doméstica Maria Bethânia. Marieta e Francisco, os donos da casa, tinham uma boa condição financeira. Nada boa era a reputação de Francisco. Prefeito na cidade de Brejo da Cruz, era conhecido pela prática de desvio da verba da merenda escolar. Certo dia o pai de Maria Bethânia adoeceu. A enfermidade se prolongou e exigiu da família recursos financeiros  dos quais não dispunham.

A jovem empregada, tendo ao seu alcance as jóias da patroa, furtou e vendeu um colar de ouro e diamantes. O comprador deu R$ 3.000,00 (três mil reais) pela jóiaavaliada em R$ 30.000,00 (trinta mil reais).Bethânia pagou consultas em uma clínica particular para o seu pai e comprou toda a medicação receitada pelo médico. Vendo que ainda lhe restava dinheiro,  comprou um celular modelo Aifone, seu sonho de consumo depois que viu a protagonista da novela usando um modelo igual.

Ao descobrir o sumiço do colar Marieta ficou muito chateada. A jóia, mais do que o valor comercial, tinha um imenso valor sentimental pois havia sido dada a ela de presente pelo marido por ocasião do aniversário de 10 anos de casamento. A providência da patroa de Bethânia foi dar queixa à polícia que prendeu Maria Bethânia em flagrante pelo crime de furto qualificado (mediante abuso de confiança).

Há duas soluções possíveis após a análise do caso: defender ou acusar Bethânia diante do ilícito tipificado no Código Penal.

2. IDENTIFICAÇÃO E ANÁLISE DO CASO

O ilícito praticado no episódio da casa dos Buarque foi um furto, previsto no Artigo 155 do Código Penal. Embora o enunciado diga que se tratou de furto qualificado, existe a necessidade de apurar se realmente o fato se configura como tal.

Vejamos duas situações colhidas na jurisprudência:4

Para a caracterização da qualificadora do abuso de confiança é preciso que a mesma exista efetivamente entre as partes, não se presumindo, e que o agente tenha dela se aproveitado para efetuar a subtração (TJSC. Primeira Câmara Criminal. Apelação Criminal 2004.007103-5, de Santo Amaro da Imperatriz. Relator: Des. Amaral e Silva. Data da decisão: 28/09/2004).

Existência de mera relação de emprego entre o réu e a empresa vítima. Ausência de vínculo de confiança capaz de facilitar o cometimento do delito. Desclassificação que se impõe (TJSC. Apelação Criminal 2007.007114-1, de São Miguel do Oeste. Relator: Des. Torres Marques. Data da decisão: 27/03/2007).

Como responsável pela promoção da Justiça e diante das evidências, indico que seja decretada a culpa da senhora Maria Bethânia e a sua punição pela prática do ilícito.

Contudo, é preciso observar que a sua punição não se dê estritamente conforme preceitua o Código Penal pelos motivos que passamos a citar:

O princípio do sistema penal mínimo defende que as condutas ilícitas que não causem grave dano à sociedade, sejam consideradas atípicas para o campo do direito penal, considerando-se que o nível de dano para a sociedade tem pequena relevância penal, podendo o prejuízo ser sanado por outros meios.

Bethânia, a empregada, no afã de dar um tratamento de saúde digno para o seu pai, caiu na tentação de furtar o colar da patroa. Existisse ou não relação de confiança entre as duas é mera subjetividade diante da situação. O argumento motivador para a prática do ilícito é que se mostra nobre, embora nada justifique a subtração de um bem propriedade de outra pessoa.

 

A ação que decorre do episódioe que culmina na compra do Aifone por Bethânia, também não se pode entender como um elemento de premeditação para o furto do colar. Uma vez que ela só se permitiu adquirir o aparelho de celular depois de ter arcado com todas as despesas para o tratamento do seu pai. A ânsia em prover a saúde ao seu genitor e podemos dizer até, ingenuidade, a fez entregar a jóia da patroa ao comprador por um preço ínfimo se consideramos o seu real valor.

Nada disso é o suficiente, no entanto, para inocentá-la integralmente. É preciso que se dê uma resposta diante do ordenamento jurídico. É preciso que se repare o dano causado não apenas pelo valor do objeto furtado, mas pelo valor sentimental que aquele tinha para a sua proprietária.  Há a necessidade, seja da pena alternativa de prestação de serviços, para que não reste a certeza da impunidade e não imaginem outras pessoas, portadora da má índole, que é possível usurpar o alheio sem uma reposta firma da sociedade através da legislação.

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