BRAÇO D?ÁGUA
Por Alexandre Schorn | 13/12/2009 | CrônicasBRAÇO D’ÁGUA
Quando fui parar nesta aventura do Rio Madeira não tinha a menor idéia do que estava indo fazer lá. Só sei que de todas as experiências que lá acumulei, serviram para que eu me tornasse melhor. Porém, antes de dar a conclusão aos episódios, quero relatar dois fatos de benevolência do mundo enteal e Elemental.
Era uma noite normal no Rio Madeira. O barulho ensurdecedor dos motores, como sempre já era costume a nossa audição, fato tão incrível que se caísse uma chave no chão, perceberíamos de imediato o diferente som.
Eu havia encerrado o meu horário de trabalho de 8 horas consecutivas no comando da draga Escariante. Passei o comando para outro colega e fui para meus aposentos na draga. Adormeci profundamente. Já fazia algum tempo que estava ressonando quando tive um sonho muito diferente. Era como se uma coluna de água densa e espessa saísse de dentro do rio em forma de um monte d’água do tamanho de um homem e entrasse em nosso dormitório. Eu estava num estado de sono profundo, oscilando entre o real e o irreal, lembro-me de ter aberto os olhos e vendo aquela forma tão diferente fiquei quieto e extremamente calmo. Esta forte presença não me trouxe medo. Foi quando percebi que dentro deste ser de água emanava uma energia rubi e uma voz mental me disse: “Eu sou o rio e tudo que há, e sempre haverá nesta dimensão aquática sob minha égide, depende de minha permissão. Permito aos pescadores que pesquem para o seu sustento, ao lenhador entrego as árvores de meu leito para fazerem suas moradas e aquecer seu fogo. A todos os seres permito que se banhem em minhas águas. De vez em quando entrego minhas riquezas para que o homem leve-as inconscientemente ao mundo onde em uma hora ou outra, cairá em mãos certas. Enfim, como eu, existem muitos. Cada rio, cada lago, cada mar, cada oceano tem nossa presença, ordenação, proteção, interferência; por isso lhe digo já salvei sua vida por duas vezes e não haverá uma terceira. O que você veio buscar aqui e está levando mesmo sem saber no passar dos anos irá ser derramado como forma de conhecimento, experiência e respeito. Vá em paz! E cumpra o seu destino”. Neste momento como se tomado por um susto acordei e nossa draga teve um violento sacolejar que me acordou e assustou a todos. O que me chamou atenção é que todo o chão estava molhado, como se alguém tivesse atirado um balde d’água ou uma grande onda tivesse nos atingido.
Diante desses acontecimentos, confesso que é muito mais fácil para o ser humano pensar mesmo vivenciando tais fatos, de que as coisas não aconteceram de fato. Assim segue-se a vida rotineira (aquilo que pensamos ser normal), os meus ensinamentos físicos e herméticos que a falange dos arcanjos e anjos vinha me elucidando não estavam nem perto de começar. Lembro-me de ter acordado no outro dia bem cedo, rindo sozinho do meu sonho, quando de repente recordei-me de que antes de acordar ter parecido ver um ser de grande formosura angelical e com emanações de poder indescritíveis. Numa mão trazia uma balança, equilibrada pelo peso de dois mundos. Na outra, uma espada flamejante. Foram rápidos, mas profundos segundos que marcaram essa impressão mental. Havíamos acabado de tomar café e estávamos terminando a apuração de uma “mandada” (retirar o ouro acumulado nos tapetes das caixas da draga).
E como de hábito uma lancha ancorou em nossa draga, pediu licença e foi dar uma “cuiada” em nossa caixa de extração. (cuia recipiente de aço onde se absorve água e material que com movimentos giratórios consegue-se ver o número de fagulhas de ouro que está sendo absorvido pela dragagem).
Eram quatro tripulantes aparentemente bem comuns com exceção de um baixinho sorridente que foi o último a entrar. Chamava-nos a atenção os colares e guias coloridas de miçangas que ambos usavam. Sorridentes e alegres começamos a dialogar. De repente, o baixinho olhou para meu pescoço e pediu para olhar um medalhão que eu estava usando. Mostrei-lhe e expliquei que tinha ganhado de minha avó. Ele sutilmente disse: “Muito bem, Alexandre. Na nossa religião deste lado do medalhão está Xangô, o velho; e do outro, a poderosa Yemanjá”. Eu não tinha muito conhecimento sobre este assunto e não quis discutir, pois para mim era a imagem de um São Jerônimo e uma Nossa Senhora.
No momento de sua partida ele virou-se para trás e nos disse: “Vamos dar uma festa hoje à noite. Você está
convidado”. Agradeci o convite e expliquei-lhe que não tinha como ir, pois
não estava acostumado a navegar a noite. Entraram sorrindo em sua lancha e já
partindo gritou: “Viremos buscá-lo mais
tarde”. Não levamos a sério e já estávamos de partida para tentar a sorte
em outro ponto do rio. Subimos
Nisto olhei pela fresta da parede de meu quarto e vi vários indivíduos vestidos com botas e enormes chapéus em suas cabeças e fortemente armados. (Hábito muito comum no garimpo).
Não deu nem tempo de me assustar quando o mais alto disse em tom cavernoso: “Diz que foi o Pai Beto que mandou busca ele”. Não me restando nenhuma alternativa a não ser acompanhá-los. Quis ir na minha lancha, porém não houve concordância, então me submeti a ir com eles numa embarcação que para mim já estava afundada, cheia de água e com 12 homens dentro.
Quando percebi que se tratava de dragueiros e garimpeiros fiquei
mais calmo. Dirigimo-nos à Cachoeira do Simãozinho (uma das varias cachoeiras
do rio madeira. Quando faltavam
Logo fomos embora e dormi o resto da madrugada, pois no outro dia eu e o proprietário da draga, conhecido como “Goiano” tínhamos de descer a cachoeira submersa do tamborete para trazer na lancha diesel para os motores e lá fomos nós.
Estas cachoeiras têm lugares certos para serem transpassadas. De um ponto mais alto para um ponto mais baixo e vice-versa, os chamados canais de correnteza, tamanho é o volume d’água e velocidade que além de ter um barulho ensurdecedor à água desgasta as rochas parecendo que um laser de precisão cortou-as.
E como já era de hábito, descemos o canal em alta velocidade,
pois esta manobra é tudo ou nada. Chegamos ao porto mais próximo e abastecemos
a pequena lancha em torotes de diesel totalizando oito mil litros, que somando
aos tripulantes, carga máxima. Tudo transcorria normalmente, mas o Rio Madeira
é imenso e cheio de poderes e surpresas. Quando entramos no canal da cachoeira
e começamos a subir percebemos que o volume d’água acima estava violentamente
aumentado, no que contornamos as primeiras rochas e fizemos a curva do canal
para a direita nos deparamos com uma violenta tempestade e uma fúria fluvial
que arremessava ondas de
Agarrei um torote (galão) de
(Entre o que sabemos e não sabemos das milhares de criaturas que nos cercam, fica mais uma vez provado que temos de conhecer as forças enteais e elementais que regem o nosso mundo). Passados alguns dias tomei a decisão de que nada mais tinha a fazer lá e por impulso incontrolável, parti. Enquanto me deslocava do coração da selva amazônica rumo ao porto mais próximo, observei a minha direita que no barranco do rio estava uma grande quantidade de belos e fortes índios, mulheres, crianças e homens. Todos me acenavam em constante alegria. Imediatamente retribuí. Foi quando meus colegas perguntaram se eu estava ficando louco. Rapidamente disse que estava dando adeus para a mata e tudo que ali vivi. ( para não passar por maluco )