BOLETO BANCÁRIO...

Por Josafá Maia de Oliveira | 20/10/2016 | Direito

BOLETO BANCÁRIO: A (IN)COMPATIBILIDADE COM OS PRINCÍPIOS REGENTES DOS TÍTULOS DE CRÉDITO[1]

Josafá Maia de Oliveira

Thalyta Maria Lopes[2]

Heliane Fernandes[3]

RESUMO

O presente trabalho traz como cerne a análise da (im)possibilidade de considerar os boletos bancários como título de crédito a partir de uma perspectiva derivada dos princípios que regem e são arraigados aos títulos de créditos em um viés comercial/empresarial. Pretendendo, assim, enriquecer as análises já existentes sobre a relevante temática e baseando-se nelas para solidificar as perspectivas que serão aqui tragas, contribuindo com o aprofundamento da discussão teórica. Explanando, dessa maneira, o perfil cronológico de tal instituto jurídico, e seus conceitos para uma análise da consonância entre boletos bancários e os princípios que regem esse segmento jurídico, interpretando as possibilidades jurídicas de um novo caminho da matéria mercantil em relação aos títulos. Em suma, a preocupação central estará em analisar o amparo legal do Boleto Bancário á luz dos Princípios que regem os Títulos de Crédito, a fim de delinear a possibilidade ou impossibildade de se considerar esse instrumento como Títulos de Crédito.

INTRODUÇÃO

Observa-se que devido à crescente utilização dos boletos bancários nas relações contratuais atuais, a pesquisa empírica e bibliográfica sobre a implementação destes no Brasil e a natureza jurídica de tais boletos mostram-se essenciais para uma melhor compreensão acerca de suas propriedades como instrumento comercial e, também, sobre o módulo de Títulos de Crédito do Direito Civil analisando este instrumento perante as normas reguladoras do Direito.

Salienta-se, também, a importância dos Títulos de Crédito, uma vez que o crédito é elemento essencial para o desenvolvimento e circulação econômica, permitindo a antecipação das relações comerciais, na medida em que possibilita a troca de um valor atual por uma contraprestação futura, o que acelera a circulação da riqueza. Títulos de Crédito é a matéria que mobiliza a riqueza e circulação de crédito, de suma importância para a dimensão social e econômica.

Assim, observa-se que a análise da possibilidade ou impossibilidade desse instrumento econômico popular como títulos de crédito é temática peculiar para a pesquisa dentro do direito comercial. A curiosidade, o amparo legal e os procedimentos de uma ferramenta comumente utilizada oferece credibilidade à pesquisa, fazendo com que os usuários deste instrumento possam utilizá-lo de forma adequada, não os confundindo em aplicar processos que dizem respeito a outros instrumentos dos títulos de crédito ao boleto bancário.

Com a análise da problemática, pretende-se observar as relações entre os princípios e as mudanças trazidas para a lógica do direito civil. Nos dias atuais, como dito antes, com o despontamento das relações comerciais de bens e serviços via rede virtual e a necessidade do homem moderno pela praticidade e rapidez, o boleto bancário mostra-se como um instrumento que facilita as ações de pagamento entre devedor e credor, auxiliando no complemento de uma movimentação da economia segura.

Segundo o Manual de Normas e Instruções do Banco Central, o boleto bancário é utilizado com fins de registrar as dívidas em cobranças nas instituições financeiras, relacionadas com operações de compra e venda ou de prestação de serviços e até mesmo relaciona-se com outros instrumentos interligados a essas operações, como duplicatas e notas promissórias. Dessa maneira, indaga-se se o boleto bancário pode representar um título de crédito com amparo legal, e quais seriam as propriedades decorrentes dos princípios dos títulos de credito que podem ser alegadas a fim de demonstrar que há possibilidade ou impossibilidade de considerar o boleto bancário como tal. Portanto, para essas indagações e análises, requer-se um trabalho em que seja possível realizar a enumeração dos princípios inerentes dos títulos de crédito e seus principais conceitos dentro do direito empresarial e associá-los com os boletos bancários, com o intuito de destacar as incompatibilidades de tais princípios com o instrumento comercial em estudo; e assim, exemplificar situações em que comumente os boletos bancários são vistos como títulos de crédito por meio de jurisprudências, e apontando quais as consequências positivas e negativas da aplicabilidade desse instrumento como tal, ensejando, também, se há alguma possibilidade de torná-lo título de crédito taxado legalmente.

Para o princípio, fora considerado interessante alocar uma cronologia dos títulos de crédito relacionando-a com a utilização dos boletos bancários como representantes destes dentro do mercado econômico, como será visto a seguir.

1 Títulos de Crédito e o dinamismo das relações comerciais: Um perfil histórico 

A evolução dos homens e da sociedade, ao longo dos anos, em seus aspectos físicos, sociológicos e econômicos, dinamizam a sociedade e delineiam seus aspectos políticos e sociais. Surge, assim, um complexo rol de relações comerciais que dinamiza a economia, eixo fundamental para que as demais relações interpessoais e ramos sociais sejam satisfeitos, uma vez que a economia fomenta diversos segmentos sociais. Assim, tais relações comerciais devem ser munidas de um caráter de segurança jurídica, tal caráter, via de regra, precisa ser regido por um conjunto de normas disciplinadoras, que viabilize a utilização segura de todos os recursos comerciais disponibilizados.

Nesse sentido, o Direito como conjunto de normas gerais e positivas, disciplinadoras da vida social, volta seus olhos para tudo que é importante socialmente, como o direito comercial, em especial o instituto jurídico dos títulos de crédito, para que esse segmento atinja o equilíbrio e o desenvolvimento social que devem ser observados, de modo, obrigatório.

Em um breve parecer acerca do historicismo dos títulos de crédito, tem-se que estes são regimentados pelo sub-ramo direito empresarial. A sua gênese teve-se com a necessidade de ter-se uma maior mobilidade das riquezas em tempo e espaço, a necessidade de fazer o capital circula fazendo ele útil e produtivo, tornando os títulos de credito de suma importância para a economia mundial, que garantia rapidez na mobilização e segurança para os usuários (RAMOS, 2013).

Prega-se que os títulos de crédito deram início em sua trajetória histórica na Idade Média, período em que também ocorreu o surgimento do próprio direito comercial. Ainda seguindo o que André Luíz Santa Cruz Ramos expões sobre a história dos títulos de crédito, tem-se que o direito cambiário está dividido em quatro períodos históricos:  o primeiro é o período italiano, onde se tem as cidades marítimas italianas com grandes feiras medievais, o desenvolvimento das operações de câmbio devido às várias moedas existentes; e, tendo particular atenção, observa-se a existência do câmbio trajetício, que se configuravam em cautio – a qual seria uma espécie de gênese da nota promissória – e  a littera cambii – uma espécie que deu origem à letra de câmbio (RAMOS, 2013).

O segundo período está configurado como o período francês, que tem como destaque o aparecimento da cláusula à ordem, a qual daria consequente aparição ao endosso, a permissão de transmissão da letra de câmbio pelo o beneficiário; o período alemão, o terceiro, trouxe como marco a Ordenação Geral do Direito Cambiário, que trazia normatização às letras de câmbio, uma legislação diferenciada do direito comum, consolidando a letra de câmbio e os demais títulos de crédito como instrumentos de créditos que viabilizam a circulação de direitos (RAMOS, 2013).

O quarto e último período explano na doutrina seria o período uniforme, que teve como marco a realização da Convenção de Genebra, em 1930, sobre títulos de crédito que teve como consequência a aprovação da Lei Uniforme das Cambiais, a qual disciplinava acerca das letras de câmbio e das notas promissórias e logo após essa lei, veio a Lei Uniforme do Cheque. (RAMOS, 2013).

Traçado esse panorama histórico, observa-se a importância que foi tomando a utilização dos títulos de credito dentro da sociedade humana, a qual tem a produção econômica como um dos principais pilares de sustentação de sua evolução. A economia movimentou a evolução e a obtenção de riqueza do homem, e, em certo momento, necessitou-se de uma movimentação mais rápida e eficaz desta riqueza, como fora dito. Do escambo à criação da moeda, da criação da moeda aos títulos de crédito, o movimento de produção e circulação de riquezas é constante.

Assim, conceituando títulos de crédito, considera-se que eles são “documentos necessários para o exercício de um direito literal e autônomo, nele mencionado” segundo o grande jurista italiano Cesare Vivante (VIVANTE, 1998, apud GONÇALVES, 2011); ou “documentos representativos de obrigações pecuniárias. Não se confundem com a própria obrigação, mas se distinguem dela na exata medida em que a representam” (Ulhôa, 2004, apud GONÇALVES, 2011); e também “segundo o Código Civil O Código Civil definiu-os, no art. 887, como o documento necessário ao exercício do direito literal e autônomo nele contido, e que somente produz efeito quando preencha os requisitos da lei” (GONÇALVES, 2011).

Em uma análise mais ao pé da letra, verifica-se que “título de crédito” refere-se a “documento representativo de um crédito (creditum, credere), ato de fé, confiança do credor de que irá receber uma prestação futura a ele devida” (GONÇALVES, 2011). Transferindo, assim, riquezas entre devedor e credor, configurando-se como como verdadeiro instrumento de circulação de riquezas na sociedade.

Como dito antes, as formas de produção e circulação de riquezas estão em constante evolução, unindo-se com a dinamicidade da sociedade.  O crédito é um elemento necessário para que haja o desenvolvimento econômico, uma vez que acelera a circulação de riquezas. A partir dessa necessidade de novos meios facilitadores para o mundo do mercado econômico, se depara com a figura do boleto bancário.

1.2 Do surgimento à aplicabilidade do boleto bancário 

O atual momento histórico em que se vive há um emaranhado complexo de relações econômicas, onde instrumentos como títulos de créditos e outros mostram-se não capazes de absorver a totalidade e complexidade das relações econômicas.

[...]

Artigo completo: