BOIADEIRO: UM CONQUISTADOR MATO-GROSSENSE

Por Henrique Araújo | 12/07/2009 | Crônicas

BOIADEIRO:UM CONQUISTADOR MATO-GROSSENSE

 

            Caminhos, caminhos, estradas, poeira...

          Árvores derrubadas, picadas cortadas, caminhos abertos, estradas, poeiras, asfalto...

          Por entre os campos limpos que se perdem no horizonte, por entre negras florestas que somem de vista, percorre ele, ora pelas picadas, ora pelas estradas, até chegar à sua mata desejada para recomeçar novo serviço. É o boiadeiro um dos mais nobre conquistador brasileiro. É ele que percorre os campos, que reúne seu gado, que caminha pelas  estradas montado em seu cavalo, cantando uma música alegre, sorrindo aos ventos, tocando seu berrante, seu mais precioso instrumento musical.

          O boiadeiro percorre quilômetros e quilômetros no seu passo lento que não pára. E nesta caminhada ele não sente tristeza, não chora, não se lastima, nem se sente cansado. E ele vai andando tranqüilo sem se importar com luxo, com beleza do físico, da roupa, dos perfumes, pois ele é um homem simples, honesto, trabalhador e tudo que precisa o gado lhe dá. É do boi que ele tira sua camisa, sua calça, seu laço, seu arreio, sua cama, seu berrante, o sapato, o chapéu, enfim tudo para o luso doméstico e da profissão.

          Quando há exposições de gato, lá está o boiadeiro nas festas, nos gigantescos rodeios, ora montando num cavalo, ora enfrentando um touro bravo.

          Quando são cinco horas da manhã, o boiadeiro já se encontra de pé tirando o precioso líquido branco para levar aos filhinhos do papai que se encontram dormindo tranquilamente nos sombrios lugares das cidades.

          E o boiadeiro continua na sua luta incansável por todo este Brasil afora.

          Hoje o progresso da cidade faz com que o povo vá esquecendo este desbravador brasileiro, passando a admirar outros tipos de pessoas, porém mesmo assim o boiadeiro continua sobrevivendo ao lado dos grandes currais, nas fazendas e enquanto existir um boi na face da terra, ainda existirá um boiadeiro, ainda existirá aquele homem vestido de couro, usando berrante, calçando espora e tocando o  gado..

          E ele percorre estradas, corta caminhos, anda pelos campos, passa por florestas, levando o mais preciso dos produtos brasileiros: o gado.

          Caminha sem cessar o boiadeiro, ora numa cidade, ora noutra, passando sertões, reunindo boiadas.

          Quando o sol some no horizonte e a noite vai descendo com seu negro véu, então o boiadeiro pára sua boiada, reúne os companheiros, toma algum aperitivo, começa a contar estórias do seu Mané, do seu João ou daquela menina que ficou para trás. Depois ele desce com a boiada ou com a sua capa de couro e ali mesmo dorme tranquilamente, sonhando com a boiada ou com alguma menina bonita que aspira encontrar.

          No outro dia ele acorda bem cedinho, reúne outra vez sua boiada e continua sua marcha para a frente, sempre no mesmo enredo, sempre na mesma rotina, sem ambicionar ser rico, na mesma vida que segue, na mesma vida que continua.

          E sua vida vai passando na luta pelos bois, na luta pelos currais, na luta pelas fazendas, sempre sendo escravo dos bois, sempre sendo escravo de fazendeiros, mas ele não liga para isto e continua sua jornada para frente.

          Mas há uma época em que o boiadeiro se vê cansado, se vê fatigado, fica velho e começa a não dar conta do serviço. Então ele vê que seus sonhos lentamente vão se perdendo, vão terminando, é o momento decisivo de sua vida. Ele então trata de lutar para a sua família, parentes e amigos. É nesta época que o boiadeiro começa a voltar-se para o que lhe pertence, então compra um pequeno sítio e vai lutando, ora criado gado de meia, ora comprando algumas reses com seu dinheirinho e aos poucos vai começando a se engrandecer, a ser um fazendeiro, a ser dono do gado, tocando boiada, comandando boiadeiros.

          Na época da mocidade o boiadeiro é um ser lutador para os outros, mas a velhice toda esta luta se passa para si e então ele começa a ser rico, a ser importante, a ser gente.

          E foi assim que o nobre boiadeiro percorreu Mato Grosso de norte a sul, de leste a oeste, levando gado, plantando cidades, desbravando sertões, conquistando o Brasil para os brasileiros.

          Ao lado dos bandeirantes, chegou o boiadeiro ao mais longínquo sertão brasileiro onde só existiam doenças, feras, insetos e toda espécie de coisas terríveis para a vida. O boiadeiro enfrentou tudo isto e fixou-se na região. E de suas aventuras nasceram pequenos núcleos que com o passar do tempo se foram tornando cidades movimentadas. Temos hoje importantes cidades em Mato Grosso, Mato Grosso do sul, Goiás, Minas Gerais e em todo o Brasil. E aquele boiadeiro incansável continua no seu serviço, na sua profissão, a profissão de boiadeiro, porque é a única que ele gosta, a única que ele quer, a única, unicamente de sua vida, de seu interesse. E então vemos o nobre boiadeiro pelas estradas poeirentas, ensolaradas, caminhando montado no seu cavalo e levando seu gadinho de um lugar para outro sempre na mesma paz, sempre na mesma tranqüilidade.

          Nós, que vivemos nas cidades movimentadas, devíamos acrescentar mais um dia comemorativo: o dia do boiadeiro, digno de ser comemorado também como os outros, porque o boiadeiro é um valente que defende a maior parte de nossa alimentação e a nossa própria terra do sertão. Como a polícia é autoridade na cidade, o boiadeiro é autoridade junto ao seu rebanho.