AVALIAÇÃO DO DESEMPENHO DOS ALUNOS NO CONCURSO DE REDAÇÃO E LEITURA: O CASO DA PROVÍNCIA DO CUNENE

Por Domingos de Jesus Ngalelo | 04/07/2022 | Educação

AVALIAÇÃO DO DESEMPENHO DOS ALUNOS NO CONCURSO DE REDAÇÃO E LEITURA: O CASO DA PROVÍNCIA DO CUNENE 

 

Autor: Domingos de Jesus: Técnico do Gabinete Provincial da Educação do Cunene. É especialista em Avaliação Educacional em Larga Escala pelo Centro de Políticas Públicas e Avaliação da Educação (CAED/UFJF/Brasil); e mestrado em Intervenção Psicológica na Educação e no Desenvolvimento pela Universidade de Atlântico/Espanha. E-mail: jesusdomingosde@gmail.com /WhatsApp: + 244 925 41 82 37. 

 

RESUMO

O presente artigo é parte de um relatório de avaliação do desempenho dos alunos participantes da primeira edição do Concurso de Redacção e Leitura na província de Cunene. Trata-se de um projecto concebido pelo Gabinete Provincial da Educação do Cunene que visa promover o desenvolvimento das habilidades leitoras e escritoras nos alunos da 6.ª classe de idades compreendidas entre 11 e 13 anos de todas as escolas do Ensino Primário da província. Para o presente estudo, constituíram a amostra os alunos 15 alunos finalistas do Concurso, apurados das fases escolar e municipal, respectivamente. A avaliação foi feita com base nas pautas finais, os cálculos percentuais foram feitos com recurso ao pacote Microsoft Excel, através dos quais foi possível estimar as médias dos alunos nos domínios da leitura e da escrita. Os resultados alcançados foram analisados tendo em conta a correlação de alguns factores subjacentes ao desempenho dos alunos em redacção e leitura, designadamente a idade, a situação tutelar e o perfil profissional dos pais dos alunos, bem como o perfil dos professores dos concorrentes. Os resultados revelaram que os alunos que obtiveram as médias mais altas e melhor desempenho em leitura e escrita vivem com os pais e são filhos de indivíduos com nível de escolaridade acima do ensino médio. 

Palavras-chave: redacção, leitura, Ensino Primário, perfil de saída.

 

Introdução

 

O Ministério da Educação de Angola (MED), no Plano Nacional de Leitura 2021 a 2022, no Conselho Consultivo 2021, considera existir uma necessidade premente de se desenvolver projetos que visam estimular o hábito de leitura no seio da população angolana, tendo em conta os dados estatísticos sobre a literacia. De acordo com o MED, a taxa de literacia da população é de 66%, sendo a população jovem representada por uma cifra de 77%, números situados abaixo da média dos países da SADC, com 77% e 85% respectivamente.

Do ponto de vista da literatura universal, vários autores abordam a leitura, apresentando uma variedade de tipologias. Marconi e Lakatos (2010) referem-se a leitura proveitosa e respectivos fundamentos; Sabino (2008), deslinda a leitura reflexiva, lugares e finalidades da leitura; Arana e Klebis (2015), em sua abordagem em torno da importância do incentivo à leitura para a formação do aluno destacam as estratégias de leituras e diferentes actividades nelas envolvidas; Guidetti e Martinelli (2007); Rodrigues (2012).

Não obstante, um texto de extrema importância sobre esta matéria surge do punho de Batista (2020), que avalia os ateliês de leitura e o seu impacto no desenvolvimento da formação leitora.

Nesse sentido, nota-se que há, cada vez mais, a necessidade de se adoptar um instrumento de avaliação que permita aferir o desempenho dos alunos nas diferentes disciplinas para ter-se a percepção da situação do processo ensino-aprendizagem nas escolas. Tal necessidade é maior quando na aplicação do instrumento de avaliação adoptado abrange a intervenção de diversos atores do processo docente-educativo, os quais têm o privilégio de testemunhar o resultado do trabalho da escola. Apesar de tal avaliação ser fruto de um concurso, acredita-se julga-se ser uma fonte privilegiada de reflexão sobre o ponto de situação das aprendizagens dos alunos da 6.ª classe, principalmente nos domínios da leitura e da escrita, habilidades indispensáveis para a aprendizagens de outras disciplinas e ao longo da vida.

O objectivo deste estudo consiste em avaliar o desempenho dos concorrentes nos domínios da leitura e escrita que participaram do concurso da redacção e da leitura nas fases escolares, municipais e provincial.

Quanto à metodologia, o presente estudo teve como base as informações recolhidas através das fichas de inscrições do Concurso Provincial de Redacção e Leitura (CPRL) preenchidas pelas escolas e encaminhadas às direcções municipais. As fichas foram compiladas em mapas específicos, modelo Excel, com os seguintes campos: nome do aluno, idade, escola onde está matriculado, com quem o aluno vive.

Para o tratamento dos dados, foi utilizado o pacote Microsoft Excel, através do qual foi possível elaborar tabelas e gráficos com as respectivas categorias com base na análise das pautas das fases escolares, municipais e provincial. A par das pautas, os membros da Coordenação Provincial realizaram várias observações in loco e entrevistas não-estruturada aos alunos, aos professores e aos membros das coordenações municipais. Trabalho feito desde a fase das inscrições à fase final.

Desta forma, o presente estudo surge da necessidade de se avaliar os resultados do desempenho dos alunos alcançados na primeira edição deste concurso, as dificuldades ocorridas, o que vai permitir prever estratégias de melhorias e, consequentemente, projectar as mudanças esperadas nos alunos e professores não apenas no Ensino Primário, como também nos ciclos subsequentes. Estas mudanças devem embasar, essencialmente, as práticas que contribuam para que os alunos aprendam de forma significativa, os professores ensinem melhor, cujo fim, conjugado com outras iniciativas e práticas pedagógicas emanadas nos currículos, é a melhoria da qualidade de ensino. 

Do ponto de vista de estrutura, o presente artigo está composto de duas seções. A primeira consiste na fundamentação teórica em que se faz um enquadramento sobre os conceitos-chave que sustentam a presente análise, tendo em conta a literatura universal sobre os mesmos, sem perder de vista a caracterização do perfil de saída do Ensino Primário, objecto desta análise. A segunda traz a abordagem metodológica e a caracterização da amostra especialmente. Faz-se, ainda, a avaliação do desempenho dos alunos participantes à fase provincial. Nesta fase são discutidos os detalhes da fase final, o perfil do corpo de júri, bem como a apresentação dos prémios dos três classificados. Finalmente, apresentam-se as principais conclusões como fruto de um trabalho de avaliação exaustiva da primeira edição.

 

 

A importância da leitura no desenvolvimento intelectual e cultural das crianças

Mais do que a expressão da luta contra o analfabetismo, o desenvolvimento das habilidades de leitura e de escrita nos alunos é uma necessidade vital e um direito a ser outorgado sempre aos cidadãos e isto é expressivo quando tiver lugar desde a tenra idade.

Pois, Piaget (1985, p. 63) considera que:

[...] o analfabetismo não é apenas uma privação do uso da leitura e da escrita, mas uma carência geral que interessa aos meios de produção e à própria saúde tanto quanto os sistemas de comunicação ligados ao alfabeto e que servem à transmissão dos conhecimentos elementares de que depende a vida inteira.

Piaget, ao reconhecer a importância da leitura e da escrita destaca o poder do jogo comparando-o ao proporcionado pela leitura e ortografia. Atribui mérito a actividades lúdicas pelas suas vantagens significativas no processo da aprendizagem das crianças. Para ser concreto, considera as actividades de jogo para as crianças em idade escolar àquelas que englobam a iniciação à leitura, ao cálculo e à ortografia, actividades que apaixonam as crianças.

Neste sentido, num concurso de redacção e leitura além do carácter lúdico que os alunos experimentam, eles têm o privilégio de aprender coisas novas não apenas pelos textos que produzem, como também entrar em contacto com os textos dos outros concorrentes e ouvirem as leituras dos seus colegas. É um momento que proporciona a troca de experiência, a partilha de conhecimento e a ampliar a forma de perceber o mundo e de se relacionar com o próximo. Quando se partilha o mesmo espaço com alunos de diferentes escolas, quando os alunos têm o prazer de conversar entre si e com professores de escolas de outros municípios, cria-se a possibilidade de fortalecer as qualidades socioafetivos e isto tem grande significado para o desenvolvimento integral dos alunos.

A importância de desenvolvermos um concurso de redacção e leitura consubstancia-se em permitir que as crianças tenham o privilégio de fortalecer as suas aprendizagens em leitura e escrita e, consequentemente, desenvolverem as suas habilidades cognitivas como base para a aprendizagem de outras disciplinas. Decerto, a aprendizagem de outras disciplinas se torna efectiva, quando antes tiver lugar a aprendizagem da Língua Portuguesa e, essencialmente, da gramática.

Segundo Oliveira (2016, p. 2), “a leitura melhora a aprendizagem por parte do aluno, pois estimula o bom funcionamento da memória, alarga o conhecimento vocabular, melhora a capacidade de interpretação e a competência da escrita”. Para a autora, a leitura é dos métodos tradicionais de aprendizagem e é através desta que o indivíduo não apenas adquire novos conhecimentos, mas também dá salto significativo em termos de maturidade de capacidade intelectivas, o que lhe permite melhorar a sua formação de intervenção e participação social. 

O antes dito tem respaldo nas investigações de grandes cientistas do campo da psicologia e pedagogia, os quais reconheceram os benefícios do ensino da gramática nas crianças, tal como vimos a sublinhar desde o princípio. Mais uma vez para exemplificar, Vygotsky (2001, p. 101), na sua célebre obra pensamento e linguagem postula que “a gramática e a escrita ajudam a criança a elevar-se a um nível mais elevado de desenvolvimento linguístico”.

Se a aprendizagem da gramática e a da escrita contribuem para o desenvolvimento linguístico da criança, é fundamental que a escola adopte um conjunto de iniciativas que favoreçam tal exercício, o que implica o engajamento de todos os intervenientes da comunidade escolar. Enquanto órgãos da administração da educação, as direcções municipais, bem como os gabinetes/secretarias da Educação devem ter este princípio patente, tendo em conta as várias vantagens que os hábitos de ler e escrever podem proporcionar aos alunos, principalmente para aqueles que se encontram nas classes de base, por se encontrarem num nível de ensino considerado o alicerce de todo o processo educativo formal.

Tal como adiantado anteriormente, a leitura é uma das fontes de aprendizagem de que mais fazemos uso, embora a sua efetivação tenha lugar com a realização de outras actividades, nomeadamente, a observação, debates/conversações, excursões e trabalhos escolares de pendor prático. Ainda assim, todas estas actividades envolvem, duma ou doutra forma, algum ato de leitura.

Nesta ordem de pensamento, os actos de ler e escrever constituem actividades de que a escola não deve prescindir, a julgar pelas múltiplas vantagens que delas podem advir na promoção do desenvolvimento intelectual e cultural das crianças. E isto tem significado se considerarmos a aprendizagem não apenas como o resultado do desenvolvimento biológico e psicossocial, mas também o suporte. Quer dizer, novas aprendizagens impulsionam o desenvolvimento de todas as esferas do indivíduo, assim como o desenvolvimento possibilita novas aprendizagens.

Desta feita, considerando a leitura como uma das fontes privilegiadas da aprendizagem escolar, não de admirar que dizermos que o seu exercício regrado e suficientemente aproveitado promova o desenvolvimento intelectual e cultural da criança, uma vez que a liberta do analfabetismo, a cegueira intelectual que, em Angola, ainda afecta milhares de cidadãos.

Nguluve (2006, p. 177) entende que, na sociedade regida pelas diferenças […], os chamados “analfabetos não são apenas aqueles que não têm o domínio da escrita e da leitura, mas também aqueles que estão desprovidos do senso crítico e de compreensão da realidade nacional e mundial”.

No entanto, a ideia não é, simplesmente, incentivar o hábito de leitura e de escrita nos alunos da 6.ª classe, senão, promover o desenvolvimento de competências comunicativas e linguísticas que permitam a inserção activa e participativa do sujeito na sociedade.

Desta feita, todo o esforço deve ser feito para que toda a comunidade escolar se empenhe em reforçar estas habilidades nos alunos, enquanto sujeitos mais importantes da existência da escola, onde tem lugar a materialização das políticas públicas destinadas à educação.

 

Perfil de saída dos alunos do ensino primário: o que os pais/encarregados de educação esperam da escola

Umas das funções básicas da escola é fazer com que os alunos, a partir das classes iniciais, aprendam a ler e a escrever. Além disso, a primeira habilidade que um pai espera dum filho matriculado numa escola é, sem dúvida, saber ler um bilhetinho e escrever um texto, por mais simples que seja. Por isso as críticas que os pais/encarregados de educação fazem à escola reflectem o resultado que os alunos apresentam face à sua intervenção pontual na escola, no processo de ensino da leitura e da escrita, uma vez que os pais e/ou encarregados de educação percebem que os seus filhos/educandos ou não sabem ler ou lêem mal, e isto não é desejável a qualquer pai ávido de ver o seu sonho realizado. Quando, porém, vêem os seus filhos/educandos a lerem e a escreverem normalmente, bem como a contarem e fazerem cálculos tal como esperado no nível de ensino e idade dos alunos, aumentar-se-ão os elogios e reconhecimento ao trabalho dos professores, em particular e da escola, como um todo.

Neste sentido, quando termina o ano lectivo, o pai/a mãe ou encarregado de educação prestará atenção em verificar se o seu filho/educando sabe ler e escrever e é em função disto que vai fazer uma avaliação sobre o trabalho da escola. Sem que isso aconteça, o trabalho da escola é tido em vão e os professores são rotulados de diferentes maneiras. Em função dessa exigência, a escola deve estar cada vez mais vigilante e o professor reforce o seu empenho para que os seus alunos logrem um melhor desempenho nas diferentes disciplinas de classe.

O Ensino Primário, como fundamento de toda a vida escolar, é o Nível de Ensino que merece uma atenção especial, caso se queira trilhar o caminho da qualidade de ensino nos diferentes subsistemas. Ou seja, é mais fácil esperar a qualidade das aprendizagens, caso o ensino de base for muito bem trabalhado, em que os professores apliquem todo o seu saber e o façam com compromisso pátrio, desde que sejam criadas as condições materiais para o efeito.

Em termos de políticas educacionais, cada estado tem uma visão de que tipo de cidadãos almeja formar e que qualidades humanas, profissionais e sociais devem ser desenvolvidas, em função do processo educativo e formativo de que se beneficiarem. Estas qualidades são emanadas em leis sobre educação, planos curriculares, currículos e programas das distintas disciplinas, classes, níveis ou ciclo de ensino, bem como em cada subsistema ou modalidade de ensino. Tal visão de estado constitui a bússola do funcionamento de todas as instituições de ensino, da administração local da educação e do ministério de tutela. Assim, objectivos e metas no sector da educação são definidos do ponto de vista macro e meso e micro operacional.

Sob estas coordenadas e elencando o que dizíamos no princípio deste assunto, neste trabalho, procuramos buscar o perfil de saída de cada disciplina, classe e nível de ensino essencialmente. Este perfil é alcançado com materialização de certos objectivos próprios de cada situação do processo de ensino-aprendizagem. É assim que o MED tem estruturado, no programa do Ensino Primário, um conjunto de habilidades e competências previstas para este nível de ensino.

Os objectivos referidos permitem, depois de ampliadas as suas dimensões complementares, de acordo com MED (2019, p. 30-31) o perfil de saída dos alunos deste ciclo com os pontos que se seguem:

  • Conhecem e aplica instrumentos básicos de comunicação e expressão oral e escrita;
  • Revelam ter adquirido conhecimentos e desenvolvidas capacidades de trabalho, pesquisa, organização, estudo, memorização e raciocínio adequadas às tarefas;
  • Conhecem o meio natural e social que o circunda;
  • Conhecem o corpo nas suas funções e a importância da higiene e da conservação da saúde;
  • Aplicam técnicas de trabalho (estudo, pesquisa, memorização e raciocínio) às novas situações;
  • Manifestam o espírito estético com base nas novas destrezas, conhecimentos e competências adquiridas (física, técnica e de criação artística).
  • Demonstram atitudes corretas de regras e normas de conduta;
  • Revelam atitudes de apreço e respeito pela realidade cultural angolana;
  • Revelam atitudes de respeito pelo meio-ambiente, pela saúde e pela higiene.

 

No caso específico da 6.ª classe sobre a aprendizagem da Língua Portuguesa, considera-se que a sua efetivação se faz através do domínio de textos de diversas tipologias e géneros. Assim, as capacidades de ouvir, falar, ler e escrever nas várias tipologias textuais, bem como o estudo evolutivo do funcionamento da língua são consideradas áreas essências da aprendizagem nesta classe e disciplina.

Nesta ordem de orientações, as competências linguísticas na 6.ª classe materializam-se tendo em conta os objectivos abaixo descriminados:

  • Conhecer as palavras, assuntos e temas leccionados no Ensino Primário;
  • Compreender a língua através da interpretação e escrita de textos adequados à classe;
  • Aplicar correctamente os conteúdos gramaticais adequados à classe e ao nível, bem como nos conhecimentos adquiridos nas classes anteriores;
  • Aplicar a prática da leitura e escrita, apropriando-se progressivamente dos meios e instrumentos a seu alcance;
  • Conhecer os aspectos inerentes ao funcionamento da língua em situações de uso;
  • Desenvolver progressivamente os conhecimentos linguísticos, expressivos, comunicativos e sociais;
  • Desenvolver o espírito de criatividade, solidariedade, camaradagem, respeito e de ajuda mútua;
  • Desenvolver a expressão oral e a expressão escrita através da leitura e interpretação dos textos e da sua redacção (MED, 2019, p. 12).

 

Portanto, fica manifesto a ideia segundo a qual a literatura sobre a leitura e a escrita é bastante vasta, o que demonstra a importância que o tema tem, tanto do ponto de vista teórico e académico, quanto social.

 

Tratamento metodológico: caracterização da amostra

De acordo com os dados estatísticos disponíveis no Departamento de Planeamento, Estatísticas e Recursos Humanos do Gabinete da Educação (DPERH/GE) para o ano lectivo 2020/2021 foram matriculados 12 414 alunos apenas da 6.ª classe nos seis municípios da Província do Cunene. Dos alunos matriculados na classe em referência, 6782 são do gênero feminino, com idade varia entre 11 e 16 anos. Para atender a este número de aluno estão disponíveis cerca de 763 escolas do Ensino Primário.

Do total de alunos matriculados na 6.ª classe, 350 alunos inscreveram-se para participar da primeira edição do CPRL, em representação de 31 escolas de 5 municípios da província, sendo 10 no município do Cuanhama e igual número em Ombadja, 3 no Cuvelai e igual número em Namacunde e 5 na Cahama. Do ponto de vista representativo, os alunos inscritos constituem um número muito reduzido, embora o projecto tivesse sido apresentado aos directores de escolas e professores.

Conforme consta do gráfico abaixo, o maior número de inscrições registou-se nos municípios de Cuanhama, com 39,4%, seguido por Ombadja, com 30,8% e a Cahama, em terceiro lugar, teve uma representação de 17,1%. Os municípios de Cuvelai e de Namacunde estiveram representados com 22, correspondente a 6,2%.

 

Gráfico. 1- Distribuição dos alunos inscritos por municípios em percentagem

 

Fonte: elaboração do autor a partir das fichas produzidas pelas DME/2021

 

Caracterização etária dos alunos CONCORRENTES

Tal como destacado no subtítulo anterior, um dos aspectos que constou da ficha de inscrição para o Concurso, é identificação dos alunos por idade, conforme previsto no regulamento. Este elemento foi importante, porquanto permitiu perceber o ponto de situação da taxa líquida de matrículas na 6.ª classe, um indicador que explica adequação entre a idade prevista nos documentos reitores de cada nível ou subsistema de ensino e a classe em que o aluno está matriculado.

Quanto a estes dados, observamos que a maior parte dos alunos, cerca de 61% tinha 12 anos de idade, sendo os municípios de Namacunde e Cuvelai com as maiores taxas. Os alunos de 11 anos de idade foram, em termos gerais, 18% nos cinco municípios, em que Cahama teve a maior percentagem, 43%, seguido por Ombadja com 19%, Cuanhama 10 e Cuvelai e Namacunde com 9% respectivamente.

Quanto aos alunos de 13 anos de idade, a percentagem foi de cerca de 21%. Esta taxa é justificável na medida em que para o ano lectivo em causa, as aulas ficaram suspensas quase onze meses, o que incidiu num acréscimo de um ano de atraso escolar para os alunos das escolas públicas, já que algumas das escolas privadas continuaram com as suas actividades lectivas, conquanto fosse em época de pandemia da Covid-19.

Um dado não menos importante é do facto de o Município de Ombadja não ter inscrito alunos de 13 anos de idade. Esta situação pode resultar, essencialmente, de um cumprimento literal do Regulamento que, na sua concepção, restringia a inscrição de alunos ao concurso àqueles de idade entre 11 e 12 anos. É importante sublinhar que a delimitação etária dos alunos para o acesso ao concurso teve como base o estabelecido no Regime Jurídico do Subsistema do Ensino Geral (DECRETO Nº 276/19 de 6 de Setembro).

Mas, por conta da situação da Pandemia, a idade foi alargada para os 13 anos, visto que alguns alunos contavam com 12 anos no ano da matrícula, no ano lectivo 2020, exactamente o ano em que as aulas ficaram suspensas.

Em termos gerais, o concurso teve a abrangência de cerca de cerca 3 % do total de alunos matriculados na 6.ª classe em toda a província. Um dos aspectos excludentes dos alunos inscritos foi o factor idade, visto que muitos alunos tinham idades superiores ao estabelecido no Regulamento, isto é, acima dos 13 anos, segundo as declarações de muitos directores escolares ouvidos quando da apresentação dos requisitos para a inscrição. Este aspecto sobre idade permite presumir duas situações: (i) os alunos devem estar a ser matriculados acima da idade prevista para o ingresso; (ii) deve estar a haver elevadas taxas de reprovações no Ensino Primário.

Quanto à primeira possibilidade, pode recorrer-se aos dados disponíveis no DPERH/GE, sobre o número de alunos matriculados onde é possível verificar que dos 12 414 alunos matriculados na 6.ª classe em toda a província, 54% têm idades entre 11 e 12 anos. Os alunos de 11 anos perfazem cerca de 32%. Mas o que chama atenção aos dados estatísticos é o facto de que a população estudantil na base da pirâmide, em que constam os alunos da 1.ª classe, com idades de 6 a 7 anos, é de cerca de 73%, sendo 49% alunos de 6 anos matriculados na 1.ª classe.

Assim, à proporção que se avança para as classes subsequentes, os números tendem a reduzir. Esta situação pode servir para explicar ou prever o congestionamento nas escolas a este nível, o que prejudica as possibilidades de acesso e fluxo escolar, visto que nas classes terminais do Ensino Primário os números de alunos matriculados tendem a decrescer.

Do ponto de vista do desenvolvimento humano, os alunos da 6.ª classe estão em fase que se enquadra naquilo que se chama de terceira infância. Nesta idade, as habilidades cognitivas, motoras e sócio-afectivas encontram-se em pleno desenvolvimento, pelo que a escola desempenha um papel preponderante.

Segundo Piovesan, Ottenelli, Bordin e Piosavesan (2018, p. 51), “a escola, nessa fase, consiste na expe­riência central, tornando-se focal no desenvolvimento físico, cognitivo e social”.

Nesta faixa etária, o aluno deve ser capaz de experimentar habilidades complexas que lhe permitem desempenhar um conjunto de tarefas que concorrerem para o reforço das competências esperadas a este nível, portanto, reflectindo o perfil de saída do Ensino Primário. De uma forma detalhada “os aspectos cognitivos envolvem avanços no pensamento lógico e criativo, no juízo na moral, na memória, na leitura e na escrita” (Piovesan et al., 2018, p. 51).

Além disso, cabe destacar que alguns alunos estão numa fase de transição para a puberdade, um período compreendido por mudanças profundas, o que demanda uma atenção particular. Segundo o Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF, 2011, p. 8), “a puberdade ocorre em momentos significativamente diferentes para meninas e meninos, assim como para indivíduos diferentes do mesmo sexo”.

A par do factor idade, a distância entre as sedes municipais e as escolas fez com que vários alunos não se pudessem inscrever a tempo, condicionado, destarte, a sua participação. A título de exemplo, os alunos do município de Curoca não puderam participar devido à via de difícil acesso e aos feitos da estiagem que assolaram a região, cujos reflexos foram a transumância de famílias para regiões com condições de subsistência. Esta situação incidiu no absentismo dos alunos.

No ano lectivo 2020/2021, o Curoca teve o registo de 343 alunos matriculado na 6.ªclasse, dos quais 173 femininos distribuídos em 41 escolas do Ensino Primário. Entretanto, espera-se que as próximas edições venham congregar mais alunos da 6.ª classe a participarem cujas idades se enquadrem no estipulado do regulamento.

 

Situação tutelar dos alunos inscritos

A seguir, fez-se a análise da situação tutelar dos alunos, um indicador que permite verificar com quem os alunos vivem. Para o efeito, as categorias seleccionadas foram: vivem com os pais (quando vive com o pai e mãe); vivem com o pai; vive com a mãe; vivem com os tios; vivem com os irmãos; com os avôs; ou com pessoas sem laços de sangue. É importante frisar que na categoria de alunos a viverem com irmãos incluem-se, também, aqueles alunos que vivem com os primos, uma vez que por questões culturais nalgumas famílias os primos são chamados de irmãos e tratos como tal.

A necessidade de identificar a situação tutelar do aluno é questão importante, na medida em que vários estudos apontam que o desempenho dos alunos tem como base o apoio vivenciado no ambiente familiar. Quer dizer, o apoio recebido dos pais/encarregados de educação, o nível socioeconómico do lar do aluno desempenham um papel preponderante, sem descurar dos factores intra-escolar.

Tal como consta no Gráfico 4, o maior número de alunos vive com os seus pais, isto é, os progenitores. Neste caso, os dados apontam um número de 214 alunos, o que corresponde a 61%, do total de alunos inscritos, que vive com os seus progenitores, sendo a maior percentagem a registar-se no município do Cuanhama. Neste município, a percentagem é de 75%, seguido por Ombadja, com 56%, e a Cahama, com 50%, e Cuvelai e Namacunde com 45% respectivamente.

Na mesma senda, os dados sobre esta categoria revelaram mais detalhes. Por exemplo, a menor percentagem recai a concorrentes que vivem com os tios, 4%, com os avôs, 5%, com os irmãos, incluindo alguns alunos a viverem com os primos, 3%. Entre os concorrentes, houve o registo de uma aluna que vive numa instituição religiosa, portanto, no convento.

Um segundo indicador refere-se à percentagem de alunos a viver com um dos progenitores, isto é, com pai ou com a mãe. Quanto a este aspecto, do total de inscritos em nível provincial, 26% dos alunos está na condição antes descritas.

O gráfico abaixo apresenta o resumo da situação tutelar dos alunos nos diferentes municípios, onde houve registo de candidatos a primeira edição do CPRL. Os dados estão representados em barras verticais, em que as barras em verde indicam a frequência e em azul o respectivo percentual, tal como se pode observar na parte inferior do Gráfico 3.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Gráfico. 1- Situação tutelar dos concorrentes

 

Fonte: elaboração do autor com base nas fichas produzidas pelas DME/2021

 

 

Análise da fase provincial

Após terem sido realizadas as fases escolares e municipais seguiu-se o momento de preparação das condições para a fase derradeira, a provincial, em que os três melhores de cada município concorreriam para as três posições, para arrebatar o prémio mais notável do concurso provincial.

Considerando que em cada município foram apurados três alunos, a fase final foi disputada por 15 alunos. Uma caracterização etária breve dos concorrentes à fase provincial, verifica-se dos 15 alunos, 12 têm idade entre 11 e 12 anos e 4 alunos de 13 anos. Sobre a situação tutelar, 11 alunos vivem com os seus pais.

Tabela 1- Caracterização dos concorrentes à fase provincial

Nome Completo do Aluno

Idade

Escola Primária

Vive com 

Município da Cahama

 Herlander Neves Hikeninge Ngulofi

12 Anos

General Simioni Mukune

Os Pais

Laurinda Nassoma Paz Java

12 Anos

de Ompupa

Os Pais

Joaquim Baptista Maurício

12 Anos

da Jangada

Os Pais

Município de Cuanhama

 

Mirian Takaleni Tulikeni

12 Anos

Nº 122

Os Pais

Deusa Eliane Capessa Clemente

 12 Anos

4 de Janeiro

Os Pais

Palmira Fernando

12 Anos

Nº 122

Os Pais

Município de Cuvelai

 

Victória Kanene Tchindund victorino

13 Anos

Rei Kauvi

Os Pais

José Marcos Venâncio

12 Anos

Rei Kauvi

Os Pais

Jossara Kanepa Lombe

13 Anos

Rei Kauvi

Os Pais

Município de Namacunde

 

Valdimiro Madureira Hunda

11 Anos

"4 de Abril"

A avó

Fernando T. S. Kahala

12 Anos

"4 de Abril"

O pai

António de Jesus  Domingos Vinhanga

12 Anos

"4 de Abril"

Pai

Município de Ombadja

 

Londrisa Nankhali Tavares  Muwambi

11 Anos

"4 de Fevereiro"

Os pais

Eunice Wimbu Afonso Kaluvi

11 Anos

Simione Mukune

Os pais

Esperança Tatiana Marchal Haleinge

11 anos

Mário Sambwako

A tia

Fonte: elaboração própria a partir das fichas produzidas pelas DME/2021.

 

Em termos de estratégia de trabalho, os 15 candidatos deslocaram-se dos seus municípios a Ondjiva, a sede Provincial, excepto os alunos de Cuanhama, acompanhados dos seus professores/tutores e os coordenadores municipais. Os alunos de Namacunde chegaram no dia do concurso e depois tiveram de regressar, tendo em conta a proximidade entre Ondjiva e Namacunde. Os outros alunos alojaram-se nos dormitórios do Complexo Escolar de Oulondelo com refeições garantidas, durante três dias. Segundo os membros da Coordenação Provincial, constataram que os alunos aproveitaram as últimas horas antes de se deitarem a treinarem para os desafios que se lhe colocariam nos subsequentes.

Dos dias em que decorreram as actividades, o primeiro foi o de recepção dos alunos e seus acompanhantes; o segundo foi da realização do Concurso, compreendendo os dois níveis; o terceiro dia foi reservado ao anúncio dos vencedores e encerramento do evento, cujo destaque foi a gala de premiações aos vencedores e presentes aos participantes, seguido por almoço de confraternização em que participaram os alunos, os professores, pais/encarregados de educação e outros convidados. Foi, deveras, um dia memorável tal como poderemos detalhar nas próximas páginas.

 

Perfil da comissão de júri

Para o júri do concurso, foi criada uma comissão de Júri Provincial sob o Despacho do Director do Gabinete Provincial da Educação, nº 15, de 15 de Maio de 2021, de que fizeram parte professores do Ensino Primário, II Ciclo do Ensino Geral e Pedagógica com idoneidade e competência profissionais amplamente reconhecidas. 

Os constituintes da Comissão de Júri:

  1. José Raul Francisco Kamati, Professor de Língua Portuguesa no Magistério de Xangongo;
  2. Simão Pedro José, Professor de Língua Portuguesa no Magistério Doutor António Agostinho Neto, Ondjiva;
  3. Hamilton Venokanya António, Crítico Literário e Professor de Literatura no Liceu Doutor António Didalelwa;
  4. Madalena da Paz Alberto, Professora do Ensino Primário nº 122.

Do ponto de vista representativo, o júri esteve bem composto, julgar pelo perfil académico dos professores e a sua experiência docente. São professores especialistas em Língua Portuguesa e uma delas conta com longa experiência no Ensino Primário.

Um dos aspectos extremamente importante foi o nível de seriedade e responsabilidade demonstrado pelo jurado que, embora alguns presentes apelassem a uma postura mais frouxa, por causa da idade e nível de escolaridade dos concorrentes, o jurado soube primar pela transparência, equidade e uma avaliação com a qualidade que se impunha.

 

Aspectos avaliados

De acordo com o ponto 2.2 do regulamento, são aptos para a fase subsequente do concurso, os candidatos que obtiverem os melhores desempenhos na redacção e na leitura que é, portanto, o objecto do projecto.

Ainda segundo o regulamento:

Os professores, com base nas necessidades e particularidades dos alunos, deverão ter em atenção os seguintes aspectos:

  1. a caligrafia;
  2. a qualidade da leitura;
  3. a qualidade do texto;
  4. a capacidade de imaginação/criatividade.

Caligrafia- os textos deverão ser manuscritos, dentro dos padrões previstos em manuais de caligrafia aprovados pelo Ministério da Educação de Angola. Os alunos deverão participar com textos a manuscritos de 160 a 200 palavras cujos temas serão seleccionados pela equipa de acompanhamento.

Qualidade da leitura- respeitar-se-á à tipologia textual, à modulação, ao ritmo, aos movimentos corporais, observando sempre a faixa etária e o nível de escolaridade do aluno.

Qualidade do texto- observar-se-á a organização textual, a coerência e a coesão textual.

Capacidade de imaginação/criatividade- dever-se-á ter em atenção a originalidade, a singularidade e, sobretudo, a relevância social do texto.

Ademais, a avaliação e classificação serão resumidas numa ficha de avaliação do Concurso a ser proposta pela Coordenação do Projecto e direcções municipais, observando o estabelecido nos critérios de avaliação e respectivas alíneas supra descritas (Regulamento do Concurso, pp. 4-5).

Ora, dos aspectos acima expostos foi elaborada a escala de avaliação do CPRL apresentado nas páginas anteriores. Nesta escala são avaliados os seguintes aspectos abaixo descritos:

-Nível 1 - Redacção: Caligrafia, ortografia, estrutura textual, coesão e coerência, originalidade.

-Nível 2 - Leitura: pronúncia, respeito aos sinais de pontuação, expressividade, postura, fluência.

Um olhar para a pauta do concurso verificou-se que os resultados são assimétricos. As notas dos concorrentes caracterizam de uma forma que permite perceber o real desempenho dos concorrentes à fase final. Um dos aspectos que mais chama a atenção, é que as pontuações alcançadas nesta fase diferem muito daquelas que foram as suas pontuações quer em nível escolar, quer em nível municipal. Por exemplo, a pauta final demonstra que apesar de alguns alunos terem obtido nota máxima, de 10 pontos, na fase final muitos destes, os seus resultados estiveram abaixo da média, isto é, de 5 pontos. Esta situação permite levantar duas questões fundamentais: (i) será que o desempenho dos alunos se comportou de forma decrescente, isto é, bom desempenho nas fases anteriores e mau desempenho na fase provincial? (ii) será que os membros da comissão de júri em nível dos municípios foram menos exigentes e os da comissão provincial foram mais exigentes?

Para uma e outra pergunta, a resposta deve ser construída olhando para aquilo que foi o perfil técnico-profissional dos membros da comissão de júri ao longo das fases do concurso e comparar os textos produzidos pelos alunos e como eles se comportaram no nível 2, isto é, a sua leitura.

Quanto ao perfil dos membros da comissão de júri, cabe destacar que nas fases escolares e municipais, houve dificuldades de encontrar professores com o nível de licenciatura, com especialidade em Língua Portuguesa, pedagogia ou ensino primário. Talvez o factor relacionado com o nível de escolaridade ou a adequação profissional tivesse na base de uma fraca interpretação dos critérios de avaliação previstos no regulamento do Concurso, por um lado. Por outro, pode ser que por se tratar de professores que estiveram a avaliar concorrentes que também são alunos de suas escolas ou municípios, a questão afectiva talvez influenciasse no processo de classificação.

Do antes exposto, presume-se que os membros da comissão de júri atribuíssem notas mais favoráveis à passagem dos concorrentes para as fases subsequentes, como forma de engradecer o município.

Quanto à segunda questão, que levanta a possibilidade de o desempenho dos concorrentes ter reduzido é um aspecto menos relevante, na medida em que os candidatos ao prémio provincial concorreram com os textos apresentados na fase municipal, tendo-se beneficiado de treinamento durante alguns dias antes da fase provincial.

Portanto, a resposta mais provável é de ter havido níveis de rigorosidade quanto ao cumprimento dos critérios de avaliação, sendo as fases escolares e municipais terem sido caracterizadas por um menor grau de exigências.

Em termos comparativos, a nota mínima foi registada no Município de Cuvelai à medida que a máxima no município Cuanhama. Apesar deste comportamento, todos os candidatos do município de Namacunde obtiveram resultados abaixo de 5 pontos, portanto, não atingiram a média da nota que confere a aprovação do aluno, segundo o regime de avaliação das aprendizagens no Ensino Primário.

Não obstante, dos resultados da fase provincial foi possível estimar a média. Para este feito, contaram-se as 15 notas e a sua divisão pela frequência resultou numa média de 4,83 pontos. Este resultado é correspondente a uma nota negativa que, se se der o caso de se verificar em todas disciplinas que compõe o plano curricular do Ensino Primário, o aluno simplesmente não transita de classe.

Ao agruparmos as notas dos concorrentes, registamos que 1 aluno obteve a nota 3,8; 11 alunos obtiveram notas que variam de 4 a 4,8; 1 aluno com a nota 5; 1 aluno, a nota 6 e 1 aluno que obteve a nota 7, 76.

Para uma melhor compreensão dos dados, as médias resultantes do desempenho dos alunos na redacção e na leitura foram agrupadas, das quais resultaram as seguintes categorias: péssima, para resultados cuja média variou de 0 a 3; muito mau, para as médias que oscilam entre 3 e 4; mau, para as médias entre 4 e 5; suficiente, para as médias entre 5 e 6; bom, para as médias entre 6 e 7; muito bom, para as médias entre 7 e 8; e no patamar está a classificação de excelente, para as médias entre 9 e 10.

De acordo com o agrupamento feito, tornou-se possível verificar que nenhum concorrente obteve uma média classificada na categoria de péssimo à medida que nenhum concorrente obteve a classificação de excelente. O maior registo de médias foi classificado de mau, isto é, notas entre 4 e 5. Se formos a fazer uma classificação global, observamos que a classificação dos concorrentes em termos de redacção e leitura é de mau. Quer dizer, os alunos, de uma forma geral, a comissão de júri, com base na Escala do CPRL, classificou de mau o desempenho dos alunos na leitura e na escrita. Este resultado é negativo e demanda despertar os professores sobre a necessidade de adoptarem estratégias que melhore o ensino, principalmente na disciplina da Língua Portuguesa, com o intuito de se reforçar as habilidades dos alunos em produção de textos e leitura em público.

 

Tabela 2. Classificação dos resultados segundo a média

Avaliação Qualitativa

Intervalos registados

Notas registadas

Frequência acumulada

%

% acumulados

Péssimo

<0>3

0

0

0

0

Muito mau

<3>4

1

1

6,7

6,7

Mau

<4>5

11

12

73,2

79,9

Suficiente

<5>6

1

13

6,7

86,6

Bom

<6>7

1

14

6,7

93,3

 Muito bom 

<7>8

1

15

6,7

100

Excelente

0

0

15

0

100

Fonte: elaboração do autor com base nas fichas produzidas pelas DME/2021

 

Portanto, com as notas obtidas neste concurso, cerca de 80% dos alunos estaria reprovado se transferíssemos estes resultados para o sistema de avaliação das aprendizagens vigente no Ensino Primário, em que é considerado aprovado o aluno com média igual ou superior a 5. Os alunos nesta situação são um total de 12 concorrentes. Sob este olhar, a percentagem de alunos aprovados, isto é, com nota igual ou superior a 5, seria estimado em cerca de 20 %, que corresponde a 3 alunos.

Conforme vimos a espelhar, um dos aspectos que prejudicou os resultados dos alunos foi o fraco desempenho registado no nível 1, que corresponde à redacção. Nestes, foram visíveis erros de grafia, falta de pontuação, de coerência e de coesão. Alguns textos estavam excessivamente artificiais, resultante de cópias de notícias de jornais/internet, o que limitou a originalidade e criatividade dos alunos. Mesmo sobre a leitura, observou-se certa mecanização dos alunos, alguns faziam pausas exageradas e outros liam sem a capacidade de observar os sinais de pontuação e faziam uma leitura aquém do esperado para um aluno da 6.ª classe, salvo um terço dos concorrentes. 

O comportamento antes mencionado parece ter raízes psicológicas mais profundas, o que exige uma maior compreensão para melhor intervenção.

É uma tarefa difícil lograr um bom desempenho em leitura e escrita ao mesmo tempo, tendo em conta as exigências de abstracção que decorre do processo de aprendizagem da escrita. Às vezes, pode-se ouvir a alguém a fazer uma leitura com um grau de fluência aceitável, mas, ao se prestar atenção no texto escrito, observa-se muitas falhas, tanto de estrutura, quanto de conteúdo. Nem sempre o que se ouve falar é do jeito que se escreve, como ocorre nas palavras oxigénio, exacto, exercício, transição etc., que para serem correctamente escritas demanda certo conhecimento da estrutura fonológica e gráfica. Por esta razão nos primeiros momentos de alfabetização é natural o indivíduo apresentar muitas dificuldades, pois, o indivíduo transita do aspecto sensorial da linguagem para a imagem da palavra. 

Não é demais esclarecer qual foi a estratégia de trabalho da Comissão de Júri. Cada membro recebeu ficha de avaliação, a também denominada escala do CPRL, através da qual fizeram o preenchimento de todos os aspectos avaliados. Assim, o texto de cada aluno era submetido ao crivo dos quatro membros da Comissão, os quais discutiam detalhadamente o texto e faziam as respectivas anotações e, depois, faziam o devido registo na respectiva ficha.

Os membros da Coordenação Provincial do Concurso, por sua vez, tomaram as fichas de todos os membros de Júri e, com base no pacote Software Excel, puderam calcular a média que cada concorrente obteve na redacção e na leitura, resultante das médias registadas por cada membro de júri e dividido por quatro, correspondente à constituição da Comissão de Júri (ver anexo). Este exercício determinou a posição conquistada por cada concorrente.

Por exemplo, pode verificar-se o antes exposto através do recorte da pauta 4, em que contam os resultados da aluna Mirian que, por sinal, obteve as máximas pontuações tanto nas pautas de cada júri quanto na pauta geral.

 

Tabela 3- Recorte da pauta 4 sobre os aspectos que júri avaliou

Mirian Takaleni Tulikeni

Proficiência em leitura 

Proficiência em redação

Escores

Aspectos

Pont.

Aspectos

Pont.

Média

%

Pronúncia

1,5

Caligrafia

1,5

Respeito aos sinais de pontuação

1,5

Ortografia

1,5

Expressividade

1,5

Estrutura textual

1,5

Postura

1,5

Coesão e coerência

1,5

Fluência

1,5

Originalidade

0,75

Médias

7,5

 

6,8

7,125

71%

Fonte: elaboração do autor com base nas fichas produzidas pelas DME/2021

 

Um olhar microscópico à pauta final (ver em anexo) permite verificar um aspecto muito interessante. As notas mais elevadas foram obtidas por alunos cuja situação tutelar identificada a viverem com os pais. Esta cifra corresponde a 73,3 % dos concorrentes. É nestes dados que estão, igualmente, as notas mais elevadas. Conforme podemos verificar na pauta, dos 15 alunos, 2 alunos que vivem apenas com o pai e obtiveram a nota média de 4,2 e 4,3 respectivamente, à medida que o aluno que vive com a avó obteve a média de 4, 4 pontos. Excepto o aluno que obteve a média de 3,7 pontos, quase todos os alunos que declararam estarem a viver com os seus pais as suas médias estiveram acima dos 4,2 pontos.

Mais uma vez, é manifesta a ideia segundo a qual viver com os pais faz diferença na vida escolar dos alunos e foi esta diferença que a pauta da página seguinte demonstra.

Outro dado não menos importante foram as declarações dos professores da primeira classificada e do segundo classificado, que se consideram profissionais muito exigentes e que têm adoptado uma diversidade de métodos de ensino para alcançar óptimos resultados. Segundo eles, a orientar os alunos a fazerem muitas cópias e a produzirem textos através do ditado e redacção, bem como a ler constantemente têm sido práticas recorrentes nas suas aulas. É sinal claro de que por trás de uma/um aluna/aluno brilhante há um professor competente, comprometido e criativo.

Há, também, um dado de extrema importância descoberto neste concurso. Observamos que a aluna vencedora manifestou, durante as suas declarações, ter muita confiança nas suas capacidades e acreditava estar em altura de seguir uma carreira profissional desafiadora. Este elemento permite corroborar os argumentos que consideram a relação entre o sucesso académico com o autoconceito e a auto-estima. Ou seja, normalmente os alunos com melhores resultados nos exames são aqueles que falam bem de si, confiam nas suas capacidades, acreditam que são capazes de chegar mais longe e tendem a olhar para as dificuldades como desafios e não desculpas para o fracasso. Na verdade, Alunos com autoconceito e auto-estima positivos são mais dedicados aos estudos e parece terem mais apoio tanto dos professores quanto dos pais, uma vez que são, às vezes, tidos como exemplos para os outros.

A análise destes dados nesta perspectiva é de extrema importância, porque permite compreender os alunos no seu contexto sociocultural, uma forma de buscar perceber os fundamentos do comportamento dos indivíduos nos contextos em que se encontram inseridos. Buscar os factores sociais e culturais que subjazem no comportamento dos indivíduos têm um valor significativo para as práticas de avaliação tanto do desempenho dos alunos, quanto para redesenhar estratégias de intervenção em caso de necessidade de melhora.

Considerações finais

A primeira edição do CPRL é um projecto de grande valor pedagógico e social, visto que a análise das fases escolares, municipais e provincial demonstram ser possível promover actividades que contribuam para o reforço das habilidades de leitura e de escrita e da socialização dos alunos da 6.ª classe. Outrossim, por meio deste concurso ficou manifesto que é possível desenvolver práticas alternativas de avaliação das aprendizagens que envolvem, não apenas os professores e alunos, como também os pais/encarregados de educação e outros intervenientes do processo de ensino-aprendizagem. Este exercício permite protagonizar uma avaliação conjunta, entre a escola e a comunidade escolar, e engendrar uma aprendizagem mais transversal ao levar o aluno a produzir textos que reflictam a sua realidade sociocultural e histórica.

Assim, a análise deste concurso revelou as seguintes lições:

  1. Na província do Cunene, existe uma taxa considerável de desfasagem idade/classe, isto é, muitos alunos matriculados na 6.ªclasse têm idade superior a 13 anos, tendo em conta as declarações dos directores de escolas e o recorte dos dados estatísticos da província referente ao ano lectivo 2020/2021;
  2. Existem muitas escolas situadas em localidades de difícil acesso, tento em conta o número considerável de alunos que ficaram de fora de acordo com as declarações dos directores escolares;
  3. As habilidades dos alunos avaliados nos domínios da leitura e escrita situam-se abaixo de 5 valores, cerca de 80% dos resultados, com uma classificação qualitativa de mau;
  4. Foi possível verificar uma correlação entre o desempenho dos alunos em redacção e em leitura, sendo que os alunos cujos pais têm elevado nível de escolaridade, acima do nível médio, apresentaram melhor desempenho;
  5. Os alunos que vivem com os pais, isto é, o pai e a mãe, mostraram bons resultados no concurso, tendo chagado à fase final, em detrimento daqueles que são cuidados por um dos progenitores ou por tios, irmãos e/ou outras pessoas;
  6.  Os alunos concorrentes apresentaram maiores dificuldades nos domínios da escrita, com maior realce em erros gráficos, falta de coesão e coerência textual;
  7. Os concorrentes com melhor desempenho em leitura e escrita são alunos de professores mais exigentes em cujas aulas há aplicação de diversidade de métodos;
  8. Os professores e os pais/encarregados de educação reconheceram a importância do concurso para despertar o gosto pela leitura e pela escrita dos alunos, sendo uma oportunidade para a continuidade da sua realização.

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