Autopista da miserável situação na África Subsaariana

Por Lito Nunes Fernandes | 02/08/2010 | História


Na história da humanidade, a posição que a África ocupava antes da invasão européia era muito privilegiada. É bom não esquecer que antes da chegada Européia, a África através dos seus diversos impérios, reinos e dinastias, contava com instituições bem organizadas e estruturadas. A chegada dos europeus não só marcou o inicio dos contactos entre a civilização européia e africana, mas também significou a destruição das sociedades autóctones que tinham criado instituições próprias e que funcionavam com certa estabilidade. Ao mesmo tempo, também significou a intensificação da nefasta atividade de escravidão que exauriu a África de braços e mentes por quase cinco séculos. Após a escravidão, o domínio físico e a instituição do sistema colonial retardaram em quase um século a retomada das instituições e do crescimento africano, oprimindo, barbarizando e colonizando territórios e seres humanos, diminuindo as coadjuvantes da sua própria história (Filho, 2000).
Dito de outra forma, a África foi obrigada a comprimir o papel de fornecedor de combustível necessário para a primeira industrialização ocidental, enquanto se condenava a sim mesma a pobreza e ao subdesenvolvimento. Contudo, esses fatores que provocaram que os Estados africanos atrasassem em ordenar as suas economias e finanças públicas, parecem ser ignorados pelos acadêmicos e cientistas ocidentais, na hora de analisar a situação atual enfrentada por esses países.
Os acadêmicos ocidentais se dedicam simplesmente a relacionar a situação enfrentada pela maioria da população africana à ausência da democracia, instituições sólidas e políticas, infra-estruturas e problemas étnicos etc. Ou seja, a literatura ocidental passa por alto os verdadeiros fatores originarias da problemática africana como são a dominação durante séculos, o processo de colonização que veio posteriormente e o trato desigual dos países africanos no comércio internacional.
Mas aqui também existe um fator crucial e cruel que permite fazer outra leitura da dura realidade africana: durante a colonização era proibida a industrialização e a escolarização nas colônias africanas. As infra-estruturas, a democracia e o desenvolvimento não podem ser construídos em um período de 40 anos - a maioria dos países africanos conquistou a independência no final da década de 1960 e alguns conseguiram esse fato só em meados da década de 1970. Paralelamente, resulta quase impossível erradicar o analfabetismo, se esses países só começaram a ter universidade depois das independências nacionais e, outros, inclusive só tiveram universidades na década de 1990. Numa visão mais realista, seria uma crueldade exigir aos países africanos de estarem no mesmo nível de desenvolvimento com os países de outras regiões.
Por exemplo, quando terminou a Segunda Guerra Mundial os Estados Unidos disponibilizou uma quantia exorbitante para a reconstrução da Europa destruída, através do "Plano Marshall", que incluía pontos fundamentais para salvar os países europeus devastados pela Guerra. Partindo deste ângulo de visão, a África que foi saqueada, destruída e roubada tudo o que tinha construído ao longo de quase cinco séculos, por que não se idealizou um plano para sua reconstrução? Por que não houve sansões aos países colonizadores ou indenizações aos povos africanos? Fala-se que os países africanos carecem de infra-estruturas, democracia ou que apresentam altas taxas de analfabetismo.
Entretanto umas das iniciativas interessantes para o arranque do desenvolmentismo foi o a elaboração de Plano de Ação de Lagos (PAL), que continha pontos fundamentais para tirar a África da situação onde se encontrava. E, quando o plano começava a dar seus primeiros frutos e a retomada do crescimento, apareceu a política ditatorial do FMI/BM denominado Políticas (Planos) de Ajuste Estrutural- PAE, que na verdade não só veio destruir os avanços que a África estava obtendo através de PAL, mas também albergava a intenção de abrir as fronteiras africanas e liberar suas economias para a entrada das grandes transnacionais ocidentais para assim continuar a perpetuar a dependência africana face grandes potências ocidentais.
Os resultados da PAE produziram efeitos perversos, e entre alguns se citam a supressão dos déficits públicos ? redução dos gastos sociais e dos investimentos públicos. Na verdade, a implementação de PAE tinha outro motivo bem claro: afastar os países africanos dos ideais socialistas. Na altura se vivia o clima da bipolaridade - Guerra Fria-, e muitos países africanos depois das independências, tinham certas inclinações socialistas, por receberem ajudas da extinta Comunidade de Ajuda Mutua Econômica (CAME). Assim, para frear essa tendência em plena época de Guerra Fria, os EUA atuaram de forma estratégica e destruíram os planos e as ajudas que os africanos recebiam do campo socialista.
Depois das independências nacionais os novos estados africanos necessitavam de capital financeiro para fazer novas infra-estruturas, financiar as indústrias e a construção das escolas que eram proibidas na etapa colonial como já referida anteriormente. Na altura, o mundo estava inundando de liquidez e o volume de dólares aumentava consideravelmente, e resolveram emprestar aos países africanos. Aproveitando da situação, alguns países industriais emprestavam aos governos africanos a juros baixos, para que estes pudessem comprar seus produtos ou mercadorias na mesma proporção da quantidade do empréstimo, fato que segundo Toussaint e Millet (2006), permitiu o surgimento da parte multilateral da divida externa.
Mas nesse ponto, inicia o outro ângulo de análise de problemática africana. Na verdade, nestes primeiros anos, os governos e as elites africanas endividaram fortemente os seus países, aproveitando desta forma transferir para suas contas pessoais quantias pedidas emprestadas em nome do Estado; motivo pelo qual, na época, muitos ditadores africanos possuíam fortunas maiores que as dívidas dos respectivos países. Como não podia ser diferente, esta situação também beneficiou os bancos dos países desenvolvidos já que o dinheiro voltava aos seus cofres e podia ser novamente emprestado a outros. Ou seja, os países desenvolvidos também foram cúmplice da corrupção dos ditadores africanos na hora de dilapidar as fortunas dos seus países e que teve uma contribuição decisiva no aumento da dívida dos países subsaarianos.
A conclusão nos remete a dizer que os países desenvolvidos dispõem de tecnologia e recursos necessários para permitir que o desenvolvimento seja alcançado por todos e livrar a humanidade da pobreza e extrema miséria. Entretanto essa vontade não existe, até porque com uma África desenvolvida os países desenvolvidos não teriam onde apoderar-se das matérias primas; onde abusar de mão-de-obra barata; onde vender os seus arsenais bélicos; nem onde realizar seus experimentos científicos, muitas das vezes nos próprios seres humanos em vez de animais. Então, para a África, o que resta é buscar soluções viáveis e palpáveis e deixar de colocar a culpa nos países desenvolvidos; porque mesmo reconhecendo que são os maiores responsáveis pela atual situação da ASS, a verdade é que também houve uma participação decisiva dos próprios africanos; começando pelos ditadores nas décadas passadas que decapitaram todas as riquezas do povo até os atuais corruptos governantes; que munidos da ideologia capitalista; se dedicam a maximizar suas riquezas em detrimento do resto da população, inviabilizando o crescimento e posterior desenvolvimento.